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Existe mais selênio inorgânico na selênio-levedura do que se acreditava anteriormente?

Publicado: 13 de dezembro de 2022
Por: Mohammed Amine HACHEMI, DMV; Mickaël BRIENS, PhD; Michele DE MARCO, PhD
Por muitos anos, a eficiência das fontes de selênio orgânico (Se) – em particular, de seleno-leveduras (SL) – foi vinculada ao nível de selenometionina (SeMet), fazendo com que a avaliação do teor e da forma de Se fosse crucial para garantir sua bioeficácia. Como essa composição e a especificação do produto são muito críticas, existe um nível regulatório europeu mínimo para as SL, que é de 97-99% do Se total sob forma de Se orgânico, bem como um mínimo de 63% do Se total como SeMet. Aperfeiçoamentos analíticos recentes permitiram que se medisse outra forma de Se inorgânico, ou seja, Se Elementar (Se0), antes não caracterizado em produtos. Quando aplicado às SL, melhora a diferenciação entre selênio inorgânico e orgânico e, portanto, deve-se levar em conta o Se0 para obter uma avaliação precisa da composição variável de SL. Também poderiam surgir novas questões relacionadas à categorização dessas formas de Se e sua importância nutricional.
Introdução  
O selênio é um mineral essencial na nutrição animal, em grande medida devido a seu papel chave na defesa antioxidante, na imunidade e na modulação de processos inflamatórios. Dado que a maioria dos ingredientes de ração do mundo todo é deficiente em Se, a suplementação da dieta com Se é uma prática comercial padrão. O Se é incluído em premix para animais tanto em formas inorgânicas (sobretudo selenito de sódio), cuja bioeficácia é muito baixa, ou em formas orgânicas, tais como SL inativada, ou em formas quimicamente puras sintetizadas (SeMet, hidróxi-selenometionina: OH-SeMet), conhecidas por sua bioeficácia mais elevada. Sabe-se que o teor de SeMet das SL varia muito de um fornecedor a outro, bem como entre bateladas de produção (Fagan et al. 2015). O processo de fabricação de SL inclui fornecer uma levedura de crescimento, principalmente Saccharomyces cerevisiae, ao Se inorgânico e permitir que a levedura sintetize certas quantidades de SeMet e a incorpore não especificamente às proteínas da levedura sob forma de SeMet. Sabe-se que a tecnologia para a produção da SL é bastante complexa, e que a eficiência da síntese de SeMet e de sua incorporação à levedura depende de muitos fatores (condições de fermentação, cepa da levedura, protocolo de adição de Se, meio de base, fonte de energia (melaço), pH, temperatura, velocidade de agitação, aeração, tamanho do inóculo, tempo de incubação e concentração de Se inorgânico, que é altamente tóxico).  É difícil padronizar o manejo de todos esses fatores, o que explica a grande variabilidade da eficiência do processo. Essa variabilidade leva a amplas variações no teor de SeMet, principal fator da bioeficácia do Se nos animais (De Marco et al. 2021). A composição em Se das 13 amostras comerciais frescas de SL de diferentes bateladas (CNCM I-3060, CNCM I-3399, NCYC R397, NCYC R645 e NCYC R646) foi pesquisada recentemente usando novos métodos analíticos de última geração. Essas SL são aprovadas como suplementos de ração com um requisito de específicação de produto de no mínimo 97% do total de Se sob forma de Se orgânico, bem como no mínimo 63% do total de Se como SeMet, de acordo com a regulamentação europeia.
Ainda é alta a variabilidade do teor de selenometionina em produtos de selênio-levedura
A elevada variabilidade da proporção de SeMet nas SL já é conhecida há algum tempo. De fato, diversos estudos revisados por pares (peer reviewed), bem como opiniões abalizadas, relataram diferentes faixas de variabilidade (de 50 to 75%; Surai et al. 2018). Essa nova avaliação, realizada com produtos comerciais recém adquiridos confirma que, embora a concentração de Se total dos produtos comeriais estava em acordo com as indicações da etiqueta, a citada variabilidade da proporção de SeMet é inerente ao processo produtivo. (Figura 1). Constatou-se que a porcentagem de SeMet variava de 19% a 72%, ao passo que as exigências europeias para as SL exigem um mínimo de 63%. Dos 13 produtos testados, oito apresentaram menos de 63% do total de Se sob forma de SeMet e não correspondiam às especificações do produto, e apenas cinco estavam acima desse nível mínimo de SeMet. Os diferentes fatores anteriormente mencionados explicam essa variabilidade.
