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A Classe Média Rural e o Agronegócio: Cooptação e Hegemonia

Publicado: 12 de março de 2024
Por: Marconi Severo. Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil.

Introdução

Os pequenos e médios agricultores, argumenta Plínio Simas (relato concedido em 2022), dirigente do Movimento dos Pequenos Agricultores do Rio Grande do Sul (MPA-RS), “servem, por uma questão de volume, por uma questão, assim, de discurso, eles servem muito para o grande agronegócio”, quando cooptados; por sua vez, Alceu Moreira (2020c, p. 31), deputado federal (MDB-RS) e ex-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), assevera que “a grande maioria da esquerda queria marcar o pequeno produtor rural. Por quê? Porque ele é em muito maior volume, maior quantidade”. Perspectivas antagônicas, mas que convergem ao menos em um ponto: reconhecem a relevância, sobretudo política e simbólica, desse público.
Como evidenciam as reflexões de Caume (2009) e Meneses (2021), as lutas sociais que têm lugar no campo constituem um fato social amplamente documentado pelas ciências sociais. Entretanto, ainda é comum encontrar estudos focados em polos antagônicos, ora chamados de camponeses e latifundiários, ora de agricultores familiares e agronegócio. O foco em um desses polos ou no contraste entre ambos, apesar de suas contribuições válidas, tem como efeito obliterar ou relegar ao segundo plano os setores intermediários, compostos por todos aqueles agricultores que se situam entre setores mais capitalizados da agricultura familiar e as agriculturas patronal e empresarial. Em vista disso, este texto se propõe à seguinte problemática: qual é o perfil dessa classe média rural? Será que esse perfil, de fato, a predispõe para se identificar com o agronegócio, justificando a acusação dos movimentos sociais de que ela seria uma espécie de “agronegocinho”? Se sim, quais são as consequências? Esse conjunto de questões objetiva apreender como a agricultura empresarial brasileira atua no sentido de cooptar apoio entre os pequenos e médios agricultores a fim de legitimar a sua hegemonia, tendo em vista que mais do que uma “simples opção produtiva”, como argumentam Capiberibe e Bonilla (2015, p. 301), o agronegócio constitui uma “concepção de sociedade” que, vale acrescentar, não se restringe apenas ao meio rural agrícola.
Para que o agronegócio possa constituir e legitimar a sua hegemonia, é de fundamental importância cooptar apoio entre os pequenos e médios agricultores. Situada entre os movimentos sociais e a agricultura empresarial, essa classe média rural, quando cooptada, pode frustrar o projeto de identificação com a imagística camponesa, já suficientemente frágil, embora nem por isso compartilhe dos benefícios jurídicos, políticos e econômicos assegurados aos setores dominantes do campo. Embora ela pareça ser um objeto em disputa, os movimentos sociais fomentam, muitas vezes à sua revelia, uma profunda demarcação de fronteiras entre os pequenos e médios agricultores, enquanto, de outro lado, os setores dominantes investem na construção e legitimação de um discurso voltado justamente para a supressão de fronteiras, cujo melhor exemplo pode ser encontrado na declaração da atual senadora (PP-MS) e ex-titular do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), Tereza Cristina (Poder 360, 2019), para quem “a agricultura empresarial e a pequena agricultura são o mesmo negócio”. Com seu ethos característico, essa classe média rural não é, contudo, um público que se deixa facilmente persuadir, uma vez que tem sua própria agenda.
Boa parte do material empírico que serviu de substrato para as considerações efetuadas ao longo do artigo é fruto de entrevistas que se dividem em dois grupos: aquelas coletadas em fontes públicas (mídias textuais, de áudio ou audiovisuais) e aquelas efetuadas pelo autor.1 Representativas, elas contemplam políticos profissionais eleitos por diferentes regiões e partidos, movimentos sociais populares, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), instituições sindicais a nível nacional, por exemplo, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag); regional, tal qual a Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (FETAG-RS) e mesmo local, como é o caso do Sindicato dos Trabalhadores Agricultores Familiares de Santa Cruz do Sul, Sinimbu, Vale do Sol e Herveiras (STR-SCS). Por sua vez, também há representantes políticos eleitos e vinculados às instituições ligadas tanto ao setor agrário-produtivo do agronegócio, por exemplo, a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), quanto ao setor empresário-industrial, como é o caso da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag).
A despeito dessa multiplicidade, há, porém, uma predominância de representantes da porção Sul do Brasil. Isso se explica pelo fato de que, enquanto as instituições ligadas ao agronegócio viabilizaram o acesso aos quadros de sua administração central, os movimentos sociais populares e algumas instituições voltadas aos agricultores familiares, alegando problemas de agenda ou destacando o local de onde a entrevista seria realizada, preferiram direcioná-las para os seus representantes regionais. Obviamente, isso não chegou a constituir um problema, uma vez que os entrevistados representam, em nível regional, as mesmas diretrizes institucionais.
Para a confecção do artigo, adotou-se uma estrutura textual que procura evidenciar, através do contraste de posições e oposições entre os mais variados atores, a complexidade que caracteriza o espaço social rural contemporâneo. Este artigo, portanto, divide-se em quatro partes. Na primeira, são problematizados alguns suportes teórico-metodológicos úteis para dimensionar o espaço social rural brasileiro; na segunda, o foco recai sobre as características constitutivas do agronegócio brasileiro, o seu aspecto universalizante e a sua relação com o Estado. Na seção seguinte, visando apreender os contrastes entre esse público e os movimentos sociais, são analisadas, conforme a perspectiva destes últimos, suas críticas, pautas e propostas de convergência entre os pequenos e médios agricultores. Por fim, a última parte é dedicada ao estudo da classe média rural e de suas relações com os movimentos sociais e com o agronegócio.
O espaço social rural: aportes teórico-conceituais
A atual hegemonia do agronegócio no meio rural, conforme demonstram as pesquisas recentes de Bruno (2016, 2021), Pompeia (2020a, 2020b) e Escher (2020), está assentada sobre um discurso universalizante que se pretende o legítimo representante da agricultura brasileira. Entendida no sentido de Gramsci (2001), complementado por Gruppi (1978), a hegemonia consiste na universalização das representações e mitos de um determinado grupo ou classe para a sociedade como um todo. A eficácia desse discurso, cuja elaboração conta com insights de intelectuais orgânicos, se deve ao fato de que ele está profundamente alicerçado na imagística cultural bem como na realidade objetiva, ao estilo do mito de Roland Barthes (2001), o que permite sua difusão por diferentes meios e mídias. É o que se passa no caso do agronegócio brasileiro. A palavra agronegócio, conforme Maria Mendonça (2015) e Caio Pompeia (2020a), deriva da sua homóloga inglesa agribusiness, que por sua vez teve origem na School of Business Administration da Universidade de Harvard, com a publicação, em 1957, do livro A Concept of Agribusiness, de John H. Davis e Ray A. Goldberg.
Sua principal característica, de acordo com Pompeia (2020b, p. 3), consiste em sua dimensão “totalizadora”, já que “engloba toda a agropecuária e a totalidade da ampla relação de funções situadas a montante e jusante dela”, opinião que é corroborada por Maria Mendonça (2015, p. 391), para quem o “termo agronegócio” é utilizado, no Brasil, “para justificar a criação das chamadas cadeias produtivas, com o objetivo de agregar atividades agroquímicas, industriais e comerciais aos cálculos econômicos da agricultura”. Segundo Mitidiero Jr. e Goldfarb (2021, p. 5), embora a palavra “tenha nascido dentro da academia”, ela “não constitui um conceito científico, mas sim, um termo que visa descrever um determinado setor da economia”, o que explica o fato de que, “nas definições dos teóricos do Agro, o agronegócio é tudo, é o antes e depois da produção”, enquanto do ponto de vista científico não é mais do que “um modelo de produção e gestão resultante da associação do capital agroindustrial nacional e internacional com a grande propriedade fundiária”.
