INTRODUÇÃO
Atualmente a comunidade científica tem avaliado a possibilidade de utilização de resíduos produzidos nas indústrias nas rações dos animais de produção. Essa ideia surge da necessidade da diminuição de poluentes e de redução dos custos.
A utilização do soro de leite como ingrediente na nutrição de suínos reduziria a carga de poluentes do setor agroindustrial e seria uma boa opção para melhorar a taxa de crescimento de leitões recémdesmamados (QUADROS et al., 2002).
O soro de leite também pode ser fornecido aos leitões na sua forma natural líquida, reduzindo custos.mEmbora essa prática seja conhecida dos suinocultores, principalmente em fase de crescimento e terminação, há poucos estudos avaliando a viabilidade técnica de sua utilização na fase pré-inicial.
Para a utilização do soro na alimentação dos suínos faz-se necessário conhecer a sua composição química para o correto balanceamento dos nutrientes na dieta. Além disso, é importante armazenar, manusear e fornecer de forma correta o produto aos animais, para que seja preservada a sua qualidade nutricional.
É sabido que alimentação é responsável por aproximadamente 80% do custo de produção. Esta é formulada com milho e soja em grandes proporções, com isso o pequeno produtor se torna dependente de um mercado de alimentos que é controlado por grandes empresas. Diante desse quadro, várias pesquisas têm sido desenvolvidas com o objetivo de utilizar alimentos alternativos que possibilitem reduzir a dependência dos grãos, bem como minimizar os custos e diminuir a poluição.
O soro in natura ou na forma líquida pode ser fornecido aos animais de diversas formas, dentre elas em cochos tipo canaleta, bebedouros tipo chupeta (com restrição hídrica) e em comedouros semiautomáticos como umidificador da ração.
Esse trabalho teve como objetivo avaliar desempenho e microbiota intestinal de leitões recém-desmamados, alimentados com ração e soro de leite bovino na forma in natura.
REVISÃO DE LITERATURA
O processo de desmame
Atualmente a forma de desmame mais praticada é a separação abrupta da leitegada e levada para as salas de creche, onde os lotes serão formados através de homogeneização por sexo e peso. Essa pratica é realizada quando a leitegada atinge entre 21 e 26 dias de idade (FACCIN et al., 2018).
Além da lucratividade relacionada ao ciclo produtivo das matrizes, o desmame traz preocupações relacionadas ao desempenho da leitegada, pois esse manejo causa aos leitões vários estresses, dentre eles a remoção da mãe, a homogeneização das leitegadas, modificação na dieta e modificação no ambiente (SANTOS et al., 2016).
O pós desmame é caracterizado por um baixo desempenho dos leitões, pois durante a amamentação, o leitão recebe um alimento altamente digestível e rico em gordura, lactose e caseína, permitindo assim seu rápido crescimento. Após o desmame, esses animais são submetidos a rações fareladas, com amidos, óleos e proteínas vegetais, sendo que o sistema digestório e imune não estão adequadamente desenvolvidos (SANTOS et al., 2016).
No intuito de minimizar o estresse nutricional e melhorar o desempenho da leitegada durante a fase de creche é importante que já na maternidade, o mais cedo possível, seja fornecido ração de alta palatabilidade e digestibilidade aos lactentes (EMBRAPA, 1999; MARTINS et al., 2018).
Sendo assim, um bom manejo nutricional no período pós-desmame é importante, visto que o desempenho dos leitões, durante esse período, irá influenciar a idade e o peso ao abate e, consequentemente, a lucratividade da produção suinícola (SANTOS et al., 2016).
Influência da nutrição na fisiologia intestinal dos leitões pós-desmame
O leitão recém-desmamado encontra-se num estágio de alta exigência energética, para que eles tenham um bom desempenho nessa fase é importante que sejam fornecidos alimentos palatáveis e de fácil digestibilidade, favorecendo o consumo e garantindo o atendimento desses níveis de energia (KUMMER et al., 2009).
Os leitões sofrem duas alterações repentinas em sua alimentação, sendo a primeira ao nascer, deixando a nutrição placentária para iniciar a amamentação e; a segunda ocorre no momento do desmame, deixando de consumir leite para consumir ração (SANTOS et al., 2016).
