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Cenários futuros da infraestrutura de transporte e seus impactos na competitividade das exportações de carne suína e nas suas emissões de gases de efeito estufa

Publicado: 4 de junho de 2012
Por: Marcelo Miele, Ari Jarbas Sandi, Airton Kunz e João Dionísio Henn
Introdução
A carne suína brasileira conquistou um espaço de destaque no comércio internacional e vem mantendo sua posição. Essa é a principal medida de sua competitividade, baseada em avanços tecnológicos, na coordenação da cadeia produtiva e no acesso a grãos. Outra característica marcante da última década foi o avanço da produção e das exportações na região Centro-Oeste, seguindo a expansão da fronteira agrícola, com a oferta de grãos mais baratos. Este avanço ocorreu de forma concomitante ao crescimento nas regiões tradicionais do Sul do país, que foram responsáveis, em termos absolutos, por mais da metade do incremento nos volumes produzidos e exportados neste mesmo período.
O padrão logístico predominante não apenas reduz a competitividade brasileira em relação aos concorrentes internacionais, como também afeta a competitividade da região Centro-Oeste em relação à região Sul, devido à maior interiorização daquela região e aos maiores custos de transporte. O modal rodoviário predomina em um país de dimensões continentais. O porto de Itajaí (SC) concentra mais da metade dos volumes e mesmo as exportações oriundas do Centro-Oeste são escoadas pelos portos do Sul e do Sudeste, seguindo na direção Norte-Sul, ao invés de buscar alternativas nos portos do Norte e do Nordeste, mais próximos dos principais importadores do produto brasileiro (ANUT, 2008; OLAVO, 2009). Além de impactar na competitividade, o atual padrão logístico também contribui para uma maior emissão de gases de efeito estufa (GEE).
 
Situação atual e cenários futuros para os corredores de escoamento das exportações
Este padrão pode se alterar em função da perspectiva que se abrem a partir das obras previstas no Plano Nacional de Logística e Transportes (PNLT), no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), bem como pela mudança no marco regulatório (CONAB, 2007; ANUT, 2008; OLAVO, 2009; ANTF, 2010; IPEA, 2010). O PNLT prevê até o ano de 2023 investimentos de mais de R$168 bilhões, sendo que 49% deste valor são considerados essenciais ao agronegócio (ANUT, 2008). A sua efetiva implantação configurará um cenário futuro para a infraestrutura de transporte com maior participação dos modais ferroviário e hidroviário, bem como dos portos das regiões Norte e Nordeste, invertendo o fluxo de mercadorias oriundas do Centro-Oeste. Para os corredores de exportação de SC e MT destacam-se os seguintes projetos que tem potencial de impactar a sua competitividade e suas emissões de GEE (ANUT, 2008; IPEA, 2010; CNT, 2011):
  • Finalização da Ferrovia Norte-Sul (FNS, ou EF-151) e construção da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO, ou EF-354), interligando as regiões exportadoras de MT e GO aos portos do Nordeste (Itaqui, em São Luiz no Maranhão) por meio da Estrada de Ferro Carajás (EFC) ou do Norte (Belém, no Pará);
  • Construção, ampliação e remodelagem de um conjunto de obras ferroviárias na região Sul, ligando o Oeste de SC e o Noroeste do RS ao porto de Itajaí e às regiões produtoras de grãos no Centro-Oeste;
  • Pavimentação e recuperação da rodovia BR163 entre o norte de MT e o porto de Santarém (PA) e construção de um terminal de containers.
Os benefícios esperados com estas obras de infraestrutura são a redução do custo do transporte, o menor consumo de óleo diesel e consequente menor emissão de GEE e, no caso das exportações do Centro-Oeste, a redução das distâncias marítimas para os portos da América do Norte, da Europa e da Rússia. Na Figura 1 apresenta-se a situação atual e cenários futuros para a configuração desses novos corredores de exportação.
Figura 1. Principais rotas de escoamento das exportações de carne suína em SC e MT e rotas alternativas previstas no PNLT.
Cenários futuros da infraestrutura de transporte e seus impactos na competitividade das exportações de carne suína e nas suas emissões de gases de efeito estufa - Image 1
 
