Revisão de literatura
Em painel de especialistas realizado em Chapecó (SC), foram identificados dois sistemas de produção de leite, típicos da agricultura familiar, como representativos e amplamente dominantes do Oeste Catarinense.
Dados publicados pelo IBGE (2008) indicam que esta região é responsável por quase três quartos da produção estadual de leite e que concentra 58% dos produtores estaduais. Estes produtores possuem 63% do rebanho leiteiro que, em 2006, responderam por 73% da produção do estado.
Entre 1996 e 2006 o crescimento da produção na região foi de 157%. Segundo Stock et al. (2008), esse crescimento se deu, não apenas, pelo aumento no número agregado de vacas (6,3% ao ano), mas especialmente por incrementos na produtividade média por vaca, em 3,4% ao ano.
Metodologia
Os dados formam coletados em painel técnico realizado no Oeste Catarinense, ocasião em que foram identificados dois sistemas de produção de leite, como representativos da região, os quais foram denominados como tradicional e tecnificado. Com respeito à representatividade, o sistema tradicional:
- Expressa a forma de produção de leite, típica da agricultura familiar da região;
- Produz, no agregado, 60% do volume total da mesorregião, cerca de dois milhões de litros/dia, o que equivale a 44% da produção total de Santa Catarina; e
- Aparece em maior número: estimou-se ser representativo de 90% dos estabelecimentos da região, cerca de 46 mil, equivalente a 52% do estado.
O sistema de produção tecnificado:
- Caracteriza a forma mais especializada de produção de leite da região;
- No agregado responde por 30% da produção da região, aproximadamente um milhão de litros/dia, equivalente a 22% da produção do estado; e
- É menor em número: estimou-se ser representativo de 9% dos estabelecimentos da região, cerca de 4.500, equivalente a 5% do estado.
Estima-se que o restante da produção, equivalente a 10% da região, seja produzido por outros tipos de sistema, mais especializados e maiores em produção por estabelecimento. No agregado, o sistema especializado é típico de 1% dos produtores da região.
A metodologia utilizada para apuração dos indicadores segue a abordagem preconizada por Stock et al. (2008), utilizando planilhas específicas, onde o custo de produção do leite é calculado separadamente. Da mesma maneira é possível estimar o custo de produção para os demais segmentos (novilhas e machos), sempre que um, ou os dois, estiverem presentes.
Resultado e discussão
As principais características sobre tamanho, produção e desempenho técnico estão apresentadas na Tabela 1. O sistema tradicional é o modelo que mais se aproxima do sistema de produção da região. Em relação ao número total de vacas, considerou-se 9 vacas, sendo que a média da região, em 2006, foi de 9,4 vacas por propriedade. Em termos de produção por dia e produtividade média por vaca, o sistema tradicional ficou abaixo da média da região, de 66 litros por estabelecimento, e 7 litros por vaca por dia, respectivamente. Os indicadores do uso de terra e mão-de-obra são apresentados na Tabela 2.
O Sistema tradicional é tipicamente de pequena produção leiteira familiar. A ordenha é realizada duas vezes ao dia, de forma manual sendo que, em alguns casos, é mecânica com balde-ao-pé. As bezerras são recriadas na própria fazenda para reposição do plantel de vacas. Alguns machos, quando criados, têm a finalidade apenas para consumo na propriedade, o que ocorre até aos 18 meses de idade.
O sistema faz uso de infra-estrutura mínima de produção, com pouca dependência de insumos externos à propriedade. O produtor compra basicamente sal comum e mineral, concentrado para vaca, vacinas e medicamentos básicos. A alimentação é composta de capim picado, silagem de milho e pastagens anuais típicas de inverno e de verão.
O Sistema tecnificado apresenta como característica de produção a utilização de alimentação volumosa de melhor qualidade e em maior quantidade, pastagens anuais de inverno e de verão, pastagens perenes de verão, e silagem de milho, complementados com ração concentrada, além de uso do sal mineral. As vacas apresentam melhor potencial genético de produção.
