INTRODUÇÃO
A produção brasileira de carne de frango tem sido destaque no mundo há alguns anos. De acordo com o Relatório Anual da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) em 2019 foram produzidos 13,245 milhões de toneladas de carne de frango, sendo que desse total, 68% destinaram-se a abastecer o mercado interno e 32% foram exportados. O consumo da carne vem crescendo em nosso país, tendo seu auge em 2011 com 47,38 kg/hab/ ano. Entretanto, houve um decréscimo no consumo per capita de carne de frango em anos sucessivos, sendo que em 2019 o consumo foi de 42,84 kg/hab, resultado melhor que no ano de 2018 (ABPA, 2020).
Mesmo com o progresso na comercialização de carcaças, tanto na forma inteira, corte e industrializados, o mercado avícola ainda sofre modificações, devendo obedecer criteriosamente a requisitos técnicos e higiênicos sanitários estabelecidos por órgãos regulamentadores como Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (DIPOA) e União Brasileira dos Avicultores (UBA) (SILVA et al., 2017).
A carne de frango in natura em condições de má higiene estará propícia à contaminação por alguns microrganismos de importância para a saúde pública, como a Salmonella spp. e Staphylococcus. As etapas de resfriamento ou congelamento são os fatores mais importantes na redução da atividade bacteriana (FRIES, 2017).
O conceito de qualidade é bastante comum e plausível em indústrias de alimentos e no comércio, e quando se trata de qualidade e segurança dos alimentos o consumidor não pensa duas vezes ao levar o produto. São realizados diversos tipos de fiscalizações, mas ainda assim, ocorrem fraudes de todo tipo. Diversos consumidores têm reclamado do grande acúmulo de água produzido ao descongelar as carnes de aves. Com o intuito de controlar esta situação e reprimir as fraudes que muitos estabelecimentos processadores efetivam, e sabendo que as carcaças ganham peso quando submetidas ao processo de resfriamento, foi estabelecido o método Dripping Test (DT), que tem como objetivo determinar a quantidade de água absorvida durante o processo industrial (GARNICA et al., 2014).
O Dripping Test é utilizado para determinar a quantidade de água resultante do descongelamento de carcaças congeladas. Se a quantidade de água decorrente do degelo, expressa em percentagem do peso da carcaça com todas as partes comestíveis na embalagem, ultrapassar o valor limite de 6%, considera-se que a carcaça absorveu um excesso de água durante o pré-resfriamento por imersão em água, sendo considerada então uma fraude (BRASIL, 2014).
Neste contexto este trabalho tem o propósito de apresentar uma revisão acerca dos aspectos relacionados à retenção de água em carcaças de frangos e os métodos usados para a medição, controle e prevenção de fraudes.
DESENVOLVIMENTO
Abate e processamento de frangos de corte
O manejo antes do abate tem suma importância para a qualidade final da carcaça, e logo após o pré-abate o animal passa pelos procedimentos necessários para que seja abatido.
O processo de abate de aves no Brasil é realizado de acordo com o Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária dos Produtos de Origem Animal (RIISPOA), de 29 de março de 1952 e a Portaria 210 de 10 de novembro de 1998. Conforme o fluxograma de etapas de abate de aves padronizado na maioria dos frigoríficos, o procedimento se inicia na recepção das aves, pendura, insensibilização, sangria, escaldagem, depenagem, corte dos pés, evisceração, pré-resfriamento, resfriamento, cortes, pesagem, embalagem e congelamento.
De acordo com a Portaria 210/1998 do MAPA, a recepção das aves ocorre com diversas análises de documentos, inclusive o Boletim Sanitário, é instalada em plataforma coberta, devidamente protegida dos ventos predominantes e da incidência direta dos raios solares, a critério da Inspeção Federal, essa seção pode ser parcial ou totalmente fechada, atendendo as condições climáticas regionais, desde que não haja prejuízo para a ventilação e iluminação, não é permitida a higienização de veículos transportadores de aves vivas nas áreas de descarga junto a plataforma de recepção, exceto para os casos de emprego de instalações móveis de vedação completa do veículo, caracterizado como sistema fechado, dotado de escoamento e canalização própria de resíduos.
