O fator fibra é muito importante quando se trata de animais não ruminantes, tendo em vista que estes não possuem a capacidade de digestão de fibras. Portanto quanto maior o teor de fibra presente nos alimentos, maior a dificuldade de utilização nas dietas para animais. Isso ocorre porque a fibra em alta concentração diminui a energia metabolizável das rações, aumenta a taxa de passagem do alimento e diminui o aproveitamento dos nutrientes.
Segundo Ribeiro et al. (2008), o frango moderno tem pouca capacidade de termorregulação, sendo bem mais sensível ao calor do que ao frio. Desta forma, o incremento calórico, que é o calor gerado no processo de digestão, absorção e metabolismo dos nutrientes, pode afetar sua produção. Musharaf e Latshaw (1999) relatam que a proteína e a fibra proporcionam maior incremento calórico durante o metabolismo, em comparação à gordura e ao amido, o que pode aumentar a temperatura interna do animal e prejudicar seu desempenho.
A inclusão de grãos secos de destilaria (DDG - dried distillers grains) vem sendo reconhecidamente uma fonte de energia, proteína, vitaminas solúveis e minerais. É necessário determinar os níveis e alternativas de inclusão na alimentação de não ruminantes, visto que a composição de nutrientes e valor alimentício podem variar amplamente entre diferentes lotes de milho dentro de uma mesma usina de etanol e, também, entre diferentes usinas (Cremonez et al., 2015). O DDG apresenta grande concentração de lipídios, minerais, proteínas e, principalmente, carboidratos fibrosos.
O DDG de milho, comparado ao milho grão e ao farelo de soja, contém uma maior concentração de fibras, o amido do milho é utilizado na produção do etanol (Stein e Shurson, 2009) e o DDG, portanto, fica mais concentrado em relação a carboidratos fibrosos, caracterizando-se como coproduto de alta concentração de hemicelulose (Silva et al., 2016).
Este fator poderia ser um entrave em sua utilização, podendo causar prejuízos no desempenho animal. Alguns trabalhos mostram que a composição do ingrediente alimentar interfere diretamente no calor metabólico produzido no processo digestivo dos animais. Em vista do exposto, o objetivo do presente estudo foi determinar o efeito da inclusão de DDG de milho sobre os parâmetros de termorregulação em frangos de corte.
Material e métodos
O trabalho foi realizado no galpão para frangos de corte da Fazenda Experimental de Zootecnia e Agronomia da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Cuiabá. O projeto foi aprovado pelo comitê de ética no uso de animais da UFMT sob número 23108.227104/2017-13. O galpão, orientado no sentido leste-oeste, era equipado com sistema de cortinas externas nas laterais, acionamento mecânico tipo catracas, ventiladores e sistema de nebulização para controle de temperatura e umidade interna. O sistema de aquecimento foi realizado por meio de lâmpadas de infravermelho de 250 W de potência, instaladas individualmente em cada boxe experimental. O sistema de iluminação apresentava acendimento automático por meio de um timer, sem forros e cortina interna, e o telhado foi constituído de telhas de barro.
O galpão foi dividido em quatro linhas laterais, com 15 boxes telados de 2,5 m² em cada linha; destes, foram utilizados 35 boxes, com densidade de 8,00 aves/m². O substrato utilizado para a cama foi de casca de arroz nova. O fornecimento de água e ração do 1° ao 7° dia foi realizado em copo de pressão e comedouro infantil, respectivamente. Para o período de 8 a 42 dias, o fornecimento de água ocorreu via bebedouro pendular e a ração em comedouros tubulares, com arraçoamento realizado duas vezes ao dia e reviragem diária da cama.
As temperaturas máximas e mínimas do galpão foram aferidas duas vezes ao dia, às 8h e às 16h, e anotadas com o uso de termômetro de máxima e mínima. A média de temperaturas máxima e mínima, durante todo o período experimental, foi calculada pela soma da temperatura máxima ou mínima dividida pelo número de dias de alojamento.
O programa de iluminação foi executado de acordo com as recomendações do manual da linhagem Cobb (2012a). Utilizou-se delineamento inteiramente casualizado com cinco tratamentos, sendo quatro níveis e o tratamento controle, e sete repetições, totalizando 35 unidades experimentais com 20 aves em cada, totalizando 700 aves. As dietas experimentais foram à base de milho e farelo de soja e formuladas para atender às recomendações nutricionais de acordo com o manual da linhagem Cobb 500 (2012b).