Uma afirmação dessa natureza é particularmente interessante quando contrastada com as estatísticas fornecidas pelo Censo Agropecuário de 2017. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE (2019)), do total de mais de 5 milhões de estabelecimentos agropecuários, mais 3 milhões foram classificados como pertencentes à agricultura familiar, o que corresponde a 76,8%. Das mais de 15 milhões de pessoas ocupadas nesse total de estabelecimentos, nada menos do que 10 milhões pertencem à agricultura familiar, enquanto menos de 5 milhões pertencem à agricultura não familiar, o que corresponde a 67% e 33%, respectivamente. Porém, quando se trata de área ocupada, os percentuais se invertem, já que das mais de 351 milhões hectares mapeadas, a agricultura familiar responde por apenas 23%, enquanto a não familiar detém 77%. Em outras palavras, embora numericamente inferior em termos de estabelecimentos e de número de pessoas ocupadas, o agronegócio detém o controle da maior parte da área cultivável do meio rural, e consequentemente as maiores produtividades, o que lhe permite converter sua proeminência econômica em proeminência jurídica e política.
Contudo, consoante lembra Regina Bruno (2021, p. 494), o “poder das elites ruralistas e do agronegócio diretamente representadas no Congresso Nacional não é absoluto”, e tampouco o agronegócio é capaz de impor unilateralmente as suas representações como legítimas. Em meio a essa figuração de mútuas interdependências, para utilizar o conhecido conceito de Norbert Elias (1993), ganha destaque a cooptação de apoio entre os pequenos e médios agricultores. O conceito de cooptação, usual em análises de governabilidade que pressupõem a formação de coalizões político-partidárias, como demonstram as reflexões de Gomes e Alves (2017) e Holdo (2019), é imprescindível para abarcar a hegemonia enquanto objeto sociológico. Isso porque a cooptação, enquanto estratégia de ação consciente ou inconscientemente orientada, busca assegurar o aumento e a estabilidade do poder mediante a adesão (ainda que apenas formal) de novos grupos e classes ao discurso dominante. Junto aos pequenos e médios agricultores, a cooptação se manifesta mediante o manejo daquilo que Elias e Scotson (2000) chamaram de “sociodinâmica da estigmatização”, de onde a mobilização de representações explícitas e implícitas por meio de associações linguísticas capazes de atingir, como notou Bourdieu (2007), estruturas sociais e cognitivas incorporadas pelo indivíduo ao longo do seu processo de socialização que incidem diretamente sobre a formação da sua identidade social.
Para compreender a hegemonia do agronegócio, é preciso levar em consideração não apenas a significação exata, mas a representação cultural e simbólica de determinada categoria ou pauta. Esse é o caso, por exemplo, da figura do camponês, uma peça-chave junto à proposta contra-hegemônica defendida pelos movimentos sociais populares e seus simpatizantes. Como demonstram as entrevistas analisadas nas seções seguintes, menos do que a definição utilizada pelos movimentos sociais, o que importa é a representação cultural que os agricultores possuem acerca do campesinato. Ora, se existência social do camponês, “o qual leva a vida da mão para a boca”, consoante escreveu Max Weber (2007, p. 67), é a verdadeira antítese do espírito do capitalismo, então a sua representação convencional na imagística cultural brasileira somada à sua presença nas pautas de movimentos sociais que contestam a ordem social vigente como que favorece, à revelia destes últimos, o afastamento dos pequenos e médios agricultores situados nessa mesma ordem social e econômica, cuja consequência presumível, e de fato constatada por Valadão, Souza e Freitas (2022), é a recusa deliberada em se identificar como camponeses. Assim, se o moderno agricultor familiar realmente tem suas origens no campesinato, conforme argumentam Baiardi e Alencar (2014), o camponês é menos o passado do que o ultrapassado, interpretação que dá ensejo a constatações, tais quais as de Guanziroli e Sabbato (2014) que, em sua análise da correspondência do family farming entre os pequenos agricultores brasileiros, mobilizam a categoria camponês sugestivamente como sinônimo de agricultor familiar pobre.
Como destacam Garcia Júnior (2003) e Medeiros (2021), a construção de identidades no meio rural constitui um processo dinâmico e complexo que coloca em evidência algumas limitações conceituais. Por exemplo, a definição legal de agricultor familiar é por vezes recusada por integrantes do MST e MPA; a categoria camponês, utilizada por estes últimos (e também por alguns intelectuais urbanos, já que é também uma categoria sociológica), é por sua vez recusada pelos agricultores familiares; já a categoria produtor rural, sem dúvida a mais usual e difundida no meio rural brasileiro, é utilizada tanto pelo Estado como pelo agronegócio. No seu conjunto, essa conjuntura impacta diretamente no campo político. Como notou Regina Bruno (2021) ao estudar a representação política do agronegócio, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), uma das mais importantes instituições políticas do agronegócio, se pretende a representante da agricultura nacional, enquanto a Frente Parlamentar Mista da Agricultura Familiar (FPAF) e a Frente Parlamentar da Terra (FPT) representam, respectivamente, a agricultura familiar e a agricultura camponesa. Por conseguinte, é característico que, além de defender os interesses do setor, a FPA atue também “no sentido de diminuir desigualdades que possam existir entre os produtores rurais”, conforme afirmou seu ex-presidente Alceu Moreira (2020b). Esse discurso não se restringe ao campo político e tampouco ao agronegócio, uma vez que almeja também os pequenos e médios agricultores que, juntos, compõem a chamada classe média rural.
Estudos sobre a estratificação social no Brasil têm conquistado espaço entre os pesquisadores, como evidenciam as análises de Cardoso e Préteceille (2017) e Ribeiro (2014). Todavia, quando se trata do meio rural, parece haver ainda uma agenda de pesquisa pouco explorada, haja vista que frequentemente as pesquisas se limitam a reproduzir os resultados fornecidos pela Pesquisa Nacional por Amostra  de Domicílios (Pnad), que utiliza basicamente duas categorias: proprietários rurais e trabalhadores rurais. Uma possível alternativa para contornar essa situação consiste no comparativo entre os públicos contemplados pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e pelo Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp). Nesse caso, a classe média rural seria composta pelos beneficiários do Pronaf, que contratam crédito rural através do Grupo V, cujo critério é possuir renda familiar anual de até R$ 415 mil, somados aos contemplados pelo Pronamp, cujo limite de renda bruta anual é de R$ 3 milhões. 
Mas também aqui a metodologia apresenta um alcance restrito, pois na melhor das hipóteses abarca somente os contratantes reais, deixando de fora todos aqueles que, apesar de potenciais beneficiários, não contrataram crédito rural ou o fizeram por outras vias. Assim, sabendo-se que existem 3,9 milhões de estabelecimentos agropecuários pertencentes à agricultura familiar, e supondo que haja apenas um contrato pelo Pronaf para cada estabelecimento, então 2,5 milhões de estabelecimentos não contratam crédito rural. Em todo caso, a fim de que se tenha uma noção do tamanho desse público, pode-se analisar a Tabela 1, na qual consta o total de contratos e de valores contratados por ambos os programas, entre janeiro de 2018 e dezembro de 2022. O contraste é significativo: em 2022, por exemplo, o valor médio contratual para o Pronaf foi de R$ 34 145,32, enquanto para o Pronamp foi de R$ 248 015,30, ou seja, uma média contratual sete vezes superior à do primeiro. O caso do Pronaf requer outra ressalva. Conforme demonstrado por Severo (2022), o maior quantitativo de contratos nem sempre equivale ao maior montante de valores contratados: o Nordeste tem o maior quantitativo de contratos, mas também as menores médias contratuais; o Centro-Oeste apresenta um dos menores quantitativos de contratos, mas uma das maiores médias contratuais; já o Sul, por sua vez, é a região que responde pela maior concentração de valores médios contratuais. Contrastadas essas informações com as do Censo Agropecuário de 2017, pode-se dizer que geograficamente a classe média rural brasileira está situada sobretudo na porção Sul/Centro-Oeste do Brasil, e que tem por característica constitutiva a produção de commodities, bem como um melhor desempenho econômico.
