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Nutrição mineral e seu impacto na produção de poedeiras comerciais modernas

Publicado: 17 de fevereiro de 2023
Por: 1Danilo de Souza Sanches, 1Elis Regina de Moraes Garcia, 1Charles Kiefer. 1Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Brasil.
1. Introdução
Há vinte e nove elementos minerais conhecidos que fazem parte da exigência nutricional dos animais, estes representam cerca de 3 a 4% do peso vivo das aves, sete são macrominerais cujos requisitos ou concentrações no organismo são superiores a 100 ppm e vinte e dois são microminerais cujas exigências são abaixo de 100 ppm, e até mesmo pode ser expressa em ppb (Bertechini, 2006). Nutricionistas avícolas descreviam os minerais no passado, como nutrientes irrelevantes na nutrição de aves, como demonstrado pela escassa disponibilidade de informações na literatura da época. Atualmente novos conceitos sobre a utilização de minerais na alimentação de poedeiras comerciais vem sendo demonstradas (McDowell, 2003; Nunes et al., 2013)
Geralmente, a maior parte das vias metabólicas do organismo animal necessitam da participação dos minerais, além dos processos hormonais e enzimáticos. Os minerais possuem papel fundamental na reprodução, no crescimento, no metabolismo energético, metabolismo ósseo, ações antioxidantes, regulação homeostática, qualidade de ovos, sistema imune e outras funções vitais para manutenção da vida e produtividade animal (McDowell, 2003; Pinto et al., 2012; Ghasemi et al., 2022).
Quando se refere a produção de ovos, esses minerais estão ligados a funções direcionadas a estruturação e composição óssea e desempenho das aves, colaborando com a taxa de postura, conversão alimentar, peso dos ovos, qualidade da casca do ovo e o ganho de peso (Araujo et al., 2008). Diante do pressuposto, objetivou-se com a presente revisão de literatura, abordar os impactos da nutrição mineral na produção de poedeiras comerciais modernas, além de demonstrar os efeitos dos minerais sobre o meio ambiente e qualidade dos ovos.
2. Metodologia
O presente estudo descritivo se baseou na revisão de literatura de caráter narrativo seguindo as normas metodológicas elaboradas por Pereira et al., (2018), que permite realizar uma explanação ampla sobre a descrição e caracterização dos artigos científicos, sem definir um protocolo rígido na execução.
Os artigos utilizados na presente revisão foram obtidos a partir de buscas nas plataformas do Google Acadêmico, a base da Science direct e Scielo, usando as seguintes palavras chaves: minerais, poedeiras comerciais, desempenho, qualidade de ovos e excreção de minerais. Foram selecionados artigos científicos publicados entre os anos 1998 a 2022 (Tabela 1). Os critérios de relevância adotados para a seleção dos artigos, seguiram a delimitação dos objetivos do estudo. A seleção dos artigos foi realizada entre o período de setembro e outubro de 2022.
Tabela 1 - Artigos científicos selecionados para elaboração da revisão.
Nutrição mineral e seu impacto na produção de poedeiras comerciais modernas - Image 1
3. Minerais Orgânicos e Inorgânicos
Os minerais são classificados de acordo com suas necessidades orgânicas em macrominerais e microminerais ou elementos traços. Esta classificação está relacionada com as concentrações dos elementos nos tecidos, o que indicam as suas exigências dietéticas (Bertechini, 2006). Na avicultura industrial, as exigências de minerais dos animais são atendidas em grande parte por fontes de suplementação mineral inorgânicas, como óxidos, sulfatos e carbonatos (Londero et al., 2020).
Os minerais inorgânicos estão mais propensos a antagonismos no trato gastrintestinal devido a sua composição química, além de interações negativas com outros componentes da dieta. Tais fatores dificultam o aproveitamento desses minerais pelo animal, reduzindo assim a biodisponibilidade desses nutrientes e levando frequentemente a deficiências (Wang et al., 2019). As linhagens modernas de poedeiras comerciais são selecionadas para altas eficiências reprodutiva e produtiva.
Assim, as melhores respostas são obtidas quando há uma melhor absorção dos nutrientes, atendendo às exigências nutricionais.
