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Qualidade Microbiológica de Salames tipo Colonial Comercializados na Cidade de Concordia-SC: análise de Staphylococcus aureus e Toxoplasma gondii

Publicado: 24 de maio de 2011
Por: Catia Silene Klein; Thais Regina Zotti; Aldo Gava; Márcia Regina Pelisser
Introdução
A contaminação microbiológica dos alimentos causa preocupação em muitos países, principalmente pelos altos índices de doenças transmitidas por alimentos crus, mal preparados e mal conservados.
Salame é um produto que consiste em uma mistura de carne crua de porco ou de carne suína e bovina, adicionada de toucinho, sais, agentes de cura e temperos, recheada em tripa natural (invólucro) ou artificial (sintética), curada, fermentada, maturada, seca e submetida para fumar ou não.
No Brasil, a Instrução Normativa nº 22, de 31/07/2000, regulamenta os requisitos técnicos de identidade e qualidade para oito tipos de salame, com a matéria-prima (espécie animal), a granulometria da carne e do toucinho, tempero e processamento de fumo ou não. De acordo com o Regulamento Técnico sobre a Identidade e Qualidade do Salame, os oito tipos designados são: Salame, Salame Alemão, Salame Calabriano, Salame Friolano, Salame Napolitano, Salame Hamburguês, Salame Italiano e Salame Milano.
Além dessas, a mesma legislação define as características da Identidade e Qualidade da Língua Colonial, popularmente denominada Salame Colonial.
De acordo com a IN n.º 22/2000, o produto é designado Salame, acompanhado ou não das expressões que caracterizem a sua origem ou processo de produção.
O produto salame tem como ingredientes obrigatórios carne suína (mínimo 60%, exceto salame tipo hambúrguer, onde o teor permitido é de no mínimo 50%), toucinho, sal, nitrito e/ou nitrato de sódio e/ou potássio. Como ingredientes opcionais pode ter carne bovina, leite em pó, açúcares, maltodextrinas, proteínas do leite, aditivos intencionais, vinho, temperos, aromas e especiarias e substâncias de revestimento (revestimento externo). Ainda, de acordo com o Decreto nº 30.691, de 29/03/1952, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), toda carne destinada à produção de salames deve ter sido submetida aos processos de fiscalização previstos no Regulamento de Fiscalização Industrial e Sanidade de Produtos de Origem Animal (RIISPOA). Na região oeste de Santa Catarina, devido às tradições culturais, 
Staphylococcus aureus é um importante patógeno, agente de uma ampla gama de infecções e transmitido principalmente por alimentos crus, preparados sem condições higiênicas adequadas. Quando o processo é manual, a bactéria é disseminada por manipuladores que espirram ou tossem no alimento, ou que apresentam feridas na pele.
Durante o cozimento ou pasteurização, a bactéria é destruída, mas as toxinas produzidas e secretadas resistem ao calor, permanecem nos alimentos e causam gastroenterite estafilocócica nos consumidores.
Nesses casos, a doença é causada pela ingestão da enterotoxina e não pela infecção causada pela presença da bactéria. Os sintomas de vômito, diarreia aquosa e dor abdominal são bastante intensos, por curto período de tempo, durando aproximadamente 2 a 24 horas após a ingestão do alimento contaminado, mas a intoxicação raramente é fatal.
A toxoplasmose, transmitida pelo protozoário Toxoplasma gondii, tem distribuição mundial, infecta a maioria dos animais de sangue quente, tem felídeos como hospedeiro definitivo e outras espécies como hospedeiros intermediários, mas tem alta frequência em humanos. O gato doméstico é considerado a espécie animal chave na transmissão e sobrevivência do T. gondii, isso porque no gato ocorre o único ciclo sexual do parasito e são excretados oocistos resistentes nas fezes que, ao serem enterrados pelo animal, prolongam a sobrevivência do parasita.
A infecção de animais e humanos ocorre por transmissão transplacentária, carnivorismo e ingestão de água e alimentos crus ou mal cozidos contaminados, como carnes, frutas e vegetais. Congelar de -12 a -20°C por 3 dias e cozinhar a carne em temperaturas acima de 66°C inativa os cistos de T. gondii.
