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Sinais clínicos e lesões causadas por micotoxinas

Publicado: 23 de maio de 2013
Por: Paulo Dilkin e CA Mallmann, LAMIC - Laboratório de Análises Micotoxicológicas da Universidade Federal de Santa Maria -UFSM-, RS.
Introdução
Micotoxinas são substâncias tóxicas resultantes do metabolismo secundário de diversas cepas de fungos filamentosos. Estes se desenvolvem naturalmente em frutas, sementes, cereais e subprodutos que são muito utilizados na alimentação humana e animal. Assim, mais que quatrocentas toxinas são conhecidas. Uma vez ingeridas, causa diversos efeitos deletérios a saúde, induzindo diferentes sinais clínicos e lesões. Os tipos de sinais clínicos e lesões são intimamente relacionados a cada micotoxina, dose ingerida, período de intoxicação e espécie animal envolvida. Objetivamos relatar neste trabalho, os sinais clínicos e lesões causadas pelas principais micotoxinas, avaliadas recentemente no sul do Brasil.
 
Material e métodos
Este trabalho é fundamentado na descrição de sinais clínicos e lesões induzidas por micotoxinas em diferentes espécies de animais intoxicadas em surtos naturais ou de intoxicação experimental realizadas na última década pelo LAMIC. As atividades do laboratório consistem no monitoramento micotoxicológico, analisando aproximadamente 10.000 amostras/ano. Avaliação da qualidade de adsorventes de micotoxinas in vivo e in vitro. Contudo, também presta assistência técnica, solucionando surtos de intoxicação natural caudas por micotoxinas em diferentes espécies. Com este trabalho, diversos surtos de intoxicação foram acompanhados e identificados: aflatoxinas em suínos, e aves, fumonisinas em eqüinos e suínos, zearalenona em suínos, ocratoxina em suínos, tricotecenos em suínos e aves.
 
