A proteína é um nutriente estrutural constituído unicamente por aminoácidos. É sabido que milhares de aminoácidos foram identificados, porém, somente 20 são usados na síntese das proteínas. Claramente, 10 desses 20 aminoácidos podem ser sintetizados nos tecidos do animal em quantidade suficiente para atender a exigência para o melhor desempenho (aminoácidos não essenciais) e, os outros 10 aminoácidos, devem ser consumidos via dieta, sendo denominados essenciais.
A metionina é um aminoácido sulfurado, pois contém enxofre em sua estrutura química, o que nenhum dos demais 20 aminoácidos envolvidos na formação da proteína animal possui (Oliveira 2014). É um aminoácido essencial, sendo, respectivamente, o primeiro e o segundo limitante para aves e suínos quando alimentados com dietas à base de milho e farelo de soja. Além da síntese de proteínas, a metionina é considerada o doador do grupo metil para a síntese de numerosos componentes, permitindo a formação da colina, creatina, epinefrina, glutationa (GSH), taurina, cisteína e poliaminas. O papel funcional da metionina é importante para o desenvolvimento e a saúde do animal (Burley, et al. 2016 e Shen et al. 2015) Também, a metionina é conhecida por melhorar o metabolismo lipídico e impactar positivamente sobre o sistema imune (Figura 1).
As fontes de metionina comumente conhecidas entre os nutricionistas se tratam da DL-Metionina (forma cristalina e 99% de pureza) e a DL-Metionina Hidroxi Análogo (MHA), também conhecida por 2-hidroxi-4-(metiltio) ácido butanóico (HMTBA 88%), uma solução aquosa de baixo pH. Ambos os produtos são provenientes de sínteses químicas e, dependentes de derivados petrolíferos.
A DL-metionina inicialmente foi desenvolvida em 1936, mas a sua comercialização ocorreu em 1945. Depois, em 1979, surgiu a DL-MHA líquida, estabelecendo as únicas fontes de metionina até 2015, quando foi introduzida no mercado global, a primeira fonte de metionina de base fermentativa, a L-Metionina cuja forma é cristalina e, 99% de pureza.
Diferente das outras fontes de metionina, a L-metionina é considerada uma fonte de metionina biologicamente funcional (bioativa), pois é um aminoácido que apresenta 100% da sua configuração isomérica na forma Levógira (L). O seu processo fermentativo, se enquadra no sistema Eco-Friendly com vista à sustentabilidade (Figura 2) e, pode ser uma excelente alternativa para animais submetidos à alimentação orgânica (produção de carne e ovos orgânicos) uma vez que a sua síntese não sofre qualquer passo químico (NSOB, 2017).
Figura 2. Sistema Eco-Friendly com vista à sustentabilidade para a L-metionina.
A síntese da L-Metionina baseada na agressão “nível zero” ao meio ambiente se deve ao fato da cana de açúcar e o milho serem as principais matérias primas utilizadas no processo industrial, não apresentando resíduos químicos de dissolução. Os resíduos do processo fermentativo se tornam reutilizáveis nas culturas de cana de açúcar e do milho. A reciclagem dentro do processo de fermentação é uma rotina (Figura 2).
O fato do aminoácido L-Metionina estar na forma bioativa traz evidências de que este aminoácido tem uma característica peculiar em relação às outras fontes de metionina.
O objetivo deste artigo é demonstrar as razões da L-Metionina ser posicionada como a melhor fonte de metionina para a nutrição de animais monogástricos.
Importância dos Enantômeros na Escolha da Fonte de Metionina.
A natureza de um componente químico pode variar, dependendo de como o grupo funcional é fixado numa mesma molécula. Os enantiômeros, por exemplo, são isômeros espaciais opticamente ativos e assimétricos. São imagens especulares um dos outros e não são sobreponíveis nem por rotação, nem por translação, ou seja, se colocarmos uma molécula sobre outra, elas não ficarão iguais, a disposição de seus átomos ligantes será diferente.Esses enantiômeros são chamados de moléculas quirais, (que significa “mão”, pois as mãos são assimétricas e não sobreponíveis). A atividade que cada enantiômero exercida no organismo é distinta de um para o outro. O dextrogiro (D) é muitas vezes menos ativo que o levogiro (L).