Os minerais orgânicos são íons metálicos quimicamente ligados a moléculas orgânicas, originando estruturas diferenciadas e mais estáveis. As fontes orgânicas são alternativas a suplementação inorgânica. Essas fontes não se dissociam no trato gastrintestinal dos animais, permanecendo neutras e protegidas de reações químicas com outras moléculas, ou seja, permanecem intactas até a sua absorção (Londero et al., 2020). Portanto, as fontes orgânicas surgiram como uma proposta para melhorar a absorção e retenção destes nutrientes pelos animais. Consequentemente, estas substâncias contribuem para a redução na excreção de minerais que podem apresentar potencial poluente ao ambiente. Alguns estudos com galinhas poedeiras demonstraram que a utilização de minerais orgânicos pode contribuir para o aumento da qualidade do ovo, e principalmente na estrutura e formação óssea e da casca do ovo (Fernandes et al., 2008; Lin et al., 2020; Qiu et al., 2020).
4. Relação da Nutrição Mineral e Qualidades de Ovos
O cálcio (Ca) é o mineral funcional economicamente mais importante na nutrição de poedeiras, sendo indispensável para a produção de ovos, pois está envolvido nos processos de formação da casca do ovo. A casca é composta em média de 2,0 a 2,5g de Ca, que representa aproximadamente 10% do incremento total (20g) deste mineral no esqueleto das aves. A maior parte do Ca utilizado pelas poedeiras para a formação da casca do ovo é oriunda de ingredientes como fonte primarias incluídas na alimentação desses animais. Por outro lado, quando estes alimentos não estão presentes no trato digestivo, as poedeiras buscam outros meios para obter Ca para a formação da casca, como a mobilização do Ca dos ossos medulares. Em aves criadas em gaiolas, este fato é um problema, uma vez que, se a mobilização do Ca dos ossos ocorrer em excesso no momento da postura, pode reduzir a resistência de certos ossos e assim provocar osteoporose e, consequentemente, fraturas ósseas principalmente no final do período de postura (Nunes et. al., 2013).
Entretanto, o Ca é um mineral que está diretamente relacionado com as elevadas perdas econômicas na avicultura de postura. Quando o mineral é associado a qualidade de casca dos ovos e as percentagens de ovos quebrados, reflete diretamente em prejuízos financeiros para os avicultores. Esses fatores são causados pelo consumo inadequado de Ca e pelo aumento da idade das aves. No entanto, além do Ca, as aves necessitam de uma quantidade adequada de P, pois o excesso e a falta deste mineral induzem à má formação da casca e em casos mais graves a morte do animal (Pinto et al., 2012).
Além do Ca e do P, outros minerais também são essenciais para esse processo de formação da casca do ovo, como o cobre, manganês e zinco. A deficiência de cobre na alimentação de poedeiras afeta a formação de ligações químicas da lisina, que estão envolvidas nos processos bioquímicos e mecânicos das membranas da casca do ovo, desta forma, pode ocorrer o surgimento de ovos deformados (Naz et al., 2016). Por outro lado, níveis elevados de cobre podem reduzir a produção de ovos e piorar a conversão alimentar das poedeiras, mas ao mesmo tempo pode ser benéfico quanto a capacidade de redução do conteúdo de colesterol da gema (Al Alkari et al., 1998).
O manganês compõe a Galβ1,3-glucuronosiltransferase (GlcAT-I) que está relacionado com a síntese proteoglicana e glicosaminoglicano e ambos influenciam na microestrutura e resistência da casca do ovo (Xiao et al., 2015). A utilização simultânea de manganês (90 mg) e taurina (1960 mg) em dietas para poedeiras comerciais após pico de postura, melhora a qualidade da casca do ovo sem provocar qualquer efeito negativo na qualidade interna do ovo (Hajjarmanesh et al., 2022). Por sua vez, o zinco está presente na anidrase carbônica, que é uma enzima uterina indispensável na disponibilização de carbonato no momento da formação da casca do ovo. A inativação dessa enzima provoca redução da secreção de íons bicarbonato e diminui drasticamente o peso da casca dos ovos. A deficiência de zinco provoca diminuição da produção de ovos e consumo de ração das poedeiras (Naz et al., 2016).
5. Ovos Enriquecidos com Minerais
A composição mineral do ovo está diretamente relacionada com os tipos de ingredientes utilizados na formulação da dieta e pela quantidade de mineral consumida pela ave, sendo estes depositados principalmente na gema e em teores menores no albúmen (Nys et al., 2018). Tem-se observado que a capacidade de aumentar os valores nutricionais dos ovos é extremamente viável e benéfica para a alimentação humana, assim alguns minerais como selênio, iodo e em menores proporções ferro, zinco e manganês vem sendo estudados em aves (Schiavone & Barroeta, 2011), dentre esses, o selênio é o mineral que mais chama atenção, pois sua deficiência na nutrição humana é uma preocupação mundial.
