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Fisiologia da digestão e da absorção em aves

Publicado: 30 de junho de 2015
Por: Fernando Rutz1, Victor Fernando B. Roll1, Eduardo G. Xavier1, Marcos A. Anciuti2, Debora C. N. Lopes1 1 Departamento de Zootecnia, Universidade Federal de Pelotas 2 Campus Pelotas-Visconde da Graça, Instituto Federal Sul-rio-grandense
Introdução
O sistema gastrintestinal (SGI) inclui o trato gastrintestinal (bico ou boca, faringe, esôfago, papo, proventriculo, moela, intestino delgado, cecos, intestino grosso e cloaca) e os órgãos glandulares (glândulas salivares, fígado e pâncreas) que não fazem parte do trato, mas secretam substâncias dentro dele via ductos conectando os órgãos ao trato (Bell, 2002).
O SGI serve para transferir moléculas orgânicas, sais e água do ambiente externo ao ambiente interno do organismo, onde eles serão distribuídos para as células pelo sistema circulatório. Ao contrário do que parece, o SGI faz parte do ambiente externo ao corpo. Este conhecimento é relevante para entender algumas das propriedades do trato. Por exemplo, o intestino grosso é habitado por milhões de bactérias, sendo a maioria inofensiva, ou mesmo benéfico neste local. Entretanto, se estas mesmas bactérias entram no sangue, como pode ocorrer, pode ser prejudicial e mesmo letal. Esta característica faz com que o SGI tenha o trato mais bem protegido imunologicamente pela ave. Entende-se que ao redor de 70% do sistema imune esteja presente no trato gastrintestinal.
A maior parte do alimento chega ao bico em forma de partículas grandes, contendo muitas macromoléculas, tais como proteínas e polissacarídeos, que são incapazes de atravessar a parede do trato gastrintestinal. Antes de ser absorvido, o alimento deve ser dissolvido e degradado em moléculas menores. Este processo, digestão, é acompanhado pela ação do ácido clorídrico no proventrículo, da bile secretada pelo fígado e de uma variedade de enzimas digestivas liberadas tanto pelas células gástricas e intestinais quanto pelo pâncreas.
As moléculas produzidas pela digestão se movem do lúmen do trato gastrintestinal pela parede de células epiteliais e entram no sistema sanguíneo (absorção), uma vez que aves não possuem sistema linfático. Enquanto a digestão, secreção e absorção estiverem ocorrendo, contrações do músculo liso da parede do trato gastrintestinal misturam o conteúdo do lúmen com várias secreções e o movem através do trato, caracterizando a motilidade.
Portanto, as funções do SGI podem ser descritas em termos de quatro processos: digestão, secreção, absorção e motilidade. Este sistema é programado para maximizar a absorção e, dentro de limites, ele vai absorver tanto quanto for ingerido. Com poucas exceções, o SGI não regula a quantidade de nutrientes absorvidas ou sua concentração no ambiente interno do animal.
Anatomia e fisiologia do sistema digestivo
O trato gastrintestinal começa com o bico (boca). Ao contrário de mamíferos, as aves não tem uma distinção clara entre a faringe e a boca e o complexo formado entre estas estruturas é chamado de orofaringe. Em contraste com mamíferos, as aves não apresentam palato mole e a fenda palatina, conectando a cavidade oral e a nasal. Esta abertura e a ausência de um palato mole torna impossível à ave criar um vácuo para sugar a água para dentro da boca. Portanto, a fim de beber, a ave deve elevar sua cabeça para permitir que a água desça o esôfago por gravidade (Bell, 2002). Esta é a preocupação com bebedouros tipo nipple localizados muito altos ou muito baixos, Em ambos os casos, a ave tem dificuldade para beber água.
