Introdução
A produção de suínos evoluiu muito nas últimas décadas, emconsequência de avanços nomelhoramento genético, nutrição e sanidade. O alto padrão da carne suína, produzida atualmente, está relacionado a carcaças com baixa quantidade de gordura e à utilização de padrões sanitários e de segurança dos alimentos comparáveis ou superiores aos de outras carnes. No entanto, toda essa evolução resultou, em alguns casos, em carne de qualidade inferior, em relação a aspectos tecnológicos e sensoriais.
Estudos que comparam linhagens de suínos, selecionadas para produzir carne magra, a linhagens controle, anteriores à seleção, apontam a redução da gordura intramuscular e escores inferiores de cor, marmoreio e firmeza nos animais selecionados (Cameron et al., 2000; Fabian et al., 2003).
Algumas raças de suínos melhoradas, tais como a Duroc, são conhecidas pela melhor qualidade da carne em razão de maior quantidade de gordura intramuscular, mas com espessura de toucinho comparável ou até superior à de outras raças exóticas melhoradas (Edwards et al., 2003; Wood et al., 2004). A raça Moura, naturalizada no Brasil e com menor grau de seleção para produção de carne, tem elevada espessura de toucinho e pequena profundidade de lombo, o que resulta em baixa percentagem de carne magra na carcaça (Fávero et al., 2007) e, acredita-se, em elevado grau de marmoreio.
Por meio de cruzamentos das raças Duroc e Moura com genótipos provenientes do cruzamento de raças melhoradas, para se obter ganho de carne magra, espera-se obter uma melhoria da qualidade da carne, desempenho satisfatório e composição de carcaça compatível com produções comerciais modernas.
Com relação à melhoria da qualidade da carne, principalmente em termos de quantidade de gordura intramuscular, o objetivo é agregar valor ao produto, tanto para consumo in natura como de produtos processados, principalmente os curados e fermentados crus. Carnes com níveis de gordura intramuscular abaixo de 2% têm atributos sensoriais, tais como suculência e sabor, afetados negativamente (Fernandes et al., 1999a). Todavia, o aumento da gordura intramuscular até 3,5% melhora a textura, o sabor e a aceitabilidade, desde que não associada a aumento da gordura visível (Fernandes et al., 1999b).
Algunstrabalhosmostramque gordura intramuscular mais elevada, obtida com dietas baixas em proteína, resulta em maior suculência e maciez da carne (Wood et al., 2004; Teye et al., 2006), conforme a raça e o músculo avaliado (Wood et al., 2004). Porém, as exigências de aminoácidos dos suínos variam com diversos fatores, entre eles raça ou genótipo, densidade energética da dieta, temperatura ambiente, densidade no alojamento e estado sanitário (National Research Council, 1998).
Entre os fatores genéticos, citam-se, principalmente, a taxa potencial de deposição de proteína corporal e a capacidadeparaconsumodiáriodealimento.Assim,raças ou cruzamentos com taxa de crescimento, capacidade de consumo e composição de carcaça diferenciadas terão diferentes exigências de aminoácidos. Além disso, dietas com baixos níveis de aminoácidos, em relação às exigências, tendem a proporcionar maior quantidade de gordura intramuscular em suínos (Teye et al., 2006; Alonso et al., 2010), embora este efeito possa ser dependente da raça (Wood et al., 2004). O objetivo desse trabalho foi avaliar a influência do genótipo e de teores de aminoácidos na dieta sobre o desempenho, retorno econômico e qualidade da carcaça e da carne de suínos.
Material e Métodos
O experimento foi conduzido nas instalações da granja experimental da Embrapa Suínos e Aves, em Concórdia, SC. Foram utilizados 112 animais, com peso médio inicial de 23,36±2,49 kg, recém-saídos da creche e que passaram por período de adaptação de 15 dias até o início do experimento.
