Explorar
Comunidades em Português
Anuncie na Engormix

Desempenho e saúde de frangos de corte não são prejudicados em função do teor de metanol da glicerina incluída em dietas

Publicado: 28 de abril de 2023
Por: Leilane R.B. Dourado2, *Luciana P. Machado2, Adriana de S. Araújo3, Mirian, L. Fernandes3, Edna T. dos Santos3, Danilo R.S. Silva3, Daniel Biagiotti3 e Hidaliana P.A. Bastos3. Docentes do Departamento de Zootecnia e Patologia Clínica Veterinária, Campus Profa. Cinobleina Elvas, Universidade Federal do Piauí, Rodovia Municipal Bom Jesus-Viana. 3Discentes de Graduação e Pós-Graduação, Universidade Federal do Piauí, Rodovia Municipal Bom Jesus-Viana s/n, Bom Jesus, PI 64900-000, Brasil.
Sumário

Em função da grande variabilidade na composição da glicerina oriunda do biodiesel, torna-se imprescindível a busca por informações que contribuam estabelecê- -la com uma alternativa na alimentação de aves. O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito da inclusão de glicerina com alto de teor de metanol em dietas para frangos de corte sobre o desempenho e parâmetros sanguíneos. Foram utilizados 90 pintos de corte machos da linhagem Cobb, com 8 dias de idade, distribuídos em um delineamento inteiramente casualizado com três tratamentos (níveis de inclusão de 0, 6 e 12% de glicerina) e seis repetições de cinco aves cada, totalizando 18 unidades experimentais. As dietas foram formuladas a base de milho e farelo de soja para atender as exigências nutricionais e a glicerina utilizada continha 1,4% de metanol e 3158Kcal/kg de energia metabolizável. Aos 21, 33 e 42 dias de idade as sobras de ração e as aves foram pesadas para determinação do consumo de ração, peso médio, ganho de peso e conversão alimentar. Foram colhidos de 1 a 3mL de sangue venoso das aves, nos últimos dias de cada fase de criação (19-21, 31-33 e 40-42 dias de idade), para determinação do hematócrito, concentração de hemoglobina, reticulócitos, proteínas plasmáticas totais e fibrinogênio. Para avaliação da bioquímica sérica foram colhidos sangue venoso das aves sem anticoagulante, apenas na fase final da criação (40-42 dias). Os dados de desempenho, parâmetros hematológicos e bioquímicos obtidos foram submetidos à análise de variância. Utilizou- -se o teste de Tukey com α=0,05 de probabilidade, para comparação das médias. Não foram observadas diferença estatística dos tratamentos sobre as variáveis de desempenho, parâmetros sanguíneos e bioquímicos, exceto para as proteínas plasmáticas entre 19 e 21, que aumentaram com a inclusão de glicerina, e para os reticulócitos que reduziram com a inclusão de glicerina. A inclusão de até 12% de glicerina com 1,4% de metanol residual em dietas de frangos de corte de 8 a 42 pode ser realizada sem prejuízos no desempenho e saúde dos mesmos.

TERMOS DE INDEXAÇÃO: Frangos de corte, metanol, glicerina, dietas, alimento alternativo, sódio.

