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O dispêndio com leite e derivados no Brasil

Publicado: 5 de março de 2013
Por: Aryeverton Fortes de Oliveira e Glauco Rodrigues de Carvalho da Embrapa Gado de Leite.
Introdução
Este estudo apresenta estimativas para as elasticidades-renda do dispêndio com produtos lácteos no Brasil e Regiões Geográficas, ou seja, medidas para variações percentuais no dispêndio com lácteos provocadas por elevação de um ponto percentual na renda dos consumidores. As medidas são diferenciadas por estratos de renda, revelando características importantes no perfil do consumo regional e fortalecendo a análise de tendências e cenários de desenvolvimento dos negócios. As mensurações contribuem para a formulação de políticas públicas e estratégias empresariais que promovam o consumo dos produtos segundo as especificidades dos mercados regionais.
O consumo per capita aparente, exibido na Figura 1, apresenta valores que evoluem em dois patamares distintos, com uma quebra estrutural no comportamento ligada ao lançamento do Plano Real. Este deslocamento significativo mostra que a melhoria da renda pode incentivar o consumo de lácteos de maneira significativa. Também a taxa de câmbio, que favorece a importação de bens de consumo, promove flutuações à medida que se encontra apreciada (de 1995 a 1998 e de 2004 a 2005) ou depreciada (1999 a 2002). Dados para o leite fluido indicam que o consumo per capita aumentou no período em que prevaleceu uma taxa de câmbio apreciada (1995 a 1998), passando de 67,6 l/hab./ano, para 75,8 l/hab./ano, e decresceu com a desvalorização cambial, a partir de 1999, até atingir 72,7 l/hab./ano em 2002.
A análise anterior revela que mudanças no montante e na distribuição da renda têm influência positiva sobre o consumo de lácteos. A perspectiva, no entanto, é crescimento lento da renda real na economia. Uma eventual desvalorização cambial, que na atual conjuntura poderia promover as exportações do setor, tem efeito indeterminado sobre a demanda total por lácteos, à medida que o consumo interno diminui com o encarecimento de bens de consumo e queda do poder aquisitivo da população. Para dificultar mais ainda o crescimento do consumo de produtos lácteos, existe uma acirrada concorrência com sucos prontos e bebidas a base de soja nos últimos anos.
A desigualdade de rendimentos dos brasileiros, como se observa na Tabela 1, persiste em termos regionais e preserva uma oportunidade para ampliação do consumo dos lácteos, principalmente com políticas que produzam impactos positivos sobre a renda dos mais pobres. Nas regiões Nordeste e Norte a desigualdade é maior e o crescimento no consumo pode ser fortemente afetado por mudanças na distribuição de renda nessas regiões.
Os dados da POF/IBGE – 2002/03 revelam que os gastos com alimentação nas famílias com renda de até R$ 600,00 correspondem à significativa parcela de 30% de seu rendimento. Além do aumento direto nos rendimentos, aumentos no poder aquisitivo desta fatia da população podem advir de quedas dos preços dos alimentos, como as induzidas por valorizações da moeda nacional, especialmente para os produtos alimentícios com elasticidade-renda maior.
 
Metodologia
Para explicar saltos no consumo com a melhoria do poder aquisitivo, como o ocorrido no consumo durante o Plano Real, são estimadas as elasticidades-renda do dispêndio com lácteos para diferentes regiões e estratos de renda, a partir dos dados da Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE (POF) 2002-2003. As nove classes da pesquisa de orçamento familiar foram agrupadas em três estratos distintos, com os possíveis agrupamentos calculados de maneira iterativa. Uma rotina computacional foi elaborada para o cálculo das elasticidades-renda para os seis níveis geográficos, quatro agrupamentos de produtos, e 36 esquemas de agrupamento de classes distintos, resultando em um total de 846 regressões poligonais nos logaritmos.
 
