Introdução:
Utilizar as recomendações nutricionais dentro de cada fase dos suínos, conhecer o coeficiente de digestibilidade da proteína e aminoácidos de cada ingrediente, aplicar o conceito de proteína ideal e, usufruir dos aminoácidos industriais, os Nutricionistas podem criar dietas com menores custos assumindo adequado nível energético, nutrientes essenciais e condicionalmente essenciais para a máxima expressão genética dos animais e com o mínimo efeito ambiental.
Numa diversidade de ingredientes disponíveis para a formulação de dietas para suínos, literalmente é estabelecido à limitação de um ou mais aminoácidos. Aminoácidos limitantes podem ser entendidos como àqueles que estão presentes na dieta em uma concentração menor do que a exigida para o máximo crescimento dos animais, existindo uma ordem de limitação dada pelo escore químico de uma dieta formulada. Também, a ordem da limitação está de acordo com a idade dos animais ou função fisiológica, porém o primeiro limitante sempre será a lisina para suínos (Bertechini, 2006; Henry et al., 1992). Numa dieta a base de milho e farelo de soja, o triptofano é considerado o quarto ou quinto aminoácido limitante depois da Lisina; Met+Cis e Treonina (Bertechini, 2006; Pereira, 2014). Por outro lado, nos países que permitem o uso de coprodutos de origem animal (farinha e carne e ossos, farinha de penas e farinha de vísceras) e, dependendo do seu nível utilizado na dieta de suínos, o aminoácido triptofano pode tornar-se o segundo (de Lima, Klein, & Hackenhaar, 2003) ou terceiro limitante, obrigando a sua suplementação dietética para atender à exigência animal. Diante do exposto, o objetivo deste artigo é apresentar o triptofano não apenas como um aminoácido essencial e limitante para suínos alimentados com dietas contendo coprodutos de origem animal, mas também usufruir da relação triptofano:lisina digestível estandarizado (Trip:Lis DIE) visando o potencial fisiológico, a resposta de desempenho, a saúde e o bem estar dos animais.
Importância do Triptofano na Alimentação de Suínos
A essencialidade do triptofano determina a sua importância na deposição de tecidos, refletindo na eficiência do crescimento animal. Também, este aminoácido participa na síntese de niacina (vitamina B3) e melatonina (neurohormônio). O triptofano é um importante intermediário do sistema imunológico e a sua demanda parecer aumentar nos processos inflamatórios (Pereira, 2014).
Segundo Henry et al. (1992) as necessidades marginais de triptofano não devem ser esquecidas nas formulações de rações, já que este aminoácido é precursor da serotonina no cérebro (5-hydroxitryptamina), um neurotransmissor envolvido no centro de regulação do consumo de alimento. A serotonina tem relação direta com o humor, comportamento e cognição (Richard et al., 2009) que pode estar ligado diretamente ao bem estar animal.
Em um experimento conduzido por Adeola and Ball (1992) foi observado que a máxima concentração de serotonina no hipotálamo de suínos na fase final de criação ocorreu 5 dias após a suplementação de L-Triptofano na dieta (Figura 1). Também, os autores observaram que a suplementação de L-Triptofano no período de pré-abate pode reduzir o estresse e a redução de PSE na carne.
Figura 1. Concentração de serotonina em suínos alimentados com L-Triptofano com 2,5 ( - ), 5 ( --- ) e 10 ( …. ) g/kg na ração aos 3; 5; 7 e 10 dias. A linha vertical representa o erro padrão da média (Adeola & Ball, 1992).
Outra evidência importante do triptofano é a sua relação direta com a síntese de grelina, um hormônio presente no estômago, intestino e outros órgãos que melhora o apetite em cooperação com o sistema nervoso. Também, aumenta a síntese de GH (Correa-Silva, Sá, & Lengyel, 2008).
Zhang, Yin, Li, Zhou, and Li (2007) conduziram um estudo em suínos para determinar se a grelina produzida principalmente pelo estômago está envolvida na estimulação do apetite quando mediada pelo triptofano. Eles usaram dietas à base de milho, glúten de milho e farelo de soja contendo 3 níveis crescentes de triptofano suplementar (0,12%; 0,19% e 0,26% na dieta ou 0,0 g/kg; 0,07 g/kg e 0,14 g/kg de ração); atendendo a relação Trp:Lis DIE de 10%; 15,7% e 21%. As dietas foram oferecidas ad libitum versus restrição alimentar (formas de arraçoamento). O ganho de peso, o consumo de ração e a conversão alimentar melhoraram com o aumento da ingestão de triptofano na dieta (Tabela 1). O triptofano dietético induziu níveis mais elevados de mRNA de grelina (P<0,01), mas as formas de arraçoamento (P>0,05) não teve efeito sobre a expressão da grelina ao nível gástrico em leitões (Figura 2A). A alimentação com dieta de 0,19% de triptofano induziu ao maior nível de mRNA da grelina entre os três tratamentos dietéticos estudados dentro de cada arraçoamento. No duodeno, o nível de mRNA de grelina tornou-se maior com o uso do triptofano alimentar (P<0,01), sendo que a dieta contendo 0,26% de triptofano induziu ao melhor nível de grelina no duodeno (Figura 2B).