O selênio está presente no ovo na proporção de 50 µg/kg na gema e 50 µg/kg no albúmen, ou seja, contém cerca de 5 µg/ovo. A concentração de selênio no ovo pode ser aumentada em até dezesseis vezes, sendo quatro vezes na gema e doze vezes no albúmen, em média os níveis desse mineral pode chegar até 500 µg/kg (30-40 µg/ovo) quando as aves são submetidas a dietas contendo 0,3 a 0,5 mg/kg de selênio na forma de selenometionina. As fontes utilizadas na alimentação de poedeiras comerciais para o enriquecimento do ovo estão na forma de selenito de sódio (Na2SeO3) e selenato de sódio (Na2SeO4), estes são depositados em maiores quantidades na gema. Contudo, o selênio na forma de selenometionina (fonte orgânica) possui maior biodisponibilidade e favorece a transferência de selênio para o albúmen (Nys et al., 2018). Essa capacidade de enriquecimento do ovo pode suprir 50-70% a exigência nutricional diária de um humano (Chinrasri et al., 2009).
Ao avaliar a suplementação de 1, 2,4 e 5,1 mg/kg de selênio orgânico durante quatro semanas na alimentação de poedeiras comerciais (Barred Plymouth Rock, Lohmann Brown, Lohmann White), Bennet e Cheng (2010) observaram aumento do teor de selênio do ovo de 40, 74 e 175 µg/ovo, respectivamente, sem afetar o desempenho das aves. O teor de iodo do ovo também pode ser alterado com o tipo de alimentação da ave. Geralmente o ovo é constituído de 4-10 µg de iodo presente principalmente na gema e pode ser aumentado em até doze vezes. Dentre as fontes de iodo mais usadas estão as formas inorgânica (iodato de cálcio, iodato de potássio ou iodeto de potássio) que são eficientemente absorvidos sob a forma de iodeto (Suttle, 2010).
O nível de iodo no ovo pode chegar até 40 µg, isso representa cerca de 20% da exigência diária para um humano. Deve-se tomar cuidado quanto a sua utilização, uma vez que esse mineral pode favorecer a redução de consumo de ração e produção de ovos, níveis a baixo de 12 mg/kg devem ser evitados. A exigência de iodo para aves é 0,3-0,4 mg/kg de dieta e é considerado tóxico em níveis superiores a 300 mg/kg de dieta (Suttle, 2010; Nys et al., 2018).
Em baixa quantidade a composição de ferro no ovo pode ser modificado, embora isso depende do nível de inclusão e da fonte alimentar utilizada na alimentação das poedeiras, Park et al. (2004) avaliaram diferentes teores de inclusão de ferro (100, 200 e 300 mg/Kg) e diferentes fontes do mineral (sulfato de ferro ou quelato de ferro-metionina) nas dietas de poedeiras e observaram aumento de 20% de ferro na composição do ovo dessas aves. Os mesmos autores respaldam que esse teor pode ser aumentado se os animais também forem suplementados com zinco e cobre.
6. Idade Versus Qualidade da Casca de Ovos
A idade da ave é um fator crucial em termos de qualidade da casca de ovos. Existem evidências de que a qualidade da casca diminui com o avanço da idade das poedeiras (Barbosa et al., 2012; Smaniotto et al., 2017; Crosara et al., 2019). Com o aumento da idade das galinhas, naturalmente a qualidade da casca do ovo tende a piorar, uma vez que, com o avanço da idade os ovos aumentam de tamanho em um momento em que, a proporção de mobilização e absorção de cálcio pela ave é baixa, ao ponto de ter disponível baixas quantidades desse mineral para deposição na casca, sendo necessário uma maior suplementação desse nutriente na dieta (Pires et al., 2015).
Dessa forma, existem estratégias nutricionais que podem minimizar esse efeito, como o uso de fontes minerais com maior biodisponibilidade (minerais orgânicos) (Qiu et al., 2020), relações de Ca e P adequadas (Pastore et al., 2012) e uso de granulometrias diferentes de fontes de Ca e tempo de alimentação (Saki et al., 2019; Pacheco et al., 2022). Durante o final do período de produção, poedeiras alimentadas com baixos níveis de minerais orgânicos proteinados melhoraram a resistência e estrutura da casca do ovo quando comparadas com aves alimentadas com níveis idênticos de fontes inorgânicas (Qiu et al., 2020).