É importante oferecer, dentro de um espaço de tempo adequado, condições térmicas satisfatórias para manter o animal em conforto após o transporte até a chegada à linha do abate. A espera nos abatedouros tem sido uma fonte potencial de estresse para os frangos, que aumenta a quantidade de aves mortas (SILVA; VIEIRA, 2010).
As aves passam pelo estágio de insensibilização, no qual são imersas em um tanque com água e logo depois recebem uma descarga elétrica. O intuito desse processo é imobilizar as aves, evitando que se debatam e levantem a cabeça no ato da sangria. Esse estágio não deve promover, em nenhuma hipótese, a morte das aves e deve ser seguida de sangria no prazo máximo de 12 (doze) segundos (Intensidade: 0,12 A ou 120 mA, com a resistência de 1.000 a 2600 Ω). As voltagens e a amperagem são controladas de acordo com o tamanho e peso da ave (MENDES; KOMIYAMA, 2011).
Após a insensibilização, inicia-se o estágio de sangria, que se constitui no escoamento do sangue, retirando cerca de 40 a 50% do seu volume, representando cerca de 7% do peso vivo da ave. Quando esses estágios são realizados de forma incorreta ocorrem as maiores perdas de produto e condenações (FRIES, 2017). Em seguida, os frangos seguem para o tanque de escaldagem, onde são escaldados a temperatura de 60ºC, após esta etapa passam por uma depenadeira para a retirada das penas, passam pelo corta-patas, são transferidos para outra linha e vão para o setor de evisceração, onde é realizada toda a limpeza do frango (CIMA; OPAZO, 2009).
Schilling (2014) ressalta que as aves são submetidas ao processo de escaldagem para remover impurezas, o sangue da superfície externa e também facilitar a remoção das penas no processo de depenagem. Para este processo, se destaca a imersão em tanque com água quente, chuveiros de água quente e aplicação de vapor, sendo a escaldagem por imersão o método mais utilizado.
A depenagem é efetuada mecanicamente por dedos vibratórios de borracha flexível em máquinas depenadeiras, que podem ser estáticas ou em série, com alimentação contínua de água fria através de chuveiros, com vazão constante por todo o período de abate (MENDES; KOMIYAMA, 2011).
O frango ainda é submetido a lavagens com água em procedimentos tecnológicos. Antes da evisceração, as carcaças deverão ser lavadas em chuveiros de aspersão dotados de água sob pressão, e logo após a evisceração as carcaças são novamente lavadas, a fim de eliminar a carga microbiana superficial e então direcionadas ao pré-resfriamento (BRASIL, 2014).
Imediatamente ao pré-resfriamento, deve ser realizado o gotejamento para o escorrimento da água contida na carcaça que foi absorvida no processo. As carcaças são suspensas pelas asas ou pescoço, em equipamento de material inoxidável, dispondo de calha coletora de água de gotejamento. Ao final desta fase, a absorção da água nas carcaças de aves submetidas ao pré-resfriamento por imersão, não deverá ultrapassar a 8% de seu peso de acordo com o Método de Controle Interno (BRASIL, 1998). Após o gotejamento, as aves seguem para o espostejamento ou para a embalagem.
É na fase de pré-resfriamento que pode ocorrer uma maior absorção de água. Porém, uma pequena absorção de 3% de água em média, ainda ocorre nas etapas de escaldagem, depenagem e evisceração (BRASIL, 1998).
Sistema de pré-resfriamento e resfriamento das carcaças de frango (Chiller)
Processos bioquímicos e mudanças estruturais que ocorrem no músculo durante as primeiras 24 horas após a morte desempenham um grande papel na qualidade final e palatabilidade da carne e são influenciados pelos processos de resfriamento que as carcaças são submetidas após o abate (CARCIOFI; LAURINDO, 2007).
De acordo com a Portaria 210/1998 do MAPA, o resfriamento é o processo de refrigeração e manutenção da temperatura entre 0ºC a 4ºC dos produtos de aves (carcaças, cortes ou recortes, miúdos e/ou derivados), com tolerância de 1ºC. Enquanto que o pré-resfriamento é o processo de rebaixamento da temperatura das carcaças de aves, imediatamente após as etapas de evisceração e lavagem, realizado por sistema de imersão em água gelada e/ ou água e gelo ou passagem por túnel de resfriamento, obedecidos os respectivos critérios técnicos específicos.