Há várias glândulas salivares na parte superior da boca, glândulas mandibulares, lingual e cricoaritenoide que produzem a saliva (Denbow, 2000). A saliva ajuda a lubrificar o alimento e contém amilase em algumas espécies (não presentes em frangos, poedeiras e perus) e podem exercer algum efeito digestivo no alimento armazenado no papo. A língua da ave apresenta um formato de flecha e ajuda a impulsionar o alimento para o esôfago, que é dividido em regiões cervical e torácica. Na região cervical, o esôfago dilata e dá origem ao papo (pH=4,0), uma estrutura que se expande e permite o armazenamento do alimento ingerido. Nesta região aparecem glândulas que produzem muco dentro da mucosa do esôfago e do papo. A função é a de lubrificar o alimento. No papo aparecem as bactérias produtoras de ácido lático por fermentação, sendo, portanto, a primeira barreira contra bactérias patogênicas.
Nas aves, o estômago é composto por dois compartimentos, o proventrículo (pH= 2,8-4,0) ou estômago glandular e a moela  (pH=2,8-4,0) ou estômago muscular. Estes compartimentos são separados por uma região de transição, denominada istmo. O proventrículo corresponde ao estômago do mamífero. Em comparação com a moela, o proventrículo é pequeno e apresenta parede fina. O lúmen do proventrículo apresenta uma aparência granular, concedida por numerosas papilas. As papilas contém células oxintopépticas, responsáveis pela produção de secreção gástrica (ácido clorídrico, pepsina e muco). O HCl age sobre o pepsinogênio, transformando em pepsina. O pH do estômago encontra-se normalmente acima de 2,7 nas aves (Long, 1967). Por ação do HCl, a proteina ingerida desnatura, expondo os seus sítios onde a pepsina exerce sua ação. A gastrina é o hormônio que estimula a produção de HCl e de pepsina. O peptídeo liberador de gastrina é também produzido no proventrículo e estimula a contração do papo e a secreção de enzimas pancreáticas. Na realidade, o alimento passa rápido pelo proventrículo, onde ocorre pouca digestão do alimento, mas as secreções passam à moela, onde a ação enzimática ocorre (Bell, 2002).
A moela tritura e mistura o alimento com secreção gástrica e saliva. O movimento de triturar ocorre devido à ação de dois pares de músculos (fino e grosso) que circundam o órgão. A moela é inativa quando vazia, mas uma vez contendo o alimento, a contração muscular da muscular mais grossa começa.  Existe uma cutícula grossa que cobre internamente a moela (membrana coilínea), a qual é secretada pelas glândulas da mucosa. Esta cutícula está sempre sendo renovada, devido ao seu desgaste contínuo (Bell, 2002). A cutícula protege a moela da ação do ácido clorídrico e da pepsina secretados pelo proventrículo. A cutícula também oferece uma proteção mecânica contra a fricção gerada pelo processo de trituração do alimento. A porção pilórica da moela é pequena na ave e contém glândulas da mucosa que secretam muco para lubrificar a passagem do alimento moído da moela para o duodeno. Partículas finas apresentam trânsito rápido pela moela, mas partículas grossas podem permanecer na moela durante várias horas. A presença de pedriscos faz com que o alimento seja digerido mais rápido antes de entrar no trato intestinal (Bell, 2002). 
A região pilórica da moela desemboca no intestino delgado, o qual é coberto por uma monocamada de epitélio. As células intestinais, presentes no lúmen intestinal são denominadas de enterócitos (digestão e absorção), caliciformes (produção de muco) e enteroendócrinas (produção de hormônios). Estas células estão distribuídas nas vilosidades, que são estruturas que se projetam no lúmen intestinal. Os enterócitos apresentam microvilosidades no seu bordo apical e um período de vida curto (72 h na ave jovem e 96 h na ave adulta), sendo constantemente substituídos por enterócitos que migram das criptas de Lieberkuhn, estrutura localizada entre as vilosidades. Enzimas são produzidas pela parede do intestino, auxiliando a digestão de carboidratos e de proteínas, complementando assim o trabalho iniciado pelo pâncreas (Bell, 2002). 
Desta forma, este arranjo anatômico confere ao intestino uma enorme superfície absortiva, que permite à aves e mamíferos absorver eficientemente água e nutrientes. Substâncias como toxinas e patógenos lesionam a superfície intestinal e reduzem a sua capacidade absortiva.
