Introdução
O constante aumento no consumo da carne de frangos de corte e, principalmente, o aumento das exportações da carne, faz com que se tenha grande número de matrizes pesadas de corte alojadas. Segundo dados da União Brasileira de Avicultura (UBA), o alojamento de matrizes de corte em 2008 foi acima das previsões iniciais, sendo alojadas 48.564.097 matrizes, um crescimento inédito de 14,3% sobre o ano de 2007 que apresentou alojamento de 42.481.788 matrizes. Ainda, segundo a UBA, este aumento foi em parte atribuído ao crescimento nas exportações de carne de frango e também pelo programa de expansão das agroindústrias, para atender as demandas dos mercados importadores (UBA, 2009).
Com a regulamentação do Plano de Regionalização Sanitária que segue as disposições do Capítulo 1.3.5. do Código Sanitário para os animais terrestres da OIE, é previsto o controle do tráfego de animais, com o objetivo de preservar o mercado internacional e suas restrições às importações de produtos de origem animal (OIE, 2009). Desta forma, cada Estado deve ter um destino adequado para as matrizes de descarte. Assim, uma alternativa viável seria o abate destas aves em abatedouros comerciais quando estas chegam ao final de seu ciclo de postura. O aproveitamento desta carne, utilizando técnica de amaciamento como a desossa, é uma opção para a avicultura brasileira.
Uma forma de comercialização, geralmente utilizada para a carne de matrizes, é a preparação de carne mecanicamente separada de aves (CMSA) que é utilizada na formulação da maioria dos embutidos emulsionados tais como, salsichas, mortadelas, hambúrgueres, apresuntados, ou ainda, podendo ser vendida a um preço inferior ao do frango (BORBA, 2008).
As matrizes caracterizam-se por serem aves grandes que pesam de 3,0 a 4,0 kg, com a conformação que se espera de um frango, ou seja, muita carne no peito e nas coxas, essas características são pela sua concentração na produção de pintos comerciais de grande vigor híbrido para a produção de carne. Além disso, a carne das matrizes de corte apresenta grande deposição de gordura, tanto subcutânea quanto abdominal (NUNES, 2003). Ainda, segundo Kondaiah (1993), a carne apresenta um aspecto desagradável da pele além de ser mais dura e menos suculenta.
Segundo Huallanco (2004), quando a carne é desossada com zero a 2h "post-mortem", de 50 a 80% da carne se tornam rígidas. No entanto, se ocorrer espera de pelo menos 6h antes da desossa, cerca de 70 a 80% da carne será macia. A maciez de cortes desossados de frango é influenciada pelo tempo "post-mortem" da desossa. Os músculos desossados imediatamente após o abate ainda possuem energia disponível para a contração (HUALLANCO, 2004).
Portanto, o objetivo deste trabalho é melhorar as características de qualidade da carne das matrizes pesadas, prejudicadas pelo avanço da idade, utilizando a desossa como técnica de amaciamento.
Material e métodos
A obtenção das amostras para determinação das características de qualidade da carne de peito de matrizes de descarte foi realizada em linha comercial de abate. As aves eram da linhagem Ross, com peso médio de 3,579 kg e provenientes da cidade de Enéas Marques, Estado do Paraná, percorrendo tempo médio de viagem de 14h com saída ao entardecer e chegada ao abatedouro no período da manhã. Os caminhões permaneceram em local coberto, durante o período de descanso, por aproximadamente 4h antes do abate, e os ventiladores e aspersores foram ligados nas horas mais quentes.
As amostras foram coletadas em Abatedouro comercial localizado na cidade de Itapetininga, Estado de São Paulo, com a presença do Serviço de Inspeção Federal (SIF). Foram coletados 60 peitos com osso e 20 peitos desossados imediatamente após a saída do chiller, isto é, ainda no abatedouro. Cada peito foi embalado individualmente em saco plástico, devidamente identificados com anilhas plásticas, acondicionados em caixa de isopor com gelo e imediatamente transportados para o Laboratório de Qualidade de Carne da FMVZ/Unesp, Campus de Botucatu, Estado de São Paulo. No Laboratório, as amostras permaneceram acondicionadas à temperatura de aproximadamente 2oC. Os peitos foram desossados nos tempos zero (imediatamente após o resfriamento no abatedouro), 4, 8 e 12h "post-mortem", sendo utilizados 20 peitos por tratamento. Inicialmente, foi mensurado o pH de todos os 80 peitos após o resfriamento. Com 24h post-mortem, foram avaliados os parâmetros de pH, cor (L*, a* e b*), perda de peso por cocção (PPC), capacidade de retenção (CRA), força de cisalhamento (FC), índice de fragmentação miofibrilar (MFI) e estrutura morfológica da fibra muscular (diâmetro da fibra e número de fibras por campo). As metodologias utilizadas nas análises da carne de matrizes pesadas estas descritas a seguir.
