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Como o melhoramento genético pode modificar a qualidade do leite

Publicado: 5 de março de 2013
Por: Maria Gabriela C. Diniz Peixoto, Marco Antônio Machado e Rui da Silva Verneque, pesquisadores da Embrapa Gado de Leite, e Luiz F. Brito, Est. de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa -UFV-, MG, e estagiário da Embrapa Gado de Leite.
A pecuária leiteira nacional vem passando, nos últimos anos, por um intenso processo de especialização da produção. Entretanto, no que diz respeito à qualidade e composição do leite, item essencial a um país que pretende ser exportador de lácteos, ainda há muito a fazer em relação a países que já participam ativamente do mercado internacional.
Uma matéria-prima de melhor qualidade e composição está associada a um maior rendimento industrial, o que permite otimizar custos de produção e oferecer produtos de melhor qualidade ao consumidor, com consequente aumento da competitividade do leite e derivados nacionais, principalmente quando se almeja um crescimento nas exportações. Além disso, com a melhoria da qualidade pode-se atender às exigências crescentes de um consumidor a cada dia mais esclarecido.
Ao se considerar a importância do leite como alimento para a população humana, além de seu interesse industrial, a preocupação com a qualidade se torna ainda maior. A gordura do leite contém muitos nutrientes necessários à dieta humana, como vitaminas lipossolúveis e lipídeos bioativos, além de ser fonte de energia. No entanto, o consumo de determinados ácidos graxos do leite tem sido associado negativamente com a saúde humana, principalmente com doenças cardiovasculares, apesar das controvérsias. Estudos têm revelado diferenças no conteúdo de ácidos graxos em diferentes raças, o que sugere a possibilidade de obtenção de produtos lácteos de qualidade nutricional diferenciada pela escolha da raça.
O leite bovino tem sete vezes mais proteínas do que o leite humano. As principais proteínas do leite são as caseínas, albuminas e globulinas. Além da importância para a alimentação humana, um aspecto de interesse à indústria reside no envolvimento das proteínas na formação do coalho para produção de queijo. As proteínas diretamente responsáveis por este processo são as caseínas e globulinas. Existem quatro formas de caseínas (alfa S1, alfa S2, beta e kappa). Estudos moleculares identificaram seis alelos para o gene da kappa-caseína e vários estudos concluíram que o alelo B está associado a uma maior capacidade de coagulação do leite, resultando em um coalho mais firme e no aumento do rendimento na produção de queijo.
Outra proteína importante para a indústria é a beta-lactoglobulina. Essa proteína é encontrada no soro do leite e, também, está envolvida no processo de coagulação do leite. Os alelos mais frequentemente encontrados em rebanhos leiteiros são o A e o B, sendo este último associado com maiores teores de caseínas no leite e, portanto, maior produção de queijo. Dessa forma, animais que possuam em sua constituição genética os alelos B para k-caseína e b-lactoglobulina irão produzir leite com maiores teor de caseínas e capacidade de coagulação.
Com respeito à lactose, sabe-se que alguns oligossacarídeos do leite bovino não apenas são fonte de nutrientes para os recém-nascidos, mas têm numerosas e importantes funções biológicas, incluindo a prevenção de ligação de patógenos ao epitélio intestinal e servindo de fonte de nutrientes às bactérias benéficas ao trato intestinal.
Um aspecto mais abrangente da qualidade do leite é o teor de sólidos (lactose, gordura, proteína, minerais, dentre outros). Algumas raças e cruzamentos apresentam leite com maior teor de sólidos, o que pode ser convenientemente aproveitado, dependendo da remuneração pela indústria. Por exemplo, a raça Holandês apresenta menores percentuais de gordura e proteína, mas maiores produções totais. Já as raças Jersey e Pardo-Suíço, apesar dos altos percentuais de gordura e proteína, apresentam produções totais inferiores à observada na raça Holandesa.