Entre as etapas críticas no processamento de carcaças de aves, destaca-se o pré-resfriamento (PR), que tem a função principal de retardar a multiplicação microbiana e facilitar os processos de resfriamento e congelamento (SIMAS et al., 2013). O pré-resfriamento serve para reidratar o frango, e em sua sequência, vem o resfriamento, onde atinge uma temperatura de 4ºC, para fins de conservação do produto. Concluídas estas etapas, os frangos são pendurados em linhas distintas de acordo com o mercado: frango inteiro ou cortes de frango (CIMA; OPAZO, 2009).
O PR, quando bem conduzido, reduz a contaminação microbiana, entretanto, quando não realizado de forma adequada, pode levar ao aumento da Salmonella sp. (OLIVEIRA et al., 2012).
No PR ocorre a reidratação da carcaça, que recupera a água perdida durante o transporte e nas operações iniciais. Quando a temperatura é diminuída, pode-se evitar uma possível proliferação da flora microbiana presente na carcaça. Além disso, também se evita a queda brusca do pH no músculo e a ação descontrolada das enzimas naturais proteolíticas (FRIES, 2017).
Porém, se a renovação da água do tanque não acontecer de forma correta com o controle de temperatura e adequado teor de cloro na água do chiller, pode acontecer o aumento da contaminação microbiana das carcaças (ROSA, 2014).
Portanto, para que o PR seja feito de forma eficiente e adequada, alguns parâmetros devem ser monitorados, dentre eles: a renovação adequada, a temperatura e o sentido contracorrente da água, os níveis de cloro, o tempo adequado de passagem da carcaça e a carga bacteriana inicial (SIMAS et al., 2013).
Em concordância com o MAPA (1998), o PR das carcaças de frangos pode ser efetivado através de aspersão de água gelada, imersão em água por resfriadores contínuos tipo rosca sem fim (chillers) ou resfriamento por ar (câmaras frigoríficas). O resfriamento industrial de carcaças habitualmente é efetuado pela imersão das carcaças em tanques de inox (chiller) preenchidos com água ou gelo, onde passam por um sistema de rosca sem fim (VIANA, 2016). Entretanto, neste processo, além de ocorrer a redução da temperatura, também acontece a absorção de água pelas carcaças.
Carciofi e Laurindo (2010) afirmam que o sistema de resfriamento de frangos por imersão é de maior eficiência por sua rapidez, sendo amplamente utilizado na América do Norte e do Sul, principalmente no Brasil e Estados Unidos, dois dos maiores países produtores de carne de aves do mundo.
Durante o pré-resfriamento por imersão as carcaças são movidas por tanques contendo uma mistura de gelo e água. A temperatura da água, a pressão hidrostática e as condições de agitação da água são determinantes na quantidade de água absorvida pelas carcaças de frango durante este tipo de resfriamento (SAVELL et al., 2005). De acordo com a portaria 210/98 do MAPA, a temperatura máxima da carcaça na saída do segundo resfriador deve ser de 7,0 ± 5ºC imediatamente após o abate e a evisceração (SHIMOKOMAKI et al., 2014).
Na etapa de pré-resfriamento é onde ocorre a maior absorção de água, devido ao fato de ocorrer a incorporação de água através das fibras musculares da carne, por isso a importância de monitorar constantemente a temperatura da água, tempo de imersão e o sistema de borbulho para que não absorva água excedente a fim de prejudicar o consumidor (FRIES, 2017).
Lorenzetti et al. (2018) avaliaram a influência da absorção e o gotejamento de água (Dripping Test) de carcaças de frango em função do processamento e pré-resfriamento da carne em um resfriador industrial, utilizando um total de 1.179 carcaças. Os autores concluíram que os melhores parâmetros para garantir níveis de absorção e testes de gotejamento dentro dos limites aceitáveis em carcaças de frango foram tempo total de residência de 60 min (no pré-resfriador, no resfriador 1 e no resfriador 2); pressão de ar dos chillers a 0,5 bar; abertura abdominal das carcaças com um máximo de 2 cm. Esses parâmetros não influenciaram o conteúdo de proteína, razão umidade/proteína, pH ou conteúdo lipídico.