O processo químico empregado na produção das fontes tradicionais de metionina produz dois tipos de configurações isoméricas representando a configuração isomérica dextrogiro (D) e o levogiro (L). No processo químico espera-se obter 50% D-Metionina e 50% L-Metionina (Figura 3) para o produto cristalino (DL-metionina) ou 50% D-MHA e 50% L-MHA para o produto líquido (DL-MHA) denominando assim de mistura de enantiômeros ou mistura racêmica.
Figura 3. Exemplo de enantiômeros.
A discussão sobre os valores de bioequivalência entre a DL-Metionina (DLM) e DL-MHA é vasta na literatura. Independentemente dos mecanismos fisiológicos ou ferramentas estatísticas utilizadas para estabelecer um valor da bioequivalência, é preciso lembrar que ambas as fontes de metionina (DLM e DL-MHA) apresentam-se na forma D e L- isômeros. Para Leeson e Summers (2001) a absorção de muitos aminoácidos ocorre por processo ativo e contra gradiente de concentração. Este mecanismo de transporte requer gasto energético e demonstra especificidade para a forma L-aminoácido. A forma D geralmente é absorvida mais lentamente do que a forma L correspondente. A forma D-isômero precisa ser convertida no fígado, rins e duodeno em seu respectivo L-isômero via D-amioácido oxidade e transaminase (Zhang et al. 2018). Portanto a D-metionina não é utilizada diretamente pelas células, precisando ser, antes, convertida na forma L (Shen et al. 2014). Os passos para compreender a efetividade isomérica das fontes de metionina são observados na Figura 4.
Figure 4. Passos da efetividade isomérica das fontes de metionina (Zhang et al. 2018).
Importância da L-Metionina na Nutrição de Animais Jovens
Entender o desenvolvimento e a maturidade fisiológica do trato gastrointestinal, assim como, o sistema imune de animais jovens, é um ponto crucial para desenhar uma dieta. Portanto, esta dieta deve estimular o desenvolvimento do sistema digestivo, enzimáticos e imunológico de neonatos. Segundo Noy e Sklan (1998), e, Stringhini et al. (2016), em aves, por exemplo, sabe-se que o período próximo e após o nascimento mudanças dramáticas ocorrem no intestino e na sua morfologia. O peso do intestino aumenta mais rapidamente do que a massa corporal como um todo. Este crescimento relativo atinge o máximo de 4 a 8 dias em aves. Exame microscópico da mucosa indica que a altura das vilosidades e suas áreas aumentam rapidamente, atingindo platô em 6 a 8 dias no duodeno e após 10 dias para jejuno e o íleo.
Este fato indica que, para a nutrição de animais jovens, grande parte dos nutrientes é destinada ao desenvolvimento do intestino e demais órgãos internos. Para Chen et al. (2014), não diferente de outros aminoácidos, a metionina afeta o metabolismo proteico intestinal. O trato gastrointestinal é um significativo local do metabolismo corporal, atingindo 20% da metionina dietética consumida. O metabolismo esplênico da metionina indica que o trato gastrointestinal apresenta alto requerimento de metionina. A D-Metionina não é utilizado diretamente pelas células intestinais até serem convertidas para L-Metionina no fígado e rins. Por outro lado, a L-Metionina ao ser administrada via ração para o animal, beneficiará diretamente o trato gastrointestinal e na síntese de glutationa (GSH), o principal antioxidante celular no intestino de leitões e pintinho (Figura 5; 6 e 7).
Figure 5. Tamanho dos vilos no duodeno de leitões alimentados com dieta de L-Metionina e DL-Metionina (adaptado de Shen et al. 2014).