O intestino delgado é formado pelo duodeno (pH= 5,7-6,1), jejuno  (pH= 5,6-6,0) e íleo (pH=6,1-6,5). O duodeno forma uma alça que circunda o pâncreas, denominada de alça duodenal. O pâncreas altera o ambiente intestinal de modo que possa ser tolerado pelas células intestinais. Isto ocorre através da secreção de água e de bicarbonato, que diluem e neutralizam o ácido produzido pelo proventrículo. Além disso, o pâncreas sintetiza enzimas digestivas importantes. Dietas abundantes em carboidratos estimulam a síntese e secreção de amilase. Dietas abundantes em proteínas estimulam a secreção de proteases e dietas com alto teor de gordura estimulam a síntese de lípases (Hulan e Bird, 1972; Bird e Moreau, 1978). Estes compostos são secretados pelos ductos pancreáticos (três nas aves), os quais se fundem com o intestino, geralmente na porção distal da alça ascendente do duodeno (Denbow, 2000).
Na porção distal do duodeno, o ducto hepato-entérico comum (originado no fígado) e o ducto entérico cístico (originado da vesícula biliar) se fundem, incorporando as secreções hepáticas (bile) no lúmen intestinal. A bile é produzida no fígado, armazenada na vesícula biliar e secretada no intestino. A bile emulsifica a gordura, permitindo uma superfície de contato eficiente para as enzimas responsáveis pela digestão lipídica (lípases). Além disso, a amilase foi descrita como componente da bile em aves jovens e, portanto, apresenta um papel na digestão de carboidratos (Denbow, 2000). A digestão completa de oligo e dissacarídeos e de proteínas depende da ação de enzimas localizadas nas microvilosidades dos enterócitos. Enzimas como a maltase, a sucrase e as proteases estão presentes na superfície do intestino delgado (Siddons, 1969). No ceco foi encontrado alguma atividade de lactase, mas acredita-se ser de origem microbiana.  
O duodeno é seguido pelo jejuno e pelo íleo. Assim como em mamíferos, o sistema de transporte de glicose é um processo ativo ligado ao sódio (transporte ativo secundário). Sistemas semelhantes têm sido apontados para alguns aminoácidos (Moretó et  al., 1991). Difusão facilitada e difusão simples são os outros mecanismos, pelos quais os nutrientes são absorvidos.  As gorduras são absorvidas principalmente no jejuno e no íleo. Os ácidos graxos são transportados para dentro dos enterócitos, onde são reesterificados em triglicerídios para formar portomícrons, os quais passam diretamente para a circulação portal (em mamíferos, a molécula é chamada quilomícron e é transportada via linfática) (Denbow, 2000). Os ácidos graxos voláteis são absorvidos pelo intestino delgado e ceco. O antiperistaltismo em aves permite o transporte de ácido úrico para dentro do ceco. O divertículo de Meckel marca uma divisão anatômica neste setor. Este divertículo é um remanescente da conexão entre o saco vitelino e o intestino delgado, durante o início da vida. O divertículo de Meckel faz parte do tecido linfóide secundário da ave.
Na junção entre o intestino delgado e o intestino grosso (pH= 5,7-6,4), aparecem os dois ceca (pH= 5,8-6,2). O conteúdo intestinal entra no ceco através das junções ileocecais. Na porção proximal do epitélio cecal, as vilosidades são bem desenvolvidas e tendem a reduzir em comprimento conforme avança em direção ao fundo do ceco. Na porção média do ceco, a mucosa se organiza para formar dobras longitudinais e próximas a área cega do ceco. Além de dobras longitudinais também dobras transversais se desenvolvem (Ferrer et al., 1991). Após um período variável de tempo, o ceco contrai e o conteúdo cecal é impulsionado ao intestino grosso. O intestino grosso é relativamente curto em aves, comparado a mamíferos, e finaliza na cloaca, que é uma área anatômica comum para os sistemas digestivo, urinário e reprodutivo. Pouca digestão de carboidratos e de proteínas ocorre no ceco. No seu interior, as bactérias são capazes de sintetizar proteínas, começando com o nitrogênio do ácido úrico. O ceco é importante também para a produção de ácidos graxos voláteis, os quais são produzidos através da fermentação microbiana. Os ácidos graxos voláteis acumulam dentro do ceco e são transportados passivamente para o sangue.