Métodos de controle do índice de absorção de água pelas carcaças de aves submetidas ao pré-resfriamento por imersão em água
Entende-se por índice de absorção o percentual de água adquirida pelas carcaças de aves durante o processo de matança e demais operações tecnológicas, principalmente no sistema de pré resfriamento por imersão, uma vez que pequeno percentual de água absorvida ocorre durante a escaldagem, depenagem e diversas lavagens na linha de evisceração (em média até 3%) (BRASIL, 1998).
A absorção de água é importante para que haja a reposição da água perdida durante o processo de pré-abate e também para que haja a hidratação das proteínas (FRIES, 2017).
O sistema de controle da absorção de água em carcaças de aves submetidas ao pré- -resfriamento por imersão deve ser eficiente e efetivo, sem margem a qualquer prejuízo na qualidade do produto final.
Um fator que pode vir a influenciar na absorção excessiva na carcaça de frango são suas partes, como pescoço e a coxa aberta durante a evisceração. Carcaças com pescoço absorvem muito mais água do que as sem pescoço. Também são causas de absorção de água acima do limite estabelecido por lei, o peso ou tamanho da carcaça, quanto menor for a carcaça mais água irá absorver (FRIES, 2017).
Deste modo, o excesso de água não é imperiosamente decorrente da injeção fraudulenta de água no produto, mas sim do ajuste inadequado de variáveis que influenciam no processo, das oscilações de temperatura de armazenamento que podem causar a formação de cristais de gelo irregulares, promovendo a injúria das fibras e demais estruturas da carne, ocasionando a migração de umidade quando do descongelamento e possivelmente, de estresse acarretado por manejos inadequados (ARALI, 2014).
Os métodos oficiais para o controle do índice de absorção de água são o Método de Controle Interno, realizado em nível de processamento industrial pela indústria local e o Dripping test para controle de absorção de água em carcaças congeladas de aves submetidas ao pré-resfriamento por imersão.
O limite máximo de absorção e perda de água pelo teste de absorção em carcaças de frango in natura e congeladas, permitido pela Portaria 210/98 regulamentado pela Lei Nº 7.889, de 23.11.1989 do MAPA é de 8,0% e no Dripping Test esse valor não pode ultrapassar 6,0%.
Método de Controle Interno - Teste de Absorção
É um método de controle interno da indústria que se baseia na comparação dos pesos das carcaças devidamente identificadas, antes e depois do pré-resfriamento por imersão. A água absorvida durante o PR por imersão está diretamente relacionada, principalmente, com a temperatura da água dos resfriadores, tempo de permanência no sistema, tipo de corte abdominal, injeção de ar no sistema (borbulhamento) e outros fatores menos significativos (BRASIL, 1998).
A quantidade de água determinada por este método exprime-se em percentagem do peso total da carcaça de ave no limite máximo de 8% de seus pesos e para cada teste necessita-se de no mínimo 10 carcaças. De acordo com a Portaria 210/1998 do MAPA, recomenda-se no mínimo 1 (um) teste para cada turno de trabalho (quatro horas).
O procedimento consiste em separar as carcaças a serem testadas após a saída do chuveiro da calha de evisceração; retirar a água das cavidades, deixando escorrer; pesar, individual ou coletivamente, as carcaças a serem testadas, determinando assim o peso inicial (Pi); identificar as carcaças em teste antes de entrarem no sistema de pré resfriamento por imersão; retirar as carcaças em teste para pesagem somente após o gotejamento das mesmas; pesar, individualmente ou coletivamente, as carcaças em teste, determinando assim o peso final (Pf).
A diferença (D) entre o peso inicial (Pi) e o peso final (Pf) multiplicada por 100 e dividida pelo peso inicial (Pi), determina o percentual de água absorvida (A) durante o processamento.