Entretanto, ressalta-se que a contaminação de humanos por T. gondii pode ocorrer de outras formas, como solo, areia de lazer e solo de jardinagem contaminados com oocistos viáveis.
A prevalência da infecção por T. gondii em suínos é variável, mas geralmente é superior a 10 ou 20% em muitos países. A criação comercial moderna de suínos, em instalações fechadas, livres do acesso de gatos e camundongos, tem reduzido a ocorrência de toxoplasmose em humanos. No entanto, suínos mais velhos, com maior exposição ao T. gondii e alta prevalência na criação doméstica, sem o uso de Boas Práticas de Produção (BPFs) e descartes comerciais, ainda são utilizados na fabricação de salames, linguiças e linguiças cruas que podem servir como uma fonte desta infecção.
Geralmente, em humanos, a toxoplasmose não apresenta sinais clínicos, mas na forma congênita, causa malformação, caracterizada por microcefalia, macrocefalia, calcificação cerebral precoce, hidrocefalia e coriorretinite, levando ao enfraquecimento mental.
A doença também pode causar cegueira, aborto e morte perinatal. Em algumas regiões do mundo, 40 a 70% dos adultos apresentam a infecção na ausência da doença. Em todo o mundo, cerca de 2 bilhões ou mais de pessoas estão cronicamente infectadas.
O objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade microbiológica para S. aureus e T. gondii em amostras de salame tipo colonial comercializadas na cidade de Concórdia-SC.
Materiais e métodos
amostras
Seis amostras de salame tipo colonial, uma de cada marca comercial, foram coletadas a cada 15 dias, 3 vezes, totalizando 18 amostras. As amostras foram coletadas em estabelecimentos comerciais da cidade de Concórdia, SC.
O período de coleta foi de fevereiro a abril de 2006. Durante a coleta das amostras, foram observados o prazo de validade e o número do lote dos produtos, a fim de evitar repetições. Cinco marcas dos produtos analisados foram fiscalizadas pelo Sistema de Inspeção Estadual (SIE) e uma pelo Sistema de Inspeção Municipal (SIM), sendo denominadas A, B, C, D, E (SIE) e F (SIM). As amostras foram submetidas a análises para quantificação de S. aureus e para detecção de cistos teciduais/bradizoítos e taquizoítos de T. gondii. 
Análises laboratoriais
As análises para quantificação de S. aureus e digestão enzimática para liberação de cistos teciduais/bradizoítos e taquizoítos de T. gondii, se presentes nas amostras de salame, foram realizadas nos Laboratórios de Microbiologia da Universidade do Contestado e do Laboratório de Saúde Animal da Embrapa Suínos e Aves, ambos em Concórdia-SC. O método de detecção de S. aureus foi o isolamento bacteriológico segundo Silva et al. (1997). 
O exame microscópico para análise das lesões e busca de taquizoítos de T. gondii, dos órgãos dos camundongos, foi realizado no laboratório de Patologia do CAV/UDESC em Lages-SC. Para isso, as amostras de salame foram submetidas ao método de digestão enzimática para liberação de cistos teciduais/bradizoítos e taquizoítos segundo Dubey (1998).
Bioensaio
O bioensaio para detecção de lesões (cistos e taquizoítos), em camundongos, foi segundo Santos et al. (2005). De cada amostra de salame, foi realizada a inoculação intraperitoneal em 3 camundongos, totalizando 54, com idade entre 3 e 4 semanas, independente do sexo. Os camundongos foram observados diariamente e, após 3-4 semanas, um de cada amostra foi sacrificado para coleta de órgãos (coração, rim, fígado, intestino e cérebro). Foram feitas lâminas de esfregaço desses órgãos com coloração de Giemsa e também fixadas em formol a 10% para coloração de Hematoxilina e Eosina. As lâminas foram visualizadas ao microscópio para exame histológico de cistos e taquizoítos de T. gondii nos órgãos. 
Resultados e Discussão
Contaminação por S. aureus 
Das 18 amostras analisadas, 15 delas (83,33%) apresentaram contagem bacteriana positiva para S. aureus coagulase (Tabela 1). Destas, 9 amostras (50%) estavam acima do limite estabelecido, estando em desacordo com a Resolução RDC nº. 12 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), de 2 de janeiro de 2001, que permite até 5x103 UFC/g em produtos cárneos maturados, indicando que a produção de salames, das marcas analisadas, é feita em condições precárias de higiene durante o manuseio /fabricação.