O pH dos 80 peitos coletados foram mensurados nos tempos zero (imediatamente após o resfriamento) e com 24h "post-mortem", sendo avaliado por método, segundo Bendall (1973), utilizando solução tamponada de iodoacetato de sódio 5 mM KCl-1 150 mM, com a finalidade de inibir a glicólise. A leitura do pH foi realizada com pH Metro (Sentron, modelo 1001) acoplado a uma sonda (Sentron tipo LanceFET, modelo 1074001) com ponta fina de penetração, após a trituração e homogeneização por 10 s (Ultraturrax modelo MA 102, Marconi, Brasil) e estabilização à temperatura do homogenato a 20°C.
A cor dos filés do peito foi determinada por meio de um colorímetro (Minolta), no sistema CIELAB, em que foram avaliados os parâmetros L* (luminosidade), a* (teor de vermelho) e b* (teor de amarelo). Os valores L*, a* e b* foram medidos em três diferentes pontos na superfície ventral e no meio da seção cranial do músculo Pectoralis major. Estas avaliações foram feitas conforme metodologia proposta por Van Laack et al. (2000).
Para as análises de perda por cocção, amostras de filés íntegros com 24h "post-mortem", embalados em papel laminado, foram cozidas em uma chapa metálica de dupla face, com aquecimento em ambas faces, pré-aquecida e regulada para 180ºC, permanecendo por 4 min. para cada lado do filé, num total de 8 min. de cozimento ou até atingir uma temperatura interna de 82 a 85ºC. Após o cozimento, os filés foram retirados do papel laminado e os mesmos foram resfriados sobre papel absorvente à temperatura ambiente. Posteriormente, as amostras foram pesadas para averiguação da quebra de peso antes e após o cozimento. A diferença entre o peso inicial (peito "in natura") e final (peito cozido) correspondeu à perda de peso por cozimento (HONIKEL, 1987).
A medida de capacidade de retenção de água foi realizada utilizando a metodologia descrita por Hamm (1960). A determinação foi baseada na medição da perda de água liberada, quando aplicada uma pressão sobre o tecido muscular. Cubos de carne de 0,5 g foram colocados entre dois papéis de filtro (12,5 cm de diâmetro) e, estes entre duas placas de vidro (12 x 12 x 1 cm), no qual é colocado peso de 10 kg 5 min.-1 (10 cm de diâmetro). A amostra de carne de peito após a pressão foi pesada e, por diferença calculou-se a quantidade de água perdida. O resultado foi expresso em porcentagem de água exsudada em relação ao peso inicial da amostra.
Para a avaliação da força de cisalhamento foi utilizado o texturômetro TAXT plus, equipado com dispositivo Warner Bratzler. O equipamento foi calibrado com peso-padrão de 5 kg e padrão rastreável. A velocidade de descida e corte do dispositivo foi de 200 mm min-1 (AMSA, 1995). Foram utilizadas as amostras usadas na determinação da perda de peso por cozimento. Foram retiradas cinco amostras por filé de peito na forma de paralelepípedos com 1 x 1 x 2 cm (altura, largura e comprimento, respectivamente), as quais foram colocadas com as fibras orientadas no sentido perpendicular às lâminas da probe Warner-Blatzler.