Informações de Shen et al. (2014)
- L-Met: 0,16% de met da dieta basal + 0,145% L-Met
- DL-Met: 0,16% de met da dieta basal + 0,145% DL-Met
- Exigência 95% do NRC (1998)
- n = 10 por tratamento
- Desmame = 21 dias e PMI = 8,40±0,25 kg
- Duração do experimento = 20 dias após o desmame
Figure 6. Tamanho de vilos no duodeno de aves aos 21 dias de idade quando alimentadas com dieta de L-Metionina e DL-Metionina (adaptado de Shen et al. 2015).
Informações de shen et al. (2015):
- L-Met: 0,56% de met da dieta basal + 0,285% L-Met
- DL-Met: 0,56% de met da dieta basal + 0,285% DL-Met
- n = 11/ tratamento.
- Análise 7; 14 e 21 dias de idade
- Exigência 90% Aviagen (2007).
Figura 7. Síntese de glutationa (GSH) no duodeno de animais jovens alimentados com duas fontes de metionina.
Informações de Shen et al. (2015):
- L-Met: 0,56% de met da dieta basal + 0,285% L-Met
- DL-Met: 0,56% de met da dieta basal + 0,285% DL-Met
- n = 11/ tratamento
- Análise 7; 14 e 21 dias de idade
- Exigência 90% Aviagen (2007)
Informações de Shen et al. (2014):
- L-Met: 0,16% de met da dieta basal + 0,145% L-Met
- DL-Met: 0,16% de met da dieta basal + 0,145% DL-Met
- Exigência 95% do NRC (1998).
- n = 10/ tratamento.
- Desmame = 21 dias e PMI = 8,40±0,25 kg.
- Duração do experimento = 20 dias após o desmame.
O papel funcional da metionina no trato grastrointestinal, evidência o efeito antioxidante (melhor status redox ou redução do estresse oxidativo), sendo chave para o crescimento saudável do intestino com consequente impacto no desempenho animal. A L-Metionina além de empregar a essencialidade para a síntese proteica é prontamente metabolizada no trato grastrointestinal para o desenvolvimento intestinal e melhor síntese de GSH, enquanto a D-Metionina não é a forma biologicamente ativa no intestino. Conclusivamente, a L-Metionina é a fonte de metionina mais apropriada para animais jovens, sendo o aminoácido mais eficiente para atender as células intestinais e promover o efeito redox quando comparado com a DL-Metionina.
Do ponto de vista prático, é possível afirmar que a L-Metionina é a melhor opção dentre as fontes de metionina para ser utilizada no programa de saúde intestinal, apoiando o banimento de antibióticos nas rações de aves e suínos.
Há outro fator biológico importante em animais na juvenília. Por exemplo, Stringhini et al. (2016) relatam que a secreção enzimática em pintinhos alcança seu pico aos quatro dias de idade para as enzimas amilase e tripsina, porém, se mantém relativamente constante para lipase até 10 dias de idade.
Para afirmar a menor atividade enzimática dada aos animais jovens. D´Aniello et al. (1993) quantificaram baixa quantidade das enzimas oxidases (responsáveis para a conversão de D-isômero aminoácido para L-isômero aminoácido) em animais jovens quando comparado com a fase adulta (Tabela 1). Para os autores, a atividade desta enzima é 50 a 150 vezes menor nos primeiros dias de vida quando comparado com adultos. Isto significa que o ponto de saturação ou atividade enzimática é baixo, consequentemente, numa maior ingestão de D-aminoácidos, excessivo acúmulo ocorrerá nos tecidos, favorecendo a ocorrência de danos fisiológicos, tais como; supressão na síntese de enzimas essenciais ao organismo e inibição do crescimento. Provavelmente, essa evidencia indica um dos motivos da maior toxidade da metionina frente a outros aminoácidos, principalmente quando se trata de animais jovens e submetidos à dieta de baixo conteúdo proteico com excesso de metionina (Benevenga, et al, 1984 e Harper et al. 1970).
Tabela 1. D- aminoácido oxidase (DAAO) em ratos e sua correlação com a idade.