Outros estudos microbiológicos de salames, na mesma região investigada, já apontavam alta contaminação estafilocócica e alertavam para a necessidade de maior rigor na fiscalização pelos órgãos competentes e, principalmente, nas práticas. O principal transmissor desse tipo de contaminação é o homem, pois essa bactéria está presente nas narinas e feridas na pele dos manipuladores.
Um estudo, em Santa Maria-RS, detectou a presença de um ou mais dos microrganismos investigados em 85% das amostras de salame colonial comercializadas, sendo 45% contaminadas por S. aureus. Nos Estados Unidos, anualmente, entre 1 e 2 milhões de pessoas são acometidas por gastroenterite estafilocócica, principalmente devido ao consumo de produtos de origem animal.
Contaminação por T. gondii
Todas as 18 amostras de salame, analisadas neste estudo, apresentaram resultados negativos para a presença de lesões (cistos e taquizoítos) de T. gondii no bioensaio em camundongos.
A ausência de T. gondii nas amostras analisadas indica que os suínos que deram origem à matéria-prima, utilizada na fabricação de salames, foram produzidos de forma adequada, evitando a contaminação pelo protozoário. Outro fator pode ser a presença de sais de cura e o processo de defumação que diminuem a viabilidade dos cistos, o que pode explicar o resultado obtido pelo fato de as amostras serem de salame curado e defumado, e não frescas.
Em Londrina-PR, a análise da massa de salame fresco, coletada até 30 minutos após o preparo, mostrou que em apenas 01 amostra (de 149) houve isolamento do parasito viável. Outras 13 amostras apresentaram sorologia positiva no bioensaio em camundongos. Em outro estudo desenvolvido em Botucatu-SP, com 70 amostras de salame fresco, foi detectado DNA de T. gondii em 33 amostras, mas elas foram negativas no bioensaio, indicando a dificuldade de obtenção de resultados positivos com esta técnica.
É importante ressaltar que os resultados positivos da sorologia no bioensaio podem não representar infecção, mas sim a resposta imune do camundongo ao parasita inviável (morto). Da mesma forma, a detecção de DNA do parasita em amostras de salame não representa a viabilidade do agente, pois o DNA é detectado mesmo quando o parasita é inviável. Portanto, o teste mais indicado para a análise do risco de infecção, por ingestão de alimentos, é o isolamento do agente e/ou a análise das lesões da doença no bioensaio.
Em Erechim-RS, município próximo a Concórdia-SC, 184 de 1.042 (17%) humanos adultos examinados apresentaram lesões oculares, provavelmente causadas por T. gondii. Na região, a prevalência em humanos é 30 vezes maior do que em outras regiões nas mesmas condições.
Considerações Finais
Todas as marcas de salame tipo colonial analisadas apresentaram pelo menos uma amostra com valor de contaminação por S. aureus acima do permitido pela legislação vigente.
Os resultados de contaminação por S. aureus indicam que há problemas higiênicos na produção de salame tipo colonial e, portanto, recomenda-se maior rigor na fiscalização por parte dos órgãos competentes, visto que o produto é amplamente consumido in natura, representando uma importante forma de transmissão de patógenos e intoxicação alimentar.
O consumo de salame tipo colonial curado e defumado não representou fonte de transmissão do T. gondii. Entretanto, novos estudos para detectar o parasito viável devem ser realizados, levando em consideração uma metodologia específica, mais sensível e de fácil execução e interpretação.
Por outro lado, os processadores de produtos de origem animal devem buscar aperfeiçoamento e orientação higiênico-sanitária na produção de alimentos destinados ao consumo humano, reduzindo assim os riscos à saúde da população.
Para reduzir a possibilidade de contaminação durante o processo de fabricação do salame tipo colonial, recomenda-se observar as Boas Práticas de Produção (BPPs), Práticas de Fabricação (BPFs) e atender às exigências de órgãos reguladores como o Serviço de Inspeção Federal (SIF), SIE, SIM, MAPA/RIISPOA e ANVISA.
