Este artigo organiza um conjunto de informações para caracterizar as condições de mercado em 2008 e as perspectivas para 2009.
Duas realidades em 2008
O ano de 2008 deve ser analisado em dois momentos. De um lado os três primeiros trimestres e, de outro, o período pós crise financeira internacional e seus desdobramentos na estrutura produtiva (a chamada economia real). Até os meses de setembro e outubro se configurou o cenário mais otimista traçado no final de 2007 com os mercados interno e externo aquecidos, queda no preço do milho e reconhecimento internacional da condição sanitária dos nossos rebanhos. Por outro lado, o último trimestre já apresenta uma deterioração significativa nas margens do suinocultor e suscita dúvidas quanto à capacidade dos mercados interno e externo absorverem nos atuais níveis de preços a produção de 2009 (em fase de gestação ou de engorda).
O alojamento de matrizes do rebanho industrial manteve a tendência de aumento verificada desde o final de 2004, com um crescimento estimado em 3,4% de 2007 para 2008, atingindo 1,526 milhões de cabeças. A estimativa de oferta de animais para abate só não cresceu na mesma proporção (+2,8%) em função de problemas com a circovirose em algumas regiões, que interromperam os ganhos de produtividade. Além disso, o aquecimento das vendas levou a uma pequena redução no peso médio das carcaças, o que também limitou as estimativas de crescimento na oferta de carne suína do rebanho industrial em 1,5%, atingindo 2,684 milhões de toneladas.
O preço do suíno vivo nas principais regiões produtoras sofreu apreciação de meados de 2007 até o final do terceiro trimestre de 2008. Enquanto que no segundo semestre de 2007 esta valorização foi em grande parte absorvida pelo aumento no preço dos grãos, em 2008 a lucratividade da atividade se recompôs tendo em vista que o preço do milho não acompanhou o do suíno vivo. As regiões Centro-Oeste e Sudeste apresentaram uma recuperação mais acentuada do que a região Sul, provavelmente refletindo as diferenças de estrutura de mercado (leia-se maior ou menor presença das integrações).
A crise financeira internacional teve impacto não apenas na demanda (interna e externa), mas também na saúde financeira das agroindústrias e na disponibilidade de crédito. Nesta nova realidade, ocorreu uma redução significativa no preço do suíno vivo a partir de novembro e, em alguns estados, a suspensão temporária das vendas de suinocultores não integrados. Esta situação se evidencia na relação de troca entre o preço do suíno vivo e o preço dos grãos (Fig. 1), bem como na comparação entre o acumulado de Nov/07 a Out/08 e Dez/07 a Nov/08 (Fig. 2).
Fig. 1 – Relação de troca entre o preço do suíno vivo e o preço dos grãos (70% milho + 30% soja) em Minas Gerais, Mato Grosso e na região Sul (Dez/07 a Nov/08)Fonte: ACCS, Acrismat, Acsurs, Asemg, Conab e Deral-PR.
Os abates SIF cresceram 5% entre os períodos Jan-Out/07 e Jan-Out//08 refletindo a situação do mercado interno. Essa condição de mercado aliada a ações de promoção e investimentos em novos cortes e logística levou à retomada dos preços da carne suína
in natura acima da inflação ao consumidor medida pelo IPCA, e acima do grupo alimentos e bebidas (Fig. 2). Em relação às demais carnes, verifica-se uma perda de competitividade frente à carne de frango, cuja oferta elevada reduziu o crescimento dos preços. Ocorreu o contrário em relação à carne bovina, cuja valorização abriu espaço para as demais carnes (Fig. 2). Os produtos processados como presunto, lingüiça, salsicha e salsichão apresentaram variação mais modesta, mas acima da inflação (com exceção da mortadela).
Fig. 2 – Variação nos preços ao longo da cadeia produtiva.Fonte: IBGE, Abipecs, ACCS, Acsurs, Conab e Deral-PR.
