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Doença Suinos Aujeszky

Avaliação dos Impactos Econômicos, Sociais e Organizacionais do Programa de Erradicação da Doença de Aujeszky no Estado de Santa Catarina

Publicado: 1 de março de 2011
Por: Marcelo Miele; Ademir Francisco Girotto; Nelson Morés Armando Lopes do Amaral; Janice Reis Ciacci Zanella
INFORMATIVO TÉCNICO
Introdução e Metodologia

Os recursos limitados para a pesquisa agropecuária e a necessidade de conhecer de que forma as tecnologias alteram a competitividade das cadeias produtivas, seu entorno social e o meio ambiente exigem que sejam implementados processos de avaliação de impacto. O uso de metodologias de avaliação de impacto das tecnologias geradas pela Embrapa remonta à sua fundação há 35 anos (Ávila et al., 2005). O objetivo deste trabalho foi avaliar os impactos econômicos, sociais e organizacionais do Programa de Erradicação da Doença de Aujeszky (DA) no estado de Santa Catarina (SC), coordenado pela Embrapa Suínos e Aves em parceria com a Companhia Integrada de Desenvolvimento Agropecuário de SC (Cidasc), o Sindicato das Indústrias de Carnes e Derivados em SC (Sindicarnes- SC) e a Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS).

O programa foi lançado em 2001 e cumpriu a meta de sanear os rebanhos infectados com o Vírus da Doença de Aujeszky (VDA) e a sua erradicação total até 2004. Com o saneamento, a Organização Internacional de Epizootia (OIE) reconheceu a condição de provisoriamente livre da infecção, mas os atuais esforços estão direcionados à obtenção da certificação como livre da DA. A partir de 2006 a coordenação do programa passou para a Cidasc (Morés & Zanella, 2003; Morés et al., 2005).

Esta avaliação de impacto segue um enfoque multidimensional, englobando os aspectos econômico, social e organizacional, e busca avaliar o retorno dos investimentos realizados. Para a avaliação dos impactos econômicos utilizou-se o método do excedente econômico, a partir do qual calculou-se os benefícios com o incremento de produtividade (diferencial de produtividade x preço) e a redução de custos (diferencial de custos x quantidade). Os impactos sociais foram avaliados a partir da metodologia Sistema de Avaliação de Impacto Social da Inovação Tecnológica Agropecuária (Ambitec- Social) nos aspectos emprego, renda, saúde, gestão e administração. A avaliação dos impactos na organização de pesquisa, desenvolvimento e inovação (P&D&I) utilizou metodologia desenvolvida na Unicamp, que não se restringe à produção científica (publicações), avaliando aspectos do conhecimento, da capacitação e políticoinstitucionais. Por fim, para determinar o retorno dos investimentos, foram calculados o valor presente líquido (VPL), a taxa interna de retorno (TIR) e a relação benefício/custo (B/C) (Galesne et al., 1999; Ávila et al., 2005, 2006; Rodrigues et al., 2005).
Principais beneficiários e área de abrangência

A DA é causada por um herpesvírus com conseqüências nas diversas etapas de produção do suíno (Sandrin, 2000; Morés & Zanella, 2003; Morés et al., 2004 e 2005), com impactos na eficiência produtiva e na moral dos produtores e, consequentemente, na rentabilidade da atividade e na competitividade da carne suína no mercado internacional (Protas et al., 1987; Parsons et al., 1990; Zanella et al., 2002). Além disso, e apesar de não ser uma doença restritiva às exportações pelas regras da OIE, pode servir como poder de barganha nas negociações internacionais. O Programa de Erradicação traz benefícios para o conjunto da cadeia produtiva da carne suína (benefício sistêmico), mas os principais beneficiários são os suinocultores, empresas e cooperativas agroindustriais. De forma específica, os beneficiários diretos foram os suinocultores cujos rebanhos apresentavam diagnóstico positivo ou eram vizinhos sob risco (Morés et al., 2004 e 2005). Além disso, o serviço estadual de defesa sanitária executado pela Cidasc pôde direcionar seus recursos para outras ações. Até o ano de 2000 existiam oficialmente em SC cerca de 110 granjas de suínos que haviam sido infectadas e/ou usavam vacina para controlar a DA.