Os genótipos resultaram dos cruzamentos de machos Duroc e Embrapa MS115 (62,5% Pietrain, 18,75% Large White e 18,75% Duroc) com fêmeas Moura e F1 (Large White x Landrace) e foram avaliados nos seguintes grupos: 1, macho Embrapa MS115 x fêmea F1 (MS115xF1); 2, macho Duroc x fêmea F1 (DCxF1); 3, macho Embrapa MS115 x fêmea Moura (MS115xMO); 4, macho Duroc x fêmea 25% Duroc, 50% Large White, 25% Moura (DCxMO3).
Em cada grupo, foram comparados dois níveis de aminoácidos em fêmeas e em machos castrados. O delineamento foi o de blocos ao acaso (peso inicial dentro de sexo e genótipo), com os tratamentos dispostos em esquema fatorial 4x2x2. Foram utilizados 23 animais (14 machos e 9 fêmeas) do genótipo resultante do cruzamento Moura x Embrapa MS115, e 28 animais (14 machos e 14 fêmeas) de cada um dos outros genótipos; cada animal representou uma repetição. Os dois níveis de aminoácidos utilizados foram os recomendados por Rostagno (2005), para o desempenho superior ou médio de machos castrados com alto potencial genético. Os níveis dos demais nutrientes foram similares entre as dietas dentro da mesma fase, e atenderam às recomendações dos mesmos autores (Tabela 1).
A ração foi fornecida à vontade, e as trocas de ração se deram de acordo com o peso vivo, aos 54,6, 73,7 e 99,7 kg, em média. Os animais foram alojados em baias individuais, com divisórias ripadas, comedouro semiautomático e bebedouro automático, durante todo o período experimental.
O abate foi feito em abatedouro comercial, em datas diferentes para cada grupo genético, de acordo com o período necessário para que o peso vivo médio atingisse aproximadamente 118 kg. Os animais foram pesados no dia anterior ao abate. A ração foi retirada às 15 h e o carregamento foi feito às 3h da manhã seguinte. O transporte durou 25 minutos, e o período de descanso pré-abate foi de três horas.
As variáveis de desempenho do crescimento foram avaliadas por meio de pesagens periódicas dos animais e do controle do consumo de ração. Após o abate, foram avaliadas a espessura de toucinho e a profundidade do lombo, de acordo com o procedimento de rotina do abatedouro, com uso de uma pistola de tipificação automática da marca SFK. Foram feitas duas avaliações do pH, uma aos 45 minutos e outra 24 horas após o abate, no músculo longissimus dorsi, na altura da última costela (P2), com um medidor de pH portátil, da marca Hanna. Vinte e quatro horas após o abate, foi avaliada a cor pelo sistema CIE Lab (L*, a*, b*), com um colorímetro Minolta (Minolta Camera Ltda., Japão), em que: L indica a luminosidade; a indica a cromaticidade que tende do verde (-) ao vermelho (+); e b indica a cromaticidade que varia do azul (-) até o amarelo (+) ; também foram avaliados a cor e o marmoreio visual, por meio dos padrões da American Meat Science Association (2001). A saturação (S), que indica a intensidade da cor, foi calculada pela seguinte equação (Little, 1975): S = (a* 2 + b* 2 ) 0,5 .
As cores visual e instrumental foram avaliadas após um período de exposição da amostra ao ar por 20 minutos, para estabilização do pigmento. Por ocasião dessa avaliação, também foram coletadas amostras do músculo longissimus dorsi e do semimembranosus, para avaliação da perda de água por gotejamento, além de amostras do longissimus dorsi para determinar gordura intramuscular.
A perda de água por gotejamento foi avaliada em amostras de 8 a 12 g, pesadas e colocadas em recipientes para suco de carne, com copo coletor do exsudato e, em seguida, refrigeradas com temperaturas entre 2 e 4 °C, durante 48 horas. Ao final deste período, as amostras foram novamente pesadas, e a perda por gotejamento foi determinada em percentagem, pela diferença entre os pesos inicial e final da amostra (Honikel, 1998).
Tabela 1. Ingredientes e composição nutricional das dietas experimentais com dois conteúdos de aminoácidos, em duas fases de crescimento e de terminação.