A selenocisteína está presente em produtos de selênio-leveduras?
O Se é um elemento não essencial para as leveduras porque, ao contrário de outros organismos mais elevados, as leveduras não têm genes que codifiquem selenoproteínas, que são as formas biologicamente funcionais de Se que têm a especificidade de conter um aminoácido selenocisteína (SeCis). Constatou-se recentemente que parte da SeMet presente nas SL também poderia ser orientada não especificamente para a via de transulfuração, assim resultando em incorporação não específica de SeCis a proteínas de levedura. Caso seja fornecida a animais, contudo, essa SeCis não pode ser armazenada da mesma maneira que a SeMet nem usada diretamente durante a síntese de selenoproteínas devido ao mecanismo de síntese obrigatoriamente in situ das selenoproteínas. De fato, está demonstrado que a SeCis da dieta é similar ao selenito de sódio em termos de bioeficácia animal (De Marco et al. 2021). Além disso, a proporção de SeCis tem sido relatada, de maneira geral, como sendo entre 10 e 22% em produtos de SL, embora as mais recentes mensurações tenham apontado a presença de apenas 1,2 a 6,6% de SeCis (Figura 1).
Há muitas outras espécies de Se orgânico em produtos comerciais de selênio-levedura
As especificações das SL atualmente no mercado são de 97-99% de Se orgânico, principalmente SeMet (63%), e as demais especies de Se orgânico costumam ser categorizadas como quantidades variáveis de SeCis, selenometabólitos solúveis em água e espécies desconhecidas de Se. Muitos desses outros compostos de Se orgânico foram relatados e caracterizados em diferentes SL. Hoje se pensa que as SL poderiam ser responsáveis por mais de 100 espécies de Se caracterizadas qualitativamente. No entanto, embora contemos com tecnologias analíticas avançadas, ainda não foram obtidos o equilíbrio de massa das espécies de Se orgânico identificadas e o Se orgânico total assumido. Portanto, mais pesquisas são necessárias para quantificar e caracterizar essas outras espécies de Se.
Técnicas analíticas avançadas revelaram níveis mais altos de Se inorgânico em selênio-leveduras do que se acreditava inicialmente
Quantificação de espécies clássicas de Se inorgânico em selênio-leveduras
De maneira geral, admite-se que os produtos de SL contém apenas concentrações residuais de Se inorgânico como selenito (Se-IV) ou selenato (Se-VI), o que foi confirmado pelo presente estudo de 13 amostras de SL (Figura 1). Até agora, quando avaliávamos a concentração de Se das SL só eram consideradas as proporções de Se total, SeMet e Se inorgânico (Se-IV e Se-VI). Contudo, essas proporções de Se inorgânico foram questionadas recentemente em virtude da disponibilidade de novos métodos analíticos avançados.
O Se elementar, nova espécie de Se inorgânico detectada em selénio-leveduras, explica parte das “espécies desconhecidas de Se”.
Em produtos à base de SL, o Se orgânico sempre foi considerado como a diferença entre o Se total e o Se inorgânico, onde, como já mencionamos, o Se inorgânico era limitado a Se-IV e Se-VI.   Porém, como resultado do avanço dos métodos analíticos, foram recentemente relatadas a detecção e a quantificação exata do Se elementar (Se0) nas SL.  Este Se0 recém identificado constitui mais uma forma inorgânica de Se. Vacchina et al. 2021, desenvolveram há pouco tempo um método exato para quantificar o Se0 nas SL. Os autores constataram que a proporção de Se0 presente em sete SL representa, em média, 10-15% do Se total e poderia representar até 40%.  