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Efeito do transporte e tempo de jejum durante o manejo pré-abate sobre a qualidade da carne dos suínos, conteúdo estomacal e lesões de úlcera esofago-gástrica

Publicado: 15 de fevereiro de 2012
Por: Osmar A. Dalla Costa; Mateus J. R. Paranhos da Costa; Jorge V. Ludke; Luigi Faucitano; Jose V. Peloso; Arlei Coldebella; Carmo Holdefer; Darlan Dalla Roza; Lauren V. Ventura; Nelise Juliane Triques
Durante o período do manejo pré-abate pouco pode ser feito para alterar a quantidade de carne na carcaça dos suínos, mas muito pode e deve ser feito para evitar perdas na qualidade da carne. Nesta etapa da produção o manejo pré-abate tem um papel fundamental no bem-estar e na qualidade da carne das carca-ças. O tempo de jejum dos suínos, o sistema de embarque e transporte, período de descanso no frigorífico e o método de atordoamento dos suínos podem influenciar diretamente sobre estes fatores.
O jejum pré-abate é caracterizado pela retirada de alimentos sólidos (ração) na fase final da terminação até o abate dos animais; entretanto os animais devem ter livre acesso a água de boa qualidade. Esta prática é de grande importância para o criador de suínos e para os abatedouros, pois pode contribuir no bem-estar, na redução da taxa de mortalidade, na redução do número de animais que vomitam durante o transporte, aumento da segurança dos alimen-tos devido ao menor potencial de contaminação das carcaças, maior velocidade e facilidade no processo de evisceração dos animais, reduz o volume de dejetos no frigorífico, e contribui para a uniformização da qualidade da carne das carcaças.
O conteúdo estomacal é um indicador se o tempo de jejum aplicado aos suínos desde a granja até a realização do abate foi adequado. Existe um padrão indicativo constituído de quatro classes em função do conteúdo estoma-cal: estômago vazio (<500 g), tendência a vazio (entre 500 e 800 g); tendência a cheio (acima de 800 g até 1100 g) e cheio (acima de 1100 g).
Entre os fatores negativos decorrentes de um período de jejum prolongado está a propen-são para o surgimento de lesões de úlcera esofago-gástrica (UEG) em suínos. A UEG é entendida como uma doença multifatorial e é encontrada em animais submetidos a estresse continuado decorrente do manejo inadequado entre os quais se destacam: mistura de lotes, superlotação e más condições de transporte, ou pelo desconforto ambiental (temperaturas ex-tremas, oscilações térmicas e altas concentra-ções de amônia) e fatores relacionados ao manejo alimentar (composição das dietas, granulometria das rações, regime alimentar e do período de jejum).
De um modo geral tem-se recomendado um período de jejum dos suínos na granja de 10 a 24 horas; porém, essas recomendações têm variado muito de acordo com o local de criação e com o material genético e da logís-tica dos frigoríficos. O presente trabalho teve como objetivo avaliar o efeito do tempo de jejum dos suínos na granja e de sua posição na carroceria do caminhão sobre a qualidade da carne, no peso do estômago cheio, vazio, e do conteúdo estomacal, de úlcera esofágica-gástrica (UEG), e correlacionar o efeito da UEG.
Material e Métodos
Foram avaliadas 192 fêmeas oriundas de cruzamentos industriais e com peso vivo médio de 134,5±9,7 kg no inverno e de 131,7±11,8 kg no verão. Estes animais pas-saram por um período alojamento de 144 dias em média, para as fases de crescimento e terminação. Em cada uma das granjas avalia-das foram escolhidas aleatoriamente 4 baias por tempo de jejum (6 animais/baia), totalizan-do 16 baias/granja para a realização do experi-mento.
Os tempos de jejum foram de 9, 12, 15  e 18 horas. Todos os animais foram  desem-barcados no  frigorífico utilizando-se  rampa móvel e permaneceram em descanso no frigo-rífico por 3 horas. Na condução dos suínos du-rante o embarque e o desembarque os animais foram conduzidos com o auxílio de uma tábua de manejo.
Os suínos foram transportados no mode-lo de carroceria metálica TRIEL-HT dupla, onde foram transportados 96 suínos. Esse modelo de carroceria é construído em aço estrutural, tubos galvanizados, assoalho em alumínio xa-drez, frente totalmente fechada com controle de ventilação modelo PVC, com área total de 43,2m2, sendo 9m de comprimento ´ 2,4m de largura ´ 0,90m de altura, onde foram trans-portados 96 suínos em 16 boxes, com 2,7m (8 boxes por piso), com portões internos de girar e traseiro de girar duplo, com guilhotina central e rampa para embarque e desembarque de metal, com 3m de comprimento.