Certa ênfase tem sido dada recentemente a fermentação microbiana da fibra que ocorre o ceco. Segundo o investigador espanhol Gonzalo Mateo (comunicação pessoal), um certo nível baixo de fibra na dieta de aves é desejável. Dentre os benefícios, estão: 1) aumenta a função da moela (aumenta o fluxo gastrintestinal, aumenta a digestibilidade de nutrientes e reduz a erosão de moela); 2) aumenta a produção de HCl e a produção enzimática (ativação da pepsina e a digestibilidade da proteína; aumenta a solubilidade e a absorção intestinal; aumenta a atividade pancreática e a produção de sais biliares); 3) reduz o pH da moela (controla o crescimento de micro-organismos, como salmonelas e clostrídios); 4) altera o perfil da microflora. 
E, por fim, a água é absorvida ao longo do trato gastrintestinal por osmose, após a absorção de glicose, sódio e aminoácidos. O antiperistaltismo retal torna o ceco um local onde a água é absorvida a partir da urina. 
Fatores que afetam a digestão e a absorção de nutrientes
O trato gastrintestinal é a maior superfície do corpo e está constantemente sendo exposta a uma variedade de desafios. Ele representa uma barreira seletiva entre os tecidos da ave e o lúmen intestinal. Esta barreira é composta por componentes físicos, químicos, imunológicos e microbiológicos. Kleyn (2013) comparou um trato gastrintestinal com ou sem uma  boa capacidade de digestão, absorção e em condições de permitir uma ótima utilização de energia e de proteína (Tabela 2). Uma ampla gama de fatores associados à dieta e de agentes infecciosos pode afetar negativamente o equilíbrio entre componentes do ambiente intestinal e o desempenho produtivo das aves em operações comerciais que serão explicados a seguir.
Desenvolvimento do trato gastrintestinal
Conforme avança a incubação, desenvolve o intestino delgado a uma taxa maior que o peso corporal. Durante os três últimos dias de incubação, a relação entre o peso intestinal e o peso corporal aumenta de aproximadamente 1% no dia 17 para 3,5% ao nascer (Uni et al., 2003).
Durante o período pós-eclosão, o intestino delgado continua a desenvolver mais rápido do que o restante da massa corporal. De igual forma progride a sua capacidade digestiva e enzimática (Sklan, 2001).
Dieta pré-inicial e desenvolvimento intestinal
No final do período embrionário, o saco vitelino é internalizado dentro da cavidade abdominal. A gema fornece os nutrientes para o embrião durante a incubação diretamente através da circulação, enquanto que próximo e após a eclosão a gema alcança o trato gastrintestinal (Noy e Sklan, 1998). Durante o período inicial de 48 h pós-nascimento, a gema contribui para a manutenção e desenvolvimento do intestino delgado. Durante este período, o pinto deve fazer a transição da utilização de energia na forma de lipídio oriundo da gema para uma dieta rica em carboidratos (Noy e Sklan, 1999).
O consumo de alimento é acompanhado pelo rápido desenvolvimento do trato gastrintestinal e dos órgãos associados. O momento e a forma dos nutrientes disponíveis aos pintinhos após a eclosão é crítica para o desenvolvimento intestinal. O pronto acesso ao alimento estimula o crescimento e o desenvolvimento intestinal e melhora a absorção da gema pelo intestino (Potturi et al., 2005).
Os pintinhos demonstram menor desenvolvimento intestinal e redução no desempenho quando ocorre atraso no arraçoamento (Maiorka et al., 2003). Quando o período entre o nascimento e o arraçoamento forem muito longos, como ocorre em algumas partes do mundo (24-72 h), pode haver prejuízo na função intestinal, que não pode ser recuperado com o avançar da idade (Potturi et al., 2005).