INTRODUÇÃO

O aumento na demanda de biodiesel em decorrência de estímulo de políticas públicas tanto no Brasil (ANP 2009) como na Europa (EPC 2009) tem proporcionado um aumento na glicerina resultante do processo de transesterificação, que ocorre pela ação do metanol sobre o óleo vegetal ou gordura animal e posterior adição de sal (Geris et al. 2007). Essa glicerina pode ser utilizada como fonte de energia dietética na nutrição de aves, pois fornece 3.696kcal/kg de energia total, com metabolização de aproximadamente 95% (Rostagno et al. 2011), provavelmente em função de sua alta taxa de absorção devido ao baixo peso molecular e ao modo de absorção, por meio de difusão facilitada (Dozier et al. 2008).
Alguns trabalhos com frangos de corte (Guerra et al. 2011, Silva et al. 2012, Henz et al. 2014), poedeiras (Swiatkiewicz & Koreleski 2009, Duarte et al. 2014) e codornas (Pasquetti et al. 2014) vem sendo desenvolvidos, entretanto a composição das glicerinas utilizadas em cada estudo é bastante variável, principalmente em relação aos teores de sódio, cloro e metanol, o que é consequência do processamento do óleo ou gordura para obtenção do biodiesel, sendo muitas vezes contraditórias as definições aplicadas à glicerina resultante desse processo.
Excesso de sódio e cloro podem causar alterações no equilíbrio ácido básico e na pressão osmótica (Faria & Junqueira 2000). De acordo com Menten et al. (2010) os teores de sódio da glicerina podem chegar até 2,75%, e se considerar uma inclusão de 12% de glicerina, teríamos dietas que ultrapassariam 0,330% de sódio, o que estaria acima das exigências relatadas por Rostagno et al. (2011). Entretanto alguns trabalhos ressaltam que a exigência de sódio pode ultrapassar 0,300% (Barros et al. 2004, Silva et al. 2006), podendo ser benéfico para o desempenho destes animais, tornando o sódio como um fator a ser considerado em suas particularidades.
Já o metanol é um álcool tóxico para humanos, porém a metabolização é diferenciada entre as espécies animais (Medinsky & Dorman 1995), sendo seus efeitos caracterizados por acidose metabólica e problemas oculares, atribuídos principalmente ao ácido fórmico, um metabólito do processo de degradação do metanol no fígado (Leão et al. 2012). Entretanto, essa toxicidade parece não ser tão expressiva em aves (Jung & Batal 2011), fato que poderia alterar as resoluções estabelecidas sobre o limite de 0,5% (EU 2013) de metanol presente na glicerina utilizada na alimentação animal, em função da espécie trabalhada.
Apesar dessas limitações de uso da glicerina, os trabalhos demonstram bons resultados no desempenho das aves recomendando inclusões de 5 até 15% (Guerra et al. 2011, Silva et al. 2012, Henz et al. 2014). Entretanto, torna-se imprescindível a abordagem de aspectos que evidenciem a interferência de componentes da glicerina na fisiologia e saúde do animal e sua relação com o desempenho, para que a glicerina se torne um ingrediente com baixa restrição do uso na alimentação animal.
Desta forma, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito da inclusão de glicerina com alto de teor de metanol em dietas para frangos de corte sobre o desempenho e parâmetros sanguíneos.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi realizado no setor de Avicultura do Colégio Técnico de Bom Jesus (CTBJ)/Campus Professora Cinobelina Elvas, Bom Jesus/PI da Universidade Federal do Piauí, e teve aprovação do Comitê de Ética em Experimentação Animal da UFPI sob parecer n. 22/2009-CEEA/UFPI.
As aves foram alojadas em baterias metálicas com gaiolas (unidades experimentais) com dimensões de 1,0 x 1,0 x 0,50m, equipadas com comedouro tipo calha e um bebedouro calha confeccionado de garrafas Pet (2L), mantidas em galpão tipo convencional.
Foram utilizados 90 pintos de corte machos da linhagem Cobb, com 8 dias de idade, distribuídos em um delineamento inteiramente casualizado com três tratamentos (níveis de inclusão de 0, 6 e 12% de glicerina) e seis repetições de cinco aves cada, totalizando 18 unidades experimentais.
Do primeiro ao sétimo dia as aves foram criadas em galpões convencionais, sendo estas alimentadas com dietas a base de milho e farelo de soja para atender as exigências nutricionais de acordo com recomendações de Rostagno et al. (2011). Aos oito dias de idade as aves foram pesadas e distribuídas uniformemente em cada gaiola para o início do período experimental. As dietas foram formuladas a base de milho e farelo de soja para atender as exigências nutricionais de frangos de corte macho de desempenho regular, preconizadas para as referidas fases (Quadro 1) de acordo com recomendações de Rostagno et al. (2011).
Quadro 1. Composição percentual e calculada das dietas experimentais de 8-21, 22-33 e 34-42 dias de idade, de acordo com o percentual de inclusão de glicerina
Quadro 1. Composição percentual e calculada das dietas experimentais de 8-21, 22-33 e 34-42 dias de idade, de acordo com o percentual de inclusão de glicerina
A glicerina utilizada nesse experimento foi adquirida da empresa Brasilecodiesel. A mesma foi enviada a laboratórios especializados para análise dos teores de glicerol (22,02%), umidade (39,23%), metanol (1,4%), sódio (2,29%), cinzas ou matéria mineral (2,8%), ácidos graxos totais (32,58%) e energia bruta (4.108kcal). O valor de energia metabolizável aparente (3.158kcal) foi determinada em ensaio de metabolismo conforme metodologia descrita por Sakomura & Rostagno (2007).
Aos 21, 33 e 42 dias de idade as sobras de ração e as aves foram pesadas para determinação do consumo de ração, peso médio, ganho de peso e conversão alimentar. Para correção do consumo de ração, foram registradas todas as mortalidades no decorrer do período experimental e realizada a correção segundo Sakomura & Rostagno (2007).
Foram colhidos de 1 a 3mL de sangue venoso das aves, nos últimos três dias de cada fase de criação (19-21, 31-33 e 40-42 dias de idade), em seringa preenchidas com anticoagulante EDTA (ácido etilenodiaminotetracético) a 10% para determinação do hemograma. A contagem absoluta de eritrócitos, leucócitos e trombócitos foi realizada em câmera de Newbauer com a utilização do azul de toluidina a 0,01% como diluente. Foram determinados o hematócrito pela técnica de microhematócrito, a concentração de hemoglobina pela técnica da cianometahemoglobina após centrifugação para remoção dos núcleos e cálculo dos índices hematimétricos. Foi realizada a análise do esfregaço sanguíneo corado com corante hematológico Romanowsky (Panótico Rápido®). Foi determinada a porcentagem de reticulócitos utilizando-se o corante azul de crezil brilhante, avaliando-se 1000 células no aumento de 1000x. A determinação das proteínas plasmáticas totais e do fibrinogênio foram obtidas por refratometria, após a precipitação térmica do fibrinogênio.
Para avaliação da bioquímica sérica foram colhidos sangue venoso das aves sem anticoagulante, apenas na fase final da criação (40-42 dias). Todas as análises foram realizadas em analisador bioquímico semi-automático (Espectrum BS® Celer, Belo Horizonte/MG, Brasil), utilizando kits comerciais. A concentração sérica de uréia foi determinada seguindo metodologia enzimático-colorimétrica (Uréia CE® Labtest, Lagoa Santa/MG, Brasil), a concentração de ácido úrico foi determinada segundo o método enzimático Trinder (Ácido Úrico Liquiform® Labtest) e de magnésio por metodologia colorimétrica do Magon Sulfonado (Magnésio® Labtest). A atividade enzimática da fosfatase alcalina (FA) foi mensurada segundo o método colorimétrico de Roy modificado (Fosfatase Alcalina®-Labtest). Todas as reações bioquímicas foram processadas conforme orientação dos fabricantes.
Os dados de desempenho, parâmetros hematológicos e bioquímicos obtidos foram submetidos a teste de normalidade (Cramer-Von Mises), os outiliers quando identificados foram removidos e posteriormente foi realizada a análise de variância pelo procedimento GLM (General Linear Models) do programa SAS® (Statistical Analysis System 2004). Utilizou-se o teste de Tukey com α= 0,05 de probabilidade, para comparação das médias.

