INTRODUÇÃO
A produção de suínos tem sido alvo de críticas em todo o mundo em razão do potencial efeito poluente gerado principalmente pelos dejetos dos animais no meio ambiente. Principalmente entre 1995 e 2004, houve crescimento de, aproximadamente, 46,0% da suinocultura nos países em desenvolvimento e de apenas 8,0% nos países desenvolvidos, evidenciando o crescimento dessa atividade naqueles países, com leis ambientes menos rigorosas (Cruz et al., 2006). Em algumas regiões do Brasil tem sido observada alta densidade de suínos, como em Santa Catarina, na sub-bacia do Lajeado dos Fragosos, onde já foram constatados 613 suínos/km², superando países altamente poluidores como a Dinamarca, que já registrou 531 suínos/km² (Mateos et al., 2005).
Entre os nutrientes mais poluidores, o nitrogênio e o fósforo advindos dos dejetos podem estar envolvidos na eutrofização de cursos d’água. Além disso, no mundo, reservas de fosfatos minerais são limitadas e devem ser preservadas. Da mesma forma, o acúmulo de Cu e Zn em solos pode impor, em médio ou em longo prazo, risco de toxicidade sobre as plantas e os microrganismos (Dourmad e Jondreville, 2007). Assim, estratégias nutricionais podem contribuir de maneira efetiva para reduzir a excreção de nutrientes poluidores nos dejetos de suínos. Para diminuir a excreção de nitrogênio nos dejetos, tem sido proposta a adoção do conceito de proteína ideal, em que se reduz a proporção de proteína bruta da dieta e adicionam-se aminoácidos industriais (Parsons e Baker, 1994).
Para a redução de fósforo nos dejetos, tem sido proposta a utilização da enzima fitase, pois tem sido observado que mais da metade do fósforo presente nos ingredientes vegetais está na forma de fitato, com disponibilidade biológica variando entre 18 e 60% (Cromwell, 1979; Corley et al., 1980), e essa enzima aumentaria a disponibilidade do P presente nesses ingredientes.
No que diz respeito à contribuição da nutrição para diminuir a eliminação de minerais traços como cobre, zinco e manganês, tem sido proposta a utilização total ou parcial desses minerais na forma orgânica. Por apresentarem melhor biodisponibilidade, os minerais orgânicos podem substituir as fontes inorgânicas em baixo nível enquanto o desempenho é mantido ou melhorado (Fremault, 2003).
O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito de estratégias nutricionais para redução de nutrientes poluidores nos dejetos sobre o desempenho e as características de carcaça de suínos dos 30 aos 100kg.
MATERIAL E MÉTODOS
Um experimento de desempenho foi realizado na Granja de Suínos da Fazenda Experimental Vale do Piranga, pertencente à Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG), localizada no município de Oratórios-MG. Foram utilizados 120 suínos de alto potencial genético para deposição de carne magra na carcaça com desempenho médio, com peso inicial de 29,81±1,36kg. O experimento foi dividido em três fases: crescimento 1, de 30 a 50kg; crescimento 2, de 50 a 70kg; e terminação, de 70 a 100kg.
Os suínos foram distribuídos em delineamento experimental de blocos ao acaso, com cinco estratégias nutricionais, quatro blocos contendo duas repetições por bloco e três animais por unidade experimental, sendo dois machos e uma fêmea. O peso dos suínos foi adotado como critério na formação dos blocos. Os animais foram alojados em baias com uma área disponível de 1,29m² por animal, providas de comedouro semiautomático, porém o fornecimento de ração foi realizado de forma manual, e de bebedouro tipo chupeta, em galpão de alvenaria com piso de concreto e coberto com telhas de amianto. As temperaturas do ar foram monitoradas diariamente, durante o período experimental, por meio de termômetros de máxima e mínima, localizados dentro do galpão, à meia altura do corpo dos animais, externamente às baias.
As cinco estratégias nutricionais foram: dietacontrole (AP) = dieta com alta proteína bruta sem suplementação de aminoácidos industriais; dieta baixa PB (BP) = dieta com baixa proteína bruta mediante a suplementação de aminoácidos industriais; dieta fitase (CONT+FIT) = dietacontrole com suplementação de fitase (FIT) e ajuste dos níveis de cálcio e fósforo; dieta orgânica (CONT+MIN) = dieta-controle suplementada com uma mistura de minerais nas formas inorgânica e orgânica (MIN), sendo que 40% das exigências foram atendidas com minerais orgânicos e 50% com minerais inorgânicos; e dieta composta (BP+FIT+MIN) = dieta com baixa proteína bruta suplementada com aminoácidos industriais, fitase e mistura de minerais inorgânico-orgânicos.
Água e dietas experimentais foram fornecidas à vontade durante todo o período experimental.