Os diferenciais de competitividade entre as regiões produtoras
Considerando a média dos preços de 2007 a 2011 (atualizados pelo IGP-DI), as principais diferenças nos custos de produção entre as duas regiões estudadas são o menor preço do milho e do custo com alimentação animal no Centro-Oeste e, por outro lado, o menor custo da integração e do transporte na região Sul. Como resultado, os custos agregados em MT são inferiores aos de SC, mas é importante salientar que a carne exportada da região Centro-Oeste perde competitividade à medida que o produto se desloca até o porto de Itajaí (Figura 2). Isso reflete maiores distâncias percorridas e maiores custos de produção não associados à ração (mão de obra e instalações suinícolas). Desta forma, investimentos em infraestrutura de transporte e logística tem o potencial não apenas de melhorar a competitividade das exportações brasileiras, mas também, alterar a competitividade comparada entre as regiões exportadoras.
Figura 2. Diferenciais de custo entre MT e SC, por elo da cadeia produtiva, no cenário atual.
Obs.: um sinal negativo representa maiores custos em SC comparativamente a MT.
Cenários futuros da infraestrutura de transporte e seus impactos na competitividade das exportações de carne suína e nas suas emissões de gases de efeito estufa - Image 2
 
Impacto dos cenários futuros na competitividade dos corredores de exportação
A introdução do modal ferroviário em SC pode trazer como benefícios econômicos a redução nos custos com transporte até o porto de exportação e a redução do preço do milho importado de outros Estados, em especial do Mato Grosso do Sul, devido à redução no valor do frete (Tabela 1). Tendo em vista as distâncias e quantidades envolvidas, a redução no custo de transporte do milho a partir de outros Estados tem potencial de trazer maior benefício econômico em SC do que o transporte da carne até o porto.
O escoamento da produção de MT pela rodovia BR163 até o porto de Santarém (PA) traz como potencial benefício econômico a redução dos custos com transporte até o porto de exportação, em função da redução nas distâncias percorridas (Tabela 1). A introdução do modal ferroviário e escoamento da produção de MT pelo porto de Itaqui (MA) também tem o potencial de reduzir os custos com transporte até o porto de exportação devido à mudança de modal, com menores custos unitários, tendo em vista que neste cenário há um incremento na distância percorrida.
Tabela 1. Distância e valor do frete nos cenários atual e futuros.
Cenários futuros da infraestrutura de transporte e seus impactos na competitividade das exportações de carne suína e nas suas emissões de gases de efeito estufa - Image 3
Todos os cenários analisados apresentaram potencial de aumento da margem bruta e do lucro agregado, que é o somatório dos lucros de todos os agentes do corredor de exportação. Isso ocorre devido à redução de custos com insumos (óleo diesel) e apesar do aumento nos custos com fatores de produção nos cenários envolvendo ferrovias (maior capital empregado do que no transporte rodoviário).
Tanto em termos absolutos quanto relativos, o cenário que apresenta o maior potencial de aumento no lucro agregado é a mudança de porto das exportações de MT, de Itajaí para Santarém (86 R$/t antes dos impostos diretos e 51 R$/t depois dos impostos diretos), seguido pela mudança para o modal ferroviário em SC (35 R$/t e 22 R$/t) e, por fim, o escoamento da produção de MT por ferrovia até o porto de Itaqui (21 R$/t e 9 R$/t).
A introdução do corredor de exportação BR163-Satarém também apresentou o maior impacto potencial na lucratividade (razão entre lucro e custo dos fatores de produção como capital e mão de obra), seguido pela introdução do modal ferroviário em SC. Apesar de apresentar o maior aumento na margem bruta, o escoamento das exportações por ferrovia até o porto de Itaqui reduz a lucratividade em função do maior uso de capital nas ferrovias.
Tabela 2. Indicadores comparados dos cenários futuros analisados (variação %)
Cenários futuros da infraestrutura de transporte e seus impactos na competitividade das exportações de carne suína e nas suas emissões de gases de efeito estufa - Image 4
 