Para o índice de fragmentação miofibrilar, foram separados 3,0 g de músculo, livre de tecido adiposo e tecido conectivo, que foram colocados em tubos Falcon (50 mL) e adicionados 30 mL de TMFI (tampão de índice de fragmentação miofibrilar). As amostras foram homogeneizadas e centrifugadas a 1200XG por 17 min. a 2°C, descartando o sobrenadante. O pélete foi dissolvido em 30,0 mL de TMFI (2°C), utilizando um bastão de vidro até dissolver o pélete completamente e centrifugado novamente a 1200XG por 17 min. a 2°C. Foi descartado o sobrenadante e a porção de gordura e o pélete ressuspenso em 8,0 mL de TMFI (2°C). Vortexar até que o pélete esteja completamente dissolvido. As amostras foram filtradas e armazenadas em tubos (15,0 mL) identificados e refrigerados. Após, foi extraída a proteína, em duplicata para cada suspensão. Foram colocados 0,75 mL de TMFI e 0,25 mL de amostra em tubo de ensaio e adicionados 4,0 mL de reagente de biureto. Foi preparado o branco com 1,0 mL de TMFI e 4,0 mL de reagente de biureto. Foram realizadas as leituras em absorbância no comprimento de onda de 540 nm, sendo obtidos os valores de MFI pelo seguinte cálculo MFI = 200 X absorbância obtida (CULLER et al., 1978).
A estrutura morfológica da fibra muscular foi realizada pela técnica de coloração Hematoxilina- Eosina (HE) de Lillie (1954). Para a confecção da lâmina histológica foi coletado um fragmento de tecido do peito que foi imediatamente congelado em nitrogênio líquido. A partir das amostras coletadas foram realizados cortes transversais (diâmetro das fibras), os quais foram corados em HE para a mensuração do diâmetro da fibra muscular e número de fibras por campo. As mensurações das fibras foram medidas, conforme Dubowitz e Brooke (1973), e para a obtenção dos dados foi utilizado microscópio ótico, modelo Olympus, com objetiva 20, acoplado a um Sistema Analisador de Imagem Computadorizado ("Image Corporation - USA") em conjunto com programa OPTIMUS 4.0. Para a mensuração do diâmetro das fibras, foram avaliadas cinco amostras por tratamento, sendo realizadas leituras de dez campos de cada amostra, cada campo equivalente a 73899,6 μm2, e mensuração do diâmetro de todas as células de cada campo, avaliado pela medida do seu menor diâmetro. Da mesma forma, para a contagem do número de fibras, foram utilizadas as mesmas amostras e campos da mensuração do diâmetro das fibras.
Foi adotado o delineamento inteiramente casualizado com quatro tratamentos (0, 4, 8 e 12h "post-mortem") e 20 repetições cada, e cada peito foi considerado uma repetição, totalizando 80 peitos. Os resultados foram submetidos à Análise de Variância (ANOVA) e posteriormente ao teste de comparação de médias de Tukey, para as variáveis com diferença estatística significativa, utilizando o procedimento GLM (General Linear Models) do programa estatístico SAS (SAS, 1996).
Resultados e discussão
A Tabela 1 apresenta o resultado encontrado do pH mensurado nos tempos 0 e 24h "post-mortem" para os peitos de matrizes pesadas de descarte desossados com 0, 4, 8 e 12h. Não foram observadas diferenças estatísticas significativas (p > 0,05) entre os valores de pH nos quatro tempos de desossa, 0, 4, 8 e 12h, que apresentaram os valores de 6,30; 6,23; 6,19 e 6,26, respectivamente.
Tabela 1. Avaliação do parâmetro pH para os tempos de desossa 0, 4, 8 e 12h, mensurado nos tempos 0 (inicial) e 24h (final) "post-mortem", da carne de peito de matrizes pesadas.
Os valores de pH mensurados com 0 e 24h "post-mortem" foram de 6,61 e 5,88, respectivamente. Neste caso, houve diferença significativa (p ≤ 0,05) entre os dois diferentes tempos, como era esperado, pois após o abate o consumo das reservas glicolíticas continua até se esgotarem as moléculas de ATP do músculo, o que se traduz no abaixamento do pH pelo acúmulo de ácido lático resultante desta quebra. Resultado semelhante ao obtido para o pH 24h (5,88) foi encontrado por Huallanco (2004), que obteve para o pH de carne de frango mensurado 24h "postmortem" o valor de 5,8. O resultado para o pH no tempo zero (6,61) obtido neste trabalho corrobora com Lyon e Wilson (1985) que encontraram maior valor de pH para o músculo quando desossado imediatamente após o resfriamento. Para a análise da interação do pH entre a desossa e o tempo não foi observada diferença estatística significativa (p > 0,05).
