Revisão de literatura
A análise do desempenho técnico e econômico de sistemas de produção de leite, na forma tradicional, tem-se mostrado inadequada quando se pretende implantar um modelo de gestão moderno e profissional na condução da atividade leiteira. Fato bastante conhecido e discutido nos dias de hoje, diante da grande complexidade que envolve a exploração leiteira, por se tratar de uma atividade multidisciplinar, requerendo a integração de várias áreas do conhecimento. Sem dúvida trata-se de uma atividade global, com envolvimento de todas as áreas do conhecimento agronômico, veterinário, administrativo e econômico.
A Embrapa Gado de Leite, com o objetivo de melhorar o entendimento destes sistemas complexos, tem preconizado a segmentação do sistema global de produção de leite em dois segmentos, o de produção e o de serviços, conforme Yamaguchi, et.al. (2002). O segmento de produção é formado pelos setores de produção de leite, fêmeas para reposição do rebanho de vacas e alimentos volumosos, enquanto o segmento de serviços é composto pelos setores de trator e implementos, irrigação e reprodução, de acordo com Yamaguchi et.at. (2005).
A apropriação de custos nos segmentos de produção e de serviços é realizada com base no procedimento metodológico que considera o custo de longo prazo, conforme discutido em Yamaguchi et.al. (2005).
Para operacionalizar o levantamento de coeficientes técnicos nos segmento de produção e de serviços, foi desenvolvido um aplicativo em planilha eletrônica da Microsoft Excel®, denominado SisSeg – Versão 1.0 (Yamaguchi et. al. 2007).
Metodologia
A pesquisa foi realizada utilizando-se da técnica de painel, que reuniu dezessete especialistas em produção de leite com profundo conhecimento da região norte do Estado de Minas Gerais. O estudo propôs caracterizar e identificar sistemas referências de produção de leite para posterior levantamento de coeficientes técnicos, em nível de unidades produtivas. Tais coeficientes são essenciais para gerar informações que permitem aferir o desempenho técnico e econômico dos segmentos de produção e de serviços que compõem o sistema global de produção de leite. Entende-se por sistema referência aquele que representa um grupo de sistemas de produção de leite que adota o mesmo nível tecnológico. Adotar o mesmo nível tecnológico significa que os processos, insumos e serviços empregados sejam o mesmo dentro do grupo, independente da escala de produção ou do nível de utilização de insumos e serviços. O levantamento dos coeficientes técnicos, em nível de unidades de produção, foi realizado com o auxílio do aplicativo SisSeg, desenvolvido em planilha eletrônica da Microsoft Excel®.
Resultado e discussões
Foram caracterizados três sistemas referências, doravante identificados como A, B e C. Com relação à representatividade regional destes sistemas, em termos de números de produtores, correspondem a 80%, 19% e 1%, em produção de leite a 51%, 38% e 12% e em número de vacas ordenhadas representam 74%, 22% e 4%, respectivamente. Quanto ao perfil tecnológico, nos sistemas A, B e C, a idade ao primeiro parto ocorre aos 48, 40 e 36 meses, o período de lactação é de 180, 240 e 280 dias e a produtividade medida em litros de leite/vaca ordenha/dia é de 3,0, 7,5 e 13,0 litros, respectivamente.
Analisando os Indicadores de desempenho técnico do Setor de Produção de Leite, na Tabela 1, observam-se ótimos resultados alcançados pelo sistema C, que superou os sistemas A e B, em termos de taxa de lotação das pastagens em 27,5% e 83,2%, produtividade das pastagens em 120,3% e 184,6% e produtividade da mão-de-obra em 539,2% e 136,6%, respectivamente. Quanto aos indicadores de desempenho econômico, o custo de produção do leite entregue na plataforma da indústria, no sistema C, foi superior em torno de 37,8% e 40,9% comparado aos sistemas A e B, respectivamente. O ativo imobilizado por litro de leite produzido no sistema C representou, respectivamente, 34,8% e 50,0% do imobilizado nos sistemas A e B, indicando eficiência no uso da estrutura produtiva pelo sistema C. A remuneração do ativo imobilizado, por sua vez, foi superior ao rendimento real da caderneta de poupança (6% a.a.) nos três sistemas considerados (A, B e C), sendo superiores em 4,97, 4,70 e 1,83 vezes ao rendimento considerado, respectivamente. Quanto ao giro do ativo imobilizado, que mostra a velocidade com que o faturamento girou em relação ao ativo imobilizado, o sistema C teve um bom desempenho, sendo de 1,29, enquanto que nos sistemas A e B este indicador foi bastante reduzido.