Fatores anti-nutricionais
Existe uma ampla gama de compostos anti-nutricionais presentes nos ingredientes (incluindo cereais), principalmente polissacarídeos não amiláceos. Todos os cereais usados nas dietas de aves contêm vários níveis de polissacarídeos não amiláceos, tais como beta-glucanos e arabinoxilanos (Iji,1999). Propriedades em comum dos diferentes polissacarídeos são sua interferência na ação de enzimas digestivas e sua tendência a criar um ambiente viscoso dentro do lúmen intestinal, o que resulta em excreção de fezes amolecidas (Choct e Annison, 1992). Algumas enzimas exógenas específicas apresentam a capacidade de degradar os polissacarídeos não amiláceos e reduzir a viscosidade da digesta, aumentar a taxa de passagem e melhorar o desempenho das aves (Wu et al., 2004).
Outras substâncias presentes nos alimentos de origem vegetal podem exercer um efeito adverso ou benéfico nas aves e estão resumidos na tabela 1.
Tabela 1. Metabólitos secundários encontrados nas plantas
Fisiologia da digestão e da absorção em aves - Image 1Fonte: Adaptado de Smithard (2002)
Forma física dos alimentos
A forma física dos cereais pode afetar as características morfológicas e fisiológicas do trato intestinal (Engberg et al., 2004), embora as respostas nesta área da pesquisa sejam inconsistentes. O alimento finamente moído pode aumentar a mortalidade, associada com enterite necrótica, comparativamente a alimentos grosseiramente moídos. Branton et al. (1987) observaram que o uso de trigo moído com moinho martelo (finamente moído) aumentou a mortalidade para 28,9%, mas o moinho de rolo (grosseiramente moído) resultou em uma mortalidade de 18,1%. As mortalidades estavam associadas com enterite necrótica e com coccidiose.
Alguns estudos indicaram que trigo em grão pode contribuir para o desempenho intestinal de frangos, através do desenvolvimento do trato gastrintestinal, especialmente a moela e também aumentar a absorção de nutrientes do trato digestivo (Engberg et al., 2004). O fornecimento de trigo inteiro reduziu a presença de salmonela e do clostrídio no trato intestinal das aves (Engberg et al., 2004). A inclusão de trigo inteiro melhorou a conversão alimentar em alguns estudos (Plavnik et al., 2002), mas não em outros. Svihus et al. (2004) não encontraram efeito significativo de dietas contendo trigo inteiro sobre o ganho de peso e a conversão alimentar, mas os resultados indicaram que os nutrientes eram melhor digeridos e absorvidos destas dietas, comparativamente as que receberam grão moído. Foi sugerido que a melhora poderia estar ligada a um aumento de secreção pancreática e hepática.
Opiniões contraditórias na literatura dizem respeito à ação de grão integral com o favorecimento (Gabriel et al., 2003) ou não (Banfield et al., 2002) do aparecimento e incidência da coccidiose.
Toxinas nos alimentos
O efeito adverso sobre o trato gastrintestinal é a principal causa de perda econômica oriunda da ação dos tricotecenos (Shiefer e Beasley, 1989). As micotoxinas, como a T2, podem causar lesões cáusticas na mucosa, destruindo as células do topo da vilosidade e também afetando as células multiplicadoras da cripta de Lieberkhun. A histopatologia das lesões do trato gastrintestinal é caracterizada por hemorragia, necrose e inflamação do epitélio intestinal, que ocorrem durante o encurtamento da vilosidade, e redução da multiplicação das células da cripta. A necrose também ocorre na mucosa do proventrículo e da moela (Hoerr, 2003). As micotoxinas podem, em combinação com outros fatores, predispor ou acentuar surtos de outras doenças. Por exemplo, a ocratoxina A e infecções por coccidiose podem interagir adversamente no desempenho de frangos (Huff e Ruff, 1982).
As aminas biogênicas, incluindo a histamina, a cadaverina, a putrescina, a espiramina e a espermidina estão presentes em produtos de origem animal. Estão envolvidas na síndrome da má absorção, a qual é caracterizada por uma redução da eficiência alimentar e aumento do proventrículo (Stuart et al., 1986). Barnes et al. (2001) demonstraram que a histidina e a cadaverina podem causar patologias associadas a proventriculite. A sua ação parece ser aditiva e sinérgica.