As amostras utilizadas para a avaliação da gordura intramuscular foram congeladas a -20°C, logo após a coleta. Posteriormente, elas foram descongeladas, moídas em multiprocessador, acondicionadas em embalagens de alumínio descartáveis e, novamente, congeladas, mantidas por 24 horas em freezer a -25°C e liofilizadas a -40°C, até umidade constante utilizando o liofilizador Liobrás Modelo LP810 (Liobrás, São Carlos, Brasil).
Após a liofilização, as amostras foram moídas em moinho refrigerado Foss (Foss Analytical, Hoganas, Suécia) e armazenadas em freezer a -25°C, para análise da composição química proximal. A determinação da matéria seca foi feita de acordo com as normas analíticas do Pregnolatto & Pregnolatto (1985), em estufa a 105°C. A determinação da proteína bruta foi feita pelo método de Kjeldhal, a extração da gordura foi feita em aparelho Soxhlet (Foss Analytical, Hoganas, Suécia), com éter de petróleo, e as cinzas com a queima em mufla, ambas de acordo com os procedimentos descritos no Association of Official Analytical Chemists (1995).
Os dados foram submetidos à análise da variância por meio do procedimento GLM do SAS Institute (2001). Para estudo da eficiência alimentar, foi avaliado o ganho de peso diário, ajustado pela covariável consumo de ração. Os dados de espessura de toucinho e peso da carcaça quente foram ajustados com uso do peso ao abate como covariável.
Para comparação das médias, foi utilizado o teste de Tukey, a 5% de probabilidade.
Resultados e Discussão
O conteúdo de aminoácidos nas dietas não influenciou nenhuma das variáveis de desempenho (Tabela 2). A maior parte das características avaliadas foi influenciada pelo genótipo.
Os leitões foram selecionados de forma a que a idade inicial fosse o mais próxima possível entre os genótipos e tratamentos. Apesar da maior diferença em idade entre os genótipos ser de apenas cinco dias, esta diferença foi significativa (Tabela 2). Da mesma forma, os pesos ao final do período de adaptação foram diferentes entre os genótipos, em razão das diferenças na taxa de crescimento das raças envolvidas. Os suínos DCxF1 apresentaram o maior peso ao final do período de adaptação, seguidos dos MS115xF1 e DCxMO3, e os leitões MS115xMO apresentaram o menor peso. Os animais foram abatidos em idades diferentes, para que atingissem peso final estatisticamente semelhante. O número de dias na fase crescimento–terminação e a idade de abate foram mais elevados nos animais do genótipo MS115xMO, seguidos dos MS115xF1, tendo sido os suínos DCxMO3 e os DCxF1 abatidos com menor idade (Tabela 2).
Da mesma forma que o peso de abate, o peso da carcaça quente não foi diferente (p>0,05) entre os genótipos.Ainda assim,utilizou-seopesoaoabate como covariável, para ajustar os valores de peso da carcaça quente com intuito de reduzir o erro experimental.
Tabela 2. Média±erro-padrão das variáveis de desempenho e de carcaça dos genótipos avaliados (1)
Houve interação (p<0,05) entre genótipo e conteúdo de aminoácidos nas dietas, para a variável consumo diário de ração (Tabela 2). O maior consumo diário foi observado no genótipo DCxMO3, com o conteúdo mais elevado de aminoácidos, e no DCxF1, em ambos os conteúdos de aminoácidos (alto e médio); enquanto os suínos do genótipo MS115xMO, alimentados com elevado conteúdo de aminoácidos, e os MS115xF1, com ambos os conteúdos de aminoácidos, apresentaram os menores consumos. O baixo consumo de ração dos animais MS115xMO em dieta com elevado conteúdo de aminoácidos pode ser explicado pela menor exigência de aminoácidos destes animais, que satisfazem seus requerimentos com menor consumo da dieta. O baixo consumo dos animais MS115xF1 pode estar relacionado ao padrão das raças que compõem o MS115, que é um genótipo selecionado para melhoria da conversão alimentar e para produção de carne magra – características ligadas a baixo consumo voluntário de alimento – e que inclui na sua composição genética a raça Pietrain. A seleção de um genótipo para melhor conversão alimentar tende a induzir baixo consumo voluntário de alimento (Cameron et al., 1999). O alto consumo de alimento, dos animais que contêm Duroc em sua composição, era esperado, pois esta raça tem apresentado consumo superior ao de outras utilizadas em linhas macho (National Pork Producers Council, 1995). O mesmo tem sido observado em progênies de machos terminais que contêm Duroc (Auspurger et al., 2002).