Impacto dos cenários futuros nas emissões de gases de efeito estufa
As emissões de GEE no transporte interno (ração, leitões, suínos para abate e carne suína congelada até o porto de exportação) são pequenas quando comparadas às emissões na produção suinícola sem o uso biodigestor (2% em SC e 5% em MT) . Desta forma, projetos com biodigestores no âmbito do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) geram uma redução nas emissões de GEE muito superiores àquelas que se pode atingir com as mudanças logísticas propostas nos cenários futuros.
Apesar da pequena importância relativa da redução nas emissões de GEE no transporte interno em comparação com os projetos no âmbito do MDL, há um impacto significativo quando se analisa apenas as emissões no transporte, com uma redução de 28% a 55% das emissões na situação atual (Figura 3) . É importante salientar que o cenário que apresentou a maior estimativa de redução nas emissões de GEE no transporte interno (corredor de exportação de Lucas do Rio Verde até o porto de Itaqui, por ferrovia), foi o que apresentou a menor estimativa de redução nos custos de transporte, nos lucros e na lucratividade (Tabela 2).
Figura 3. Estimativa das emissões de GEE no transporte interno, por cenário analisado (kg de CO2 equivalente/t de carne).
Cenários futuros da infraestrutura de transporte e seus impactos na competitividade das exportações de carne suína e nas suas emissões de gases de efeito estufa - Image 5
 
As mudanças nos fretes marítimos
As alternativas de cenários futuros acima estudadas apontam potenciais impactos na competitividade e nas emissões de GEE da carne suína até o porto de exportação (preço FOB). Entretanto, o impacto das mudanças analisadas pode ser ainda maior caso se considere a redução nas distâncias percorridas até o porto de destino, com redução no valor dos fretes marítimos e seguros (preço CIF) e, também, nas emissões de GEE pelos navios.
O principal destino das exportações de carne suína brasileira na última década foi a Rússia (porto de São Petersburgo). Assim, o escoamento da produção do Centro-Oeste pelos portos do Norte do país implica em redução das distâncias até o seu destino final. Mesmo a alternativa de escoamento pelo porto de Itaqui (MA), apesar de aumentar a distância interna, reduz a distância marítima em mais de 2,5 mil km e a distância total em mais de 2,1 mil km (ou -15%). No caso da alternativa por Santarém (PA), todas as distâncias diminuem, totalizando uma redução de mais de quase 2,4 mil km (ou -17%). Desta forma, as mudanças de porto de escoamento e de modal analisadas para o cenário futuro em MT, tem maior impacto quando se considera o custo do frete marítimo para os países do hemisfério Norte. No caso da mudança de modal em SC, não há redução das distâncias, não havendo impacto no frete marítimo.
 