RESULTADOS

Não houve efeito (P> 0,05) da inclusão de glicerina bruta nas dietas sobre o peso médio (PM), ganho de peso (GP), consumo de ração (CR), e conversão alimentar (CA) de frangos de cortes em nenhuma das idades avaliadas (Quadro 2).
Não houve diferença (P> 0,05) entre os tratamentos para os valores médios do volume globular (VG), hemácias (Hem), hemoglobina (Hb), volume corpuscular médio (VCM), concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM), reticulócitos (Ret) e fibrinogênio (Fib) de frangos com 19 a 21 dias de idade. Para a proteína plasmática total (PPT) houve um aumento da mesma, à medida que foi aumentando a inclusão de glicerina na dieta. Não houve efeito (P> 0,05) dos tratamentos no hemograma dos frangos de 31 a 33 dias de idade. Nos frangos com 40 a 42 dias de idade, houve efeito (P< 0,05) dos tratamentos apenas para os reticulócitos (% e x103/µL), que foi menor nos frangos de ingeriram dietas com glicerina bruta.
Não houve diferença (P> 0,05) dos níveis de glicerina bruta para os valores médios de contagem de trombócitos (Trom), leucócitos (Leu), heterófilos (Het), linfócitos (Lin), eosinófilos (Eos), basófilos (Bas) e monócitos (Mon) de frangos de corte nas diferentes idades avaliadas (Quadro 4). De forma semelhante, não houve diferença (P> 0,05) para os valores médios dos parâmetros bioquímicos séricos: Fosfatase Alcalina, Uréia, Ácido Úrico, Proteína Total e Magnésio de frangos aos 42 dias de idade (Quadro 5).
Quadro 2. Peso médio (PM), ganho de peso (GP), consumo de ração (CR) e conversão alimentar (CA) de frangos de corte em diferentes idades, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta
Quadro 2. Peso médio (PM), ganho de peso (GP), consumo de ração (CR) e conversão alimentar (CA) de frangos de corte em diferentes idades, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta
Quadro 3. Valores médios do Volume Globular (VG), Hemácias (hem), Hemoglobina (Hb), Volume Corpuscular Médio (VCM), Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média (CHCM), Reticulócitos (Ret), Proteína plasmática total (PPT) e Fibrinogênio (Fib) de frangos de corte em diferentes idades, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta
Quadro 3. Valores médios do Volume Globular (VG), Hemácias (hem), Hemoglobina (Hb), Volume Corpuscular Médio (VCM), Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média (CHCM), Reticulócitos (Ret), Proteína plasmática total (PPT) e Fibrinogênio (Fib) de frangos de corte em diferentes idades, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta
Quadro 4. Valores médios da contagem de trombócitos (Trom), leucócitos (Leu), heterófilos (Het), linfócitos (Lin), eosinófilos (Eos), basófilos (Bas) e monócitos (Mon) de frangos de corte em diferentes idades, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta
Quadro 4. Valores médios da contagem de trombócitos (Trom), leucócitos (Leu), heterófilos (Het), linfócitos (Lin), eosinófilos (Eos), basófilos (Bas) e monócitos (Mon) de frangos de corte em diferentes idades, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta
Quadro 5. Valores médios dos parâmetros bioquímicos séricos: Fosfatase Alcalina, Uréia, Ácido Úrico, Proteína Total e Magnésio de frangos aos 42 dias de idade, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta
Quadro 5. Valores médios dos parâmetros bioquímicos séricos: Fosfatase Alcalina, Uréia, Ácido Úrico, Proteína Total e Magnésio de frangos aos 42 dias de idade, alimentados com dietas contendo diferentes níveis de glicerina bruta