Resultados e discussão
A grande maioria das micotoxicoses apresentam características essencialmente sub-clínicas, cujas alterações dificilmente são percebidas na inspeção animal. Esta tendência é confirmada na medida que diversos alimentos contaminados com baixas concentrações de micotoxinas são amplamente utilizadas na alimentação animal. Por esta razão, a quantidade de surtos identificados de intoxicação crônica são significativamente maiores do que os casos de intoxicação aguda. Os sinais clínicos predominantes na micotoxicose crônica são se relacionam à diminuição do desempenho produtivo dos animais, incluindo redução da ingestão de alimentos, do ganho de peso, conversão alimentar e produção de ovos por poedeiras, hipogalactia em matrizes suínas, aumento da incidência de enfermidades no plantel, falhas vacinais e diminuição da fertilidade. O aspecto clínico dos animais geralmente é relacionados ao mau desenvolvimento, como animais magros, pêlos secos e sem brilho, mucosas e cristas pálidas, podendo ou não apresentar diferentes graus de diarréia e lote de animais desuniformes. Contudo, algumas toxinas produzem sinais clínicos característicos em diferentes espécies.
As aflatoxinas Os sinais clínicos da aflatoxicose aguda poderão iniciar 6 horas após a ingestão, traduzindo-se por severa depressão, inapetência, presença de sangue nas fezes, tremores musculares, incoordenação motora com hipertermia (até 41°C) que decresce após, podendo a morte ocorrer nas 12-24 horas seguintes. Nas intoxicações subagudas, os sinais clínicos são de evolução mais lenta, observando-se cerdas eriçadas, hiporrexia, letargia e depressão. Paralelamente, os animais podem apresentar aspecto ictérico, encontram-se desidratados e emaciados, com áreas de coloração vermelho púrpura na pele, além de perda progressiva de peso. A intoxicação crônica manifesta-se pela diminuição no ganho de peso e redução da conversão alimentar, inapetência, má aparência geral e, por vezes, diarréias. Com a progressão para os estágios finais, ocorrem freqüentemente sinais de ataxia, icterícia e, às vezes, convulsões. Em surtos de aflatoxicose no campo, uma das características mais marcantes é a má absorção que se manifesta como partículas de ração mal digeridas nas excretas das aves. Está associada com esteatorréia ou excreção aumentada de lipídeos. Em frangos de corte, a esteatorréia é acompanhada por uma diminuição nas atividades específicas e totais da lipase pancreática, principal enzima digestiva das gorduras, e pela diminuição dos sais biliares, necessários tanto para a digestão como para a absorção de gorduras, levando a esteatose hepática (fígado gorduroso). Também se observa, em frangos e poedeiras que recebem ração contaminada com AF, extrema palidez das mucosas e pernas. Esta pigmentação deficiente parece ser resultado da menor absorção, diminuição no transporte e deposição tecidual dos carotenóides da dieta sendo a aflatoxicose identificada como "síndrome da ave pálida".
Além de reduzir a produção de ovos, a aflatoxicose também é responsável pela redução do tamanho dos ovos, bem como pela redução proporcional no tamanho das gemas, devido aos prejuízos causados na síntese protéica e lipídica. Mas a deposição de cálcio na casca dos ovos por si só não é afetada, podendo inclusive aumenta-la e dificultar a eclosão. A postura é afetada somente 14 dias após o início da intoxicação, enquanto a eclodibilidade começa a ser afetada imediatamente após o início do consumo de ração contaminada.
Quando a toxina é ingerida em níveis mais elevados, o fígado apresenta degeneração gordurosa, necrose lobular com incremento de células basofílicas na periferia do lóbulo, proliferação dos ductos biliares e cirrose. A icterícia da carcaça, associada ao fígado edemaciado e amarelado são indicativos muito fortes de intoxicação. A vesícula biliar pode estar edemaciada e o fígado friável e hiperêmico, principalmente nos casos de intoxicação aguda. Também ocorre uma diminuição do tempo de coagulação sangüínea, podendo observar-se coleções líquidas sanguinolentas nas cavidades bem como em mucosas e hemorragias em massas musculares.
Em eqüinos, as fumonisinas possuem tropismo especial pelo sistema nervoso central, onde produzem uma necrose liquefativa da substância branca, cuja lesão é denominada leucoencefalomalácia Assim, eqüinos intoxicados por fumonisinas apresentam distúrbios nervosos. Os sinais clínicos caracterizam-se por inapetência, fraqueza generalizada, sonolência, anorexia, lentidão ao caminhar, depressão, sinais de cegueira, desorientação seguida por ataxia, tendência de permanecer com os membros anteriores cruzados, andar em círculo, batidas contra cercas e objetos, decúbito lateral e movimentos de pedalar até a morte. As alterações anatomopatológicas mais observadas estão relacionadas a assimetria dos hemisférios cerebrais, achatamento das circunvoluções. Ao corte transversal do encéfalo, visualiza-se as áreas focais de hemorragias, distribuídas aleatoriamente pela substância branca subcortical. A formação de áreas cavitárias maiores que 8 cm são freqüentemente observadas. As áreas com necrose de liquefação se caracterizam pela formação de cavitações multifocais na substância branca, que contém material encefálico fragmentado e amolecido, formando uma massa pastosa de coloração brancoacinzentada. Em suínos intoxicados pela mesma micotoxina, pode induzir o edema pulmonar e hidrotórax. Os principais sinais clínicos são relacionados ao sistema cardio-respiratório, como aumento da freqüência respiratória, respiração abdominal e cianose. Em aves a fumonisina causa aumento do consumo de água e ração, bem como diarréia escura e pegajosa com diminuição no ganho de peso. Frangos intoxicados com FB1 apresentaram diminuição do desempenho produtivo, diarréia, inapetência, lesões orais, aumento de peso do fígado e alta mortalidade.
A zearalenona possui destacados efeitos estrogênicos em suínos. A ação desta toxina se dá pelo estímulo aos receptores estrogênicos citoplasmáticos, incrementando a síntese protéica no aparelho reprodutor. Conseqüentemente, a secreção das células endometriais, síntese das proteínas uterinas e o peso do trato reprodutivo são aumentados. Estas alterações podem levar à pseudogestação pela manutenção de corpo lúteo. Leva a quadros caracterizados por vulvovaginite, leitões fracos e natimortos e, muitas vezes, a um quadro de splayleg. Também pode-se observar uma marcada redução nas taxas de concepção, acompanhadas da repetição de cio. A intoxicação mimetiza o estro e os leitões recém-nascidos poderão apresentar os sinais clínicos, caracterizados como vulvovaginite infantil. Útero, cérvix, vagina e vulva poderão encontrar-se espessados, ocorrendo edema e proliferação em todas as camadas destes órgãos, causada por uma combinação de hiperplasia e hipertrofia. Em machos jovens a toxina causa feminização, incluindo edema de prepúcio, atrofia testicular e aumento da glândula mamária, porém, estas alterações aparentemente, não levam a efeitos sobre a capacidade reprodutiva, quando adulto. Em cachaços, a redução da libido, bem como, uma discreta redução sobre a qualidade espermática pode ser observada.
A ocratoxina A afeta principalmente os rins. Causa alteração da filtração glomerular e prejuízos na função dos túbulos contornados proximais são os principais prejuízos da intoxicação por ocratoxina A, levando a perda da capacidade de concentração urinária. A ocratoxicose em suínos traduz-se por uma intoxicação que cursa com diminuição do ganho de peso, sinais clínicos caracterizados por polidipsia e poliúria, além de lesões renais que podem levar a hematúria. Doses de 200 mg/kg de OTA na ração foram suficientes para que os animais apresentassem nefropatias, levando a reflexos negativos sobre a conversão alimentar e o ganho de peso. A mortalidade pode chegar a 90% nos lotes afetados.
Tricotecenos compreendem cerca de uma centena de micotoxinas. Nivalenol e Deoxinivalenol induzem recusa de alimentos e perda de peso. Nível combinado menor que 0,4 mg/kg é descrito como aceitável (para suínos, os quais são relativamente susceptíveis), enquanto mais de 2,0 mg/kg é sempre inaceitável. Os tricotecenos estão relacionados à recusa alimentar e distúrbios gástricos em suínos. Em aves se observa principalmente lesões erosivas e ulcerosas na mucosa oral e comissura labial quando ingerem a toxina T-2. Os tricotecenos atuam inibindo a enzima peptil-transferase, desta forma diminuindo a síntese protéica o que afeta principalmente células em divisão ativa, como as do trato gastrintestinal, pele e células linfóides, eritróides e órgãos vitais. São imunossupressores e também associados a hemorragias, sendo que o tempo da protrombina é aumentado significativamente, porém o fator primário da hemorragia é pela diminuição do fator VII da coagulação sangüínea. As intoxicações por TCT acarretam recusa de alimentos, vômito, redução na conversão alimentar e diarréia. A síndrome sanguinolenta, produzida pela toxina T-2, se caracteriza pela ocorrência de dermatites, abortamentos, distúrbios nervosos, hemorragias gástricas e vicerais. Todos os TCT podem ser agudamente letais. Porém os maiores problemas tendem a ser as toxicoses subagudas chegando a cronicidade, as quais levam a efeitos inespecíficos associados ao mau desempenho. Lesões macroscópicas após a necropsia nem sempre são evidentes, embora que um aumento do volume do fígado, hemorragia em linfonódios e erosões no estômago e intestinos possam ser observados.
A ingestão de Alcalóides de ergotamina por suínos levam ao aumento da ingestão de água, e poliúria. A toxina apresenta ações ocitócicas e vasoconstritivas, clinicamente observadas pela isquemia das extremidades, como orelhas, focinho, pernas e cauda. Em surtos graves ocorre a gangrena, levando freqüentemente a perda de órgãos por processos degenerativos e necróticos. A freqüência cardíaca decresce e a pressão arterial aumenta à medida que aumenta a quantidade de alcalóides ingeridos.
Ergotismo gangrenoso tem sido diagnosticado em lactantes de porcas intoxicadas, embora a hipogalactia ou agalactia seja sempre o primeiro sinal clínico da intoxicação, que pode ser produzida com uma dose única de ergocriptina administrada oralmente 24 horas do parto. Acreditase que o efeito primário seja pela inibição da prolactina. A redução do tamanho do mamilo das tetas ocorre concomitantemente à diminuição da produção de leite.
 