Por sua vez, a Contagem de Células Somáticas (CCS) é um parâmetro importante da qualidade do leite, pois constitui indicativo de qualidade microbiológica e está associada a uma doença de grande incidência em rebanhos leiteiros, a mastite, que afeta a produção e provoca mudanças na composição do leite e na adequação do leite para o processamento industrial.
Compreende-se, portanto, a relevância do tema composição e qualidade microbiológica do leite. Sabe-se da complexidade envolvendo a expressão das características relacionadas a este tema e que as mesmas são inerentes a cada raça leiteira e dependentes de diversos fatores de ambiente. Através de modificações ambientais, como, por exemplo, disponibilidade de alimentos de qualidade, nutrição balanceada e manejo adequado, ou seja, sanidade, bem-estar, dentre outros, pode-se obter ganhos em qualidade do leite, porém, de caráter transitório. Ao contrário dos ganhos genéticos que são duradouros.
Apesar de serem permanentes e cumulativos, os ganhos por meio do melhoramento genético são, entretanto, demorados devido ao longo intervalo de gerações dos bovinos. Sendo assim, os objetivos de seleção devem ser determinados com cautela e os programas de melhoramento devem estar atentos às tendências do mercado futuro, para que os produtores alcancem seus objetivos a tempo de usufruir das bonificações e terem maior inserção de seu produto no mercado.
Com vistas ao melhoramento genético, estudos verificaram que as produções e/ou porcentagens de gordura, de proteína e de lactose são características herdáveis e que, portanto, podem ser melhoradas por meio de seleção, ou seja, a escolha de pais de alto valor genético pode gerar progênie de alto potencial produtivo. O quanto as características são herdáveis, ou possuem de herdabilidade, varia em torno de 0,20 a 0,35 para as produções, enquanto que para as porcentagens são relatados valores mais elevados. Portanto, é possível alterar estes componentes através da seleção de reprodutores e escolha de matrizes, valendo-se da diferença dentro e entre raças. Para outros constituintes como lactose e minerais não existe, por enquanto, incentivo econômico que justifique a consideração destas características em programas de seleção. Para a CCS, a literatura científica tem relatado coeficientes de herdabilidade variando de 0,08 a 0,19. Portanto, adicionar a CCS ao programa de seleção poderá trazer benefícios à qualidade do leite, como também ao bem estar animal.
Com os avanços da biotecnologia tornou-se possível obter informações de importância estratégica e elevado valor econômico sobre o genótipo dos animais para o melhoramento por meio de seleção. De posse dessas informações, o produtor pode orientar os acasalamentos, a escolha do sêmen e adicionar a informação dos marcadores moleculares para o melhoramento genético do rebanho. Para tanto, a Embrapa Gado de Leite publica nos catálogos de touros de diferentes raças leiteiras, informações sobre o valor genético de características como produção e composição de leite, além de informações sobre o genótipo dos animais para genes que influenciam características de importância econômica.
Deve-se ressaltar, no entanto, que a seleção para altas porcentagens de gordura e proteína deve estar associada a bons patamares ou volume de produção leiteira, pois a produção de leite tem correlação alta e negativa com o teor de sólidos do leite. Faz-se, também, necessário salientar e conscientizar os produtores de que produzir leite com maior teor de sólidos é mais oneroso e, portanto, deve-se avaliar a relação custo e benefício desse investimento, ou seja, se a indústria valorizará este esforço. O pagamento do leite por qualidade, com a inclusão da proteína e da gordura no esquema de pagamento, já é uma realidade em diversos países e vem sendo executado por algumas indústrias do setor de lácteos no Brasil e, em breve, acredita-se, será prática comum.
O melhoramento genético do rebanho pode, de fato, propiciar melhorias na qualidade do leite, no entanto, cabe ao produtor a difícil tarefa de definir corretamente seus objetivos, suas metas, adotar as tecnologias acessíveis, utilizar genótipos adequados e a arte de manejar corretamente seu rebanho. Desta forma, poderá garantir a produção de leite de qualidade e a baixo custo, atendendo aos anseios da indústria e dos consumidores e permitindo sua permanência sustentável na atividade leiteira.