DISCUSSÃO

Observou-se que a inclusão de 6 e 12% de glicerina não prejudicou o desempenho das aves em nenhuma das fases estudadas, o que significa que os teores de 0,084 e 0,168% de metanol presente nas duas dietas, respectivamente, não causou toxicidade nestas aves. Jung & Batal (2011) avaliaram diferentes glicerinas com teores de metanol de até 3,1%, e verificaram que a inclusão de glicerina de alto teor de metanol não prejudica o desempenho das aves, indicando que aves podem ingerir até 0,310% de metanol na dieta.
Considerando o período de 8 a 21 dias, observou-se melhoria (P< 0,076) de 4,66% na conversão alimentar dos frangos com a inclusão de 12% de glicerina. Nessa fase alguns autores, como Dozier et al. (2008) relatam que a metabolização da energia da glicerina é maior nas fases iniciais do que em fases posteriores.
Os resultados de desempenho obtidos neste estudo são corroborados por outros trabalhos que indicam que a glicerina não prejudica o desempenho de aves, porém a maioria dos estudos recomendam inclusões entre 5 e 10%, entretanto, não mencionam o teor de metanol da glicerina utilizada (Guerra et al. 2011) ou o teor de metanol da glicerina é menor que 250ppm (Silva et al. 2012), estando abaixo dos valores preconizados pela (EU 2013) que é de 0,5% de metanol na glicerina. Apesar do alto teor metanol da glicerina utilizada (1,4% ou 14000ppm de metanol) neste estudo, os valores diluídos na ração representam 0,084% e 0,168% de metanol na dieta com 6% e 12% de glicerina. A partir dos resultados deste estudo, a inclusão de até 12% de glicerina em dietas para frangos de corte de 8 a 42 dias de idade, torna-se uma alternativa quando os preços dos ingredientes energéticos convencionais da dieta estiverem elevados.
Resultados contrários aos deste estudo, foram encontrados por Guerra et al. (2011), que ao trabalharem com níveis de até 10% de inclusão de glicerina nas rações para frangos de corte de 21 a 42 dias de idade, observaram redução no ganho de peso, aumento no consumo de ração e consequente piora na conversão alimentar. Essas divergências entre resultados de pesquisa podem estar relacionadas à composição química das glicerinas utilizadas nos experimentos que podem varias quanto a fonte de obtenção (Bernardino et al. 2014), teores de metanol, glicerol e sódio dentre outros (Dozier et al. 2011)
Os resultados do eritrograma, proteína plasmática total e fibrinogênio (Quadro 3) e do leucograma (Quadro 4) apresentaram valores médios dentro da faixa de normalidade para a espécie em todos os grupos e momentos. Demonstrando que a inclusão de glicerina não acarreta nenhum prejuízo na hematologia de frangos de corte.
A concentração das proteínas plasmáticas totais das aves (coletados com 19-21 dias idade) que receberam glicerina na dieta (6% e 12%) foram maiores que dos frangos que ingeriram dietas sem glicerina, indicando um efeito benéfico da suplementação nesta fase inicial da criação. As proteínas plasmáticas do sangue são formadas por: albumina, globulinas alfa, beta, gama e fibrinogênio e a maioria destas é sintetizada no fígado. Estas proteínas compõem 20% do sangue e além de serem nutrientes essenciais, tem entre suas funções, a de manter a pressão osmótica, serem reguladoras do mecanismo ácido-base do sangue, transporte de hormônios e formarem parte importante das enzimas e imunoglobulinas (Noriega 2000).
Os resultados da contagem de reticulócitos no grupo controle (0%) foram superiores em relação aos grupos de 6% e 12% de glicerina, em frangos com 40 a 42 dias de idade, sendo indicativo que nos últimos grupos citados há uma diminuição na taxa de renovação das hemácias, no qual o tempo de sobrevivência das mesmas provavelmente estaria sendo maior e consequentemente demandando menor taxa de produção de reticulócitos. Esta menor taxa de produção pode indicar uma redução da taxa metabólica com a inclusão do glicerol, visto que, segundo Christian (2000), quanto maior a taxa metabólica do animal maior será o estresse oxidativo acumulado e menor a vida média dos eritrócitos, caracterizando um efeito benéfico do glicerol.
São poucos os trabalhos com referências da faixa de normalidade dos parâmetros bioquímicos em frangos de corte, e em alguns casos eles chegam a divergir. Porém, comparando com os trabalhos de vários autores (Furlan et al. 1999, Schmidt 2007, Cardoso et al. 2009, Wakenell 2010) os parâmetros bioquímicos dos frangos avaliados apresentaram-se dentro da faixa de normalidade (Quadro 5) para a espécie em todos os tratamentos, demonstrando que a inclusão de glicerina bruta não acarreta nenhum prejuízo na função renal, hepática e metabólica, que sua inclusão possibilitou a manutenção de frangos em excelente condição. Entretanto, é importante ressaltar que o teor de metanol nas glicerinas oriundas da produção de biodiesel varia de 0,01 a 14%, podendo interferir no aproveitamento da energia pelas aves (Dozier et al. 2011), tornando-se imprescindível mais estudos para avaliar a toxidez do metanol em aves, visto a escassez de relatos em relação a essa espécie.