Tabela 1. Contratação de crédito rural via Pronaf e Pronamp (2018-2022)
Tabela 1. Contratação de crédito rural via Pronaf e Pronamp (2018-2022)
Outro fator que impactou na constituição dessa classe média rural tem a ver com as relações entre Estado e entidades sindicais. Conforme José de Souza Martins (1981), em opinião corroborada por Moacir Palmeira (1989), com a repressão e fragilização dos movimentos camponeses pelo regime autoritário civil-militar e a subsequente sindicalização dos pequenos agricultores por meio de categorias oficiais, houve um fomento à identificação com essas mesmas categorias e suas imagísticas correspondentes. Dito com outras palavras, não só porque representavam o canal oficial para interação entre sociedade civil, sindicatos e Estado, mas também ao se difundirem pelo cotidiano nas interações linguísticas e simbólicas, essas categorias e suas imagísticas tiveram como contrapartida a negação dos movimentos sociais populares mais fortemente identificados com a problemática camponesa. Por conseguinte, embora Maria Wanderley (2014, p. 31) alegue que os “conceitos de campesinato e agricultura familiar podem ser compreendidos como equivalentes”, nem por isso deixa de reconhecer que, “com muita frequência”, mesmo o agricultor mais pobre ainda assim se identifica como agricultor, não como camponês. Conforme a própria autora reconhece, “para eles, a produção para o próprio consumo ou para o consumo interno do seu estabelecimento é uma prática que os legitimam como agricultores familiares”, motivo pelo qual “não hesitam em se definir” como tais (Wanderley, 2014, p. 40). Em outras palavras, não só a equivalência não é perfeita, como sobressai a predisposição para se identificar com as imagísticas convergentes com a realidade objetiva.
Conforme Picolotto (2012), que entende por classe média rural apenas o segmento consolidado dos agricultores familiares, esse público tem sido objeto de disputas entre instituições governamentais e sindicais ligadas tanto aos agricultores familiares quanto às entidades patronais, o que teria gerado algumas divisões e rupturas. Tal é o cenário que daria origem a alguns dos principais movimentos sociais populares, como o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) que, junto com o MST e a Via Campesina, convergem na acusação de que as instituições sindicais vinculadas aos agricultores familiares contribuem para a construção de um “projeto de integração com os mercados agroindustriais”, formando o que chamam de “pequenos capitalistas” ou “agronegocinho”, tal qual argumenta Picolotto (2014, p. 75-76). Essa mesma opinião é sustentada por Leonilde Medeiros (2021, p. 7-8), para quem essas rupturas e disputas refletem-se “no crescente uso acusatório pelos movimentos sociais, em especial os ligados à Via Campesina, da categoria agronegocinho, referindo-se aos segmentos que crescentemente se integram ao agronegócio”. Para melhor compreender e explorar essas demarcações de fronteira, talvez seja oportuno explorar a seguir a constituição e os contrastes desses diferentes grupos e classes.

O agronegócio

Em termos institucionais, segundo Sônia Mendonça (2005), a Assembleia Constituinte de 1987/1988 representou um importante marco temporal no processo de formação política do agronegócio. Naquela ocasião, a União Democrática Ruralista (UDR) teria liderado uma concepção de agricultura patronal fortemente identificada com a propriedade privada, avessa à reforma agrária e que, não raro, relativizava o uso da força física para combater os movimentos sociais populares. Em contraposição, a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), pouco afeita ao radicalismo e propensa à defesa de uma concepção empresarial da agricultura, organizou o que seria mais tarde a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), fundada em 1993. Decorridas mais de três décadas, porém, as agriculturas patronal e empresarial passaram a se identificar publicamente como agronegócio, operação simbólica favorecida pela própria dimensão universalizante do setor, o que teria levado a Abag a rever esse conceito. Consoante declarou recentemente o seu ex-presidente Marcello Brito em entrevista concedida para o programa Roda Viva (Roda Viva, 2021), o agronegócio brasileiro “tem centenas de faces”, o que o levaria, alguns meses mais tarde, a se mostrar reticente quando aos usos midiáticos da categoria. Segundo Brito, em vídeo concedido ao canal 4 Ases do Youtube (4 Ases, 2021), é preciso ter cautela: “eu acho temeroso, e eu falo isso para os meus amigos da imprensa sempre, ‘gente, esse agro de vocês aí é grande demais, cabe muita coisa aí dentro’”, motivo pelo qual alega ter solicitado a supressão da campanha publicitária conhecida pelo mote O Agro é tech, agro é pop, agro é tudo, uma vez que “essa propaganda foi boa”, mas “hoje não dá mais, sabe, porque o agro não é tudo”.
A crítica é motivada pela disputa entre os setores agrário-produtivos e os setores empresário-industriais, dentre os quais se situa a Abag, uma vez que estes últimos estariam sendo prejudicados por uma imagem – instigada pelos primeiros – segundo a qual o agronegócio deve ser prioritariamente produtor e exportador de commodities com baixo valor agregado.9 Entretanto, a despeito das divergências intersetoriais, suas predisposições universalizantes somadas aos seus impactos publicitários possibilitaram o surgimento de uma imagística convergente de que o Brasil teria uma vocação agrícola ingênita. É o que transparece na fala de Ariovaldo Zani (Sindirações, 2018), presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (Sindirações), para quem “o agropecuarista é um herói nesse país de vocação para o agronegócio”. É com base nessa imagem algo grandiloquente que se busca minimizar as divergências internas e legitimar uma imagem pública do agronegócio como um setor unido e homogêneo.
Como condição de sua pretensa universalidade, o agronegócio visa responder formalmente por todos os perfis de agricultores. Oswaldo Ribeiro Jr. (DBO Play, 2020), presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), por exemplo, afirma que “uma das preocupações” da instituição “é olhar para o pequeno, olhar para as bases, olhar para aqueles que não têm uma retaguarda de comercialização para os seus animais”, ou seja, é uma “entidade que visa o pequeno produtor ao grande produtor”. A mesma opinião pode ser encontrada junto ao presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Fernando Cadore (Aprosoja, 2021), segundo o qual “existe uma impressão errada de que os sojicultores são grandes produtores”, já que apenas uma minoria é composta por “grandes áreas, grandes grupos, que também fazem parte do sistema produtivo”, embora a “grande maioria” seja constituída pelos pequenos e médios produtores “que não têm mão de obra terceirizada, a esposa que está lá cozinhando, e que o filho está pilotando numa máquina”. Representar o meio rural como um todo constitui, inclusive, um dos objetivos publicitários do setor. É o que se pode inferir da declaração do presidente da Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMRA), Ricardo Nicodemos (2021), segundo o qual “estamos criando uma narrativa de comunicação consistente” cujo “grande objetivo” é “tornar o agro admirado pelo povo brasileiro”.
Essa concepção é vivenciada como um mito, no sentido de Barthes (2001), que se pretende legítimo ao apreender o meio rural não pelo que ele deve ser, mas pelo que ele é. “Nós somos uma potência agrícola”, ressalta Gedeão Pereira (Página Rural, 2021), presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), o que “nós elevamos e interpretamos que é uma conquista de um povo, do povo brasileiro”. A partir dessa perspectiva, é compreensível que alguém como Geraldo Borges (Correio Braziliense, 2021), presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Abraleite), afirme com naturalidade que “o que é bom para o Agro”, “é bom para a sociedade brasileira como um todo”, uma vez que o “nosso país é um país do Agro”. São declarações que constituem exemplos evidentes daquilo que Caio Pompeia (2020b, p. 3) chamou de “sinédoque política”, situação em que se busca representar o todo (a agricultura brasileira) pela parte (o agronegócio), visando com isso “simular uma representatividade superdimensionada para a opinião pública e o Estado”.
