Aspectos agro e zooecológicos
Trajetória da suinocultura e organização da produção até o advento da divisão de tarefas que redundou no surgimento do sistema de produção de leitões.
Planejamento, gestão e padrões operacionais
Um sistema de produção de leitões, no caso da maior parte da suinocultura brasileira que gera renda e emprego, deve levar em consideração o ambiente da integração. O crescimento acelerado das agroindústrias, especialmente a partir da década de 70, teve como sustentáculo o modelo integrado de produção de suínos, que funciona até hoje de maneira semelhante. De forma geral, a empresa fornece os animais, a assistência técnica, as rações e medicamentos (há casos, em menor escala, que os animais são do suinocultor). A cargo do agricultor fica as instalações, gestão ambiental, mão de obra que atenda as tecnológicas da integradora (em termos de genética, manejo, sanidade e equipamentos) e entregar os animais dentro de um determinado prazo e quesitos de qualidade e rastreabilidade. Fazer essa engrenagem tornar-se ainda mais eficiente depende de planejamento, gestão e aplicação de padrões operacionais.
A mudança mais importante ocorrida no sistema integrado aplicado à suinocultura foi a divisão da criação em diferentes fases de produção para maximizar os resultados. Essa mudança se disseminou há cerca de duas décadas e fez com que hoje predominassem cincos tipos de produtores. Um é o produtor de leitões, especializado na inseminação das fêmeas (pelo método natural ou artificial), gestação, parição e criação dos animais até o desmame ou até a saída da creche. Depois vem o crechário, que recebe os leitões desmamados e os cria até a saída da creche, com mais ou menos 60 dias de vida. O terceiro tipo é o terminador, que recebe os animais após a creche e os cria até os 150 dias, quando são entregues para abate com aproximadamente 115 kg. Ainda existe um quarto tipo de produtor, minoritário, que produz os animais do nascimento ao abate dentro da mesma granja, chamado de ciclo completo. O quinto tipo de produtor é o que trabalha dentro do sistema "wean to finish", recebe os leitões desmamados e une na mesma instalação a creche e a terminação. O que fica claro dentro dessas opções é que a agroindústria entende que a divisão da produção em fases é o caminho mais indicado para aumentar a eficácia da integração.
É com base na especialização do produtor exigida pela integração que a Embrapa Suínos e Aves pensou o Sistema de Produção de Leitões baseado em Planejamento, Gestão e Padrões Operacionais. Há farta literatura a respeito de como se deve produzir leitões, mas praticamente inexistem publicações que descrevem de maneira simples as medidas indispensáveis para se obter sucesso dentro de um sistema de produção exigente como o da integração seguindo a lógica descritiva dos padrões operacionais. Como se sabe, um padrão operacional exige que se apresentem de forma simples e detalhada todos os passos, na voz imperativa, para o cumprimento de uma atividade. Mas antes de listar os padrões operacionais, é preciso compreender que o sucesso da produção começa no planejamento e na adoção de um modelo de gestão mínimo por parte do produtor.
Do ponto de vista do planejamento, a Embrapa Suínos e Aves indica que as granjas optem pela produção de suínos em lotes com o vazio sanitário entre eles. Desta forma, as instalações devem ser construídas em salas para cada fase de produção (maternidade, creche e crescimento/terminação). No caso de Unidades Produtoras de Leitões (UPL) para produção de leitões desmamados, a maternidade é a fase que precisa ser construída em salas. O objetivo é manter no mesmo ambiente (sala) os leitões com idades semelhantes. A principal vantagem desse sistema é a produção de suínos em lotes com vazio sanitário nas salas, o qual melhora o desempenho dos animais, diminui a transmissão de doenças, racionaliza, concentra e otimiza a utilização da mão-de-obra e organiza o uso das instalações. Além disso, o produtor visualiza melhor o desempenho produtivo da granja. No caso de granja nova, além de planejar as instalações visando a produção em lotes com vazio sanitário, o produtor deve sempre levar em consideração futuras ampliações. Em granjas já construídas, torna-se um pouco mais complicado o planejamento porque é necessário adequar as instalações ao plantel, ou o plantel às instalações.