Figura 8. Esquema ilustrativo da D-AAO no fígado e rins conforme D`Aniello et al. (1993).
Importância da L-Methionine na Nutrição de Animais Adultos
A fase inicial da criação de aves e suínos é um ponto crucial para alcançar a máxima performance final. As perdas de desempenho na fase inicial dificilmente serão resgatadas com o crescimento compensatório. Diante disso, o melhor modelo nutricional para aves e suínos se baseia no fato de oferecer o consumo adequado de nutrientes, evitando a máxima ineficiência do metabolismo animal e desafios de campo.
Diferentemente dos animais jovens, D'Aniello (1993) estabelece que, para animais adultos, a ingestão de D-aminoácidos não se acumula nos tecidos devido à disponibilidade/atividade enzimática, o que traz a sensação de que o isômero D passa a ser um tema irrelevante nesta fase de vida.
Por outro lado, reconhecendo que a conversão do isômero D em L dos aminoácidos, em sua maior parte, ocorre no fígado e nos rins (Saunderson, 1985), é possível afirmar que a eficiência hepática e renal está diretamente ligada à qualidade dos ingredientes e o nível de proteína que compõe uma dieta. A alimentação com micotoxinas, peróxidos e alto teor de proteína bruta afetará negativamente o metabolismo hepático e renal o que pode influenciar na taxa de isomerização de aminoácidos. Por fim, a oferta da L-metionina bioativa na fase de crescimento e final de aves e suínos, melhora o desempenho e oferece melhor proteção hepática facilitando o processo de desintoxicação dos animais.
Marchioro et al. (2021) avaliando o efeito protetor da metionina para frangos de corte quando contaminados com aflatoxinas, observaram melhora significativa no desempenho aos 42 dias de idade (Tabela 02).
Tabela 2. Desempenho e peso relativo do fígado de aves intoxicadas por aflatoxinas, suplementadas ou não com metionina - 42 dias de idade.
Abdel-Wahhab et al. (1999) utilizando L-metionina na prevenção de toxicidade por ocratoxina em ratos fêmeas gestantes, observaram que os animais suplementados com L-metionina promoveu a proteção dos tecidos renais e hepáticos. Houve redução na natimortalidade.
Para Yunianta et al. (2010) a metionina nas rações de frangos aumenta a síntese de GSH sendo um fator importante no processo de desintoxicação dado pelas micotoxinas.
Segundo Liu et al. (2022) o glutamato, a cisteina e a glicina podem ser usados como substrato para a síntese de glutationa e participar no processo de desintoxicação. Os autores sustentam a ideia do ajuste nutricional de nutrientes desintoxicantes na dieta já que as micotoxinas podem reduzir o consumo alimentar.
Como pode ser observado, as informações supracitadas mostram a importância dos aminoácidos sulfurados no processo de desintoxicação. Portanto o aumento da recomendação de metionina ou, preferencialmente usar L-metionina na dieta dos animais atormentados com micotoxinas pode ser uma solução nutricional eficiente.
Neste artigo, não podemos deixar de mencionar a bioequivalência das fontes de metionina. A pesquisa realizada por Esteves-Garcia (2018) sobre bioequivalência (BE) das fontes de metionina demonstra que a DL-metionina apresentou BE de 89% para ganho de peso e 77% para conversão alimentar quando comparado com a L-metionina (Figura 8).
Figura 8. Ganho de peso (a) e conversão alimentar (b) das aves alimentadas com diferentes níveis de DL e L-metionina – 37 dias de idade.
Hannas et al. (2014) utilizando leitões de 15 a 30 kg encontraram bioequivalência de L-metionina de 105,49% e 134,30% para ganho de peso diário e eficiência alimentar, respectivamente, quando comparado com a DL-metionina. Estes resultados indicam superioridade biológica da L-metionina sobre a DL-metionina.
Nossa experiência por meio de testes de campo e pesquisas científicas deixam evidências de que a L-metionina é 20% superior quando comparada com a DL-metionina.