A enzima fitase foi suplementada na dieta fitase e na dieta composta em 100g/tonelada, sendo que o produto comercial continha 5.000 (FTU) unidades de fitase/kg, fornecendo, portanto, 500 FTU/kg de dieta. Considerou-se que a fitase contribuiria com 0,112% de fósforo disponível, assim o fósforo total das dietas fitase e composta era menor que das demais dietas, entretanto, com a contribuição da fitase, o fósforo disponível era o mesmo para todas as dietas. Da mesma forma considerou-se que a fitase liberaria o cálcio fítico e disponibilizaria 0,112% de cálcio na dieta. Não foi considerado o possível acréscimo de energia e de digestibilidade de aminoácidos na dieta com o uso de fitase.
Formulou-se um suplemento mineral composto por minerais inorgânicos para as dietas controle, baixa PB e fitase e um suplemento mineral inorgânico-orgânico para as dietas orgânica e composta.
As dietas experimentais (Tab. 1, 2 e 3) foram formuladas à base de milho e farelo de soja. As exigências nutricionais para os suínos dentro de cada fase seguiram as recomendações estabelecidas por Rostagno et al. (2005), sendo a composição aminoacídica das dietas analisadas.
Ao final do período experimental, com peso final de 99,87±3,47kg, os animais foram submetidos a jejum, por 18 horas, e encaminhados para o abate, realizado no Frigorífico Industrial do Vale do Piranga (FRIVAP), sendo as características de carcaça avaliadas por meio de aparelho de tipificação de carcaça (Henessy), segundo técnica adotada no frigorífico.
Os dados experimentais foram submetidos à análise de variância. O modelo estatístico utilizado no cálculo das análises de variância foi: Yij = m + ti + bj + eij em que: i = 1, 2, 3 ..., I j = 1, 2, 3 ....., j; Yij = valor observado na parcela relativa ao tratamento i no bloco j ; m = média geral; ti = efeito devido ao tratamento i ; bj = efeito devido ao bloco j ; eij = efeito devido aos fatores não controlados (erro experimental).
As médias foram comparadas com o tratamentocontrole mediante o teste de Dunnett, a 5% de probabilidade. Todos os dados foram processados pelo programa SAEG (Sistema..., 2007).
RESULTADOS
As temperaturas máximas e mínimas do ar com seus respectivos desvios-padrão foram 26,76±3,51ºC e 20,65±2,08ºC, respectivamente.
Não houve efeito (P>0,05) das estratégias nutricionais para ganho de peso médio diário, consumo de ração diário, conversão alimentar (Tab. 4) e características de carcaça (Tab. 5) em nenhum dos períodos analisados.
DISCUSSÃO
A temperatura média das máximas ficou acima da zona de conforto térmico para suínos em crescimento, 20ºC (Orlando et al., 2005), e em terminação, 15 a 18ºC (Ferreira, 2005). Assim, constatou-se, com base na variação da temperatura ocorrida na realização do experimento, que os animais podem ter sido submetidos a período de estresse térmico. Entretanto, o desempenho dos suínos foi maior que os 945g por dia entre 30 e 100kg relatados pela Agroceres Pic (Agroceres..., 2007), para animais de alto desempenho criados em boas condições de manejo, como da progênie de Camborough 22 e machos AGPIC 412, enquanto, no presente estudo, a média foi acima de 1000g por dia.
Os resultados observados no desempenho dos suínos alimentados com a dieta baixa proteína bruta foram similares ao constatado por Orlando et al. (2007) em ambiente de alta temperatura, por Orlando et al. (2005) em ambiente de conforto térmico e por Zangeronimo et al. (2006), com leitões na fase inicial e diminuição de 21% para 16,5% de PB com a suplementação de aminoácidos industriais.
Os resultados obtidos no presente estudo também estão em conformidade com a revisão realizada por Relandeau et al. (2000), ao observarem que, em todos os 21 trabalhos revisados, a redução da proteína bruta da ração não prejudicou significativamente o desempenho dos animais. Esses autores relataram que o teor de proteína bruta na fase de terminação pode ser reduzido para 12%.
Diferentemente do que foi encontrado nesta pesquisa, Zangeronimo et al. (2007), ao testarem duas porcentagens de proteína bruta, 18% e 16%, e quatro porcentagens de lisina digestível, 0,7; 0,9; 1,1 e 1,3% em leitões de 9 a 21kg ,verificaram que a redução da proteína bruta da ração diminuiu o ganho de peso diário.