O agronegócio, conforme Caio Pompeia (2020b), possui instituições próprias que atuam na política profissional tanto de forma explícita como nos bastidores, a exemplo do que ocorre com o Instituto Pensar Agropecuária (IPA), o “principal e mais influente núcleo do agronegócio”, como afirmou Pompeia em outra ocasião (2022, p. 27). A atuação conjunta em prol de uma mesma imagística pode ser observada de forma objetiva na declaração do presidente da Associação dos Produtores de Soja, Milho, Sorgo e outros Grãos Agrícolas do Estado de Minas Gerais (Aprosoja-MG) e ex-presidente do IPA Fábio Meirelles Filho (2018, p. 8), para quem o “IPA e a FPA representam, além dos anseios dos produtores rurais e da agricultura brasileira, a sociedade como um todo”. Que o agronegócio seja também um fenômeno político é algo que está claro para as lideranças do setor. Marcelo Brito (2021b), por exemplo, é taxativo: “nós não somos partidaristas, nós somos políticos”. Vias institucionais tradicionais, como aquelas representadas por partidos políticos, representações sindicais e de classe, convivem lado a lado com o lobby. Conforme afirma Márcio Portocarrero (relato concedido em 2022), diretor executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), “a gente joga muita força no Instituto Pensar, que nos representa junto com outras entidades do Agro”, além de ajudar os deputados da FPA “na época que eles precisam, na campanha, nos estados onde nós temos interesse”. Para além destes canais, Portocarrero afirma ter uma equipe “que passa, independente do IPA e da FPA”, o “dia todo dentro do Congresso, com a pastinha debaixo do braço com as minhas agendas, agenda do algodão”, em uma atuação que certamente não é exclusiva da Abrapa.
Segundo Heredia, Palmeira e Leite (2010, p. 165), “não se pode falar do agronegócio sem pensar no Estado e nas políticas públicas, que não só viabilizam sua origem, mas também sua expansão”. Consoante demonstrado em Severo (2023), embora o seu reconhecimento como “agronegócio” date do início dos anos 1990, a imagística que lhe serviu de suporte remonta aos anos 1960, momento marcado pelos “processos de acumulação capitalista recém-adotados na economia agrária”, como escreveu Florestan Fernandes à época (2008, p. 251). A legislação surgida nesta época, conforme Palmeira (1989, p. 95), “impôs um novo recorte da realidade” e “criou categorias normativas para uso do Estado e da sociedade”, dentre as quais as mais difundidas são as categorias trabalhador rural, empregado rural e produtor rural. Outro exemplo do quanto essa convergência com o Estado foi de fundamental importância para assegurar e legitimar a hegemonia do agronegócio pode ser encontrado na Constituição Federal que, se reconheceu a função social da terra, conforme destaca Leonilde Medeiros (2021, p. 10), nem por isso deixou de registrar que, junto com as pequenas e médias propriedades, as terras produtivas não seriam objetos de desapropriação. Não é sem motivos, portanto, que Alceu Moreira (Jornal da Cidade Online, 2022) afirme que, “do ponto de vista social, a terra, com seus benefícios, não está diretamente ligada a quem é o seu dono. Está ligado ao que ela produz”.
A assertiva de Márcio Portocarrero (relato concedido em 2022) acerca da estratégia comunicativa empregada pelo setor é igualmente emblemática. Segundo afirma, se a Abrapa apresenta canais especializados na comunicação com os Ministérios da Agricultura, Meio Ambiente e Economia, nos “outros ministérios, é a gente que fala a língua deles”, o que pressupõe a existência de dois léxicos: aquele que o agronegócio domina e aquele a que ele se sujeita. Tudo se passa como se os setores dominantes do campo se valessem do Estado em seu benefício, segundo o clássico preceito defendido por Marx e Engels (1998), não apenas pelo uso generalizado das mesmas categorias ou pelas vantagens políticas e econômicas de uma representação parlamentar robusta e pragmática, mas também pela forma como são geridas algumas interações oficiais. Um exemplo paradigmático de como essa situação é vivenciada na prática por pequenos agricultores pode ser encontrado na fala do dirigente do Movimento dos Pequenos Agricultores do Rio Grande do Sul (MPA-RS), Plínio Simas (relato concedido em 2022). Segundo ele, quando “a gente chega no banco”, seja ele público ou privado, “tem uma salinha do agronegócio” que é destinada à contratação de crédito rural e “se você não quiser entrar naquela sala, você não tem financiamento”, logo o pequeno agricultor terá que “se identificar com o agronegócio, senão ele não vai ter crédito”, o que o leva a concluir que “todo o aparelhamento do Estado brasileiro está a serviço do agronegócio”.

Os movimentos sociais populares

A defesa da agricultura familiar constitui um ponto de convergência entre as classes populares do campo. É o que fica explícito na fala do presidente da União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes), Vanderley Ziger (Unicafes, 2018), que alega ser preciso “reafirmar o papel da agricultura familiar, tão combalida e combatida pelo agronegócio, muitas vezes dizendo que é uma agricultura só, e não é”. Sua opinião é corroborada pelo assessor de política agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Lauri Sieb (relato concedido em 2022), que argumenta que “não dá para tratar todo mundo igual”, isto é, “com as mesmas políticas, tem que ter políticas diferenciadas em relação ao agronegócio, aos grandes, e dentro da própria agricultura familiar”. Em outras ocasiões, é a defesa dos povos originários que assume a ofensiva contra o agronegócio, como transparece nas falas do presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Roque Paloschi (Tutaméia TV, 2021a), para quem o agronegócio estaria “ocupando todas as terras possíveis e impossíveis”.
Conforme foi observado por Leonilde Medeiros (2021), os movimentos sociais populares têm apostado na convergência de antigas e novas pautas com o duplo objetivo de promover a sua agenda e combater o agronegócio. É o que indica, com efeito, a fala de João Pedro Stédile (Brasil de Fato, 2019), membro-fundador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Segundo Stédile, “nós não lutamos só por terra, nós lutamos para que a produção agrícola nas terras seja feita sem veneno”. Afora a reforma agrária e a agroecologia, o “terceiro grande objetivo” do MST, como afirmou Stédile (Rede TVT, 2020), “é transformar o camponês, que vai ser o beneficiário da terra”, em “um zelador da natureza”. Para Stédile (Tutaméia TV, 2021b), que parte de uma perspectiva que remete às “narrativas em disputa” de que falam Niederle et al. (2019), a “luta de classes no campo” estaria “marcada pela disputa de três propostas para a agricultura”: a do “latifúndio improdutivo, o latifúndio atrasado, predador”, cujos membros “destroem a natureza”; a do agronegócio, caracterizado pelo “capital moderno”, mas “que não produz alimentos”, apenas “commodities para exportação”; e a da “agricultura familiar, da agricultura camponesa, da reforma agrária, que somos nós”. Esse conjunto de pautas funciona como um ponto de convergência. Segundo Plínio Simas (relato concedido em 2022), dirigente do MPA-RS, nós “trabalhamos muito forte nisso e enfrentando o agronegócio, esse agronegócio sem gente, esse agronegócio usurpador da riqueza, esse a gente combate todo dia”. Opinião semelhante pode ser encontrada junto ao assessor de política agrícola da Contag, Ronaldo Ramos (relato concedido em 2022), para quem “esse enfrentamento ao avanço do agronegócio, da agricultura patronal ou industrial propriamente dita, isso de fato tem sido um dos grandes enfrentamentos nossos”.