Na Tabela 2, estão apresentados os resultados do desdobramento da interação do pH inicial e 24h "post-mortem" entre os tempos de desossa de 0, 4, 8 e 12h da carne de peito de matrizes pesadas. Não houve diferença estatística significativa (p > 0,05) entre o pH inicial e os diferentes tempos de desossa (0, 4, 8 e 12h), sendo os valores encontrados para o pH inicial de 6,71; 6,59; 6,56 e 6,59, respectivamente. Para o pH mensurado com 24h "post-mortem", os valores obtidos nos quatro diferentes tempos de desossa foram de 5,89; 5,87; 5,83 e 5,93, respectivamente.
Tabela 2. Resultado do desdobramento da interação do pH inicial e 24h "post-mortem", entre os tempos de desossa: 0, 4, 8 e 12h da carne de peito de matrizes pesadas de descarte.
Houve diferença significativa (p ≤ 0,05) entre as mensurações do pH inicial e 24h "postmortem" somente dentro de cada tratamento, e os maiores valores foram observados quando o valor de pH foi mensurado logo após o resfriamento (zero). Isto já era esperado, pois após o abate, o consumo das reservas glicolíticas continuou, até se esgotarem as reservas de ATP do músculo, o que se traduz no abaixamento do pH pelo acúmulo de ácido lático resultante desta quebra. O resultado do pH mensurado com 24h "post-mortem" para o tempo de desossa 12h foi de 5,93. Estes resultados foram semelhantes aos encontrados por Wattanachant et al. (2004) que observaram valores de 5,93 para o pH de frango de corte mensurados com 24h "post-mortem". Esses valores também não apresentaram diferença significativa (p > 0,05) entre si. Porém foram observadas diferenças significativas (p ≤ 0,05) entre o pH inicial e final com 24h "post-mortem" para todos os tempos de desossa analisados (0, 4, 8 e 12h).
Na Tabela 3, são apresentados os valores de cor (L*, a* e b*), perda de peso por cocção (PPC), capacidade de retenção de água (CRA), força de cisalhamento (FC) e índice de fragmentação miofibrilar (MFI) da carne de peito de matrizes de descarte submetidas a diferentes tempos de desossa.
Tabela 3. Resultados das análises de cor objetiva (L*, a* e b*), perda de peso por cocção (PPC), capacidade de retenção de água (CRA), força de cisalhamento (FC) e índice de fragmentação miofibrilar (MFI) da carne de peito de matrizes de descarte submetida a diferentes tempos de desossa.
Para os valores de luminosidade (L*), foi observada diferença significativa (p ≤ 0,05) entre as amostras desossadas com zero (44,71) e 4h (45,34) das desossadas com 8 e 12h "post-mortem" (49,81 e 48,89, respectivamente), que não diferiram entre si (p > 0,05). Sendo o valor de L* a mensuração da luminosidade da amostra de carne, o aumento deste valor demonstra que com o aumento do tempo de desossa de 0 e 4 para 8 e 12h a carne se tornou mais pálida. Estes resultados diferem dos encontrados por Borba (2008) que também trabalhou com a carne de peito de matrizes pesadas e encontrou o valor de L* de 50,20 mensurado após a instalação do "rigor mortis". Qiao et al. (2001), trabalhando com peito de frango, encontraram valor de L* de 49,72 mensurado a 0 hora "post-mortem", sendo este resultado semelhante aos obtidos nos tempos de desossa 8 e 12h (49,81 e 48,89, respectivamente).
Os teores de vermelho (a*) da carne apresentaram diferença significativa (p ≤ 0,05) entre os tempos de desossa. Os valores encontrados neste trabalho para este parâmetro foram de 5,29; 6,99; 5,82 e 6,85 obtidos nos tempos de desossa 0, 4, 8 e 12h, respectivamente, e os maiores valores para este parâmetro foram observados nos peitos desossados a partir de 4h "post-mortem", quando comparado aos peitos desossados logo após o resfriamento (5,29). Esses resultados indicam maior conteúdo de mioglobina, resultando em uma carne mais avermelhada encontrado nas amostras que foram desossadas a partir de 4h "post-mortem". Resultado distinto aos obtidos neste trabalho foi encontrado por Borba (2008) que obteve o valor médio de 2,08 para este parâmetro, mensurado em carne de peito de matrizes de corte desossadas após a instalação do "rigor mortis", assim, resultando em uma carne com menor intensidade de vermelho.