Dietas com porcentagens proteicas elevadas sobrecarregam a digestão, a absorção e a eliminação do nitrogênio não aproveitável, havendo sobrecarga de fígado e rins do animal (Bertechini, 2006). Outra influência da porcentagem de proteína bruta refere-se ao incremento calórico (IC). O IC representa toda perda de energia durante os processos de digestão, absorção e metabolismo de nutrientes (Sakomura e Rostagno, 2007), sendo que a dieta com maior teor proteico tem apresentado maior incremento calórico em relação às dietas com reduzida porcentagem de proteína bruta. A elevação do IC reduz a energia líquida que poderia ser utilizada para deposição de tecido muscular e, consequentemente, diminuiria a eficiência alimentar. Assim, com a formulação utilizando o conceito de proteína ideal, foi possível alcançar desempenho semelhante ao dos animais da dieta-controle e evitar os problemas associados ao excesso de proteína na dieta relatado anteriormente.
Em relação à dieta fitase, nos trabalhos de Corassa et al. (2009), com animais de peso inicial de 94,0kg, de Ludke et al. (2002), com suínos em crescimento e terminação, e de Peter et al. (2001), com suínos de 84 a 123kg, também não se verificaram diferenças no desempenho com o uso de fitase.
Provavelmente a redução no teor de fósforo disponível com a redução do uso de fosfato bicálcico na dieta fitase foi compensada pela liberação do fósforo fítico mediante ação da fitase, propiciando desempenho similar aos suínos da dieta-controle. Além da liberação do P fítico, outros benefícios podem ter contribuído para tornar o desempenho semelhante ao dos animaiscontrole, como aumento na digestibilidade dos aminoácidos/proteína (Jongbloed, 2008) e elevação da biodisponibilidade de cátions bivalentes de Ca, Mg, Zn, Mn e Fe, que poderiam estar quelatados na molécula do fitato (Bertechini, 2006).
No que se refere à dieta orgânica, Lima et al. (1999) também concluíram que as fontes quelatadas de cobre e zinco, em porcentagens menores que aquelas normalmente utilizadas quando se suplementa com fontes tradicionais (sulfato e óxido), não causaram prejuízo no desempenho dos animais.
A equivalência de desempenho e de características de carcaça dos suínos alimentados com a dieta composta e dos animais da dieta controle pode ser em razão do efeito da combinação de cada estratégia nutricional. Com a redução da proteína bruta, por exemplo, incluíram-se aminoácidos industriais para atender as exigências dos aminoácidos essenciais limitantes, evitando desbalanço deles. Ao incluir fitase, foi possível reduzir a inclusão de fosfato bicálcico, pois ela propiciaria liberação de grande parte do P fítico da ração, permitindo, assim, atingir a exigência de P disponível. Por fim, a inclusão de parte dos minerais na forma orgânica permitiria maior biodisponibilidade de Cu, Zn e Mn, reduzindo, desse modo, a possível interação dos minerais, como tem sido observado na forma inorgânica.
Tuitoek et al. (1997) observaram que a redução da porcentagem de proteína bruta da ração de 16,6% para 13,0% no crescimento e de 14,2% para 11,0% na terminação de suínos não afetou (P>0,05) a espessura de toucinho, embora tenha ocorrido uma tendência de aumento. Por outro lado, Ruusunen et al. (2007) constataram que a diminuição da proteína bruta da ração causou redução no peso da carcaça e na porcentagem de carne magra e aumento da porcentagem de gordura corporal de suínos abatidos aos 165 dias de idade.
Os resultados obtidos com a dieta fitase estão de acordo com Peter et al. (2001), que também não verificaram diferença nas características de carcaça de suínos de 84 a 123 kg mantidos com dietas contendo 300 ou 500 FTU. Também Corassa et al. (2009), ao avaliarem a inclusão de fitase para suínos com peso inicial de 94,0kg, já haviam obtido respostas semelhantes às deste trabalho. Lima et al. (1999) também observaram que as fontes quelatadas de cobre e zinco, em proporções mais baixas que as normalmente utilizadas quando se suplementa com fontes tradicionais como sulfato e óxido, não causaram prejuízo para as características de carcaça dos suínos.
Tendo em vista a importância dos minerais traços para o metabolismo de proteína, de carboidratos e de lipídeos, como o zinco, que é componente de muitas enzimas, o cobre, que desempenha importante função no sistema imune, e o manganês, que é essencial para o desenvolvimento do esqueleto (Gaudré e Quiniou, 2009), constata-se que a combinação dos minerais na forma inorgânico-orgânica propiciou condições para que as características de carcaça fossem semelhantes àquelas observadas nos animais da dieta- controle.
CONCLUSÕES
A combinação das estratégias nutricionais, como a redução de proteína bruta e a suplementação com fitase e minerais inorgânico-orgânicos, pode ser adotada por não alterar significativamente o desempenho na fase de crescimento e terminação e as características de carcaças de suínos aos 100kg