O intervalo entre lotes e a idade do desmame definem o número de salas e o intervalo entre partos, juntamente com o intervalo entre lotes, define o número de lotes de porcas. Porém, o tamanho do plantel é definido pelo tamanho/capacidade das salas por fase de produção. Os intervalos entre lotes mais utilizados são de 7, 14, 21, 28 e 35 dias ou suas combinações, mas é recomendado que cada granja utilize apenas um desses intervalos. Ressalta-se que as instalações são planejadas e definidas no momento da construção ou reforma da granja. Fica evidente, então, que as decisões tomadas no instante da edificação das instalações valem por um longo período, enquanto que os lotes de porcas são sempre ajustados a cada desmame/cobertura, considerando os descartes das porcas, a reposição das leitoas e os retornos ao cio.
Para uma boa gestão de uma granja, é fundamental, no entender da Embrapa Suínos e Aves, definir as metas de produtividade a serem atingidas e a forma como os dados serão anotados e organizados, dando clareza sobre a obtenção ou não das metas traçadas. Um aspecto importante detectado junto aos produtores foi a dificuldade que eles têm de registrar os dados para uma boa gestão da produção. Grande parte do sucesso de uma granja de suínos depende da avaliação/acompanhamento de indicadores de produtividade e da obtenção de bons índices produtivos, baseados em dados reais registrados na granja. No Brasil, existe uma variabilidade enorme de tamanho de granjas. Granjas grandes normalmente utilizam sistemas informatizados para subsidiar a gestão da granja, o que geralmente não acontece com granjas menores. Isto ocasiona enorme dificuldade para produtores e técnicos na hora de gerir a produção, pois como as informações do rebanho não são anotadas, ou o são de forma desorganizada, não possibilitam uma análise dos dados.
Então, para que possa de fato gerir uma granja de suínos, o produtor necessariamente deve utilizar um sistema informatizado ou organizar as informações básicas da produção em fichas especiais que permitam a obtenção dos principais indicadores da produção (a Embrapa Suínos e Aves sugere como indicadores mínimos: taxa de parto maior de 90%, 12 leitões nascidos vivos por parto ou mais e uma taxa máxima de 8% de mortalidade de leitões na maternidade). Essa forma de trabalhar acaba se transformando num modelo de gestão, que irá fornecer índices produtivos mínimos da granja, capazes de orientar os produtores e técnicos na tomada de decisão e correção de possíveis falhas. Quando o produtor faz a gestão de sua granja de uma forma informatizada ou não, ele consegue visualizar melhor os índices produtivos que estão sendo obtidos e, quando for o caso, tomar medidas corretivas. Todavia, salienta-se que é fundamental fazer as anotações dos dados do rebanho de forma correta e analisá-los constantemente.
Os padrões operacionais descritos nesta publicação foram desenvolvidos em conjunto pela Embrapa Suínos e Aves e equipe técnica da Coopercentral Aurora (central que reúne 15 cooperativas agrícolas instaladas em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná), dentro do Projeto Leitão Ideal, que iniciou em 2011 e será concluído em 2013. O exercício de unir o conhecimento científico com a prática da assistência técnica partiu de dois documentos. A Embrapa Suínos e Aves utilizou as Boas Práticas de Produção de Suínos, elaboradas em 1997 e atualizadas em 2006 pelo seu quadro de pesquisadores, com a intenção de descrever as condições ideais de produção. Já a Aurora possuía um Manual de Produção de Leitões, que orientava os técnicos encarregados de trabalhar com os produtores.
Após várias reuniões, os pesquisadores da Embrapa e os técnicos da Aurora chegaram a um consenso em relação a quantos e quais padrões operacionais deveriam ser descritos e implantados para atender todas as etapas da produção de leitões (também foi feito um consenso sobre o planejamento da produção mais apropriado à realidade da Aurora e a forma de gestão dos índices da granja). As escolhas feitas refletem a realidade da Aurora, mas certamente respondem, em sua maioria, às condições encontradas na suinocultura praticada nas principais regiões produtoras do Brasil. Por isso, os padrões descritos nesta publicação podem servir como referência para outras cooperativas ou empresas que atuam na produção de leitões.