No frigorífico os suínos foram desembar-cados com o auxílio de uma plataforma móvel e conduzidos até as baias de descanso cole-tivas. Durante o período de descanso no frigorífico (3 horas), os suínos tiveram acesso à água, fornecida por bebedouros do tipo chu-peta. A insensibilização por eletro-narcose era aplicada automaticamente, transferindo alta voltagem (700V) e amperagem (acima de 1,25 Amps) (Valhalla, Stork RMS b.v., Lichten-voorde, Holanda). Após a insensibilização os animais eram imediatamente sangrados na po-sição horizontal e suspensos na norea ao fim da mesa de sangria. As carcaças dos suínos permaneceram em câmara fria submetidas a temperaturas variando entre 1 e 4°C por 24 horas.
Durante o processo de evisceração fo-ram coletados os estômagos, que foram pesa-dos cheios (com todo o conteúdo estomacal - ração e água - PEC) e vazios (após a retirada do conteúdo estomacal e limpeza com água corrente - PEV) com o auxílio de uma balança eletrônica Marte modelo AS-5500, e pela diferença (PEC-PEV), foi calculado o peso do conteúdo estomacal (PCE). O PCE foi classifi-cado em quatro categorias: (<500 g) indicati-vo de estômago vazio; (≥500-800 g) tendên-cia a estômago vazio; (≥800-1100 g) tendên-cia a estômago cheio; (≥1100 g) estômago cheio.
Após a limpeza dos estômagos os mês-mos foram examinados macroscopicamente para avaliação da presença de úlcera esofá-gica-gástrica (UEG), sendo classificada como: grau 0= estômago normal - Pars oesophagea com epitélio liso e com brilho; grau 1= paraqueratose - Pars oesophagea com epitélio proliferado rugoso e sem brilho, podendo haver pequenas erosões; grau 2= úlcera ativa ou crônica, de menos de 33% da Pars oesophagea; grau 3= úlcera ativa ou crônica, de 33 a 66% da Pars oesophagea; grau 4= úlcera ativa ou crônica, de mais de 66 % da Pars oesophagea.
As medidas do pH foram realizadas na meia carcaça esquerda nos músculos semispi-nalis capitis (SC) e longissimus dorsi (LD)entre a penúltima (14a) e antepenúltima (13a) coste-la, perpendicularmente à linha média da meia-carcaça, o mais próximo das vértebras e com uma profundidade média de 3,5cm, e no semimembranosus (SM), 45 minutos (pH1) e 24 horas após o abate (pHU). Na avaliação do pH foi utilizado o medidor  pH portátil da mar-ca Mettler Toledo (MP 120 pH Meter, Suíça), na qual foi acoplado uma sonda para medir a temperatura (NTC 30 K Temperature probe) da carcaça no músculo Semimembranosus.
A porcentagem de perda de água por gotejamento (%PG) do músculo semimembra-nosus foi determinada em 50% dos animais que participaram deste estudo, com a coleta de amostras de aproximadamente 110 g desse músculo, livre de gordura, que após a pesa-gem, foram suspensas em redes de nylon seladas dentro de sacos plásticos, e assim permaneceram na câmara fria submetidos a temperaturas variando entre 1 e 4°C por 48 horas. A porcentagem de perda de água por gotejamento foi calculada como resultado da diferença entre o peso inicial e o peso final da amostra dividido pelo peso inicial e multipli-cado por 100.
As carcaças foram classificadas como pH baixo (≤5,55), normal (5,55 U≤ 5,90) e elevado (>5,90), independente do tempo de jejum dos suínos na granja.
Para a análise de variância das variáveis pH1,e pHU e da %PG, PEC, PEV e PCE foram incluídos os efeitos de blocos (estação do ano inverno e verão), tempo de jejum dos suínos na granja antes do embarque (9, 12, 15 e 18 horas), posição dos animais na carroceria  (frente, meio e atrás), piso da carroceria (inferior e superior), lado da carroceria (direito e esquerdo) e da interação entre bloco e tempo de jejum dos suínos na granja antes do carregamento.
A incidência de UEG e a classificação das carcaças foram analisadas pelo Teste de c2.  
Resultados e Discussão
Na Fig. 1 estão apresentados os valo-res de pH1 e pHU dosmúsculos SC, LDe SM, em função do tempo de jejum dos suínos na granja e na Fig. 2 em função da posição dos animais na carroceria do caminhão. Na Fig. 3 são apresentados os valores da porcentagem de perda de água por gotejamento no músculo SM, por estação do ano, modelo de carroceria, e posição dos animais na carroceria.
O tempo de jejum dos suínos na granja não influenciou o pH1 nos músculos SC  e SM e a %PG. Contudo houve efeito sobre o pH1 de LD e no pHU dos músculosSC, LDe SM.  Suínos que receberam um jejum de 15 horas na granja apresentaram maiores valores do pH1 no LD, do que os que receberam jejum de 12 horas,  porém não diferiram dos animais que receberam jejum de 9 e 18 horas. Os animais submetidos a jejum de 12 horas na granja apresentaram menores valores pHU nos múscu-los SC, LDe SM. Os animais que receberam jejum de 18 horas apresentaram maiores valo-res do pHU no SC e suínos submetidos a jejum de 15 e 18 horas apresentaram maiores valo-res de pHU nos músculo LDe SM.