A fosfatase alcalina é uma enzima útil na avaliação da colestase hepática, juntamente com a proteína e outros metabólitos (Borsa et al. 2006, Kaneko et al. 2008). Borsa et al. (2006) encontraram valores médios de fosfatase alcalina em torno de 2310 a 4110 U/L para frangos da linhagem Ross entre 35 a 42 dias utilizando-se pools de amostras de soro para compor suas amostras avaliadas pelo método cinético, entretanto Kanashiro et al. (2001) obtiveram valores em torno de 357,1 a 702,9 U/L utilizando método de “tempo fixo” para aves da linhagem Ross aos 43 dias, e estes valores estão de acordo com os 482,5 U/L descritos por Kaneko et al. (2008) e semelhantes aos deste experimento, com método semelhante. Minafra et al. (2010) encontraram valores em torno de 969,08 U/L para fosfatase alcalina de frangos da linhagem Cobb na fase inicial de 8 a 21 dias, também por avaliação colorimétrica, sendo necessário maiores estudos sobre os valores de referência. Apesar da variabilidade de resultados encontrados na literatura pode-se constatar que os animais do presente estudo apresentaram valores normais para FA.
O ácido úrico e a uréia são as provas bioquímicas utilizadas para avaliar a função renal das aves. O ácido úrico é o principal produto do metabolismo do nitrogênio nas aves, constituindo aproximadamente 60 a 80% do total de nitrogênio excretado pela urina da ave. É sintetizado no fígado e nos rins, sendo 90% do ácido úrico sanguíneo excretado primariamente por secreção tubular, nos túbulos proximais dos néfrons corticais. A concentração da uréia sanguínea é influenciada pela ingestão de proteínas, pela taxa de excreção renal (que pode aumentar a concentração sanguínea da uréia), pelo estado de hidratação e pela função hepática, por ser o fígado o órgão responsável pela sua síntese. As concentrações normais do acido úrico para aves estão abaixo de 15mg/dL e de ureia para aves não carnívoras de 0 a 5mg/ dL (Schmidt 2007), para frangos de corte da linhagem Cobb, Franciscato et al. (2006) observaram valores semelhantes ao do presente trabalho, portanto para todos os tratamentos analisados não foram observadas alterações na função renal.
A glicerina bruta comercializada no Brasil possui em torno de 71 a 90% de glicerol (Melo 2011), este composto segundo Simon et al. (1997), quando fornecido a partir de 10% na ração poderiam suplantar a capacidade hepática, pois observaram aumento de glicerol hepático de aproximadamente 18 µmol/g para 40 µmol/g em seu estudo realizado com frangos de corte. Entretanto o teor de glicerol do fígado, plasma ou músculo pode ser influenciado não só pelo teor de glicerol dietético, como também em função da idade do animal (Romano et al. 2014) refletindo a capacidade individual do animal para metabolização do mesmo. Já Lin et al. (1976) observaram que ao alimentar frangos por até três semanas com 20% de glicerol, não houve alteração no peso do fígado, porém ocorreu uma queda na atividade de enzimas lipogênicas do mesmo, assim como na taxa de síntese de ácidos graxos.
A concentração de proteína sérica em aves é influenciada por diversos fatores como idade, sazonalidade, condições de criação (manejo) e doenças, inclusive hepáticas. As concentrações observadas neste trabalho são próximas às encontradas por Rêgo et al. (2014). A proteína sérica juntamente com o eletrólito magnésio, auxilia na avaliação da homeostasia interna. Este mineral encontra-se no organismo associado ao cálcio e ao fósforo participando da composição do esqueleto. A absorção desse mineral pode ser afetada pela quantidade de cálcio, fosfato e proteína presente na dieta (Minafra et al. 2009).
A dieta ofertada a frangos de corte suplementadas com glicerina não promove prejuízo na homeostase hematológica das aves, pois não houve comprometimento dos leucócitos e nenhum sinal de anemia nas mesmas. Sugere-se ainda um efeito protetor do glicerol com possível aumento da vida média dos eritrócitos, o que pode ser observado por meio da contagem de reticulócitos, comprovando que esse parâmetro também pode ser utilizado para avaliar indiretamente a taxa metabólica celular. Os parâmetros bioquímicos mantiveram-se normais comparados a diferentes valores de referência, demonstrando que não houve efeito deletério na função hepática, renal e metabólica.