O ganho de peso diário foi maior nos animais dos genótipos DCxF1 e DCxMO3, do que nos animais MS115xF1 e MS115xMO (Tabela 2). Este resultado pode ser atribuído, inicialmente, a diferenças genéticas quanto às taxas de crescimento (National Pork Producers Council, 1995), com reflexos na curva de crescimento e no peso à maturidade (Fisher et al., 2003), e pode ser atribuído também ao maior consumo de ração dos animais dos dois primeiros genótipos, comparadas aos de MS115xF1, já que a conversão alimentar foi semelhante entre ostrês. O menor ganho de peso diário, observado nos animais MS115xMO, também pode ser atribuído a diferenças genéticas da raça Moura quanto à taxa de crescimento (Fávero et al., 2007), ao consumo de ração e à conversão alimentar destes animais. O efeito do consumo de ração sobre o ganho de peso diário é demonstrado no ganho de peso ajustado por covariável, para o mesmo consumo de ração, que foi semelhante entre os genótipos DCxF1, MS115xF1 e MO3xMS115, e superior ao MS115xMO.
Os resultados deste estudo estão de acordo com os relatados por Fávero et al. (2007), que verificaram crescimento mais lento e pior conversão alimentar em suínos Moura puros, em comparação a animais resultantes do cruzamento MS60 xF1. Brandt et al. (2010) também observaram pior desempenho zootécnico em suínos de raças nativas não melhoradas e seus cruzamentos, em comparação a genótipos comerciais. Com relação ao efeito negativo da raça Pietrain sobre o consumo voluntário de alimento, à taxa de ganho diário de peso e ao efeito positivo da raça Duroc sobre estas mesmas variáveis, este trabalho também está de acordo com o National Pork Producers Council (1995), Augspurger et al. (2002) e Edwards et al. (2006).
Os animais com 50% de raça Moura (MS115xMO) apresentaram desempenho zootécnico inferior àqueles com 12,5% (DCxMO3) e aos demais genótipos avaliados. O alto consumo de alimento dos animais resultantes dos cruzamentos cujo cachaço terminal era o Duroc garantiu a estes animais ganho de peso superior em comparação aos resultantes do cruzamento com cachaços MS115; porém, a conversão alimentar e o ganho de peso ajustado pelo consumo foram semelhantes entre esses genótipos. Tais resultados estão de acordo com osrelatos de Edwards et al. (2006), que observaram maior ganho de peso nas progênies de machos Duroc, em comparação aos de progênies de machos Pietrain, mas a eficiência alimentar foi semelhante entre os genótipos. Porém, esses resultados diferem dos de Latorre et al. (2003), que observaram ganho diário de peso mais elevado em suínos Duroc puros comparados a suínos Duroc x Large White e Pietrain x Large White, mas com consumo diário de alimento similar e conversão alimentar superior nos animais Duroc puros.
Foi observada interação (p<0,05) entre sexo e genótipo para a variável espessura de toucinho ajustada pelo peso ao abate (Tabela 2).As maiores espessuras de toucinho ocorreram nos machos e fêmeas MS115xMO e nos machos DCxMO3, enquanto as menores foram observadas nos machos DCxF1 e MS115xF1. Altas espessuras de toucinho eram esperadas nos suínos com maior percentagem da raça Moura, o que está de acordo com os dados de Fávero et al. (2007). Um fato inesperado foi a espessura de toucinho das fêmeas DCxF1 e MS115xF1, mais elevada do que nos machos dos mesmos genótipos.