Literatura consultada
Brito, J.R.F., Brito, M.A.V.P. Descomplicando as células somáticas. Coronel Pacheco: EMBRAPA–CNPGL, 1998. p.75-81.
Madalena, F. E., Estratégias de uso de recursos genéticos visando melhorar a qualidade do leite e derivados. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE MELHORAMENTO ANIMAL, 7, São Carlos, 2008. Anais... São Carlos : SBMA, 2008.
Morris, C. A., Hickey, S. M., Cullen, N. G., et al. Associations between ß-casein genotype and milk yield and composition in grazing dairy cows. New Zealand Journal of Agricultural Research, v. 48, p.441-450, 2005.
Rubez, J. A era dos sólidos totais. Disponível em http://www.leitebrasil.org.br/artigos/jrubez_094.htm. Acesso em 08 de janeiro de 2009.
Soyeurt, H., Dardenne, P., Gillon, A., et al. Variation in Fatty Acid Contents of Milk and Milk Fat Within and Across Breeds, Journal of Dairy Science, v. 89, p.4858–4865, 2006.
Stoop, W. M., Arendonk, J. A. M., Heck, J. M. L., et al. Genetic Parameters for Major Milk Fatty Acids and Milk Production Traits of Dutch Holstein-Friesians, Journal of Dairy Science, v. 91, p.385-394, 2007.
Verneque, R. S., Peixoto, M. G. C. D., Machado, M. A., et al. Melhoramento genético de gado de leite. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE MELHORAMENTO ANIMAL, 7, São Carlos, 2008. Anais... São Carlos : SBMA, 2008.
Tão, N., De Peters, D.J.,German, J.B. et al.Variation in bovine milk oligosacharides during early and middle lactation analysed by high-performance liquid chromatrography-chip mass spectrometry. J. of Dairy Science, v.92, p.2991-3001, 2009.
***O trabalho foi originalmente publicado pelo Centro de Inteligência do Leite (CILeite), coordenado pela Embrapa Gado de Leite
Autores:
Maria Gabriela C. Diniz Peixoto
Embrapa
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Marco Antônio Machado
Embrapa
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Rui Da Silva Verneque
Embrapa
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Romão Miranda Vidal
5 de marzo de 2013

Srs.e Sras.
Toda a tecnologia advinda da pesquisa é destinada ao aumento da produtividade e aumento de renda do produtor, mas o segmento produtivo não retribui à altura dos esforços depreendidos desde a pesquisa até a mesa do consumidor, passando pelo produtor. A genética quando aplicada para dar os devidos resultados, no caso aqui - Melhoramento genético x Qualidade do leite, necessita de ações conjunturais específicas, como: remunerar o leite por kilo e não por litro. Quais as implicações? O produtor que possui 20 vacas SRD em lactação e produzem 100 litros/dia tem a sua remuneração igual ao produtor que possui 8 vacas de raças especializadas, que produzem 200 litros/dia, recebe praticamente o mesmo preço. Qual a política correta? Remunerar pelo teor de gordura? Pela somatória das Células Somáticas? Ou o produtor que opera 100 lts, nas mesmas exigências? Um exemplo paralelo. Soja é paga pelo teor de umidade. E se fosse paga pelo teor de óleo? Plantéis especializados passarão a produzir leite com seis alelos para o gene da kappa-caseína. Ou plantéis diferenciados geneticamente, que venham a produzir leite com o alelo B, que apresenta a uma maior capacidade de coagulação do leite. Efeito direto sobre a produção de derivados lácteos, onde normalmente se utilizam 10/1, passariam a utilizar 7/1. Quem pagaria por esta produção diferenciada? Produzir leite especial para fins especiais? Ou para o consumo geral?

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