Tabela 1. Efeito do nível de triptofano sobre o desempenho de leitões.
Adaptado de Zhang et al. (2007).
Médias de com letras diferentes e na mesma linha, são diferentes estatisticamente (P<0,05).
GP – Ganho de peso; CR – consume de ração e CA – conversão alimentar.
Figura 2. Efeito das formas de arraçoamento e dos níveis de triptofano sobre o mRNA da grelina gástrica (A) e duodeno (B) em leitões. Os níveis de mRNA da grelina são médias ± S.E.M. Barras com letras diferentes diferem estatisticamente (P<0,05).
O triptofano e os aminoácidos neutros de cadeia longa (Leucina, isoleucina, valina, fenilalanina e tirosina) competem através da barreira hemato-encefálica, compartilhando um sistema de transporte em comum. Diante desta circunstância, a quantidade de triptofano no cérebro pode ser reduzida caso a ingestão de aminoácidos neutros de cadeia longa (AANL) sejam elevados (Pereira, 2014), implicando negativamente na síntese de serotonina. Assim, entender a relação entre triptofano:AANL pode ser um fator importante na formulação de rações para diagnosticar o melhor mecanismo de consumo alimentar, melhor saúde e bem estar dos suínos. Na revisão realizada por Adeola and Ball (1992) há evidências que o aumento do triptofano em relação aos AANL melhora o nível de serotonina no cérebro de ratos, frangos de corte e poedeiras causando efeito sedativo.
Os fatos supracitados podem ser considerados cruciais quando os Nutricionistas se deparam com alta disponibilidade farinha de carne e ossos; farinha de vísceras e farinha de penas, oriundos de frigoríficos e indústrias rendering uma vez que o triptofano pode ser entendido como o segundo aminoácido limitante das rações de suínos de (de Lima et al., 2003).
A relação Trip:Lis DIE para suínos são referenciadas por Rostagno et al. (2011) que recomendam 18% para as fases: inicial, crescimento e terminação. Rostagno et al. (2017) estabelecem 19% para a fase inicial e 20% para as fases crescimento e terminação. Para o NRC (2012) a recomendação é de 16% para a fase inicial e 17% para a fase crescimento-terminação (machos castrados, fêmeas e machos inteiros).
Inclusões Práticas de Coprodutos de Origem Animal na Dieta de Suínos
As Indústrias Rendering em diferentes partes do mundo possuem rigorosos regulamentos governamentais e códigos de boas práticas de produção, gerando produtos de alta qualidade, o que a torna um elo importante para a produção animal sustentável. São empresas recicladoras e essenciais ao meio ambiente, saúde pública e animal (Juzefowicz, 2017).
As especificações de produção, qualidade e segurança alimentar para os coprodutos de origem animal é bem documentada na literatura (Bellaver, 2001, 2002; Compêndio, 1998), sendo uma excelente alternativa para redução do custo final de uma ração diante do alto preço do farelo de soja e fosfato bicálcico (Pereira, 2014; Thaler & Holden, 2010). Neste sentido, cabe ao Nutricionista conhecer a inclusão mínima e máxima de coprodutos de origem animal para suínos (Tabela 2).
Tabela 2. Nível de inclusão de coprodutos de origem animal para suínos (%).
Adaptado de Rostagno et al. (2011).
Na prática o teor de cálcio e fósforo presente na farinha de carne e ossos pode ser o fator limitante de sua inclusão nas dietas dos animais. Também, é de se esperar que o total de coprodutos de origem animal não ultrapasse em 10% a 12% da ração. Em um experimento realizado por de Lima et al. (2003) com o objetivo de avaliar relações Trip:Lis DIE em dietas de suínos na fase de terminação (70 a 95 kg de peso vivo) houve a inclusão de 8% de farinha de vísceras + 2% de farinhas de penas, sem observar impacto negativo no desempenho final dos animais.
Um ponto crucial para o sucesso do uso de coprodutos de origem animal para os suínos é conhecer o conteúdo e a digestibilidade de cada nutriente, já que se espera obter variação no teor de proteína bruta e aminoácidos dado pela falta de padronização das matérias primas (Pereira, 2014).