Por sua vez, as exportações devem fechar o ano com uma queda de 6% nos volumes comercializados, com 571 mil toneladas em 2008 frente a 606,5 mil toneladas em 2007. Entretanto, esta queda foi mais do que compensada pela elevação no preço da carne suína no mercado internacional (Fig. 2), que ultrapassou o valor de US$ 3.180 por tonelada em setembro. Os ganhos com as exportações ainda foram impulsionados pela desvalorização do Real frente ao Dólar (de 41% entre agosto e novembro de 2008). A queda nos volumes exportados elevou a disponibilidade interna de carne suína e também os estoques das agroindústrias. Além disso, aponta para a perda de competitividade do produto brasileiro e menor participação no mercado internacional, onde se destaca o desempenho dos EUA, cujas exportações cresceram de 28% do mercado mundial em 2007 para 39% em 2008. Neste mesmo período China e Canadá perderam espaço e a União Européia manteve-se estável.
Cenários para 2009
Para 2009, algumas tendências já estão consolidadas. A oferta de animais para abate e a produção de carne suína estão praticamente dadas, com um crescimento semelhante ao ano de 2008 ou um pouco superior caso haja maior controle da circovirose. O preço da carne bovina deve se manter elevado devido à menor oferta, perdendo competitividade para as demais carnes, sobretudo à de frango. Além disso, as empresas exportadoras se beneficiarão do novo patamar do câmbio.
Dadas estas tendências, os preços e a rentabilidade na cadeia produtiva dependerão de duas incertezas. A primeira delas diz respeito à capacidade dos mercados interno e externo absorverem a oferta atual de carne suína. A segunda, que acompanha a suinocultura brasileira ao longo dos anos, refere-se ao reconhecimento internacional da sanidade do rebanho bovino brasileiro (Fig. 3).
O ano de 2008 foi marcado pela contínua melhora no reconhecimento internacional da condição sanitária do rebanho bovino, com reflexos para a carne suína através do avanço nas negociações de acordos sanitários com a China e o Japão, bem como a abertura do mercado Chileno. Além disso, a forte demanda interna e os elevados preços no mercado mundial caracterizaram uma situação de mercado bastante aquecido. Assim, configurou-se um cenário de crescimento da suinocultura brasileira denominado de “SEGUINDO EM FRENTE” (Fig. 3), sendo que até o terceiro trimestre a passos firmes.
Como apontado anteriormente, a crise financeira internacional já está trazendo desdobramentos para a economia real. Entretanto, em um cenário otimista de crescimento do PIB brasileiro de 3% e pouca perda de dinamismo das economias emergentes, se mantém a atual demanda por alimentos. Outro fator que impulsionaria as vendas neste cenário é a possibilidade de acesso aos mercados da China e do Japão. Assim, mantido o atual reconhecimento sanitário do rebanho bovino brasileiro, se configuraria um cenário favorável denominado “SEGUINDO EM FRENTE”, semelhante a 2008 mas um pouco menos dinâmico devido aos desdobramentos da crise nos países desenvolvidos (2009 A na Fig. 3). Neste caso, não ocorreria o acúmulo de estoques nas agroindústrias e as margens de lucro na suinocultura se manteriam positivas.
Caso ocorra um aprofundamento da crise financeira internacional, com uma significativa retração da economia brasileira e dos países emergentes, se configuraria um cenário denominado de “AJUSTE À CRISE” através do acúmulo de elevados estoques excedentes nas agroindústrias e da redução do preço do suíno a níveis iguais ou inferiores aos custos de produção (2009 B na Fig. 3). Esse quadro se agravaria ainda mais caso as exportações dos EUA avancem no mercado russo, tomando espaço do produto brasileiro. Por fim, a ocorrência de um lamentável retrocesso na condição sanitária do rebanho bovino levaria a um cenário de “DESASTRE” com o fechamento dos mercados exportadores em um momento de restrição da demanda interna em função da redução da atividade econômica (2009 C na Fig. 3).
Fig. 3 – Cenários para a suinocultura em 2009Fonte: elaborado pelos autores.
Obs.: as estrelas (P) indicam a localização de cada ano nos cenários propostos, as setas (é) indicam as possíveis direções para os cenários futuros.
Considerções finaisOs sinais sobre a economia real ainda são confusos, não havendo consenso entre os especialistas e analistas de mercado quanto aos rumos em 2009. Nesse sentido, a principal incerteza é a capacidade do mercado em absorver a oferta de alimentos em geral, e de carne suína em particular. Mais do que nunca, isso reforça a necessidade de manter o reconhecimento internacional do controle sanitário do rebanho bovino. Espera-se com os três possíveis cenários acima desenhados trazer uma contribuição aos atores da cadeia produtiva e aos formuladores de política pública para melhor vislumbrar as possibilidades que configurarão o ano de 2009.