A análise bromatológica do DDG de milho utilizado para formulação das rações está apresentada na Tabela 1.
Os tratamentos experimentais aplicados a partir do primeiro até o 42° dia de idade (conforme a Tabela 2) foram: T1 - dieta controle com 0% de DDG; T2 - dieta com 4% de DDG; T3 - dieta com 8% de DDG; T4 - dieta com 12% de DDG; T5 - dieta com 16% de DDG. Visando não prejudicar o desempenho dos frangos de corte, devido a fatores limitantes do uso de DDG como a quantidade de fibra e o teor de aminoácidos, estes valores foram baseados em uma revisão bibliográfica realizada sobre o tema em questão.
Tabela 1 - Análise bromatológica de grãos secos de destilaria (DDG) de milho
No final de cada fase de produção (7, 35 e 42 dias de idade) foram coletados os dados relacionados às variáveis termorregulatórias das aves. A avaliação da temperatura corporal foi realizada às 13h, horário em que a temperatura interna e externa das aves é mais alta, utilizando-se uma amostra de 10% das aves de cada parcela.
Foram coletados os dados das variáveis de temperatura da cabeça, canela, peito, dorso e asa utilizando-se termômetro infravermelho (Termômetro Digital Infravermelho Mira Laser), com mira laser a 15 cm de distância da pele do animal. Para a temperatura cloacal (TC), utilizou-se termômetro clínico digital com ponta rígida (iColor- THGTH150B - Branco - G-Tech), introduzido na cloaca das aves, com emissão de sinal sonoro quanto à estabilização da temperatura. Para a avaliação da temperatura da cama, o termômetro infravermelho foi utilizado a 15 cm de distância do piso, até sua estabilização, em três pontos equidistantes da parcela experimental.
Tabela 2 - Composição percentual das rações experimentais de frangos de corte de 1 a 7, 8 a 35 e 36 a 42 dias de idade nos diferentes tratamentos
Em seguida, os dados fisiológicos coletados foram utilizados para o cálculo da temperatura média da pele (TMP) e da temperatura média corporal (TMC) das aves, de acordo com a equação proposta por Richards (1971), considerando as temperaturas (oC) de superfície e a temperatura retal das aves: TMP = 0,70 TD + 0,12 TA + 0,09 TCA + 0,09 TP, em que TD = temperatura do dorso, TA = temperatura da asa, TCA = temperatura da cabeça, TP = temperatura da canela; TMC = 0,3 TMP + 0,7 TC, em que TC = temperatura clocal.
O índice de temperatura e umidade (ITU) foi calculado a partir do modelo indicado por Thom (1959), conforme descrito na equação abaixo, sendo T = temperatura do ar (ºC) e UR = umidade relativa do ar (%):
As variáveis estudadas foram submetidas às premissas estatísticas de normalidade de resíduos através do teste de Shapiro Wilk e a homogeneidade das variâncias por meio do teste de Levene’s. Os dados que apresentaram disparidade passaram por transformação e, em seguida, realizou-se a análise de variância através do programa R Studio Ink®. As médias foram submetidas ao teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade, utilizando-se o programa SAS (1990).
Resultados e discussão
As temperaturas máxima e mínima e a umidade relativa do ar, verificadas diariamente durante o experimento às 8h e às 16h, estão apresentadas na Tabela 3.
As condições de conforto térmico até as primeiras duas semanas de vida dos frangos de corte são de 33 °C reduzindo até 24 °C, com quatro semanas de idade, e para 21 a 22 °C com seis semanas de idade, e a umidade relativa do ar em torno de 57% a 69% (Oliveira, 2016). Conforme os valores registrados pelos termômetros, observa-se que as aves passaram por estresse térmico por calor no período total de produção.
Com a finalidade de determinar os níveis de conforto frente às condições ambientais às quais os animais estão sujeitos, diversos índices como a temperatura efetiva, índice de temperatura e umidade (ITU) e índice de temperatura de globo e umidade (ITGU) foram desenvolvidos (Hahn, 1985).
O ITU esteve na faixa de 68,49 a 71,65 durante o tempo de produção. Segundo Araujo et al. (2017), o ITU é um valor considerado adimensional, em que valores de até 74 representam ambientes confortáveis, de 74 a 78 exigem cuidado no manejo, de 79 a 84 são perigosos e de 85 em diante apresentam condições extremas de estresse, podendo elevar a mortalidade do plantel.