A posição dos animais na carroceria do caminhão não influenciou o pHU de SC e a %PG. Entretanto  esta fonte de variação influ-enciou o pH1 dos músculos SC, LD e SM e do pHU dos músculos LD e SM. Suínos transpor-tados na parte da frente da carroceria apresen-taram menores valores do pH1 dos músculos SC, LDe SMe do pHU nos músculos LDe SM em relação aos transportados no meio e atrás da carroceria.
Não foram observadas diferenças signifi-cativas do piso (inferior e superior), sobre o pH1 nos músculos SC, LD e SMe do pHU dos músculosSC, LD e SM , bem como na %PG).
O lado da carroceria (direita e esquerda) não influenciou significativamente os valores de pH (pH1 e pHU) de SC, nem a %PG (p=0,6051). Porém, houve efeito no pH1 dos músculos LD e SM e no pHU dos músculos LD e SM. Suínos transportados no lado direito da carroceria apresentaram menores valores de pH1 de LDe SM, contudo 24 horas após o abate esses animais apresentaram maiores valores de pHU.
O tempo de jejum dos suínos na granja não influenciou o PEC e o PEV. Contudo teve efeito significativo sobre PCE, havendo dimi-nuição do conteúdo estomacal dos suínos em função do aumento do tempo de jejum na granja. Os animais que receberam um jejum de 15 e 18 horas apresentaram menores valores de PCE, não havendo diferença significativa entre estes dois tratamentos Fig. 4.
Independente do tempo de jejum na granja, os suínos apresentaram um peso médio  dos estômago cheio de 1006 gramas, vazio 674 gramas e do conteúdo estomacal de 332 gramas.
Com relação a PCE, pode-se dizer que os mesmos foram submetidos a períodos de jejum adequados, pois no presente estudo, não foi encontrado nenhum estômago com PCE maior que 1100g (indicativos de suínos com estôma-go cheio). Dos animais avaliados com presença de conteúdo estomacal, 169 suínos (90,37%) apresentaram PCE menor que 500g (indicativo de suínos com estômagos vazios).
Observou-se baixa incidência prevalência de suínos (8,56%) com PCE entre 500-800 g (tendência a estômago vazio), e somente 2 animais (1,07%) apresentaram PCE entre 800-1100 g (com tendência a estômago cheio).
A localização do box, piso e lado dentro da carroceria não influenciaram significativa-mente  o peso do estômago cheio, vazio, e do conteúdo estomacal.
O tempo de jejum dos suínos na granja não influenciou significativamente (P>0,05) na incidência de UEG dos suínos (Fig. 6). A incidência de UEG nos suínos pode ser consi-derada como baixa (14,97%) e desses 13,90% (26 suínos) apresentaram escore de úlcera um e somente 1,09% (2 suínos) apresentaram úlcera com escore dois. A inci-dência de animais sem UEG e com paraquera-tose foi alta (48,13% e 36,90%, respectiva-mente).
A presença de UEG não influenciou significativamente (p>0,05) a classificação das carcaças em função do pHU do músculo SM (Fig. 3). Observou-se um efeito signifi-cativo  da presença de UEG na classificação das carcaças em relação ao pHU do músculo do SM. Dos suínos com UEG, 57,14% apre-sentaram carcaças com baixo pH (≤5,55) e 42,86% com  pHU bom (5,55 < pHU ≤ 5,90), e dos animais com estômago normal 31,85% das carcaças apresentaram pHU baixo (≤5,55), e a grande maioria desses suínos (66,88%) apresentaram carcaças com pHU bom (5,55 < pHU ≤ 5,90) e somente 1,27% apresentaram carcaças com  pHU elevado (>5,90).
 
Conclusões.
 
O manejo pré-abate dos suínos tem in-fluência na qualidade da carne. Suínos submeti-dos a jejum inferiores a 15 horas na granja apre-sentam carcaças com menores valores de pH final.
O aumento do tempo de jejum dos suínos na granja no manejo pré-abate contribuiu na re-dução dos valores do peso do conteúdo estoma-cal dos suínos, sendo que os suínos que foram submetidos a jejum de 15 e 18 horas apresenta-ram menores valores de PCE, em relação aos que receberam jejum de 9 e 12 horas. O tempo de jejum na granja não modifica a prevalência da UEG, todavia suínos com UEG apresentaram maior porcentagem de carcaças com pHU do músculo LD baixo, indicativo de carcaças com problema de carne ácida. Com o intuito de se obter carcaças com uma melhor qualidade de carne e proporcionar um incremento no bem-estar dos suínos durante o manejo pré-abate, re-comenda-se que os mesmos sejam submetidos a um tempo de jejum de 15 a 18 horas.    
A posição do animal na carroceria do caminhão durante o transporte da granja ao frigo-rífico não apresentou efeitos consistentes sobre a qualidade da carne. Estes efeitos devem ser melhor explorados para investigar as causas das diferenças. 
Tópicos relacionados:
Autores:
Dr. Osmar Dalla Costa
Embrapa Suínos e Aves
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