As críticas não se restringem ao agronegócio, já que os movimentos sociais populares demarcam fronteiras também entre os pequenos agricultores, sobretudo em relação aos agricultores familiares estabilizados. Ronaldo Ramos (relato concedido em 2022), da Contag, não apenas vê com preocupação a situação atual, em que muitos “agricultores, que também são agricultores familiares, estão entrando de cabeça nesse negócio chamado soja”, uma das principais commodities do agronegócio, como critica a opinião, supostamente difundida no meio rural e fomentada pelos setores dominantes em parceria com agentes estatais, de que “quem não está no agronegócio, está no atraso”. Ramos descreve um caso sintomático de como ocorre essa cooptação “muito clara” e de “uma agressividade grande” para com os pequenos agricultores.
Uma vez um agricultor do estado de Santa Catarina, durante algumas atividades que nós fizemos sobre semente crioula, ele chegou para mim e disse: “Olha, Ronaldo, eu tinha vergonha de trabalhar com semente crioula, inclusive, a gente tinha vergonha de dizer que tinha semente crioula. Por quê? Porque o técnico da Epagri [Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina] dizia para a gente que agricultor que trabalha com semente crioula, ia se dar mal, era atrasado, era ignorante, tem que trabalhar com semente comercial, com semente híbrida, entre outras.” Então veja que inclusive os instrumentos públicos que são criados para fomentar o desenvolvimento, eles não têm essa compreensão da importância da agricultura familiar num sentido mais amplo, nos seus recursos genéticos. (Relato concedido em 2022)
Trata-se de um depoimento com grande significação sociológica, pois descreve um caso de cooptação negativa, uma vez que o possível cooptado adere à imagística hegemônica menos pelos lucros potenciais do que pela negação do estigma associado à proposta alternativa.11 Assim, “tudo aquilo que caracteriza, que diferencia a agricultura familiar do agronegócio”, conforme Ramos (relato concedido em 2022), “vai por água abaixo, porque as pessoas se sentem, digamos assim, ameaçadas ou constrangidas de tentar manter aquilo”. O agronegócio, obviamente, possui uma interpretação distinta. Conforme o diretor técnico da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Daniel Rosa (relato concedido em 2022), “é bonito o discurso, realmente, mas na prática é complicado”, uma vez que essa alternativa ignora alguns princípios fundamentais de agronomia e de mercado: “como é que você vai fazer o controle da lagarta? Mesmo com semente transgênica, você tem problema com lagarta, e aí você entra com uma cultura suscetível em larga escala… pode ser que em pequena escala possa ser que funcione”, mas ainda assim “ele sempre vai ter uma produção menor, uma produtividade menor do que a de uma biotecnologia preparada e direcionada para altos rendimentos”. O pragmatismo de Daniel Rosa deixa entrever o quão facilmente algumas pautas dos movimentos sociais podem ser associadas à agricultura de subsistência e, consequentemente, à marginalização ou exclusão econômica e social.
Entretanto, o que parece ser apenas uma crítica direcionada à cooptação que incide sobre os pequenos agricultores assume um viés distinto na visão do dirigente do MPA-RS. Conforme Simas (relato concedido em 2022), “a classe média rural tem uma crise muito grande de identidade”, porquanto ignora a sua condição de agricultores familiares quando se pretende partícipe do agronegócio. Nesse caso, a cooptação é positiva, na medida em que conta com a adesão espontânea do pequeno agricultor que “acha bonito a palavra agronegócio”. Evidentemente, é menos uma questão de estética do que de busca deliberada por aprovação e distinção social, fenômeno já abordado por Elias e Scotson (2000) e Bourdieu (2007) em outras sociedades e épocas. Segundo Simas, essa cooptação seria muitas vezes incentivada pelos próprios sindicatos, que “diziam que a agricultura familiar era um agronegocinho”, visando com isso “negar a agricultura camponesa”. Dentre esses “sindicatos que preferiram ficar dialogando com o agronegócio, a gente tem muito claro a FETAG-RS [Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul]”, uma vez que ela “dialoga, troca posição, tem unidade em torno das pautas do agronegócio, do grande agronegócio”, o que o leva a afirmar que, “estrategicamente, a gente nunca vai estar junto”.
A demarcação de fronteiras, tema analisado também por Picolotto (2018) e Medeiros (2021), é tornada explícita por Simas (relato concedido em 2022) ao afirmar que, “quando a gente fala agricultor familiar, nós botamos camponeses” justamente “para diferenciar dessa agricultura familiar que tem tentado nos botar goela abaixo que ‘somos agricultor familiar, então somos agronegocinho’”, uma forma alternativa para se referir ao que Caume (2009) chamou de agricultura familiar empresarial. Convém observar que a palavra “agronegocinho” constitui uma expressão pejorativa que, surgida alguns anos após o reconhecimento político da agricultura familiar, cumpriria com uma função acusatória, não sendo, portanto, reconhecida como categoria científica ou oficial. Em suma, as análises acima sugerem que os movimentos sociais populares, que se identificam como camponeses, habituaram-se a negar outras categorias, inclusive a de agricultor familiar, enquanto estes últimos não apenas negam os primeiros como tendem a se identificar, em determinadas ocasiões, como produtores rurais, almejando ou não fazer parte do agronegócio.

A classe média rural

Se for verdade que o poder de persuasão de que dispõe o discurso do agronegócio se deve à sua congruência com a realidade objetiva, então ao defender o aumento da renda pessoal ou familiar, objetivo que permeia toda a dimensão produtiva do meio rural, o agronegócio acaba por representar também, ao menos em certa medida, os anseios da classe média rural. Bartolomeu B. Pereira (2020, p. 24), ex-presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), sintetizou com precisão esse preceito ao declarar que, se o “nosso principal objetivo é dar renda ao produtor, seja ele pequeno, médio ou grande”, é porque o “Agro só vai continuar existindo se o produtor rural tiver renda e continuar na atividade”. Observe-se que, sem deixar de ser lógico e coerente, esse é um típico argumento que, como notou Caio Pompeia (2020b), opera por meio de “sinédoques”, tendo em vista legitimar a dimensão “totalizadora” do setor. Não é difícil, a partir dessa premissa, convergir opiniões e cooptar apoios. Veja-se, por exemplo, a declaração do deputado federal Heitor Schuch (PSB-RS) (2020), cuja agenda é vinculada à agricultura familiar, para quem o “agricultor hoje não pode ser apenas agricultor, ele é um pouco veterinário, um pouco técnico agrícola, um pouco de agrônomo, um pouco de metrologista, um pouco de economista”, ou seja, “ele é de tudo para poder atender à sua propriedade e poder fazer essa gestão no sentido de que ela funcione, que ela gere receita para sobreviver e manter a sua família”.
A mesma racionalidade transparece na declaração de Daniel Rosa (relato concedido em 2022), diretor técnico da Abramilho, portanto, de uma importante instituição ligada ao setor agrário-produtivo do agronegócio. Segundo ele, porque age em consonância com sua sociedade e época, “o médio produtor ele, como todos, inclusive na cidade”, “quer ter um empreendimento que dê lucro, que dê retorno”. Se essa conduta socialmente aprovada predispõe uma identificação positiva com o agronegócio, ela também atua no sentido de favorecer uma identificação negativa com os movimentos sociais populares, o que a torna duplamente eficaz. Na opinião de Daniel Rosa, o “produtor médio” “não quer mais se vincular a essa imagem de subsistência, de trabalho manual, de pouca tecnologia”, que supostamente caracterizaram os movimentos sociais, “eu acredito que o principal ponto ali seria a subsistência versus o que vou chamar de lucro. Acaba que essa visão do campesinato, do pequeno agricultor com a enxada na mão, tomando um sol, isso é subsistência, pobreza”. A sua conclusão lógica de que “o mercado seleciona, e quem não se moderniza vai ficando para trás”, sem dúvida não é desconhecida entre pequenos e médios agricultores. É o que comprova a declaração emblemática de Carlos Lopes (Correio Braziliense, 2023), presidente da Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), segundo o qual “eu acredito igual a Darwin, toda espécie que não evolui, some”, pressuposto natural para quem acredita que a “confederação tem como missão conseguir linkar o nosso setor produtivo à contemporaneidade”.
O deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS) reuniu o argumento econômico, a justificação social e a representação política em uma única fala que constitui o exemplo mais bem-acabado de como o discurso do agronegócio persuade e coopta apoio entre os pequenos e médios agricultores. Segundo o Moreira (2020a), “por que será que apareceu no Brasil uma frase para cunhar o agricultor como agricultura familiar? Todo mundo fala em pequeno agricultor. Ele não é pequeno agricultor, ele é pequeno proprietário”, pois “tem pessoa com 14 hectares de área dobrada que tem os filhos formados em medicina, engenharia, tem um padrão de vida qualificadíssimo”, uma vez que ela “tem uma parreira de uva, tem criação de peixe, produz tudo o que se alimenta, tem um paiol cheio, tem gado, tem suíno, tem aves, tem tudo em 14 hectares. Esse cara, ele não é um pequeno produtor, é pequeno proprietário”. Carlos Joel da Silva (2018), presidente da FETAG-RS, parece confirmar essa interpretação, pois admite que o pequeno proprietário pode ser um grande produtor: a produção para exportação “é o caminho do futuro. Inclusive tem muitos produtores já exportando – caso dos suínos, do frango. Hoje a pecuária familiar entra muito forte também”, afora o “vinho”, já que “a uva hoje está na mão do pequeno agricultor”. Essa perspectiva caracterizada pela “integração aos mercados”, segundo Picolotto (2018, p. 212-213), teria contribuído para formar, junto às organizações sindicais, uma determinada concepção de agricultura familiar em que pautas como a defesa da reforma agrária cederiam espaço para a demanda por crédito agrícola. Isso teria ocorrido com as políticas públicas que, conforme Soldera e Niederle (2016), também estariam permeadas por essa perspectiva.
Na “condição de eleitos pelo agronegócio”, conforme argumenta Regina Bruno (2016, p. 153), os “empreendedores familiares são alvo de uma intensa pressão política e ideológica por parte das elites agroindustriais que procuram aproximá-los argumentando que agronegócio e empreendedores, juntos, representam o setor mais dinâmico da sociedade brasileira”. É o que transparece no editorial da Revista Coplacana (2021, p. 43), que traz uma manchete sob o significativo título de “trabalhadores rurais possuem papel essencial na transformação do agronegócio brasileiro”, em que se lê que o “agro está presente em tudo: na alimentação, roupas, passando pelos biocombustíveis, móveis, objetos de decoração, instrumentos musicais e o que mais se possa imaginar”, conforme preconiza sua definição e mobilização discursiva, “porém, boa parte dessa produção provém de pequenos produtores e de agricultores familiares, que muitas vezes precisam de assistência na implantação e condução das lavouras e criações”. Ainda mais significativo é o editorial da Revista Campo (2012), cuja matéria de capa, A nova classe média rural, é complementada pela significativa sentença “eles não são atendidos por programas sociais e nem alcançam os lucros dos grandes produtores. Essa nova classe C representa mais de 60 milhões da produção bruta brasileira”.
A reportagem, que é fruto de uma pesquisa encomendada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), “recomenda” que as “empresas integradoras sejam canais” de comunicação entre o Estado e os agricultores, a fim de que este grupo não passe para o “nível D/E”, composto por um público economicamente vulnerável e dependente das “políticas destinadas aos grupos de pobreza extrema” (Revista Campo, 2012, p. 22). Do ponto de vista semiológico, toda ela é perpassada por exemplos e imagens de pequenos agricultores que, junto com suas famílias, permanecem nas suas atividades e nelas prosperam “sem a ajuda de políticas públicas” ou “cuidando sozinhos de toda a produção”, segundo um ethos tipicamente pequeno-burguês. A pesquisa, que não traz esclarecimentos metodológicos, foi apresentada de uma maneira peculiar: se o foco era a “classe C”, os signos visuais, textuais e estatísticos funcionam como uma propaganda do agronegócio, que “só é minoria em número de propriedades”, mas “líder em contratações”.
Ao contrário do que alegam os movimentos sociais, nem todos os agricultores familiares economicamente estáveis se veem como membros do agronegócio. Alguns, inclusive, além de terem claras as diferenças que os separam da agricultura empresarial, são críticos daqueles, dentre os seus pares, que se comportam dessa maneira. “Na minha visão”, afirma Sergio Luiz Reis (relato concedido em 2022), presidente do Sindicato dos Trabalhadores Agricultores Familiares de Santa Cruz do Sul, Sinimbu, Vale do Sol e Herveiras STR-SCS, “o agronegócio é a agricultura empresarial que cria inclusive o CNPJ e faz a lavoura através desse CNPJ, não é que nem o agricultor familiar que é no CPF, que tudo está na mesma conta”, ou seja, enquanto os primeiros são pessoas jurídicas, os segundos são pessoas físicas, portanto desprovidas do controle empresarial dos meios de produção. No entanto, ainda assim “alguns produtores caem nessa tentação” de se pensarem como empresários rurais, o que, em sua opinião, não condiz com a realidade, “alguns produtores querem estar no topo da cadeia e dizer ‘ah, eu sou do agro’”, embora não façam talvez “uma análise mais aprofundada para ver as consequências disso, as condições diferentes em que a gente trabalha”.
Como se pode perceber, as eventuais adesões são mais fomentadas do que espontâneas. Ocorre que, comparadas com os movimentos sociais, as pautas da classe média rural são mais objetivas e pragmáticas, o que demonstra certa sintonia com a ordem objetiva e, por extensão, a existência de um ethos que potencialmente a afasta dos movimentos sociais e a aproxima do agronegócio. É o que se pode deduzir da fala do dirigente da UNICAFES-RS, Gervásio Plucinski (relato concedido em 2022). Segundo ele, as cooperativas representadas pela instituição “trabalham muito nesta lógica do agricultor produzir cada vez mais, com mais tecnologia, num alinhamento, digamos assim, muito mais econômico, parecido com as grandes propriedades, lógico que com escala menor”. Não se pode dizer que esse seja um posicionamento que critica os movimentos sociais, e tampouco que elogia o agronegócio, mas nem por isso deixa de evidenciar qual das duas alternativas se mostra mais atraente para o setor.
A relação com os movimentos sociais, ou entidades sindicais que aderem às suas pautas, não é isenta de conflitos. É o que evidencia a reação de lideranças tanto do agronegócio como de pequenos e médios agricultores ao comentário, efetuado por ocasião do impeachment de 2016, de Aristides Veras dos Santos, então presidente da Contag. Na ocasião, Santos (Câmara dos Deputados, 2016a) teria afirmado que a “forma de enfrentar a bancada da bala contra o golpe é ocupar as propriedades deles ainda lá nas bases, lá no campo. E a Contag e os movimentos sociais do campo é que vão fazer isso”. Tereza Cristina (Câmara dos Deputados, 2016b), uma das principais lideranças políticas do agronegócio, alegou então que “diante dessas declarações, de incitação à violência e ao cometimento de crimes, essa Comissão Parlamentar de Inquérito possui o dever, regimental e moral, de intimá-lo para prestar esclarecimentos”. A declaração de Santos repercutiu também entre os pequenos e médios agricultores. Carlos Joel da Silva (Fetag, 2016), presidente da FETAG-RS, fez questão de salientar que a sua fala “deve ter sido”, no “calor da discussão”, um “pensamento dele, dele como pessoa e não como instituição”, afinal, “não queremos crer que a nossa confederação pensa aquilo que ele disse ou tenta fazer aquilo que ele disse. A Fetag tem um posicionamento muito firme. Não apoiamos em nenhuma vírgula aquilo que foi dito por ele”. Contrariamente aos movimentos sociais e seus simpatizantes, que muitas vezes apresentam vínculos político-partidários explícitos, sobretudo com o Partido dos Trabalhadores (PT), as lideranças vinculadas aos agricultores familiares prezam por uma maior neutralidade política. A FETAG-RS, de acordo com Silva, não deve se envolver com partidos, movimentos ou ideologias, limitando-se à representação e à defesa de seus filiados, opinião que é corroborada por Gervásio Plucinski (relato concedido em 2022), presidente da UNICAFES-RS, segundo o qual alguns membros desta instituição “realmente querem se afastar de pautas político-partidárias”.