CONCLUSÃO

A inclusão de até 12% de glicerina com 1,4% de metanol residual em dietas de frangos de corte de 8 a 42 dias de idade pode ser realizada sem prejuízos no desempenho e saúde dos mesmos.
Agradecimentos.- À empresa Brasilecodiesel pela doação da glicerina.


Publicado originalmente em Pesq. Vet. Bras. 37(6):537-543, junho 2017. DOI: 10.1590/S0100-736X2017000600001. Acesso disponível em: https://www.scielo.br/j/pvb/a/Lyvvxprc5NsGknJ6r4JfZBN/?format=pdf&lang=pt

ANP 2009. Resolução Conselho Nacional de Política Energética No. 6, de 16.09.2009. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.

Barros J.M.S., Gomes P.C., Albino L.F.T., Rostagno H.S. & Costa L.F. 2004. Exigência de sódio para frangos de corte nas fases de crescimento (22 a 42 dias) e final (43 a 53 dias). Revta Bras. Zootec. 33:1721-1733.

Bernardino V.M.P., Rodrigues P.B., Oliveira D.H., Freitas R.T.F., Naves L.P., Nardelli N.B.S., Teixeira L.V. & Prezotto C.F. 2014. Fontes e níveis de glicerina para frangos de corte no período de 8 a 21 dias de idade. Revta Bras. Saúde Prod. Anim. 15:649-658.

Borsa A., Kohayagawa A., Boretti L.P., Saito M.E. & Kuibida K. 2006. Níveis séricos de enzimas de função hepática em frangos de corte de criação industrial clinicamente saudáveis. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec. 58:675- 677.

Cardoso V.S., Lima C.A.R., Lima M.E.F., Dorneles L.E.G., Filho W.L.T., Lisboa R.S., Junior D.S.G., Direito G.M. & Danelli M.G.M. 2009. Administração oral de piperina em frangos de corte. Ciência Rural 39:1521-1526.

Christian J.A. 2000. Red blood cell survival and destruction, p.117-124. In: Feldman B.F., Zinkl J.G. & Jain N.C. (Eds), Schalm’s Veterinary Hematology. 5th ed. Lippincott Williams and Wilkins, Philadelphia.