Considerações finais
A região Centro-Oeste apresenta uma clara vantagem competitiva em relação à região Sul, mas esta vantagem se reduz ao longo do corredor de exportação devido a maiores custos, sobretudo com logística de transporte. Todos os cenários futuros analisados tem o potencial de impactar positivamente na competitividade das exportações de carne suína e na redução das suas emissões de GEE. Em termos de comparação regional, a inversão do fluxo de exportação de carne suína da região Centro-Oeste da direção Norte-Sul para a direção Sul-Norte aumenta a competitividade das exportações desta região em relação àquelas da região Sul. Outra observação importante é que o cenário logístico de menor impacto econômico é aquele que apresentou o maior potencial de redução nas emissões de GEE no transporte interno.
As emissões de GEE no transporte dos corredores de exportação de carne suína não tem a mesma importância do que nas iniciativas de redução no âmbito do MDL, mas entende-se que projetos que se propõem a alterar a logística de transporte do agronegócio brasileiro no sentido de encurtar distâncias ou utilizar modais mais eficientes em termos energéticos também devem ser considerados pelo Brasil nas negociações globais sobre mudança climática na 15ª. Conferência das Partes (COP-15).
O presente estudo se propôs estimar o impacto de projetos de infraestrutura que estão em implantação ou ainda em fase de estudo. Deve-se ressaltar que os cenários analisados são de médio ou longo prazo, e que dependem da superação de inúmeros obstáculos e entraves para efetivamente serem considerados uma alternativa para a logística de exportação de carne suína. Enquanto que as obras da FNS e da BR163 encontram-se em estágio avançado de implantação, a FICO e a expansão da malha ferroviária ligando o Oeste de SC às regiões exportadoras de milho e ao porto de Itajaí estão ainda na fase de projeto. Em geral, as ferrovias brasileiras são voltadas ao transporte a granel, não estando plenamente preparadas para containers refrigerados. Há ainda a necessidade de assegurar que não haja contaminação a partir de outras cargas como minério de ferro e combustíveis. O mesmo ocorre com os portos de Itaqui e Santarém. No caso de Santarém, há ainda impedimentos ambientais e sociais a serem superados, além da regulamentação e cobrança do trânsito de navios de longo curso nas rotas fluviais do Amazonas até o Oceano Atlântico. Por fim, o presente estudo não incorpora as mudanças que estão sendo propostas com a discussão de um novo marco regulatório para o transporte ferroviário.
Para finalizar, há um conjunto de obras de infraestrutura de logística de transporte previstas no PAC e no PNLT que permitem vislumbrar a ampliação da "fronteira logística" brasileira nos próximos dez anos, de forma a acompanhar as demandas crescentes da expansão da "fronteira agrícola".
 
Bibliografia
ANTF – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS TRANSPORTADORES FERROVIÁRIOS. As ferrovias e o futuro do país. Brasília: ANTF, 2010. 28p. ANTT – AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES. Simulador tarifário FNS – Ferrovia Norte Sul. Brasília: ANTT, 2011.
ANUT - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS USUÁRIOS DO TRANSPORTE DE CARGA. Transporte – Desafio ao Crescimento do Agronegócio Brasileiro. Rio de Janeiro: ANUT, dez. 2008. 150p.
CETESB, 2002. Metodologia simplificada de cálculo das emissões de gases do efeito estufa de frotas de veículos no Brasil. São Paulo.
CNT - CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO TRANSPORTE. Plano CNT de Transporte e Logística 2011. Brasília: CNT, 2011, 370 p.
CONAB. Corredor da BR 163. Corredores de Escoamento cda Produção Agrícola. Brasília: CONAB, 2007. 79p.
IPEA. Transporte Ferroviário de Cargas no Brasil: Gargalos e Perspectivas para o Desenvolvimento Econômico e Regional. Comunicados do IPEA. Brasília: IPEA, mai. 2010, n. 50. 54p.
OLAVO, F. Escoamento da produção agrícola matogrossense pela hidrovia Tapajós – Teles Pires e pela rodovia BR- 163. Brasília: CONAB, 2009, 6p. Documento enviado por email.
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Autores:
Marcelo Miele
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Vincenzo Mastrogiacomo
29 de julio de 2015
caro Marcelo , parabéns pelo artigo . nos do oeste de Santa Catarina , reivindicamos que a ferrovia norte sul passe por Santa Catarina ,na cidade de Chapeco e va em duração ao porto de Rio Grande , conforme o estudo do Ministério dos Transportes, com isso teríamos o abastecimento de milho produzido na região centro oeste e consumido em Santa Catarina .
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