Se, para a amostra de no mínimo 10 carcaças, a quantidade média de água absorvida for superior a 8%, considera-se que a quantidade de água absorvida durante o resfriamento por imersão tenha ultrapassado o valor limite (AGRODEFESA, 2019).
Método de gotejamento (Dripping Test)
Com o objetivo de controlar o percentual de água nas carcaças e coibir a prática de fraude durante a etapa de pré-resfriamento e resfriamento pelos estabelecimentos processadores, visto que as carcaças ganham peso quando submetidas ao resfriamento, estabeleceu-se o Dripping Test (DT), que visa determinar a quantidade de água absorvida durante o processo industrial (GARNICA et al., 2014).
O método de gotejamento (Dripping Test) é utilizado para determinar o teor de líquido perdido por degelo de aves congeladas, através de ensaio gravimétrico. O percentual de água das carcaças com os miúdos não pode ultrapassar o limite de 6% de água em relação ao peso da carcaça, em até seis frangos do mesmo lote. A legislação considera que valores acima do limite estabelecido indicam absorção de maior quantidade de água nas carcaças durante a etapa de pré-resfriamento por imersão (BRASIL, 2014).
Através da Portaria SDA nº 210, de 10 de novembro de 1998, a Secretaria de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura determina que frangos congelados sem tempero não devam conter mais de 6% de água além de sua umidade natural. A portaria também descreve a metodologia de quantificação de água perdida pós-descongelamento, denominada Drip Test ou Dripping Test.
O Dripping Test é realizado em frigoríficos e visa detectar possíveis fraudes por excesso de água em carcaças de frango congeladas. A Portaria nº 210/98 e o Ofício Circular nº 13/08, ambos do MAPA, ressaltam que este teste é obrigatório por lei, e deve ser realizado diariamente por um fiscal do Serviço de Inspeção Federal (SIF) e anualmente por um fiscal do MAPA (SOUZA, 2014).
De acordo com a legislação, cada item de ensaio é composto por seis unidades (uma unidade = uma carcaça de ave). O ensaio deve ser iniciado com as aves a uma temperatura de -12ºC. Deve-se enxugar o lado externo da embalagem de modo a eliminar todo o líquido e gelo e depois pesar a embalagem com seu conteúdo, obtendo-se “M0”, expresso em gramas e registrar esta pesagem. Após pesar, retirar a carcaça congelada de dentro da embalagem com as vísceras, se houver, enxugar a embalagem e pesar novamente, obtendo “M1”.
Deve-se introduzir a carcaça com os miúdos em um saco plástico, colocando a cavidade abdominal voltada para o fundo do saco plástico, retirar o excesso de ar por meio de pressão manual, fechar com barbante e colocar dentro de uma rede plástica. Pendurar no banho de modo que a carcaça fique mergulhada de tal maneira que a água não penetre no interior do mesmo. Então repetir o procedimento para cada uma das carcaças. Deve-se manter as carcaças verticalmente com o auxílio de pesos, sendo que os sacos individuais não devem tocar uns nos outros. O conjunto deve permanecer no banho com circulação de água mantida a 42 ± 2ºC por um determinado tempo de acordo com o peso da carcaça, segundo o Quadro 1 (BRASIL, 2014).
Quadro 1. Tempo de imersão das carcaças de acordo com o peso, conforme estabelecido pelo MAPA.
Para lotes com pesos diferentes, colocar primeiro no banho as aves mais pesadas. Para cada 100g menos, deixa-se passar 7 minutos, coloca-se então o próximo lote e assim por diante. No final todas as aves sairão ao mesmo tempo.
Realizado o procedimento de imersão, deve-se fazer um orifício na parte interior da embalagem, de modo que a água liberada pelo descongelamento possa escorrer. Após fazer o orifício, a embalagem e seu conteúdo deverão ficar por uma hora a temperatura ambiente entre 18 e 25ºC. A ave e as vísceras devem ser retiradas da embalagem para escoar e logo após, devem serem enxutas. Faz-se então a pesagem da ave descongelada juntamente com as vísceras e sua embalagem, obtendo-se a medida “M2”. A pesagem da embalagem que continha as vísceras, fornece a medida “M3”. (BRASIL, 1998).