Não houve interação entre osfatores genótipo, níveis de aminoácidos e sexo, em nenhuma das características de qualidade de carne avaliadas. Somente o marmoreio foi influenciado pelo nível nutricional, enquanto a maior parte dessas variáveis foi influenciada pelo genótipo (Tabela 3). Observou-se maior escore de marmoreio no lombo, nos animais que receberam a dieta com o menor conteúdo de aminoácidos (1,66 ± 0,12 vs. 1,92 ± 0,11; p<0,05). Estes resultados estão de acordo com os relatos de Wood et al. (2004), Teye et al. (2006) e Alonso et al. (2010), que observaram maior nível de gordura intramuscular em suínos alimentados com dietas com teor reduzido de proteína e baixa relação lisina/energia. No presente estudo, os níveis reduzidos de aminoácidos foram suficientes para elevar o marmoreio, sem, no entanto, prejudicar o desempenho nem aumentar a espessura de toucinho. Wood et al. (2004) e Teye et al. (2006), no entanto, relataram redução do ganho de peso diário com a redução do conteúdo de proteína.
Também foi observado o efeito de genótipo no escore visual de marmoreio (Tabela 3), que foi maior nos animais MS115xMO, e menor nos MS115xF1. Este resultado era esperado, pois a seleção para produção de carne magra reduz a gordura intramuscular (Cameron et al., 2000; Fabian et al., 2003), e a linha fêmea do cruzamento MS115xF1 é selecionada para carne magra, ao contrário da linha fêmea do cruzamento MS115xMO. O segundo maior escore de marmoreio foi observado nos animais DCxF1, o que também foi relatado por outros autores em relação a Duroc e seus cruzamentos (Candek-Potocar et al., 2002; D´Souza & Mullan, 2002; Suzuki et al., 2003; Wood et al., 2004; Olivares et al., 2009). O baixo escore de marmoreio do genótipo MS115xF1 também pode ser explicado pela presença da raça Pietrain, que normalmente imprime esta característica em sua progênie, ao contrário da raça Duroc (Edwards et al., 2003).
Os resultados de gordura intramuscular, determinada pela extração em laboratório, não coincidem exatamente com os dados de marmoreio. Esta variável sofreu alteração apenas dos efeitos principais de genótipo e sexo. Porém, os genótipos DCxF1, DCxMO3, e MS115xMO apresentaram valores de gordura intramuscular semelhantes entre si, enquanto o genótipo MS115xF1 apresentou o menor valor (Tabela 3), o que era esperado, pois os três primeiros continham ao menos uma linha de alto marmoreio, ao contrário do último.
Embora tenham sido observados resultados conflitantes entre os diferentes indicadores de gordura intramuscular, é possível afirmar que a presença da raça Moura nos genótipos proporcionou aumento na espessura de toucinho e na gordura intramuscular, enquanto a raça Duroc influenciou apenas a gordura intramuscular. Esta última variável é importante para a qualidade da carne, em razão de seu efeito sobre a suculência e a maciez da carne in natura (Teye et al., 2006; Alonso et al., 2010) e sobre o sabor e textura dos produtos processados curados.
Tabela 3. Média±erro-padrão de variáveis de qualidade da carne do lombo e do pernil, nos genótipos de suínos avaliados (1)
Os animais DCxMO3 apresentaram os maiores valores de L*, a* e b* (Tabela 3). Os menores valores de L* foram observados nos animais MS115xMO. A maior intensidade da cor, indicada pela saturação da cor, ocorreu nos animais DCxMO3 e a menor nos animais MS115xF1. Os maiores valores de a* e a maior saturação da cor na carne dos animais DCxMO3 indicam carne com tendência para uma coloração mais avermelhada, mas com alta luminosidade dada pelo maior valor de L*. Para os escores visuais de cor do lombo e do pernil, os maiores valores foram observados nos animais MS115xMO, e os menores nos animais DCxF1. Com a análise conjunta dos valores de L*, a* e b*, saturação da cor e escores visuais de cor, verificou-se que os animais MS115xMO e DCxMO3 tiveram as características mais favoráveis, dadas pela coloração mais escura (maior escore visual) e com menor luminosidade (menor valor de L*) em MS115xMO, e pela coloração mais avermelhada (maior valor de a*) e mais intensa (maior saturação da cor) em DCxMO3.