Na Tabela 3 são apresentados os principais indicadores do custo de produção dos dois sistemas. Os valores referem-se aos preços médios de mercado do mês de setembro de 2008.
Nos dois sistemas, o custo total de produção do leite foi superior ao preço liquido recebido pelo litro de leite vendido. Se considerado apenas o valor do desembolso e a remuneração da mão-de-obra familiar (à base de R$ 600 por mês de uma pessoa adulta, se trabalhasse 100% do tempo na atividade leiteira), o sistema tradicional mostra-se deficitário por não cobrir depreciações, ao valor estimado de R$ 0,07 por litro de leite. Falta, portanto, sete centavos no preço líquido pago ao produtor para cobrir o custo operacional.
Já no caso do sistema tecnificado, o valor líquido recebido pela venda do leite mostra-se suficiente para cobrir o custo operacional, de R$ 0,45 por litro e proporciona ainda um excedente de R$ 0,03 por litro para cobrir as depreciações das benfeitorias e equipamentos e remunerar o capital empregado.
Em termos percentuais, em relação ao preço líquido recebido pelo produtor, o item desembolso foi relativamente maior no caso do sistema tradicional, de 74%, e de 62% para o sistema tecnificado.
Por produzir menos leite por vaca, o sistema tradicional acaba por apresentar custo relativamente mais alto, por litro de leite, com a mão-de-obra familiar, equivalente a 26% do valor líquido de um litro de leite, e 18% no sistema tecnificado.
Sob a ótica da renda mensal (Tabela 4), o sistema tecnificado é o sistema de produção que mostrou melhor desempenho: margem líquida mensal de R$ 232 com o leite para remunerar o capital. Em termos da atividade leite (incluindo a cria e recria da novilha) o desempenho foi ainda melhor, de aproximadamente R$ 900 por mês (Tabela 5).
Tendo em vista os resultados obtidos no painel os técnicos participantes demandaram estudos para avaliar os impactos sobre a margem bruta devido ao aumento da produtividade das áreas com pastagens e conseqüentemente das vacas. O principal argumento é de que a utilização de pastos perenes de melhor qualidade e com melhor adubação possibilita maior taxa de lotação, ainda que as despesas com adubação aumentem os custos de produção, em valores absolutos.
Conclusões
Dos resultados do desempenho técnico e financeiro de dois sistemas de produção de leite identificados como mais importantes de Santa Catarina, observou-se a produção de leite familiar tradicional é o que apresenta maior dificuldade de geração de renda.
Entretanto, é importante mencionar que, sem a prática de mercado de pagamento por volume de leite vendido, em que os dois sistemas recebem o mesmo preço, a diferença de renda foi fortemente reduzida entre os sistemas.
Cada sistema tem suas especificidades. Há a expectativa de que a resposta à variação de preços seria distinta entre os mesmos, em termos de rentabilidade. Nessa hipótese, a velocidade de tecnificação do sistema familiar tradicional seria provavelmente muito mais rápida e poderia aumentar com maior velocidade a produção regional.
Referências bibliográficas
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. SIDRA Pesquisa. Disponível em: <http://www.sidra. ibge.gov.br> Acesso em: 30/09/2008.
STOCK et al. Estrutura da produção de leite de Santa Catarina. In.: ZOCCAL, R. (Ed.) Boletim CBLeite. Consórcio Brasileiro para Comparação de Modelos de Produção de Leite. Embrapa Gado de Leite. Juiz de Fora, MG: Embrapa Gado de Leite, ano 2, n. 5, out/2008. p6-9.
STOCK et al. Metodologia de obtenção de sistemas representativos de produção de leite com a utilização da técnica de painel. In.: ZOCCAL, R. et al. (Ed.) Competividade da cadeia produtiva do leite no Ceará: produção primária. Juiz de Fora, MG: Embrapa Gado de Leite, 2008. 382p.
Anexos
***O trabalho foi originalmente apresentado no X Minas Leite – 25 e 26 de novembro de 2008, publicado pela Embrapa Gado de Leite, Centro de Inteligência do Leite (CILeite).