O parâmetro amarelo (b*) apresentou os valores médios de -0,44; 1,08; 0,10 e 0,55 para os tempos de desossa de 0, 4, 8 e 12h, respectivamente. Houve diferença estatística significativa (p ≤ 0,05) entre o tempo zero e os tempos 4 e 8h. No entanto, não foram observadas diferenças estatísticas (p > 0,05) entre o tempo de desossa de 12h dos demais tempos (0, 4 e 8h). Borba (2008) encontrou para o parâmetro b* valor médio de 1,43 para peitos desossados de matrizes de descarte, valor acima dos encontrados neste trabalho. Essas diferenças entre os teores de vermelho e amarelo podem ser em razão dos diversos fatores como diferentes lotes de matrizes, diferença entre a idade média das matrizes, diferença entre os tempos de jejum (duração do período e a distância do transporte até o abatedouro) e o tempo de espera na plataforma de abate.
Foi observada diferença significativa (p ≤ 0,05) para a perda de peso por cocção (PPC) entre os peitos desossados com 4 e 8h "post-mortem" (31,78 e 34,50, respectivamente), porém estes tempos de desossa não diferiram daqueles observados para as amostras desossadas com 0 e 12h (33,52 e 33,30, respectivamente). Entretanto, resultado distinto foi encontrado por Borba (2008) que obteve o valor médio de 17,65 para as perdas por cocção analisadas em peitos de matrizes pesadas, desossadas após o "rigor". Resultado bem distinto ao encontrado neste trabalho o que pode ser relacionado a diferente metodologia empregada pelo pesquisador e pelas etapas "ante" e "post-mortem" a que as aves foram submetidas. Para Souza et al. (2005) que analisaram a carne de peito de frangos, diferentes períodos de desossa da carne após o resfriamento da carcaça não afetaram significativamente as perdas por cocção.
No parâmetro capacidade de retenção de água (CRA) houve diferença significativa (p ≤ 0,05) entre os tempos de desossa, e os valores encontrados para o peito desossado logo após o resfriamento, 0 hora (75,66), diferiu daqueles desossados nos tempos de 8 e 12h "post-mortem" (69,57 e 70,91, respectivamente). Para este mesmo parâmetro foram observadas diferenças significativas (p ≤ 0,05) entre as amostras desossadas com 8h "post-mortem" (69,57) daquelas desossadas com 0 e 4h "postmortem" (75,66 e 73,69, respectivamente). Entretanto Oba et al. (2007) obtiveram para este parâmetro, analisado em peitos de frangos de corte, valor mais baixo de 68,5 para a desossa feita com 24 horas "post-mortem". A capacidade de retenção de água está inversamente ligada ao parâmetro luminosidade (valor L*) deste modo, com o aumento do valor L* a CRA da carne diminui o que pode ser observado neste trabalho para os tempos 8 e 12h "post-mortem" em que obtiveram maiores valores de L* e menores valores de CRA. Borba (2008) obteve o valor médio de 68,03 para a capacidade de retenção de água (CRA) medida na carne de peito de matrizes pesadas desossadas após a instalação do "rigor mortis". Este valor foi ligeiramente inferior aos obtidos neste trabalho, o que pode ser pelos diversos fatores como idade diferente, linhagem das matrizes e ao processo de abate. A capacidade de retenção de água está diretamente ligada à qualidade final da carne assim maior capacidade de reter a água leva à melhor suculência e à menor perda de umidade e peso durante a estocagem desta carne, fatores relevantes para o consumidor.
A força de cisalhamento (FC) apresentou diferença significativa (p ≤ 0,05) apenas para o tratamento zero (8,478) em relação aos tempos 4, 8 e 12h (5,154; 5,375 e 4,819, respectivamente). Portanto, foi possível observar que houve aumento da força de cisalhamento com tempo de desossa a partir de 4h "post-mortem". Resultados contrários foram encontrados por Lyon et al. (2003) que encontraram para o tempo de desossa de 4h, os maiores valores de força de cisalhamento quando comparados aos tempos 2, 8 e 24h "post-mortem".