O uso de casca de ostras moídas com diâmetro de partículas grossas (2-4 mm) fornecidas por um tempo de alimentação de 21 horas para aves, proporciona o aumento do teor de cálcio da casca, espessura da casca, área de superfície do ovo e peso da casca. O tamanho da partícula é crucial, já que o ingrediente permanece por mais tempo no trato grastrointestinal da ave, no período da formação da casca a ave terá disponível o nutriente ao longo de todo o processo de calcificação (Saki et al., 2019).
7. Minerais e suas Relações com o Meio Ambiente
Até o início dos anos 2000 o uso de elevados níveis de inclusão de minerais nas dietas de aves era uma pratica comum, tal fato, associado ao baixo custo (0,2% do custo total) da suplementação era uma estratégia nutricional que assegurava qualquer risco de deficiência mineral da dieta. As preocupações com os efeitos ambientais que os resíduos oriundos da produção intensiva animal impuseram novas restrições quanto ao uso excessivo de minerais em formulações de ração (Schlegel et al., 2013; Cano-sancho et al., 2014).
O consumo elevado de alguns minerais, como o cobre, zinco e fósforo podem causar o aumento da excreção e se os dejetos forem descartados incorretamente podem provocar a contaminação do solo, cursos d’água e até mesmo serem tóxicos para as plantas. Estudos evidenciaram que a suplementação dietética de baixas doses de minerais orgânicos (ferro, cobre, manganês e zinco) em dietas de poedeiras comerciais em postura, reduziu a excreção de minerais, sem afetar negativamente o desempenho e qualidade de ovos (Qui et al., 2020).
No entanto, Nys et al. (2003) salientam que devido às incertezas em estimar as exigências dos minerais para as aves, a excreção ainda costuma exceder 95% do fornecimento alimentar. Geralmente as exigências nutricionais dos minerais são baseadas em métodos empíricos de dose-resposta, que permitem uma estimativa rápida da quantidade necessária para maximizar o desempenho dos animais, de acordo com diferentes níveis de fornecimento de um determinado mineral na alimentação dos mesmos. Entretanto, diversos fatores como tipo de ingrediente e seus componentes podem alterar a disponibilidade dos minerais, modificando sua exigência nutricional. Recomenda-se que as formulações das dietas para aves sejam calculadas adotando os valores digestíveis dos minerais (Rostagno et al., 2017).
8. Considerações Finais
Os minerais são fundamentais para o sucesso da produção avícola, pois se manipulados e introduzidos de maneira correta na alimentação das aves minimizam a incidência de cascas trincadas, fissuradas e quebradas dos ovos, refletindo no aumento da lucratividade do produtor. Além disso, a utilização adequada dos minerais proporciona redução da excreção dos nutrientes, o que reflete consideravelmente na diminuição dos impactos ambientais provocados pela produção avícola.
O uso de fontes minerais orgânicas, relações maiores de Ca e P e uso de fontes de Ca e P com granulometrias maiores podem minimizar a queda da qualidade da casca dos ovos em poedeiras com idade avançadas, sendo estratégias nutricionais extremamente relevantes e eficientes para poedeiras dessa categoria. A utilização de minerais no enriquecimento de ovos é uma forma clara de usar ferramentas para aumentar a qualidade do produto, afim de agregar valor no mesmo, no entanto, a busca por fontes de minerais orgânicos que apresentem características nutricionais melhores e que sejam economicamente viáveis aos produtores é um gargalo na cadeia produtiva de ovos.
Exposta a importância da temática acreditamos que investigações futuras são de extrema relevância para uma melhor compreensão dos impactos provocados da nutrição minerais sobre o desempenho, qualidade interna e externa dos ovos e excreção dos nutrientes de poedeiras comerciais, bem como para novas sugestões de estratégias nutricionais mineral que impactam sobre esses fatores, por exemplo novos estudos utilizando os minerais e suas interações com o ritmo circadiano das aves.
Publicado originalmente na Sociedade de Pesquisa e Desenvolvimento, em dezembro de 2022. Acesso disponível em: https://rsdjournal.org 

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