Entretanto, após a implementação dos protocolos de erradicação¹, constatou-se que este número estava subestimado. Dos 1.022 rebanhos suínos em 986 granjas investigados até 2005, 320 (32,45%) estavam infectados pelo VDA. O último caso de infecção pelo VDA em SC ocorreu em junho de 2004 (Morés et al., 2005). A área de abrangência foi calculada com base na diferença entre a evolução verificada do número de rebanhos infectados (de aproximadamente 320 em 2002 para nenhum em 2004) e a estimativa de evolução caso o programa não tivesse sido implementado. Neste cenário estima-se que o número de rebanhos infectados teria aumentado a uma taxa (conservadora) de aproximadamente 10% ao ano (Fig. 1). Com isso, a área de abrangência do programa evoluiu de 19 rebanhos em 2002 para 559 em 2007, com a ocorrência de 30 a 45 novos rebanhos infectados por ano.
Avaliação dos Impactos Econômicos, Sociais e Organizacionais do Programa de Erradicação da Doença de Aujeszky no Estado de Santa Catarina - Image 1
Fig.1. Cenários para a evolução da doença de Aujeszky em Santa Catarina.
Impactos econômicos

O principal benefício econômico é o aumento da produtividade das matrizes estimado em dois leitões terminados por matriz, por ano (Zanella et al., 2002), representando R$ 2,4 milhões para o período entre 2002 e 2007². O segundo benefício econômico em ordem de valor é a redução dos custos com vacinas, tendo em vista que a cada ano são necessárias 2,3 doses para as fêmeas e duas doses para os machos reprodutores e as leitoas de reposição (Zanella et al., 2002). A partir da composição média dos rebanhos em SC, estima-se que sejam necessárias anualmente 316 doses por rebanho. Para o período entre 2002 e 2007 o benefício acumulado foi de R$ 1,4 milhão. Por fim, estima-se que a cada novo surto sejam gastos 3% da receita bruta da granja (Protas et al., 1987; Parsons et al., 1990; Zanella et al., 2002), o que equivale a um benefício acumulado entre 2002 e 2007 de R$ 964 mil. O benefício econômico total acumulado desde o início do programa foi estimado em R$ 4,79 milhões (Tabela 1). Esse resultado se deve sobretudo ao crescimento da área de abrangência. Também influenciaram os resultados os baixos preços e as margens de comercialização negativas nos anos de 2002 e 2003, bem como a forte valorização do preço do suíno vivo em 2005.
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Impactos sobre o nível de emprego

Estima-se que o impacto sobre o nível de emprego seja elevado tendo em vista as implicações do programa para a rentabilidade das granjas infectadas, bem como para o poder de barganha das agroindústrias exportadoras no mercado internacional. Entretanto, não é possível estimar este valor tendo em vista que o nível de emprego direto e indireto varia em função de inúmeros fatores conjunturais, evolução tecnológica e deslocamentos regionais. De forma específica, o programa atingiu 986 granjas, com um emprego estimado de 1.347 ocupados diretos. Destas, 320 estavam infectadas, envolvendo 703 empregos diretos. Após o processo de erradicação, constatou-se que 64 granjas saíram da atividade, envolvendo 150 empregos diretos, correspondendo a 6,5% das granjas e 11,2% dos empregos diretos beneficiados pelo programa. Além disso, 39 granjas saíram da produção de leitões (em ciclo completo ou em unidade de produção de leitões) e se especializaram no processo de crescimento-terminação, provavelmente por restrições de escala e de recursos (financeiros, humanos e terra). Entretanto, deve-se considerar que a crise na suinocultura que durou até o primeiro semestre de 2004 também foi determinante para esse processo de desligamento e especialização. Além disso, tendências consolidadas como o incremento tecnológico, o aumento de escala e as crescentes pressões para a adequação à legislação ambiental têm maior influência na permanência na atividade do que o programa de erradicação.
Avaliação dos impactos sociais