Rancidez e oxidação das gorduras
O valor nutricional das gorduras pode ser afetado pela rancidez oxidativa. A rancidez pode influenciar as qualidades organolépticas das gorduras, bem como a cor e a textura, e pode causar a destruição de nutrientes lipossolúveis, como as vitaminas, tanto da dieta como a armazenada no corpo. A gordura rancificada pode afetar adversamente os lipídios de membrana das células intestinais e, com isso, prejudicar o processo de digestão e de absorção. A presença de ácidos graxos insaturados, aumento da temperatura, aumento da exposição, extrusão e ausência ou nível sub-ótimo de antioxidantes podem levar a formação de peróxidos e, consequentemente, a lesão sub-letal do enterócito (Leeson e Summers, 2005).    
Agentes infecciosos
O trato gastrintestinal propicia mecanismos pelos quais o organismo retira nutrientes do ambiente para nutrir-se. A etiologia de uma doença entérica é complexa, uma vez que envolve uma combinação de vírus, bactérias e outros agentes infecciosos e não infecciosos (Reynolds, 2003). Conforme dito anteriormente, o propósito do trato gastrintestinal é clivar os alimentos em componentes básicos para o transporte e absorção intestinal e posterior uso na mantença e crescimento ou deposição tecidual. Alterações físicas, químicas ou biológicas destes processos podem resultar em doença entérica (Dekrich, 1998), prejudicando a digestão e a absorção.  
Tabela 2. Comparação entre um trato gastrintestinal com ou sem ótima condição de saúde
Fisiologia da digestão e da absorção em aves - Image 2Fonte: Kleyn (2013).
Conclusão
O trato gastrintestinal visa digerir e absorver nutrientes, assim como dar os passos iniciais no processo de conversão do alimento em proteína animal. Ele apresenta a maior superfície de exposição do corpo, por isso trata-se do setor corporal mais bem protegido imunologicamente.  A sua integridade apresenta  um efeito determinante nas condições ambientais e de bem estar animal.  Uma ampla gama de fatores associados à dieta e agentes infecciosos pode afetar adversamente o equilíbrio entre os diversos componentes intestinais, prejudicando a digestão e a absorção. Alterações neste equilíbrio podem afetar o estado sanitário, observado através de uma resposta inflamatória, perda de produtividade e aumento de mortalidade, culminando com a redução no desempenho produtivo dos frangos.  
Referências
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Fernando Rutz
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Oscar Briceño
20 de julio de 2015
Profesor Rutz: En cuantas kilocalorias puede afectar la acidez de la gordura (acidos grasos libres) en la disponibilidad de energia metabolizable de la gordura? A mayor acidez, menos energia disponible? Puede cuantificar una acidez mayor de 14% menos energia? Cuanto? Muy amable por su respuesta y un fuerte abrazo Oscar Briceño, Lima Peru
Jose Joseli Da Silva
Instituto Agronomico de Pernambuco - IPA
3 de julio de 2018
Nas enzimas encontradas no Trato Gastrintestinal das ave não encontrei que as mesmas sintetizam lactase. É verdade que as aves não sintetizam esta enzima? Assim sendo as aves não digerem o leite ( como exemplo o leite bovino)? Vemos muito os agricultores que criam perus ou passaros administrar leite com fubá de milho. Esse leite não é aproveitado??
Marcia Rocha
3 de mayo de 2017
Li a matéria toda a fim de tentar esclarecer o que está acontecendo com a minha ave e já ocorreu com outras que já morreram. Ela perdeu peso e o peito está seco... separei para dar um trato mais reforçado de frutas, folhas, até pão que ela tanto ama comer... percebi que o alimento ficou parado no papo, não digeriu!!! Agora ela parece que limitou ainda mais a comer, não quer comer ração. A outra que tive e já morreu foi a mesma coisa até que o papo ficou muito cheio e ela veio a morrer, talvez de fome ou desnutrição. POR FAVOR, ALGUÉM PODE ME AJUDAR? O QUE É ISSO?
Luis Fernando Vergamini Luna
Opta Alimentos e Insumos
20 de julio de 2015
Professor Rutz, com a redução de níveis de Glicina e Conglicinina nas dietas iniciais, experimentos demonstraram ganhos de relação Cripta/Vilos e maior área de vilosidades, é possível considerar melhora de digestão e absorção? Grato, Luis Luna
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