Em seguida, é realizada uma equação com o intuito de calcular o valor do Dripping test:
M0 = Peso da carcaça congelada (com as vísceras) com a embalagem comercial.
M1 = Peso da embalagem comercial.
M2 = Peso da carcaça descongelada (com as vísceras e sua embalagem).
M3 = Peso da embalagem das vísceras.
Se, para a amostra de seis carcaças de mesma marca e lote, a quantidade média de água resultante do descongelamento for superior a 6%, considera-se que a quantidade de água absorvida durante o pré-resfriamento por imersão ultrapassa o valor limite.
Análises da retenção de água em carcaças de frangos congelados
Vários trabalhos têm sido realizados em diferentes regiões do Brasil com a finalidade de determinar o teor de água retido em carcaças ou cortes congelados de frangos através do Dripping Test e verificar se a indústria atende ou não à legislação em vigor. Kato et al. (2013) avaliaram pH, capacidade de retenção de água e teste de gotejamento de cinco marcas de frangos congelados comercializadas em supermercados de Londrina/PR e verificaram que três marcas apresentaram valores de gotejamento acima de 6%. Do mesmo modo, Souza (2014) verificaram que duas das três marcas analisadas em Francisco Beltrão/PR apresentaram elevada percentagem de absorção de água; assim como, Mafra (2014) relatou que, de cinco marcas de frangos congelados avaliadas em Londrina/PR, três marcas tiveram seus resultados acima do permitido pela legislação.
Foi realizada uma avaliação de 45 amostras de seis carcaças de frangos de quatro abatedouros diferentes em São Paulo/SP por Garnica et al. (2014), e constatado que apenas 4,44% (2/45) das amostras apresentaram valores de gotejamento acima do limite permitido. Uma outra pesquisa desenvolvida por Silva et al. (2016) concluiu que cinco marcas de filé de peito, quatro marcas de coxas com pele e quatro marcas de coxas sem pele de frangos avaliados em Niterói/RJ apresentaram teor de umidade acima do preconizado pela legislação.
Silva et al. (2017) analisaram duas marcas de frangos congelados nos municípios paraenses Conceição do Araguaia, Redenção, Rio Maria e Xinguara e verificaram que 97,9% das amostras avaliadas apresentaram percentual de hidratação acima do permitido. Da mesma forma, Repetti, et al. (2017) observaram que amostras de 18 carcaças de frangos de três marcas avaliadas em Marília/SP apresentaram teor de água superior ao permitido.
Entretanto, Fries et al. (2017) observaram que todas as amostras de frangos congelados analisados em Lajeado/RS atenderam aos padrões exigidos pelo MAPA. Queiroz et al. (2017) relataram que de três marcas avaliadas em Rio Branco/AC, apenas uma possuía teor de água acima do limite de 6% estabelecido pelo MAPA. Resultados semelhantes foram encontrados por Gonçalo et al. (2020), em que foram avaliadas seis marcas de frangos e apenas três delas apresentaram valores acima do permitido pela legislação.
As fraudes nas indústrias alimentícias visam conseguir um maior lucro sobre os produtos e conceder-lhes características como o excesso de água do frango, com o desígnio de ampliar o peso da carcaça através da incorporação de água, gerando então, resultados fora do padrão estabelecido pela Portaria 210 de 1998 e prejudicando consequentemente o consumidor (FRIES, 2017).
De todos os trabalhos relatados acima, apenas um apresentou todos os valores dentro dos padrões, sendo que a maioria dos estudos manifestou que a maioria das marcas de frangos congelados estavam com teores de água acima do limite preconizado pela legislação. Os resultados de percentual de hidratação elevada, além de afetar o bolso do consumidor, pode também afetar a saúde, pois na maioria dos trabalhos também foi apontada a má qualidade da carne analisada, como por exemplo a carne PSE (pálida, mole e exsudativa) ou com a presença de microrganismos (Salmonella spp).
Em um teste comparativo, realizado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) em 2004 entre oito marcas de aves congeladas existentes em supermercados de São Paulo, foi constatado que o consumidor brasileiro não tem uma adequada proteção em relação às carnes de frango congeladas (IDEC, 2005).