O impacto social do programa foi avaliado como positivo pela metodologia Ambitec-Social (Rodrigues et al., 2005). O aspecto capacitação é o mais importante, tendo em vista as ações desenvolvidas junto aos produtores, aos técnicos das agroindústrias e da extensão rural pública e aos técnicos do órgão de defesa sanitária. Além das visitas às granjas para coleta de material e esclarecimentos, foram realizadas 18 palestras e seminários e dois cursos de treinamento para veterinários e técnicos, aos quais coube a difusão do conhecimento para os suinocultores. Apesar disso, uma das principais dificuldades encontradas foi a falta de mão-de-obra oficial especializada para acompanhar e orientar todos os procedimentos operacionais nas granjas infectadas e para fiscalizar o transporte de suínos para reposição. Também foram considerados importantes os impactos na gestão e administração do estabelecimento suinícola, seja pelos efeitos do programa na dedicação do suinocultor para a atividade, seja pela maior e melhor interação com os órgãos oficiais de defesa sanitária e de extensão rural (Morés et al., 2005). Também merecem destaque os impactos positivos no montante da renda e no valor da propriedade a partir dos investimentos realizados em benfeitorias (ligados à bioseguridade da granja).
 Avaliação dos impactos sobre conhecimento, capacitação e político-institucional

O desenvolvimento do programa trouxe significativos impactos sobre o conhecimento, a capacitação e no âmbito político-institucional. A interação e cooperação entre Embrapa, Cidasc e as áreas técnicas das agroindústrias permitiram capacitar as equipes, aprimorar sua capacidade de formar redes e de estabelecer parcerias, bem como de socializar o conhecimento. Foram 18 palestras e seminários, além de dois cursos de treinamento para implementação dos procedimentos de despovoamento, limpeza, desinfecção, vazio sanitário e repovoamento. Em termos políticoinstitucionais, o programa trouxe mudanças no marco institucional ao dar origem ao Plano Nacional para Erradicação da Doença de Aujeszky (IN 08/2007 do Mapa) e a programas estaduais já implementados no Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso do Sul. Além disso, trouxe uma melhora na imagem da Embrapa entre os atores da cadeia produtiva e o sistema nacional de pesquisa agropecuária, bem como demonstrou haver capacidade de captar recursos através de parcerias (ver detalhamento dos custos a seguir) e de implementar programas desta natureza, sobretudo em relação à seriedade no pagamento de indenizações (Morés et al., 2005).

Custos, fontes de recursos e retorno do investimento

O total de recursos financeiros investidos no programa foi de R$ 9,65 milhões³, sendo a principal fonte o Fundo Estadual de Desenvolvimento da Suinocultura, seguida da Cidasc e da Embrapa. A principal finalidade dos recursos foi o pagamento de indenizações e subsídios aos suinocultores, seguido de exames laboratoriais e compra de vacinas (Tabela 2). Além destes valores, estima-se que a Embrapa e a Cidasc tenham incorrido em custos com pessoal (pesquisadores, analistas e técnicos de campo) e administrativos que não foram computados. O programa não gerou receitas financeiras, pois assumiu o caráter de um bem público.
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Para calcular o retorno dos investimentos no programa, considerou-se um horizonte de vida útil de 20 anos, três diferentes taxas de desconto (subsidiada, de poupança e Selic) e a estabilização da área de abrangência a partir de 2007. Nessas condições o programa apresenta uma TIR de 9,26% ao ano e se mostra rentável (VPL > 0) para custos de oportunidade subsidiados ou igual à poupança. Quando se considera o custo da dívida pública (Selic) o VPL é negativo. A relação benefício/custo é superior à unidade para os três custos de oportunidade considerados, ou seja, para cada R$1,00 investido são gerados entre R$1,00 e R$1,76 em benefícios (Tabela 3). Estes resultados são modestos quando comparados com a alta rentabilidade das avaliações de investimentos em P&D&I agropecuária no mundo e no Brasil (Ávila et al., 2005).