É importante destacar que a forma com que o Sistema de Produção de Leitões baseado no Planejamento, Gestão e Padrões Operacionais foi concebido procurando dar ao produtor um controle total do processo e atingir produtividade mínima necessária para permanecer na atividade com lucro. De acordo com estudos da Embrapa Suínos e Aves, a linha mais provável que divide o lucro do prejuízo na produção de leitões é a marca de 24 leitões/porca/ano desmamados que é considerada, na média, como a produtividade mínima para se obter lucratividade dentro da suinocultura industrial. Ou seja, cada fêmea instalada na propriedade precisa produzir ao final de cada 12 meses 24 leitões desmamados, no mínimo. Há a certeza de que já existem as condições de genética, alimentação e equipamentos, na média, para que se alcance a produtividade mínima necessária em termos de rentabilidade na produção de leitões. Basta que o produtor planeje e organize de forma adequada a sua granja baseado em indicadores (de forma informatizada ou não) e reveja o que apregoam os padrões operacionais sempre que algum problema for detectado em qualquer etapa da produção.
Fichas indispensáveis a serem utilizadas em rebanhos suínos sem informatização
A coleta diária de dados do rebanho suíno em uma granja é indispensável para a gestão. Aqueles que usam um sistema informatizado, devem utilizar os formulários/fichas indicados pelo próprio sistema. Porém, para aquele que não possuem um sistema informatizado, a seguir são relacionadas algumas fichas indispensáveis para a coleta diária de informações. A Ficha 01 deverá ser utilizada para controle das coberturas realizadas. Tais informações, posteriormente são repassadas para a Ficha 06 ou 06.1 que irá compor o Caderno da Produtividade.
As leitoas de reposição serão as futuras reprodutoras da granja (Ficha 02). Então, os cuidados que o produtor deve ter com elas, desde o recebimento até o primeiro parto, influenciarão a vida reprodutiva posterior. Por esta razão é fundamental que cada lote de leitoa recebido seja manejado adequadamente. Essa ficha auxilia o produtor nos procedimentos indispensáveis a serem realizados, em especial a adaptação das leitoas, o programa de vacinação e as datas de ocorrência dos cios. A correta anotação dos cios das leitoas é fundamental na gestão das coberturas, pois assim é possível programar adequadamente e com antecedência as substituições que serão realizadas a cada desmame. Também, é importante para identificar precocemente leitoas que não entram em cio e descarta-las, sem ocasionar prejuízos elevados. Lembrar que uma leitoa de reposição consome aproximadamente 2,5 kg de ração/dia.
A Ficha 03 é importante para o controle dos produtores descartados, mortos ou que tiveram aborto. Nela é possível registrar até três inseminações em cada cobertura, em função do protocolo utilizado na granja.Tais informações serão úteis na gestão da reposição do plantel e dos problemas sanitários ou mortes inespecíficas de reprodutores.
A Ficha 04 auxilia na gestão dos lotes de cobertura em granjas que utilizam o intervalo entre lotes semanais (a cada sete dias). Nela é possível acompanhar cada lote de matrizes cobertas ao longo das semanas de gestação. Nela deve ser registrado as causas de porcas que não ficam prenhas.