Ao que parece, os membros da classe média rural não só não se veem representados pelas pautas dos movimentos sociais, como assumem uma postura crítica ao seu modus operandi. Isso fica visível nas declarações do presidente do STR-SCS, Sérgio Luiz Reis (relato concedido em 2022). Em sua opinião, existem “pessoas que acham que o agricultor familiar é aquele que vive só para subsistência”, conforme a imagem convencional que se tem do campesinato, “mas não pode desclassificar o agricultor familiar por estar uma classe acima da subsistência, por ele participar de uma geração, do desenvolvimento de uma região, de uma comunidade, com o suor do seu trabalho”. O “desclassificar” é uma referência às críticas dos movimentos sociais que, através da expressão “agronegocinho”, buscariam depreciar os setores economicamente ativos da agricultura familiar. Reis, que nega e critica essa percepção, também assinala as diferenças constitutivas entre os pequenos agricultores. Segundo ele, “quando vai falar em agricultura camponesa, parece para a gente mais a agricultura de subsistência” (relato concedido em 2022), o que demonstra uma vez mais a mobilização de uma visão de campesinato profundamente fundamentada na imagística cultural brasileira, cuja representação não deve, com efeito, ser ignorada na análise acerca das lutas sociais do campo.
Carlos Joel Silva (relato concedido em 2022), da FETAG-RS, possui uma opinião semelhante. Embora afirme que “a gente respeita todos os movimentos que tem no setor”, também reconhece que “eles têm um público específico, que é aquele público que já vem dos assentamentos, que são as pessoas, não vou dizer mais pobres, mas com menos condições”, enquanto a FETAG-RS, por outro lado, “atende toda a agricultura familiar”, sobretudo “uma agricultura familiar desenvolvida”. Quanto à questão camponesa, Silva é taxativo: alguns agricultores familiares realmente “não se enxergam quando falam em [agricultura] camponesa, eles têm uma visão de que [agricultura] camponesa é o pessoal dos sem-terra, de invadir a propriedade, de fazer acampamento, eles têm essa ligação”. O que a prática demonstra é que se os setores médios não se identificam com os movimentos sociais, nem por isso aderem prontamente ao agronegócio, constatação que parece contrariar a interpretação de Soldera e Niederle (2016), segundo a qual essa “nova” classe média rural, também chamada de “o meio do campo”, estaria em disputa: ora o simples fato de que os movimentos sociais empreguem um termo acusatório para se referir a esse público, o que demonstra que não há equivalência conceitual entre agricultor familiar e camponês, conforme a interpretação de Maria Wanderley (2014), é suficiente para comprovar que menos do que uma disputa pela classe média rural, o que se pretende é a demarcação de fronteiras, situação que é reforçada pelo próprio setor ao criticar os movimentos sociais de forma análoga à do agronegócio.
Conforme Sergio Reis (relato concedido em 2022), “o radicalismo, para mim, não é bom em lugar nenhum. E aí eu vejo muitas vezes os movimentos sociais, na minha opinião, pecando um pouco nisso”, uma vez que se “tem a obrigação de ser agroecológico, tem que brigar com o agro… eu não vejo que tem que brigar com o agronegócio”, ao contrário, “acho que cada um tem o seu espaço”. De fato, “tem espaço para todo mundo”, afirma Plucinski (relato concedido em 2022), até porque “não tem como você pensar tudo que se produz hoje no Brasil sem o próprio agronegócio”. Assim, além de se beneficiar da divergência com os movimentos sociais, a cooptação é favorecida pela afinidade com o discurso hegemônico. Afinal, também para Alceu Moreira (2020c, p. 31-32), “tanto o pequeno, como o médio, quanto o grande, todos podem ser rentáveis”, já que “todos os mercados estão disponíveis, para pequenos, médios e grandes produtores”. Porque ajustados à ordem social e jurídica, os setores médios tendem a assumir uma perspectiva crítica em relação aos outsiders, conforme fica evidente nas afirmações de Sergio Reis (relato concedido em 2022), segundo o qual é preciso “deixar os radicalismos de lado”, ou nas de Gervásio Plucinski (relato concedido em 2022), que entende que se o agricultor familiar “prefere hoje de ser chamado de agro do que de agricultor familiar”, é porque ele tem em mente uma “concepção de sociedade” em que “o cara avança um pouco no econômico, o cara quer esquecer um pouco aquele grupo que ele pertenceu ou que estava antes, enfim, quer se enxergar num outro grupo”. O forte investimento na ascensão social que caracteriza a pequena-burguesia, como evidenciam as reflexões de Bourdieu (2007) e Elias e Scotson (2000), é duplamente vantajoso para o agronegócio, pois ao mesmo tempo em que o indivíduo nega suas origens (ou renega sua realidade) em uma busca de aprovação social, ele tende a rechaçar as propostas alternativas como inviáveis e pouco prestigiosas.
Como notaram Elias e Scotson (2000) acerca das relações entre estabelecidos e outsiders, mesmo os membros que possuem menos poder dentro do grupo do qual fazem parte tendem a reivindicar para si, por identificação, as características e os valores que o grupo atribui a si como um todo, geralmente tomando como base a “minoria dos melhores”. A identificação com o agronegócio, entretanto, não ocorre sem resistências. Isso porque a classe média rural não é uma matéria amorfa, mas uma classe com características distintas, pautas próprias e objetivos definidos. Além disso, a adesão nunca é total. Curiosamente, o exemplo mais elucidativo do descompasso entre a inclusão formal e a exclusão real pode ser encontrado nas duas reportagens temáticas que buscaram destacar a importância dos pequenos e médios agricultores como membros ativos do agronegócio brasileiro. É o que transparece quando da utilização exclusiva da categoria produtor rural para se referir ao agronegócio, enquanto proposital e indistintamente todos os demais públicos foram agrupados sob as categorias pequenos produtores rurais, trabalhadores rurais e agricultores familiares.
Se de fato o “sindicalismo fala pelos agricultores familiares mais estabelecidos”, conforme Medeiros (2021, p. 8), é natural que os “segmentos mais empobrecidos” não se sintam representados, o que os instiga à formação de uma agenda própria fundamentada na tríade agroecologia, campesinato e reforma agrária. É nesse sentido que se destaca a atuação do MPA que, conforme Medeiros (2021, p. 8), “fala para um grupo de agricultores com organização mais delimitada e que buscam a construção de um novo modelo de agricultura com base em princípios agroecológicos, recuperando o termo camponês para referenciar um modo de vida” alternativo à proposta hegemônica. A assertiva é, com efeito, confirmada por Plínio Simas (relato concedido em 2022), dirigente do MPA-RS, segundo o qual “não somos aquele camponês que achamos que tem que voltar para o cabo da enxada”, mas aquele que entende que “tem que ter tecnologia, mas tecnologia acessível à pequena propriedade”. Essas pautas, no entanto, não são convergentes com as da classe média rural.