Tabela 1. Contagens e porcentagem de confirmação de colônias de Staphylococcus aureus em amostras de salame tipo colonial
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Autores:
Catia Silene Klein
Embrapa Suínos e Aves
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Comentário
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Flauri Migliavacca
MIG-PLUS
29 de mayo de 2011
Porque uma distancia tao pequena entre Erechim e Concódia, pode ter uma diferença tão grande nos dados aqui divulgados sobre Toxoplasma? Tenho certeza que se realizados hoje os dados de Erechim deverão se assemelhar aos de concórdia, (desta pesquisa)pois o tipo de criação de suínos das duas regiões se equivalem. Ninguem mais cria suinos soltos e que possam ter acesso a fezes de gatos, sendo este o principal hospedeiro. Creio ainda importante ressaltar que ainda é muito comum nas hortas coloniais, não haver um cercado para impedir a entrada de gatos nestas áreas de plantação de hortaliças para consumo proprio. Em algumas que até possuem cercado, é impressionante como tem buracos na cerca e o gato adentra o cercado, fazendo suas necessidades neste ambiente, onde a terra é fofa e ele não tem dificuldade de escavar um buraco para suas necessidades e assim contaminar as pessoas que consomem estas verduras in natura. Creio se fazer necessário uma publicação bem datalhada mostrando mais uma vez que o suíno está de fora deste ambiente outrora prejudicial a saúde humana no que se refere a Toxoplasma. Quanto aos Stafilococus, o grande culpado é quem manipula estas carnes para fabrico de salames. Estes pequenos industriais devem receber treinamentos para evitar estas toxicoinfeções, parando pra sempre de culpar o Suino como o ator principal.
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sidinei aparecido causs
11 de mayo de 2014

Olá, bom dia!

É a segunda vez que faço salame caseiro. A primeira vez que fiz, criou o fungo branco e o salame ficou muito bom. A segunda vez, utilizei a mesma receita, porém não teve a presença de fungo algum, porém o sabor também ficou muito bom. Saberia informar o por que do não aparecimento do fungo? Obrigado! Att, Sidinei

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Evani maria wermuth Ninaus
22 de abril de 2014

Gostaria de saber como proceder no processo de maturação quando o salame após dois dias de defumação fica com aparencia de palidez e umidade. Não desenvolve fungos as tricas não são sintéticas.

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Catia Silene Klein
Embrapa Suínos e Aves
13 de octubre de 2011
Prezado Camilo, Obrigada pela participação no fórum. Não há como identificar visualmente se o salame está contaminado com os patógenos investigados neste artigo publicado. Apenas exames laboratoriais possibilitam a detecção. A respeito dos fungos presentes no envoltório (tripa) é um processo natural e normal de maturação, considerando as condições normais. Não conheço trabalhos a respeito, mas até onde conhecemos não se trata de fungos produtores de toxinas nocivas ao organismo. Havendo dúvidas, estamos à disposição.
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Catia Silene Klein
Embrapa Suínos e Aves
13 de octubre de 2011
Prezados Flauri, Obrigada pelo seu comentário e observações coerentes a respeito de transmissão de toxoplasmose, que de fato, o suíno não é o principal transmissor considerando às modernas criações existentes na atualidade. Infelizmente, no meio médico, ainda é muito associado como sendo o responsável. Quanto aos dodos de portadores de toxoplasmose, para se ter uma análise completa e conclusiva sobre os índices regionais, seria necessário uma avaliação regional considerando a população de pessoas, não apenas os índices levantados em consultórios e/ ou resultados de exames laboratoriais de pessoas que possuem suspeita da infecção. Sobre a contaminação de Staphilococcus aureus, concordamos sim que deve ser dada maior atenção na manipulação dos produtos, no ato da fabricação, devendo atender aos requisitos mínimos de higiene, o que evitaria a contaminação do produto com microrganismos presentes na pele e narinas dos manipuladores. Estamos à disposição para outros esclarecimentos.
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Belarisio Camilo De Oliveira
Belarisio Camilo De Oliveira
28 de julio de 2011
Boa noite, lí a reportagem acima descrita e gostei dos comentários. Gostaria também de saber como identificar visualmente, se um salame pode estar contaminado com algum dos patógenos acima mencionados e o que é um fungo esbranquiçado que aparece sobre o envoltório (tripas de colágeno). Se for atendido em minha curiosidade, desde já fico-lhes grato. Camilo de Assis-sp
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