Entretanto, deve-se considerar que o impacto pode estar subestimado porque alguns benefícios econômicos não foram quantificados, assim como nenhum benefício social, ambiental e organizacional. A estabilização da área de abrangência também é uma hipótese bastante conservadora. Além disso, o caráter de bem público com baixa apropriabilidade dos benefícios remete à necessidade de se avaliar programas desta natureza com taxas de desconto subsidiada ou nulas. Por outro lado, alguns custos da Embrapa e da Cidasc não foram contabilizados, o que poderia reduzir ainda mais a rentabilidade. Entretanto, referem-se a despesas do quadro de pessoal que seriam executadas mesmo sem a implementação do programa (são os chamados custos afundados).
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Considerações finais

O Programa de Erradicação da Doença de Aujeszky no Estado de Santa Catarina atingiu o objetivo no ano de 2004 conforme meta inicial. O resultado contribui para o fortalecimento da competitividade e do poder de barganha da cadeia produtiva da carne suína no mercado internacional. Os benefícios sistêmicos se estendem dos suinocultores e agroindústrias para o conjunto da cadeia produtiva e, também, para os órgãos oficiais de defesa animal, pesquisa e extensão. Mesmo considerando-se a estabilização dos benefícios econômicos quantificados nos níveis de 2007, estima-se um retorno positivo dos investimentos feitos no programa, em um horizonte de 20 anos, para taxas de desconto de até 9,26% ao ano. Além disso, são significativos os benefícios sociais e na organização de P&D&I.
Referências

AVILA, A.F.D.; MAGALHÃES, M.C.; VEDOVATO, G.L.; IRIAS, L.J.M.; RODRIGUES, G.S. Impactos econômicos, sociais e ambientais dos investimentos na Embrapa. Revista de Política Agrícola, v. 14, p. 86-101, 2005. GALESNE, A.; FENSTERSEIFER, J.E.; LAMB, R. Decisões de investimentos da empresa. São Paulo: Atlas, 1999. 295p. MORÉS, N.; AMARAL, A.L. do; VENTURA, L.; ZANELLA, J.R.C.; SILVA, V.S. Programa de erradicação da doença de Aujeszky no Estado de Santa Catarina. Concórdia: Embrapa Suínos e Aves, 2005. 8p. (Embrapa Suínos e Aves. Circular Técnica, 44). MORÉS, N.; ZANELLA, J.R.C. Programa de erradicação da doença de Aujeszky no Estado de Santa Catarina. Concórdia: Embrapa Suínos e Aves, 2003. 50p. (Embrapa Suínos e Aves. Documentos, 81). MORÉS, N.; AMARAL, A.L.; VENTURA, L.; ZANELLA, J.R.C.; MORI, A.; DAMBRÓS, R.M.F.; PROVENZANO, G.; BISOLO, E. Relato epidemiológico do vírus da doença de Aujeszky, envolvendo o comércio de reprodutores suínos de reposição. Concórdia: Embrapa Suínos e Aves, 2004. 4p. (Embrapa Suínos e Aves. Comunicado Técnico, 370). PARSONS, T.D.; PITCHER, P.M.; JOHNSTONE, C. Economic analysis of an epizootic of peseudorabies and subsequent production following the institution of a vaccination program in a Pennsylvania swine herd. Journal of the American Veterinary Medical Association, v.197, n.2, p.188-191, 1990. PROTAS, F.S.J.; SOBESTIANSKY, J.; SONCINI, R.A. Custo de um surto da doença de Aujeszky em uma granja de suínos. Concórdia: Embrapa Suínos e Aves, 1987. 2p. (Embrapa Suínos e Aves. Comunicado Técnico, 124). RODRIGUES, G.S.; CAMPANHOLA, C.; KITAMURA, P.C.; IRIAS, L.J.M.; RODRIGUES, I.A. Sistema de avaliação de impacto social da inovação tecnológica agropecuária (ambitec-social). Jaguariúna: Embrapa Meio Ambiente, 2005. 30 p. (Embrapa Meio Ambiente. Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento, 35). SANDRIN, A. Estudo educativo epidemiológico da doença de Aujeszky em Santa Catarina no período de 1983 a 1999. 2000, 62p. Monografia (Pós- Graduação em Sanidade Animal) - Centro de Ciências Agroveterinárias, Universidade do Estado de Santa Catarina, , Lages, SC. ZANELLA, J.R.C.; MORÉS, N., GIROTTO, A.F. Estimativa de impacto econômico anual da doença de Aujeszky para a suinocultura do estado de Santa Catarina. Concórdia: Embrapa Suínos e Aves, 2002. 4p. (Embrapa Suínos e Aves. Comunicado Técnico, 294).
 
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Autores:
Marcelo Miele
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