Não houve efeito (p > 0,05) para as variáveis temperatura cloacal, temperatura média corporal, temperatura média da pele, e temeratura média da cama de frangos de corte aos 7, 35 e 42 dias de idade, alimentados com dietas com diferentes níveis de DDG de milho (Tabela 4).
Segundo Brown-Brandt et al. (2003), a tempera-tura cloacal representa a temperatura do núcleo corporal e pode ser utilizada para avaliar a condição de conforto ou estresse. Han et al. (2010) relatam que frangos de corte, quando expostos à temperatura ambiental acima de 25 oC, apresentam temperaturas da cloaca e da pele significativamente aumentadas.
Conforme relatado por Marchini et al., (2007) a temperatura retal de frangos em ambientes termoneutros é de 41,4 °C. Na primeira semana, os valores de temperatura cloacal permaneceram acima do preconizado pela literatura, estando entre 42,14 e 42,48 C°. Já a temperatura média corporal variou de 40,72 a 41,22 oC e a temperatura média da pele de 37,42 a 38,35 oC.
O pintinho possui grande relação entre área/ volume corporal, dificultando o processo de retenção de calor pela ave. O desconforto térmico pode acarretar sérios problemas na produção como menor taxa de crescimento, maior consumo de água, aceleração do ritmo cardíaco e alteração da conversão alimentar. Cordeiro et al. (2010) também relatam que quando a temperatura está acima do conforto térmico das aves pode ocorrer desidratação, o que prejudica o consumo de ração e o ganho de peso.
Tabela 3 - Valores da temperatura máxima e mínima e umidade relativa do ar registrados no interior da instalação nas fases de produção 7, 35 e 42 dias de idade
Tabela 4 - Temperatura cloacal (TC), temperatura média corporal (TMC), temperatura média da pele (TMP) e temperatura média da cama (TCA) de frangos de corte aos 7, 35 e 42 dias de idade, alimentados com dietas com níveis de grãos secos de destilaria (DDG) de milho
Aos 35 dias, as médias de TC, TMC e TMP variaram em 39,01 e 39,42 oC, 38,68 e 39,265 °C e 37,92 e 38,30 °C, respectivamente. Alves (2012) relata que várias medidas podem ser tomadas para minimizar o desconforto térmico. A utilização de certos alimentos na dieta que forneçam energia com baixo incremento calórico pode ser uma destas medidas. Animais em períodos de estresse térmico reduzem a alimentação em função da necessidade de diminuir seu incremento calórico.
Segundo Musharaf e Latshaw (1999), em comparação aos lipídios, a fibra e a proteína possuem maior incremento calórico. Blaxter (1989) afirma que o incremento calórico é o aumento na produção de calor associado ao consumo de alimento. Este termo é advindo da diferença de calor produzido por um animal comparando antes e após alimentar-se, e isto é totalmente dependente da quantidade e do tipo de alimento consumido.
O DDG de milho, comparado ao milho grão e ao farelo de soja, contém uma maior concentração de fibras, onde se atingem valores de FDA superiores a 10% e de FDN acima de 30% (Stein e Shurson, 2009). Este fator poderia ser um entrave em sua utilização, podendo causar prejuízos no desempenho animal. Alguns trabalhos mostram que a composição do ingrediente alimentar interfere diretamente no calor metabólico produzido no processo digestivo dos animais.
Ferreira et al. (2011), avaliando a variação de produção de calor de pintinhos alimentados com diferentes densidades energéticas, observaram que o aumento da densidade energética da dieta proporcionou menor temperatura média superficial. Sarmiento-Franco et al. (2000) relataram que alimentos fibrosos proporcionaram maior incremento calórico em frangos, e propuseram que as diferenças no efeito térmico são devido a efeitos fisiológicos e mecânicos resultantes da variação da fonte de fibra sobre o trato digestório das aves. Miranda et al. (2017) verificaram que utilização do farelo de algodão em substituição à proteína do farelo de soja não altera a temperatura da pele e temperatura superficial de frangos de corte, o que corrobora com a presente pesquisa.
Conclusão
Os parâmetros termorregulatórios dos frangos de corte não sofreram interferência dos níveis de inclusão de grãos secos de destilaria na dieta.