Efeito do Triptofano em Suínos Alimentados com Dietas contendo Coprodutos de Origem Animal
Para entender o efeito do triptofano em suínos alimentados com dietas contendo coprodutos de origem animal, a pesquisa realizada por Pereira (2014) na Universidade Federal de Viçosa no Brasil, deixa evidências que facilitam o entendimento do assunto. Assim, com o objetivo de avaliar a redução do farelo de soja por coprodutos de origem animal em suínos alimentados com duas relações de Trip:Lis DIE, Pereira (2014) utilizou 96 suínos machos castrados, híbridos PIC x PIC na fase inicial (15 a 25 kg de peso vivo); fase de crescimento (30 a 65 kg de peso vivo) e fase de terminação (70 a 95 kg de peso vivo). Os animais foram distribuídos num delineamento em bloco casualizados para peso inicial (leve, médio e pesado) e arranjo fatorial 2 x 2 (alimentos proteicos (vegetal e animal) x relações de Trip:Lis DIE (18 e 21%) com 12 repetições de dois animais cada. As dietas experimentais (Tabela 3) foram formuladas para serem isonutritivas e atender ou exceder as recomendações de Rostagno et al. (2011). A inclusão de farinha de carne e ossos, e, farinha de penas foram respeitados as recomendações práticas de Rostagno et al. (2011).
Tabela 3. Composição das dietas basais.
Para a relação de 21% de Trip:Lis DIE, o L-Triptofano substituiu o amido nas dietas basais (vegetal ou Coprodutos). As rações e água foram fornecidas ad libitum por todo o período experimental. Determinou-se o peso final, consumo de ração diário, ganho de peso diário e a eficiência alimentar (teste de F<5%) submetido ao SAS inst.
Resultados e Discussão
Na fase inicial, não houve interação (P>0,05) dos alimentos proteicos e as relações de Trip:Lis DIE sobre o peso, consumo de ração diário, ganho de peso diário e a eficiência alimentar (Figura 3).
Clique aqui para ampliar a imagem Figura 3. Desempenho de suínos de 15 até 25 kg de peso vivo alimentados com dois alimentos proteicos e duas relações Trip:Lis DIE (P>0,05). Para o período de 30 a 65 kg de peso vivo (Tabela 4), não houve interação entre os tratamentos estudados. Os suínos alimentados com dietas contendo coprodutos de origem animal apresentaram menor consumo de ração diário (P<0,05). Os dois alimentos proteicos não influenciaram no peso final, ganho de peso diário e eficiência alimentar. Por outro lado, suínos alimentados com a relação Trp:Lis DIE de 21%, independente dos alimentos proteicos, apresentaram melhor (P<0,01) peso final, ganho de peso diário e eficiência alimentar. As duas relações Trp:Lis DIE não afetaram o consumo de ração diário.
Na fase de 70 a 95 kg de peso vivo dos suínos, não houve interação dos alimentos proteicos e das relações Trp:Lis DIE sobre o desempenho. Os alimentos proteicos não afetaram o desempenho final dos animais, porém quando alimentados com relação Trip:Lis DIE de 21% apresentaram maior ganho de peso, consumo de ração diário e ganho de peso diário. As relações Trp:Lis DIE, não afetarem a eficiência alimentar (Tabela 5).
Tabela 4. Desempenho de suínos de 30 até 65 kg de peso vivo alimentados com dois alimentos proteicos e duas relações Trip:Lis DIE.
A e b – médias seguidas de letras diferentes nas linhas são diferentes pelo teste de F (P<0,05)
Tabela 5. Desempenho de suínos de 70 até 95 kg de peso vivo alimentados com dois alimentos proteicos e duas relações Trip:Lis DIE.
A e b – médias seguidas de letras diferentes nas linhas são diferentes pelo teste de F (P<0,05)
Os resultados apresentados demonstram que coprodutos de origem animal na dieta de suínos, não comprometem negativamente o desempenho final. A sua utilização dependerá diretamente do preço, qualidade e da disponibilidade ao Nutricionista.
Para o autor, a relação Trip:Lis DIE de 18% foi suficiente para atender o desempenho dos animais no período de 15 a 25 kg de peso vivo. Por outro lado, suínos a partir de 30 kg de peso vivo alimentados com a relação Trip:Lis DIE de 21%, apresentaram melhor resposta de desempenho. A modulação do hormônio grelina no estomago dos suínos, com consequente expressão do GH pode ter influenciado no melhor desempenho dos animais (Correa-Silva et al., 2008; Pereira, 2014; Zhang et al., 2007). Também, o maior teor de triptofano nas rações independentemente dos alimentos proteicos utilizados neste experimento, pode ter promovido a melhor relação Triptofano/AANL no plasma, beneficiando a absorção de triptofano na barreira hemato-encefálica e melhorando a síntese de serotonina (Adeola & Ball, 1992), refletindo no melhor resultado de desempenho final dos animais.
Considerações Finais
Os alimentos proteicos de origem vegetal (farelo de soja) ou animal (farinha de carne e ossos + farinha de penas) estabeleceram o mesmo desempenho final dos suínos. Assim, o preço dos alimentos estudados quando associado à qualidade final e disponibilidade, parecem ser os critérios fundamentais ao uso na dieta dos suínos a partir de 15 kg de peso vivo.
A relação de Trip:Lis DIE de 21% em suínos a partir de 30 kg de peso vivo, independentemente dos alimentos proteicos estudados, é uma excelente opção para os Nutricionistas que visam o melhor desempenho; a melhor saúde e o melhor bem estar dos suínos.