Borba (2008) obteve também resultado distinto para a força de cisalhamento, para a qual foi encontrado o valor médio de 1,41 para a carne de peito de matrizes pesadas desossadas após o estabelecimento do "rigor mortis", valor bem menor (carne mais macia) que os resultados obtidos neste trabalho para o parâmetro FC. Os valores mais altos obtidos neste trabalho para a força de cisalhamento podem ser em razão dos diferentes fatores causadores de estresse nas aves nas etapas "antemortem", como por exemplo, o tempo e distância de transporte entre a granja até o abatedouro. O transporte também influencia no tempo de jejum, tanto hídrico como alimentar da ave. Neste trabalho, as aves viajaram por 14h, da cidade de Eneas Marques, Estado do Paraná, até a cidade de Itapetininga, Estado de São Paulo, e tiveram 4h de descanso antes de serem abatidas, o que gerou longo estresse para as aves causado pelo grande trajeto percorrido, além do estresse adicional causado pelo jejum prolongado, afetando a qualidade da carne destas aves. No caso do trabalho de Borba (2008), não são mencionados a distância percorrida pelas aves até o abatedouro e o tempo de jejum total. Assim, provavelmente no trabalho realizado por este autor, o estresse sofrido pelas aves pode ter sido menor e influenciado pouco na qualidade da carne, representado pela baixa força de cisalhamento das amostras. No entanto, de acordo com trabalhos da literatura (KOMIYAMA et al., 2009; ROCHA GARCIA et al., 2003; NUNES, 2003), a carne de aves de descarte apresenta dureza acentuada, sendo este caso considerado uma exceção.
O parâmetro índice de fragmentação miofibrilar (MFI) apresentou os resultados 60,90; 69,02; 76,36 e 69,52 para os tempos de desossa 0, 4, 8 e 12h, respectivamente. Esses resultados não apresentaram diferença estatística significativa (p > 0,05) entre os tempos de desossa. Esses resultados diferem dos encontrados por Santos (2007) em frangos de corte que em seu estudo obteve o valor 55,0 para o índice de fragmentação miofibrilar (MFI) com 24h "postmortem". A Tabela 4 apresenta para os quatro diferentes tempos de desossa (0, 4, 8 e 12h) os resultados obtidos para diâmetro e número de fibras musculares da carne de peito de matrizes de descarte. Na análise de diâmetro, foi observada diferença estatística significativa (p ≤ 0,05), e o valor do diâmetro no tempo zero (67,24) diferiu dos tempos 4 e 8h (55,93 e 60,08, respectivamente) que não diferiram entre si (p > 0,05). Houve diferença significativa (p ≤ 0,05) entre o tempo 12h (63,83) e os tempos 4 e 8h "post-mortem". O valor do diâmetro no tempo zero não diferiu estatisticamente (p > 0,05) do tempo 12h "post-mortem". Os valores obtidos para a contagem do número de fibras foram 34,87; 34,25; 36,09 e 37,05 para os tempos de desossa zero, 4, 8 e 12h, respectivamente, esses valores não diferiram estatisticamente (p > 0,05).
Tabela 4. Avaliação do efeito do tempo de desossa sobre o diâmetro e número das fibras musculares da carne de peito de matrizes de descarte.
A Figura 1 apresenta as fotomicrografias de cortes transversais do músculo Pectoralis major de matrizes pesadas de descarte submetidas a diferentes tempos de desossa "post-mortem" (A = zero hora, B = 4h, C = 8h e D = 12h "post-mortem").
Figura 1. Cortes transversais do músculo Pectoralis major de matrizes pesadas de descarte submetidas a diferentes tempos de desossa "post-mortem" (A = 0 hora, B = 4h, C = 8h e D = 12h "post-mortem"). x200. Coloração HE.
Tempo de desossa na carne de matriz de corte
Acta Scientiarum. Animal Sciences Maringá, v. 32, n. 1, p. 85-92, 2010 Pode-se observar que com o passar dos tempos de desossa (0, 4, 8 e 12h "post-mortem") houve aumento do espaçamento entre as fibras musculares e perda da forma das fibras principalmente observadas nas Figuras C e D. Isto demonstra a desestruturação do tecido muscular conforme aumentou o tempo de desossa "post-mortem".
Conclusão
Com os resultados obtidos neste trabalho, conclui-se que houve melhoria dos índices indicativos da maciez da carne das matrizes pesadas de descarte, sendo necessário o período de desossa de no mínimo 4h para se obter melhor resultado na maciez.
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***O trabalho foi origianlmente publicado por Acta Scientiarum. Animal Sciences Maringá, v. 32, n. 1, p. 85-92, 2010.