Pasqualetto (2001) realizou um estudo que demostrou que das 84 amostras analisadas no centro-oeste brasileiro, 74,57% se encontravam com médias superiores ao valor estipulado pela legislação. No Distrito Federal, Alonso (2004) relatou que de três marcas analisadas, notou-se que duas das amostras não correspondiam aos pré-requisitos exigidos pelo MAPA.
Programa de prevenção e controle de absorção de água em carcaças de aves
Em decorrência de fraudes por excesso de absorção de água em frangos e as empresas produtoras de carne de aves terem sido alvo de reclamações dos consumidores, o Programa de Combate à Fraude por Adição de Água em Carcaças de Aves, cujo objetivo é coibir a prática de fraude econômica que ocorre durante o processo de resfriamento das carcaças de aves por ocasião do abate, iniciou-se em 2000. O Programa segue os parâmetros definidos na Portaria nº 210, de 10 de novembro de 1998, que aprovou o Regulamento Técnico de Inspeção Tecnológica e Higiênico-Sanitária de Carnes de Aves, no qual estabelece-se a metodologia de análise (Drip Test) e determina-se o limite máximo de 6% de água resultante do descongelamento das carcaças congeladas (BRASIL, 2007).
O Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal – DIPOA do MAPA vem intensificando as ações de combate a essa fraude econômica, em âmbito nacional. Uma das ações é a disseminação da Instrução Normativa que serviu de influência para análises oficiais do MAPA, que são realizadas mensalmente pelas unidades Estaduais do Ministério da Agricultura e a elaboração de um Programa específico para controle de fraudes econômicas, o qual foi chamado de Programa de Prevenção e Controle da Adição de Água aos Produtos (PPCAAP), através do Ofício Circular nº 010/2005, substituindo o Ofício nº 009/2004 (ARALI, 2014).
Desde o ano de 2005 as empresas foram obrigadas a desenvolver seu Programa de Prevenção e Controle de Adição de Água aos Produtos, descrevendo os controles executados para fins de prevenção de possíveis fraudes econômicas decorrentes dos diferentes processos produtivos na indústria de carne de aves e derivados, principalmente relacionados ao aumento na quantidade de água e salmoura agregada às carcaças, cortes e produtos de carne de aves (BRASIL, 2008).
O PPCAAP da AGRODEFESA (Agência Goiana de Defesa Animal) tem o objetivo de coibir a prática de fraude no processo de absorção de água durante o pré-resfriamento de carcaças de aves e na fabricação de carne de aves temperadas. O programa enfatiza que a empresa deve descrever quais são as ações corretivas/preventivas em cada caso para retomar a conformidade das análises. É fundamental que após um histórico de ocorrências, seja iniciado um processo de ações preventivas com o intuito de prevenir reincidências, além de outras medidas que também poderão ser adotadas conforme julgamento dos responsáveis pelo estabelecimento (AGRODEFESA, 2019).
Fiscalização e monitoria nas indústrias
Com o aumento da demanda interna e externa pela carne de frango, há uma maior precaução com a qualidade do produto, onde se tem progressivamente uma fiscalização mais rígida neste caso. Diante disto, por questões econômicas, o Ministério da Agricultura iniciou em 2005 o uso de programas de inibição de fraudes e defesa dos consumidores finais através da aplicação de métodos de análise, anteriormente já existentes, para controle do teor de água contida nos produtos, seja pelo Dripping Test em carcaças de aves ou pela relação umidade/proteína em cortes (ARALI, 2014).
Uma pesquisa realizada pelo IDEC (2005) concluiu que o segmento de aves congeladas necessita de medidas urgentes de fiscalização e controle de qualidade, principalmente quanto à questão sanitária, o limite de água, a rotulagem e serviços de SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor). Até o ano de 2016, a fiscalização do MS emitiu alerta aos consumidores sobre os limites máximos de tolerância no produto. Na tentativa de inibir as fraudes, a superintendência afirma ter intensificado as fiscalizações, mas o número de análises ainda é pequeno diante do volume de reclamações.