Analisando os indicadores de desempenho técnico do Setor de Produção de Fêmeas, verifica-se que a taxa de lotação das pastagens e produtividade das pastagens foram superiores no sistema A, seguido do sistema C e B. Também neste setor, o sistema C mostrou ser mais eficiente na utilização da mão-de-obra, empregando apenas 0,44% e 0,55%, comparado aos sistemas A e B, respectivamente. Analisando os indicadores de desempenho econômico constata-se que o sistema A apresenta melhores resultados, seguido dos sistemas B e C, embora isto não assegure que o retorno econômico seja melhor nos sistemas A ou B em relação ao C. Há que se analisar, neste caso, a escala de produção e os preços das fêmeas.
Analisando o Setor de Produção de Alimentos Volumosos, constata-se que o sistema A utiliza apenas pastagens como alimentação do rebanho, enquanto o sistema B adota a capineira, cana-de-açúcar e sorgo para silagem, além da pastagem de braquiária. O sistema C, além da pastagem de braquiária utiliza cana-de-açúcar e milho irrigado e sorgo para produção de silagem. Analisando o custo de produção da silagem de milho, apurado no sistema C, observa-se que foi bastante elevado, razão da baixa produtividade provocada pela falta de chuvas no período analisado. O mesmo foi observado em relação aos custos de produção da silagem de sorgo, cana-de-açúcar e capim picado. No caso do sistema C, o custo unitário da cana-de-açúcar foi apenas 48,8% do custo do sistema B, em razão do uso da tecnologia de irrigação. Cabe registrar, que os custos discutidos acima contemplam a distribuição dos alimentos nos cochos. Por fim, o custo das pastagens foi maior no sistema C, comparado aos sistemas A e B, sendo superior em 18,5% e 157,6%, respectivamente. Este diferencial decorre do custo de sua manutenção e da eficiência do seu manejo.
Analisando os Setores de Trator e Implementos e de Irrigação, na Tabela 2, constata-se que somente sistema C dispõe de tais tecnologias. O custo-hora apurados indicam eficiência no uso de trator e implementos e ineficiência no uso da irrigação, ambos em razão dos seus níveis de utilização. No Setor de Reprodução, o custo unitário apurado inclui as vacas e as novilhas gestantes. O maior custo observado no sistema C decorre do uso da tecnologia de inseminação artificial. Contudo, este diferencial é mais que compensado por agregar valor às fêmeas, que alcançam um preço mais elevado no mercado.
Conclusão
Os resultados encontrados permitem concluir que o procedimento de análise a partir da segmentação do sistema global de produção de leite, oferece grande vantagem porque possibilita conhecer e entender melhor sistemas complexos como é o caso da produção de leite, uma atividade com enfoque multidisciplinar.
Referências bibliográficas
YAMAGUCHI, L.C.T.; CARNEIRO, A.V.; MARTINS, P. do C.; MACHADO, A.D.C. Custo de produção de leite: abrindo a caixa preta. Curvelo, MG: Cooperativa Agropecuária de Curvelo Ltda. Embrapa Gado de Leite, 2002. 72p.
YAMAGUCHI, L.C.T.; MARTINS, P. do C.; OLIVEIRA, A.F. de. Gestão da Informação como fator de competitividade na produção de leite. In: CARVALHO, L. de A.; ZOCCAL, R.; MARTINS, P. do C.; ARCURI, P.B.; MOREIRA, M.S. de P. (Ed.) Tecnologia e gestão na atividade leiteira. Juiz de Fora, MG: Embrapa Gado de Leite, 2005. p. 13-40.
YAMAGUCHI, L.C.T.; CARNEIRO, A.V.; MARTINS, P. do C. Sistema para análise de custos da atividade leiteira segmentados em setores de produção e serviços. Juiz de Fora, MG: Embrapa Gado de Leite, 2007. 26p. (Embrapa Gado de leite. Documentos, 123).
Anexos
***O trabalho foi originalmente apresentado no X Minas Leite – 25 e 26 de novembro de 2008, publicado pela Embrapa Gado de Leite, Centro de Inteligência do Leite (CILeite).