Dozier W.A., Kerr B.J. & Corzo A. 2008. Apparent Metabolizable Energy of Glycerin for Broiler Chickens. Poultry Sci. 87:317-322.

Dozier W.A., Kerr B.J. & Corzo A. 2011. Apparent metabolizable energy of crude glycerin originating from different sources in broiler chickens. Poultry Sci. 90:2528-253.

Duarte C.R.A., Murakami A.E., Boso K.M.O., Eyng C., Ospina-Rojas I.C. & Matumoto-Pintro P.T. 2014. Mixed crude glycerin in laying hen diets: live performance and egg quality and fatty acid profile. Braz. J. Poult. Sci. 16:351-358.

EPC 2009. Directive 2009/28/EC. European Parliament and of The Council. Official Journal of the European Union (L140):16-62.

EU 2013. Catalogue of feed materials N. 68/2013. Commission Regulation (EU). Official Journal of the European Union (L29):1-64.

Faria D.E. & Junqueira O.M. 2000. Enfermidades Nutricionais, p.431-448. In: Bechieri Junior A. & Macari M. (Eds), Doença das Aves. FACTA, Campinas.

Franciscato C., Lopes S.T.A., Santurio J.M., Wolkmer P., Maciel R.M., Paula M.T., Garmatz B.C. & Costa M.M. 2006. Concentrações séricas de minerais e funções hepática e renal de frangos intoxicados com aflatoxina e tratados com montmorilonita sódica. Pesq. Agropec. Bras. 41:1573-1577.

Furlan R.I., Morais V.M.B., Malheiros R.D., Secato E.R. & Macari M. 1999. Alterações hematológicas e gasométricas em diferentes linhagens de frangos de corte submetidos ao estresse calórico agudo. Revta Bras. Ciênc. Avícolas 1:77-84.

Geris R., Santos N.A.C., Amaral B.A., Maia I.S., Castro V.D. & Carvalho J.R.M. 2007. Biodiesel de soja–reação de transesterificação para aulas práticas de química orgânica. Quím. Nova 30:1369-1373.

Guerra R.L.H., Murakami A.E., Garcia A.F.Q.M., Urgnani F.J., Moreira I. & Picoli K.P. 2011. Glicerina bruta mista na alimentação de frangos de corte. Revta Bras. Saúde Prod. Anim. 12:1038-1050.

Henz J.R., Nunes R.V., Eyng C., Pozza P.C., Frank R., Schone R.A. & Oliveira T.M.M. 2014. Effect of dietary glycerin supplementation in the starter diet on broiler performance. Czech J. Anim. Sci. 59:557-563.

Jain N.C. 1993. Comparative hematologic features of some avian and mamalian species, p.54-71. In: Jain N.C. (Ed.), Essencials of Veterinary Haematology. Lea and Febiger, Philadelphia.

Jung B. & Batal A.B. 2011. Nutritional and feeding value of crude glycerin for poultry. 2. Evaluation of feeding crude glycerin to broilers. J. Appl. Poultry Res. 20:514-527.

Kanashiro A.M.I., Bottino J.A., Ferreira F., Castro A.G.M. & Ferreira A.J.P. 2001. Influência da administração contínua de próbioticos a frangos de corte sobre atividades enzimáticas séricas e concentração de colesterol sérico. Arqs Inst. Biológico, São Paulo, 68:11-17.

Kaneko J.J., Harvey J.W. & Bruss M.L. 2008. Clinical Biochemistry of Domestic Animal. 6th ed. Academic Press, San Diego.

Leão J.P., Ramos A.T., Maruo V.M., Souza D.P.M., Neiva J.N.M., Restle J. & Moron S.E. 2012. Anatomopatologia de amostras de bovinos alimentados com glicerol. Ciência Rural 42:1253-1256.

Lin M.H., Romsos D.R. & Leveille G.A. 1976. Effect of glycerol on lipogenic enzyme activities and on fatty acid synthesis in the rat and chicken. J. Nutr. 106:1668-1677.

Medinsky M.A. & Dorman D.C. 1995. Recent developments in methanol toxicity. Toxicol. Lett. 82-83:707-711.

Melo D.S. 2011. Viabilidade da glicerina bruta na alimentação de suínos em terminação. Dissertação de Mestrado em Zootecnia, Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG. 106p.

Menten J.F.M., Zavarize K.C. & Silva C.L.S. 2010. Biodiesel: oportunidades do uso de glicerina na nutrição de aves. Congresso Latino Americano de Nutrição Animal, Estância de São Pedro. CLANA, Estância de São Pedro, CD-ROM.