Cada leitoa quando coberta irá fazer parte do plantel de reprodutores e deverá ser adequadamente identificada e acompanhada com a ficha da porca (Ficha 05). Nessa ficha deverão ser registrados todos os acontecimentos da porca e todos os dados reprodutivos desde a primeira cobertura até o descarte. Os dados de cada parto deverão ser tranferidos para a Ficha 06 ou 06.1 do caderno de produtividade. Ela fornece um histórico de cada porca que será fundamental na gestão do rebanho, em especial no momento de decidir a eliminação de porcas que serão substituídas por leitoas. Grande parte da produtividade de um rebanho está na correta política de eliminação/substituição de porcas. Cada granja deve estabelecer seus critérios de eliminação de porcas, cuja taxa de reposição recomenda-se ser entre 35 a 45%. Como exemplo sugere-se os seguintes critérios:
• Porcas com menos de oito leitões nascidos em dois partos consecutivos;
• Porcas com mais de duas repetições de cio;
• Porcas em anestro pós desmame por mais de 30 dias;
• Porcas velhas com redução da produtividade e da produção de leite;
• Porcas com três partos ou mais cuja produtividade média de leitões desmamados seja abaixo de 9,5 leitões;
• Porcas agressivas: que mordem ou matam as crias logo ao nascimento;
• Porcas com problemas de aprumos;
• Porcas com ligamentos do úbere soltos que não conseguem expor as mamas para os leitões;
• Porcas com corrimento vulvar mesmo após tratamento;
• Porcas com problemas de prolapsos;
• Porcas com problemas sanitários que não responderam bem ao tratamento: mastite, cistite, endometrite, artrite e unheiro.
A Ficha 06 deve compor um caderno com aproximadamente 30 folhas, denominado de caderno da produtividade. Cada folha corresponde a um lote de porcas da granja e deve ter quatro linhas a mais do tamanho médio do lote de parto previsto para a granja. Exemplos:
• A Ficha 06 destina-se a uma granja que foi planejada para ter 20 partos por lote, portanto a folha de produtividade deve ter 24 linhas (quatro linhas de reserva, pois cada linha corresponde a uma porca).
• A Ficha 06.1destina-se a granjas menores com lotes de até seis porcas (um linha de reserva para cada lote). Então em cada folha, é possível registrar as informações de três lotes consecutivos de porcas.
Nessa folha é possível acompanhar os lotes de porcas desde a cobertura até o próximo cio, anotando-se todas as informações relacionadas à cobertura, parto, morte de leitões, desmame e entrada em cio. O caderno de produtividade servirá de base para gestão do dia a dia da granja e terá os principais dados necessários para análise de desempenho do rebanho. No dia do desmame de cada lote a ficha deve ser totalmente preenchida e devem-se calcular os dados totais e médios obtidos do lote (penúltima e última linha). Os dados médios dessa ficha deverão ser transferidos para a ficha de compatibilização dos lotes (Ficha 07).
Na Ficha 07 estarão os dados médios de todos os lotes produzidos e possibilita ao produtor visualizar, acompanhar e avaliar o desempenho obtido em cada lote de porcas ao longo do tempo. Os dados obtidos num período de três meses ou de um número estimado de lotes (granjas pequenas pode ser seis meses) são somados, calculados os dados médios e transferidos para a ficha de acompanhamento histórico da granja (Ficha 08).
Na Ficha 08 o produtor terá os dados médios das variáveis mais relevantes de cada período (pode ser mensal, trimestral, semestral ou a cada determinado número de lotes) e de forma cumulativa no ano. Cada final de ano, os dados médios são transferidos para a coluna do ano. Assim, o produtor terá informações básicas de produtividade dos lotes até a saída de creche dos leitões obtida no ano e um histórico dos anos anteriores, permitindo avaliar a evolução obtida ao longo do tempo.
A Ficha 09 serve para o produtor anotar os dados mais relevantes de cada lote produzido no crechário durante um ano e acompanhar a evolução obtida ao longo do período. A Ficha 10 é utilizada para compatibilização das médias obtidas em cada ano na Ficha 09, permitindo uma avaliação histórica dos resultados obtidos.
As metas a serem estabelecidas nas Fichas 08, 09 e 10 devem ser discutidas com o técnico pois podem variar entre granjas e integrações de suínos.
Adicionalmente, outras fichas podem serem importantes para o manejo e gestão da granja, a exemplo da Ficha 11 relevante para quem utiliza inseminação artificial e da Ficha 12, que fornecem informações médias sobre o manejo de arraçoamento dos suínos em cada fase.
***O trabalho foi originalmente publicado por Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária /Embrapa Suínos e Aves/ Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - ISSN 1678- 8850, Versão Eletrônica - Junho, 2013.