Na opinião de Gervásio Plucinski (relato concedido em 2022), ao invés da reforma agrária, “para muitos dos agricultores familiares, seria mais importante para eles uma política de crédito fundiário”, dado que o “tema da reforma agrária não é um tema que se debate, que se discuta, que tenha alguma ressonância no meio do nosso público”; quanto à agroecologia, informa que “a gente não está nem usando a expressão agroecologia, mas alimentos limpos, alimentos que tenham respeito ao meio ambiente”, pois “o tema o não dialoga com o agricultor”, ou seja, “não é um tema que você vai agregar as pessoas”; quanto à problemática camponesa, alega que, “realmente, a gente não tem nenhuma consciência, não tem nenhum debate que pudesse, digamos assim, juntar esse público todo numa denominação campesina”, o que o leva a concluir que, “se você casar esses temas num único público, vai se ter pouca adesão de pessoas nesta proposta”. Consoante sugerem as reflexões de Picolotto (2018), essas são afirmações de primeira grandeza no que se refere ao problema da representação sindical de pequenos e médios agricultores, pois evidenciam sua complexidade e desafios.
Os próprios movimentos sociais e seus simpatizantes ratificam essa interpretação. É o caso, por exemplo, de Plínio Simas (relato concedido em 2022), do MPA-RS, que não deixa de reconhecer que “a palavra camponês não está no meio dos nossos agricultores”, ou seja, ela “não está no dia a dia do agricultor de modo geral”. Ronaldo Ramos (relato concedido em 2022), da Contag, corrobora com esse entendimento, pois, segundo afirma, a “agroecologia por si só, ela não é compreendida por todos os setores, é compreendida por quem está no dia a dia no debate”, e por isso tende a ser transubstanciada como produção de alimentos saudáveis, já que assim “você consegue ampliar as camadas da sociedade que são, digamos assim, atingidas, que são contempladas com essa fala”. Décio Lauri Sieb (relato concedido em 2022), também da Contag, confirma essa interpretação ao informar que a “agroecologia é referência nossa para produção, mas uma coisa é referência, outra é a vida, a prática, no dia a dia”. Com relação à reforma agrária popular Ramos (relato concedido em 2022) complementa ainda que, “lamentavelmente, essa pauta, apesar de continuar sendo uma pauta extremamente importante, ela vem sendo enfraquecida ao longo dos anos”.
Se mesmo entre estes setores há dúvidas quanto à efetividade da identificação dos pequenos agricultores com o campesinato, nada mais natural, portanto, do que a afirmação jocosa de Daniel Rosa (relato concedido em 2022), diretor técnico da Abramilho, segundo o qual “campesinato é igual filhote de pombo: dizem que tem, a gente nunca viu”. Tudo indica que a defesa dessas pautas como alternativas ao modelo hegemônico tem um efeito positivo limitado que se faz acompanhado por um efeito negativo real e potencial que, ao se materializar no crescente afastamento da realidade objetiva, contribui para o insulamento dos movimentos sociais na mesma medida em que fomenta a identificação da classe média rural com o discurso do agronegócio. Se esse raciocínio está correto, então se pode afirmar que a crítica de Octávio Ianni (1986, p. 115) ao movimento camponês permanece atual, uma vez que suas pautas seriam permeadas por um elevado nível de radicalidade e idealismo que “nega a ordem burguesa, as forças do mercado, as tendências predominantes das relações capitalistas de produção”, fazendo dela tanto uma “utopia construída pela invenção do passado” como ou uma “quimera de algo impossível no presente”, ou seja, “uma fantasia alheia às leis e determinações que governam as forças produtivas e as relações de produção no capitalismo”. Na melhor das hipóteses, não seria mais do que uma “fabulação do futuro”.

Considerações finais

A desqualificação dos movimentos sociais, afirma Décio Lauri Sieb (relato concedido em 2022), da Contag, não só “faz parte do projeto desse grupo hegemônico”, como é “uma questão de visão de sociedade”. Sua opinião é confirmada por Regina Bruno (2003, p. 300), para quem os porta-vozes do agronegócio e da agricultura patronal historicamente “se empenharam em desqualificar, na grande imprensa, os trabalhadores rurais sem-terra”. Essa aparente oposição compreende, porém, um elevado grau de complexidade. Quando os movimentos sociais e seus simpatizantes personificam e caracterizam os seus opositores, mas desconsideram a sua profunda convergência com a realidade objetiva, a crítica se expande do grupo em questão para a ordem social como um todo. Dito com outras palavras, como o agronegócio se vale de um mesmo substrato social e cultural para cooptar os setores médios, explorando afinidades reais e potenciais, a crítica dos movimentos sociais necessariamente assume um viés generalizante, o que muitas vezes contribui para o seu insulamento político. Tal situação não é ignorada, conforme revela a declaração de algumas militantes ligadas ao MST (2023), porquanto cientes de que “os nossos inimigos no campo, eles são comuns no mundo inteiro, ou seja, a luta contra o agronegócio é uma luta do mundo inteiro porque é um modelo instaurado em todos os países do mundo”. O esquema abaixo sintetiza o poder de persuasão do discurso do agronegócio. O pontilhado crescente no interior da seta significa que quanto mais se vai em direção ao agronegócio, maior a identificação absoluta com a sua imagística.
Figura 1 O discurso do agronegócio – abrangência e persuasão
Figura 1 O discurso do agronegócio – abrangência e persuasão
O principal argumento deste trabalho consiste em demonstrar como e por que a atual conjuntura social, política e cultural é favorável ao agronegócio: de um lado, os movimentos sociais e a classe média rural demarcam fronteiras entre si, o que gera uma mútua negação seguida, às vezes, de um irreconciliável afastamento; de outro, os setores dominantes atuam estrategicamente no sentido de cooptar os pequenos e médios agricultores sob a premissa de que, juntos, formam uma só agricultura. No primeiro caso, as diferenças e conflitos assumem o primeiro plano; no segundo, são as semelhanças e afinidades. Esse conjunto de constatações, complementado pelo problema da incapacidade de convergir apoio entre os pequenos e médios agricultores, aponta para a existência de uma nova agenda de pesquisa, voltada sobretudo para a efetividade das pautas que caracterizam os movimentos sociais populares e seus simpatizantes. Talvez aponte também, em um maior nível de abstração teórica, para a necessidade de atualizar os recursos teórico-metodológicos atualmente empregados no estudo do meio rural brasileiro, tendo em vista um maior realismo sociológico.

4 ASES. 2021. Próxima parada: Glasgow. A chapa está fervendo. Convidado: Marcello Brito. YouTube, 4 nov. 2021. Disponível em: https://youtu. be/yFEmzA9-KuY. Acesso em: 24 mar. 2022.

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A cooptação da classe média rural pelo agronegócio exerce um impacto significativo na economia brasileira, impulsionando o crescimento do setor agrícola. A adesão dessa classe às práticas e interesses do agronegócio contribui para aumentar a produtividade, gerar empregos e fortalecer as exportações agropecuárias, tornando-se um pilar importante para o desenvolvimento econômico do país.
A hegemonia do agronegócio na sociedade rural brasileira enfrenta desafios socioambientais significativos. A intensificação agrícola, o uso extensivo de agroquímicos e as mudanças nos padrões de uso da terra podem resultar em impactos ambientais negativos, como a degradação do solo e a perda de biodiversidade. Enfrentar esses desafios é crucial para garantir a sustentabilidade a longo prazo do agronegócio no Brasil.
As relações de poder no meio rural desempenham um papel crucial na dinâmica entre o agronegócio e a classe média rural. A concentração de poder em grandes corporações agrícolas pode influenciar as decisões políticas, econômicas e sociais, moldando as oportunidades e os desafios enfrentados pela classe média rural. Compreender essas dinâmicas é essencial para analisar a cooptação e a hegemonia nesse contexto.
Geograficamente a classe média rural brasileira está situada sobretudo na porção Sul/Centro-Oeste do Brasil, e tem por característica constitutiva a produção de commodities, bem como um melhor desempenho econômico.
Autores:
Marconi Severo
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