O pH medido 45 minutos após o abate também variou entre os genótipos avaliados (Tabela 3). Os menores valores, tanto do lombo quanto do pernil, foram observados nos animais MS115xMO, e os mais elevados nos animais DCxF1 e DCxMO3. Com relação ao pH medido 24 horas após o abate, não foram observadas diferençassignificativas entre os genótipos, na análise de variância do lombo e no teste de médias para o pernil. Esperava-se que os genótipos com raça Moura tivessem pH mais elevado do que os demais, o que efetivamente ocorreu no genótipo DCxMO3, mas não no MS115xMO, já que a seleção para carne magra e desempenho zootécnico em outras raças tem levado a uma deterioração dos aspectos tecnológicos e sensoriais da carne (Cameron et al., 2000; Fabian et al., 2003; Gilbert et al., 2007). É provável que as raças envolvidas no lado paterno desses cruzamentos tenham desempenhado um papel fundamental para as diferenças observadas nesta variável, entre os genótipos avaliados.
A perda de água por gotejamento no lombo foi mais elevada nos animais MS115xMO do que nos demais genótipos (Tabela 3). No pernil, a perda de água por gotejamento mais elevada foi observada nos animais MS115xF1, e a menor foi no DCxMO3. A maior perda de água do lombo por gotejamento, observada nos animais MS115xMO, coincide com os baixos valores de pH medidos 45 minutos após o abate, o que poderia ser indício de ocorrência de carne PSE ("pale, soft and exudative", ou pálida, macia e exsudativa) neste genótipo; porém, os baixos valores de L* e o alto escore visual da cor não confirmaram isto.
Os resultados obtidos no presente estudo, quanto aos aspectos da qualidade de carne que dependem mais diretamente do manejo pré-abate, tais como pH aos 45 minutos após o abate, cor e perda de água por gotejamento, devem ser analisados com reserva, pois os animais foram abatidos em datas diferentes, o que inevitavelmente acarreta variações nas variáveis ambientais e de manejo. É de conhecimento geral a interferência destes fatores na qualidade da carne. Portanto, estas características necessitam ser mais bem avaliadas em estudos com abate simultâneo dos diferentes genótipos.
Em termos econômicos, como a conversão alimentar não diferiu entre os genótipos MS115xF1, DCxF1 e DCxMO3, pode-se dizer que o custo de produção no crescimento-terminação foi semelhante entre os três genótipos. No entanto, em razão da pior conversão alimentar e maior tempo para atingir o peso de abate, os animais MS115xMO tiveram maior custo de produção. Em relaçãoà receita,somente comosdadosde espessura de toucinho, é possível ordenar os tratamentos quanto à remuneração das carcaças. A espessura de toucinho é o principal componente nas equações utilizadas na agroindústria para a definição da percentagem de carne magra nas carcaças (Guidoni, 2000). Assim, para um mesmo peso de abate, no mercado convencional, onde o pagamento é feito em função da percentagem de carne magra (Guidoni, 2000), é possível afirmar que a receita mais elevada será obtida nos genótipos MS115xF1 e DCxF1, seguida pela dos DCxMO3 e, por último, a dos genótipos MS115xMO, em razão da maior espessura de toucinho e, consequentemente, menor percentagem de carne magra nestes dois últimos.
Conclusões.
- A inclusão da raça Moura em alta proporção nos cruzamentos influencia negativamente o desempenho zootécnico, e deve ser recomendada somente para atender mercados alternativos que paguem prêmio pela melhor qualidade da carne, tanto in natura como em produtos processados.
- Os genótipos que contêm Duroc apresentam melhor desempenho zootécnico que os demais genótipos avaliados.
- A raça Moura influencia negativamente a qualidade da carcaça e positivamente a qualidade da carne, a depender de sua proporção nos cruzamentos.
- A raça Duroc influencia positivamente a qualidade da carne nos cruzamentos.
- Conteúdosreduzidos de aminoácidos proporcionam aumento do marmoreio, independentemente do genótipo utilizado, mas não prejudicam o desempenho zootécnico.
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