Conclusões
As micotoxicoses representam um importante fator clínico nas espécies domésticas. O devido reconhecimento dos sinais clínicos é impressindível para minimizar as perdas econômicas decorrentes, bem como a adoção de medidas profiláticas adequadas.
 
Referências bibliográficas
Dilkin, P; et al. Toxicológical effects of chronic low doses of aflatoxin B1 and fumonisin B1-containing Fusarium moniliforme culture material in weaned piglets. Food and Chemical Toxicology, v. 41, p. 1345-1353. 2003.
Leeson, S.; et al. Poultry disorders and mycotoxins. Guelph, Ontário, Canadá, pp. 352. 1995.
Mallmann, C.A. et al. Aflatoxinas – Aspectos clínicos e toxicológicos em suínos. Ciência Rural, v. 24, n. 3, p. 635-643, 1994.
Mallmann, C.A. & Dilkin, P. Micotoxinas: clínica e diagnóstico em suínos. Pg. 191 - 222. In: Tópicos em suinocultura II. 312 p. Pigpel. Associação Pelotense de Suinocultores. Corrêa, M.N.; Lucia Jr, T.; Deschamps, J.C. Ed. PRINTPAR Gráfica e Editora Ltda.
Mallmann, C.A. et al. Equine leukoencephalomalacia associated with ingestion of corn contaminated with fumonisin B1. Revista de Microbiologia, v. 30, p. 249-252, 1999.

***Trabalho apresentado - Anais do XI Encontro Nacional de Micotoxinas, 30/06 a 02/07 2004. Realizado em Piracicaba – SP, Universidade de  São Paulo – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz.
Tópicos relacionados:
Autores:
Prof. Mallmann
LAMIC -  LABORATÓRIO DE ANÁLISES MICOTOXICOLÓGICAS
LAMIC - LABORATÓRIO DE ANÁLISES MICOTOXICOLÓGICAS
Paulo Dilkin
LAMIC -  LABORATÓRIO DE ANÁLISES MICOTOXICOLÓGICAS
LAMIC - LABORATÓRIO DE ANÁLISES MICOTOXICOLÓGICAS
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