Assim, é necessário um monitoramento de rotina, com coleta de amostras prontas para a comercialização sem prévio aviso, como prática a salvaguardar os interesses dos consumidores e à coibição de fraudes intencionais, principalmente naqueles estabelecimentos que evidenciem valores frequentemente elevados (GARNICA et al., 2014).
No ano de 2017 o IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) divulgou uma lista de produtos alvos da Operação Carne Fraca. Foram abertas investigações em relação a diversas empresas que continham produtos com irregularidades, dentre eles, frangos congelados.
O DIPOA/MAPA realiza auditorias nos estabelecimentos para verificar a observância da legislação principalmente no que se refere aos Programas de Boas Práticas de Fabricação e atendimento as demais exigências da legislação. Os Serviços Federais localizados nos Estados realizam supervisões com os mesmos objetivos (BRASIL, 2007).
De acordo com o artigo 1º da resolução n° 4, de 29 de outubro de 2002, da Lei nº 10.192, de 14 de fevereiro de 2001. Art. 1º Cabe ao Serviço ou Seção ou Setor de Inspeção de Produtos de Origem Animal - SIPA, da Delegacia Federal de Agricultura - DFA, em sua jurisdição, autuar estabelecimento produtor, armazenador e varejista, quando detectado, por meio da coleta de amostras, índices de absorção de água acima do permitido pela legislação em vigor e dar seguimento aos procedimentos administrativos fiscais. Os procedimentos administrativos fiscais podem variar desde o estabelecimento da necessidade de nova colheita de amostras para confirmação dos resultados, até a autuação, e multa com valor dobrado em até R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) com necessidade de apresentação de resultados oficiais de testes de gotejamento de tantos lotes consecutivos quanto for o número de violações para a comercialização das produções posteriores (BRASIL, 2014).
De acordo com Nota Técnica do DIPOA, em 2008 foram realizadas cerca de 5.308 análises permitindo a avaliação do processo de fabricação nos estabelecimentos sob Inspeção Federal e divulgação de uma relação dos estabelecimentos autuados por excederem o índice de absorção de água nas carcaças de aves nos anos de 2006, 2007 e 2008. Foram autuados estabelecimentos nos Estados: BA (01), DF (02), GO (05), MS (02), MT (03), PA (02), PR (16), RS (12), SC (08) e SP (25) (BRASIL, 2008).
Ainda de acordo com a Nota Técnica acima, a intenção do DIPOA é a de que o consumidor seja informado sobre os produtos que estão sendo oferecidos ao consumo, bem como sobre as Empresas que foram autuadas e multadas por excesso de água em carcaças de aves, através da divulgação das mesmas nos veículos de comunicação e de forma permanente no site do MAPA, para consulta dos interessados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É evidente a importância da apuração do teor de água excedente em carcaças de frango devido ao considerável prejuízo que as empresas podem causar ao consumidor e à economia popular.
É essencial que as agroindústrias procurem sempre melhorar seu sistema de abate, buscando a minimização de efeitos causadores de problemas com qualidade das carcaças, fatores esses que estão relacionados com o manejo durante as fases de criação, processo de pré-abate e durante o abate, sempre levando em conta as perdas econômicas, que pode ser tanto para o consumidor com o excesso de congelamento, quanto para a empresa que poderá sofrer perdas com a condenação de carcaças que podem estar em condições inadequadas para consumo.
Em virtude dos resultados das pesquisas realizadas com o método Drip Test, fica claro que se deve aumentar ainda mais as fiscalizações nas indústrias, deixando assim, um produto com mais confiança e esclarecendo toda hesitação que pode haver em relação a irregularidades e fraudes.
Portanto, a aplicação do PPCAAP pela indústria de carne de aves e derivados para fins de prevenção de possíveis fraudes econômicas, é essencial para a garantia da qualidade do produto como um todo, seguindo os padrões estabelecidos pelos órgãos responsáveis e que foram criados a partir do assunto.
Publicado orignalmente em Ciência e Tecnologia de Alimentos: pesquisa e práticas contemporâneas - Volume 2.
Acesso disponível em: https://www.editoracientifica.com.br/artigos/aspectos-da-retencao-de-agua-em-carcacas-de-frango-uma-revisao-sistematica