O Se0 foi medido recentemente em 13 amostas comerciais de SL, usando o mesmo método; foi demonstrado que a proporção de Se0 variava entre 3,6% e 51,8% (Tabela 1). Considerando a soma das espécies de Se inorgânico (Se-IV, Se-VI e Se0), a proporção de Se orgânico em todos os produtos foi muito inferior à especificação de 97%, (Figura 2). Quando se leva em conta a mistura de fermentação complexa usada no processo de produção de SL, assim como o fato de que o selenito de sódio (a fonte de Se na produção de SL) pode ser reduzido a Se0 por vários agentes redutores, é muito provável que ocorra uma reação de precipitação de Se sob forma de Se0. Portanto, a concentração de Se0 agora pode ser medida usando novas técnicas analíticas avançadas. Além disso, está demonstrado que as fontes de Se orgânico puro, inclusive SeMet, Zn-SeMet e OH-SeMet, não contêm Se0 detectável. Na verdade, essas formas puras só entregam Se como SeMet, que é um importante passo na construção de reservas de Se no corpo ; isto, em troca, pode ajudar a atenuar o impacto das condições de estresse comercialmente relevantes, melhorar a adaptabilidade dos animais e ajudar a manter sua saúde, o que contribui para sua produtividade e desempenho reprodutivo.
Conclusão
Os avanços recentes em metodogias analíticas propiciaram a determinação cada vez mais exata, confiável e abrangente da composição das SL. Essas análises revelam a presença de Se0 inorgânico, o que explica grande parte das espécies de Se antes desconhecidas. Essas descobertas demonstram que os produtos de SL usados na nutrição animal contêm muito menos do que 97% do Se total como Se orgânico. Assim sendo, é preciso rever a proporção de Se inorgânico nos produtos de SL e, possivelmente, deva ser realizada uma caracterização completa das espécies de Se orgânico. Segundo essas constatações, a caracterização da SL como forma plenamente orgânica de Se pode ser questionada e, por conseguinte, os usuários finais e a indústria têm a oportunidade de fazer uma escolha mais ponderada ao decidir o quanto investir em uma forma orgânica de Se.
Figura 1: Especificação de Se comparada com o Se total (%) de vários produtos comerciais de selenoleveduras (SL)
Figura 1: Especificação de Se comparada com o Se total (%) de vários produtos comerciais de selenoleveduras (SL)
A concentração de selenometionina (SeMet), selenocisteína (SeCis), Se elementar (Se0), selenito (Se-IV), selenato (Se-VI) e outras espécies de Se são expressas como % do Se total. A análise foi realizada usando a técnica HPLC-ICP MS para todas as espécies de Se, e ICP AES para o Se total. A linha pontilhada representa os limiares de % de SeMet em SL tais como informados na especificação do produto.
Tabela 1: Teor de Se elementar (Se0) de vários produtos comerciais de selenolevedura (SL)
Tabela 1: Teor de Se elementar (Se0) de vários produtos comerciais de selenolevedura (SL)
Figura 2:  Teor de Se orgânico e inorgânico comparado com o Se total (%) de vários produtos comerciais frescos de selenolevedura (SL) 
Figura 2: Teor de Se orgânico e inorgânico comparado com o Se total (%) de vários produtos comerciais frescos de selenolevedura (SL)
Se inorgânico (%) = Soma do Se elementar + selenito + selenato
Teor de Se orgânico (%) =   Se total– Se inorgânico

Surai, F. Peter; I. Kochish, Ivan; I. Fisinin, Vladimir; A.Velichko, Oksana (2018) Selenium in Poultry Nutrition. From Sodium Selenite to Organic Selenium Sources. In : The Journal of Poultry Science, advpub. DOI: 10.2141/jpsa.0170132.

Fagan, Sheena; Owens, Rebecca; Ward, Patrick; Connolly, Cathal; Doyle, Sean; Murphy, Richard (2015) Biochemical Comparison of Commercial Selenium Yeast Preparations. In : Biological trace element research, Ahead. DOI: 10.1007/s12011-015-0242-6.

De Marco, Michele; Conjat, Anne-Sophie; Briens, Mickaël; Hachemi, Mohammed Amine; Geraert, Pierre-André (2021) Bio-efficacy of organic selenium compounds in broiler chickens. In : Italian Journal of Animal Science, vol. 20, n° 1, p. 514–525. DOI: 10.1080/1828051X.2021.1894994.

Vacchina, Véronique; Foix, Dominique; Menta, Mathieu; Martinez, Hervé; Séby, Fabienne (2021) Optimization of elemental selenium (Se(0)) determination in yeasts by anion-exchange HPLC-ICP-MS (7).

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