Minafra C.S., Marques S.F.F., Stringhini J.H., Ulhoa C.J., Rezende C.S.M., Santos J.S. & Moraes G.H.K. 2010. Perfil bioquímico do soro de frangos de corte alimentados com dieta suplementada com alfa-amilase de Cryptococcus flavus e Aspergillus niger HM2003. Revta Bras. Zootec. 39:2691- 2696.

Minafra C.S., Moraes G.H.K., Lopes A.C.C., Júnior C.O.L., Vieites F.M., Rezende C.S.M. & Viu M.A.O. 2009. Balanço eletrolítico e proteico dietéticos sobre as aminotransferases hepáticas, renais e séricas e teores séricos de magnésio e cloro de frangos de corte. Ciênc. Anim. Bras. 10:425-437.

Noriega M.L.V.C. 2000. Apuntes de hematología aviar:material didático para curso de hematologia aviária. Departamento de Produccíon Animal: Aves. Universidad Nacional Autónoma de México, México. 70p. (Apostila mimeo)

Pasquetti T.J., Furlan A.C., Martins E.N., Ton A.P.S., Batista E., Pozza P.C., Grieser D.O. & Zancanela V. 2014. Glicerina bruta para codornas de corte, de um a 14 e de 15 a 35 dias de idade. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec. 66:1547-1556.

Rêgo G.M.S., Silva D.R.S., Filho J.J.R., Brito T.K.P., Martins I.S., Lopes J.C., Barrozo M.M., Dourado L.R. B. & Machado L.P. 2014. Perfil bioquímico sérico de frangos de corte criados em clima sub-úmido seco. 41º Conbravet, Gramado. (CD-ROM)

Romano G.G., Menten J.F.M., Freitas L.W., Lima M.B., Pereira R., Zavarize K.C. & Dias C.T.S. 2014. Effects of glycerol on the metabolism of broilers fed increasing glycerine levels. Revta Bras. Ciênc. Avícolas 16:97-105.

Rostagno H.S., Albino L.F.T., Donzele J.L., Gomes P.C., Oliveira R.F., Lopes D.C., Ferreira A.S., Barreto S.L.T. & Euclides R.F. 2011. Tabelas Brasileiras para Aves e Suínos: composição de alimentos e exigências nutricionais. 3ª ed. UFV, Viçosa. 252p.

Sakomura N.K. & Rostagno H.S. 2007. Métodos de Pesquisa em Nutrição de Monogástricos. Funep, Jaboticabal. 283p.

SAS Institute 2004. SAS User’s Guide. Statistics. Version 9.1 ed. SAS Inst. Inc., Cary, NC.

Schmidt E.M.S., Locatelli-Dittrich R., Santin E. & Paulillo A.C. 2007. Patologia clínica em aves de produção – uma ferramenta para monitorar a sanidade avícula-revisão. Arch. Vet. Sci. 12:9-20.

Silva C.L.S., Menten J.F.M., Traldi A.B., Pereira R., Zavarize K.C. & Santarosa J. 2012. Glycerine derived from biodiesel production as a feedstuff for broiler diets. Revta Bras. Cienc. Avícolas 14:159-232.

Silva J.D.B., Fuentes M.F.F., Freitas E.R., Espíndola G.B., Sousa F.F. & Cruz C.E.B. 2006. Níveis de sódio em rações de pintos de corte na fase inicial. Revta Ciênc. Agron. 37:84-90.

Simon A., Schwabe M. & Bergner H. 1997. Glycerol supplementation in broiler rations with low crude protein content. Arch. Anim. Nutr. 50: 271-282.

Swiatkiewicz S. & Koreleski J. 2009. Effect of crude glycerin level in the diet of laying hens on egg performance and nutrient utilization. Poultry Sci. 88:615-619.

Wakenell P.S. 2010. Hematology of Chickens and Turkeys, p.958-967. In: Weiss D.J. & Wardrop K.J. (Eds). Schalm’s Veterinary Hematology. 6th ed. Wiley-Blackwell, Philadelphia.

Tópicos relacionados:
Autores:
Leilane Rocha Barros Dourado
Universidade Federal do Piauí (UFPI)
Recomendar
Comentário
Compartilhar
Profile picture
Quer comentar sobre outro tema? Crie uma nova publicação para dialogar com especialistas da comunidade.
Junte-se à Engormix e faça parte da maior rede social agrícola do mundo.