INTRODUÇÃO
Um dos maiores problemas atuais na produção industrial de frangos de corte está relacionado com a falta de informação sobre os pontos críticos das operações pré- abate, responsáveis, em grande parte, pelas mortes antes da chegada (DOA). Até então, estudos como o de Nijdam et al. (2004), que avaliaram o efeito de diversos parâmetros pré-abate na mortalidade, têm realizado tentativas de estimar diferentes níveis de DOAs em função da variação dos fatores mais importantes nestas etapas, por meio da aplicação da Razão de Chances (Odds Ratio), que é a chance de aumento ou diminuição da mortalidade em relação ao fator de interesse, como por exemplo, aumento de 1ºC na temperatura, ocorrência das operações no turno da tarde, dentre outros. Entretanto, existem métodos mais robustos, tais como as Redes Neurais Artificiais (RNAs), que vêm sendo utilizados na produção animal como indicativos eficientes de predição, podendo informar ao setor produtivo com mais precisão o quanto se perde na combinação de fatores importantes nestas etapas (RODRIGUES, 2006). Porém, segundo Fernandez et al. (2006), os avanços na área de Ciência Animal ainda são recentes. Sempre que métodos tradicionais lineares não apresentam bom desempenho no tratamento de problemas que envolvem, por exemplo, aproximação de funções multivariadas, as Redes Neurais Artificiais são alternativas seguras, principalmente devido à sua capacidade de representar comportamentos não-lineares aleatórios. Dentro desta temática, poucos trabalhos foram desenvolvidos na área de Avicultura (SALLE et al., 2003; JAISWAL et al., 2005).
A estrutura de funcionamento das RNAs apresenta um grande potencial na predição de cenários, envolvendo variáveis em um dado problema ou situação. Recentemente, trabalhos relevantes na área de produção animal afirmam que as redes são eficientes em processos de generalização, e diversos cenários podem ser obtidos por meio de redes e tipologias adotadas para cada caso especificamente (CRANINX et al., 2008).
O poder de generalização apresentado pelas Redes Neurais Artificiais é notável para a construção de saídas condizentes com entradas que não foram apresentadas no treinamento efetivo do sistema. O resultado é o grande benefício em resolver problemas complexos de grande escala que são atualmente intratáveis. Considerando a diversidade de fatores que influenciam a mortalidade, esta ferramenta de decisão pode ser utilizada para extrair padrões de comportamentos e, assim, auxiliar na predição de perdas pré-abate
OBJETIVO
Objetivou-se por meio deste trabalho avaliar o desempenho das redes neurais artificiais na predição de perdas pré-abate por mortalidade de frangos de corte.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido em um abatedouro comercial no Estado de São Paulo, no ano de 2006. Mais de 13 mil caminhões foram registrados quanto aos dados de mortalidade de frangos de corte durante as operações pré-abate. Fatores que influem no conforto térmico das aves foram registrados através de planilhas com dados históricos da empresa, tais como fatores climáticos e fatores relacionados às operações pré-abate, conforme descrito por Vieira (2008). Para este trabalho, foram selecionados aleatoriamente 3.743 dados referentes ao turno da tarde, considerado o mais crítico em termos de estresse térmico das aves, durante as 4 estações do ano.
Para a simulação das perdas por mortalidade, foram construídos 2 cenários para os fatores pré-abate, visando à avaliação da performance preditiva da rede em estudo, bem como a entender as variações não observadas nas discussões anteriores. Os cenários foram divididos de acordo com determinações de temperatura e umidade de conforto e estresse térmico, segundo Barbosa Filho et al. (2007). Os valores utilizados para cada cenário são descritos na Tabela 1.
Quanto ao método de reconhecimento de padrões e predição de perdas pré- abate, foi implementada em ambiente ®Matlab 2006a uma RNA de retropropagação muito utilizada para sistemas de predição chamada de Feedforward-backpropagation. A rede apresenta topologia configurada em duas camadas, com 10 neurônios na camada oculta e 1 na camada de saída. As funções de ativação para cada camada (oculta e de saída) foram a tangente sigmóide e linear, respectivamente.
Os dados de entrada consistiram nas variáveis tempo de espera, temperatura externa, umidade relativa do ar externo e número de aves por caixa. A saída foi caracterizada por taxa de mortalidade (em porcentagem). Em média, cada estação apresentou aproximadamente 940 vetores de informações de tempo de espera (T.esp), temperatura externa (T.ext), umidade relativa do ar externo (UR), número de aves por caixa (Nº.) e mortalidade em porcentagem (Mort.). Para a análise de performance de predição da rede foi empregado o MSE (mean-square error).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O MSE da rede ajustada foi de 0,00415467, considerado razoável, quando comparado com os resultados de Jaiswal et al. (2005), e com as redes para a estação de verão, outono e primavera. Quanto ao cenário 1, onde foram variados os tempos de espera em uma situação de estresse por frio, é possível observar que a predição da mortalidade foi satisfatória, cujo comportamento é condizente – QUANTO QUAL O PADRÃO ACEITÁVEL com o efeito exercido pela hipotermia nas aves. Ou seja, quanto maior o tempo de espera, maior o número de aves mortas neste cenário. Houve um aumento na proporção de mortalidade até o tempo de 1 hora e meia de espera, a partir do qual foi registrada uma estabilização na mortalidade, seguida de um novo aumento na mortalidade após 3 horas e meia. No entanto, para intervalos maiores de tempo (acima de 5 horas), a rede não conseguiu manter o mesmo padrão (Figura 1).
Figura 1 - Valores preditos de mortalidade, em relação à variação do tempo de espera, sendo as condições: T.ext.: 11,5ºC; UR: 100% e Núm. aves: 5
Em relação à situação de estresse por calor (Figura 2), conforme o esperado, o aumento dos valores numa situação de temperatura, tempo de espera e número de aves por caixa elevados, resultou em aumento na mortalidade, principalmente entre 65% e 80% de umidade, a partir do qual se alcançou um elevado patamar de mortalidade.
Figura 2 - Valores preditos de mortalidade, em relação à variação da umidade relativa externa, sendo as condições: T.ext.: 26,7ºC; Tempo de Espera: 4 horas e Núm.aves: 8.
Observa-se que o comportamento da umidade na predição se mostrou mais uniforme, evidenciando a acurácia da rede em generalizar estes padrões em relação à mortalidade.
Sobre as proporções de mortalidade que não foram satisfatoriamente preditas pela rede, Betker et al. (2003) afirmaram que a existência de lacunas nos dados de um fator pode causar incerteza no sistema, isto é, a predição apresenta erros na relação entre a variável resposta e o fator explicativo na falta de dados para o aprendizado. Os autores ainda consideraram que, nestes casos, a adição de mais informações na combinação de fatores pode melhorar a acurácia da rede. No entanto, as redes apresentaram boa performance na predição das demais proporções de perda, indicando que o aprendizado foi eficiente, possibilitando a generalização das respostas ligadas aos fatores de estudo, complementando assim, as informações geradas neste trabalho.
CONCLUSÕES.
Com relação ao poder de generalização das redes neurais, os modelos apresentaram boa performance preditiva na maioria das estações do ano incorporadas no ajuste, além da acurácia elevada para predizer a mortalidade em condições importantes, indicando o grande potencial das redes neurais artificiais em pesquisas pré-abate de frangos de corte.
REFERÊNCIAS.
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