Resultados e discussão
Na Tabela 2 são comparados os resultados para a POF 2002-2003 com os resultados de estudo semelhante feito por Hoffmann (2000), para a POF 1985/86. Os estratos escolhidos para descrição dos resultados para agrupamento das classes foram: o primeiro estrato, com as quatro primeiras classes; o segundo estrato, que incorpora as classes de cinco a sete; o terceiro estrato, da oitava a nona classe da POF. Este esquema de agrupamento impede que variações estranhas das elasticidades ocorram nos casos de iterações que produzem estratos com apenas uma classe. Observa-se que ao longo do tempo pouco mudaram os valores das elasticidades para os estratos de renda selecionados. Hoffmann (2000) encontrou uma elasticidade renda negativa da despesa com leite em pó integral no segundo estrato, enquanto as estimativas atuais mostram uma elasticidade negativa já no primeiro estrato. O leite em pó despontou como um bem inferior (seu consumo cai com aumentos de renda), enquanto o dispêndio com queijo tipo prato foi altamente elástico em relação à renda (aumenta mais que 1% para elevações de 1% na renda), como mostra a Tabela 2.
As estimativas de elasticidades-renda do dispêndio com lácteos no Brasil e nas diferentes regiões são apresentadas nas Tabelas de 3 à 8. Como esperado, a tabela mostra que as elasticidades-renda do dispêndio decrescem para níveis de renda mais elevados. Para o Brasil, os valores revelam que a demanda pelo agregado de leite e derivados é inelástica (para dada variação percentual na renda, a variação percentual no dispêndio com lácteos é menor). O leite em pó foi o produto com menor elasticidade-renda do dispêndio, chegando a ser um bem inferior para as classes de renda entre zero e mil e duzentos reais. O leite de vaca apresentou elasticidaderenda mais elevada para o primeiro estrato, com classes de renda entre zero e mil e duzentos reais, mas a demanda mostrou-se inelástica em relação ao rendimento. Já os queijos foram bastante mais elásticos em relação à renda em todos os estratos, com valores superiores à unidade no primeiro.
As Tabelas 4 e 5 mostram que o consumo de leite em pó é mais elástico nas regiões Norte e Nordeste do Brasil. No Nordeste o produto apresenta uma demanda bastante elástica no segundo estrato de renda, como se verifica na Tabela 5. Queijos foram produtos com elasticidades elevadas nas duas regiões, mas para os níveis de renda mais elevados os produtos exibiram demandas inelásticas, revelando semelhança no consumo de outras regiões.
A Tabela 6 mostra a elasticidade-renda do dispêndio na região Centro-Oeste. As elasticidades de leite de vaca são baixas, especialmente para o segundo estrato de renda, cujos rendimentos médios variam entre R$ 375 e R$ 639. As elasticidades dos queijos mostraram-se maiores que as dos outros produtos, mas o valor não chegou a ultrapassar a unidade. As menores elasticidades ocorreram para o leite integral em pó, com valores próximos de zero, ou seja, aumentos de renda não aumentam significativamente o dispêndio com este produto na região Centro-Oeste. Comportamento semelhante foi observado na região Sul do Brasil, como se observa na Tabela 7.
A região Sudeste, que congrega o maior mercado consumidor do país, apresenta valores de elasticidades para o agregado de leite e derivados próximos a 0,5, ou seja, o dispêndio com os produtos cresce pouco com aumentos nos rendimentos. O leite integral em pó foi apontado como um bem inferior nesta região, sendo adquirido em menores quantidades com elevações nos níveis de recebimentos. Os queijos apresentaram um pequeno grau de inelasticidade. Nesta região o leite de vaca se mostrou bastante inelástico, especialmente para as classes de rendimentos mais elevados.
 
Conclusões
Embora preços de commodities venham caindo e, conseqüentemente, melhorando o poder aquisitivo das pessoas, a participação cada vez menor dos gastos com alimentos nas despesas torna este impacto cada vez menos significativo sobre as escolhas individuais. Melhorias do poder aquisitivo dos consumidores podem aumentar o dispêndio com leite em pó principalmente no Nordeste do Brasil, e em alguma medida na região Norte. Nas outras regiões o dispêndio com o produto tende a ser reduzido com o aumento de renda. Os queijos foram os produtos com maiores elasticidades, próximas ou superiores à unidade nos dois primeiros estratos de renda construídos. Outros esforços serão envidados para integrar as estimativas de elasticidades com projeções regionais e globais do consumo de lácteos com cenários de crescimento e distribuição de rendas.
 
Referências Bibliográficas
IBGE (Rio de Janeiro, RJ). Orçamento familiar. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela/ listab1.asp? e=l&c=399>. Acesso em: 28 de março de 2006.
HOFFMANN, R. Elasticidades-renda das despesas com alimentos em regiões metropolitanas do Brasil em 1995- 96. Informações Econômicas, v. 30, n. 2, p. 17-23. 2000.
 
Anexos
Figura 1. Consumo per capita aparente de produtos lácteos no Brasil, em litros.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 1
Tabela 1 - Distribuição do número de famílias por classe de recebimento familiar.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 2
Tabela 2 - Elasticidades-renda do dispêndio com produtos lácteos.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 3
Tabela 3 - Elasticidades-renda no Brasil, em %.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 4
Tabela 4 - Elasticidades-renda na região Norte, em %.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 5
Tabela 5 - Elasticidades-renda no Nordeste, em %.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 6
Tabela 6 - Elasticidades-renda no Centro-Oeste, em %.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 7
Tabela 7 - Elasticidades-renda no Sul, em %.
O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 8
Tabela 8 - Elasticidades renda no Sudeste, em %.
 O dispêndio com leite e derivados no Brasil - Image 9

9º Congresso Panamericano de Leite / O trabalho foi originalmente publicado por Embrapa Gado de Leite / Organizado pelo Centro de Inteligência do Leite CILeite.
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Autores:
Aryeverton Fortes de Oliveira
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