Ao recém-nascido é fornecido um alimento com uma elevada digestibilidade, o colostro, e depois o leite materno, com alto teor de gordura, adequado ao seu estado de desenvolvimento digestivo. Mesmo com dietas balanceadas e com alimentos de qualidade esse aporte nutritivo de alta digestibilidade não é garantido ao leitão desmamado (CAPOULAS, 2015), além disso, as dietas de origem vegetal podem apresentar antígenos que provocam reações de hipersensibilidade transitória no intestino (TEIXEIRA et al., 2003).
Os leitões ao serem desmamados precocemente são submetidos ao estresse fisiológico e nutricional, e isso causa danos como redução no consumo de alimento e consequentemente ao ganho de peso. Logo após o desmame, o sistema digestório destes animais necessita adaptar-se ao novo regime alimentar, dentre essas adaptações as principais são alteração do potencial hidrogeniônico (pH), à secreção de enzimas e à motilidade intestinal (SANTOS et al., 2016).
Baseado na melhoria da digestibilidade e no aumento dos níveis de ingestão de ração, o uso de dietas complexas com alta porcentagem de produtos lácteos, associados a fontes proteicas de origem animal e vegetal vem sendo utilizado para diminuir problemas digestivos no período pós-desmame (TEIXEIRA et al., 2003).
Limitações fisiológicas no sistema digestivo dos leitões pós-desmame
A acidez estomacal (pH 2,0 a 3,5) têm várias funções, dentre elas inibir formação de colônias bacterinas patogênicas no intestino delgado dos animais. Nos leitões lactentes já aos 8 dias de idade existe produção de HCl no estômago, entretanto o pH é relativamente alto devido à pequena quantidade produzida (ROSTAGNO, PUPA, 2018).
A secreção de ácido clorídrico pode ocorrer de forma eficiente em até 8 dias após o desmame, sendo diretamente dependente do tipo de dieta. A presença de lactose na dieta desses animais é importante, pois servirá de substrato para microrganismos fermentadores, que serão responsáveis por baixar o pH e inibir formação de colônias de bactérias maléficas aos sistema gastrointestinal (CHAMONE et al., 2010).
Outra forma de auxiliar a redução no pH estomacal de leitões desmamados precocemente é a adição de ácidos orgânicos nas rações. Os ácidos disponíveis no mercado são: cítrico, fórmico, fumárico, láctico, propiônico ou misturas (ROSTAGNO, PUPA, 2018).
O estresse da desmama pode influenciar negativamente a estrutura e a função da mucosa intestinal dos leitões. A superfície do epitélio ao entrar em contato com o bolo alimentar, tem a função de absorver, utilizar e encaminhar os seus nutrientes. A súbita mudança na alimentação juntamente com os outros estresses causados pela desmama favorecem a redução na altura das vilosidades e aumento da profundidade das criptas da mucosa intestinal, isso influencia na eficiência com que os leitões desmamados digerem e absorvem o alimento que consomem. Por outro lado, quando há consumo satisfatório de alimentos, ocorre elevação na secreção de hormônios gastrintestinais (secretina, colecistocinina e peptídeo insulinotrópico), resultando em maior proliferação celular nas criptas do epitélio intestinal, acompanhado por um aumento no tamanho das vilosidades (SANTOS et al., 2016).
As vilosidades são maiores nos recém-nascidos, diminuem durante a lactação, porém a redução é mais drástica após o desmame, que pode reduzir em até 63% seu tamanho nos primeiros dias (ROPPA, 1998).
Microbiota do trato gastrointestinal
Os suínos apresentam em seu trato gastrointestinal (TGI) uma complexa diversidade de microrganismos importantes para sua sobrevivência. A manutenção e equilíbrio destes microrganismos em sua microbiota intestinal dependem do tipo de alimento consumido (DINIS, 2010).
A colonização por bactérias tem seu início no momento do nascimento através do contato com o muco vaginal. Após o nascimento essa infestação continua mediante ao contato com fezes e via amamentação (CANIBE, JENSEN, 2009).
Mediante ao pH relativamente alto nessa idade devido a baixa secreção de ácido clorídrico, as bactérias tolerantes a este nível de acidez, encontram a oportunidade de colonizar diferentes seções do intestino. Nos leitões lactentes, o pH decresce com a produção de ácido láctico, funcionando como um mecanismo seleto de bactérias resistentes a esta acidez, proporcionando proteção contra a penetração de bactérias patogênicas (CANIBE, JANSEN, 2009). No intestino delgado dos suínos, os Lactobacillus, Streptococcus e Bifidobacterium são os gêneros de bactérias predominantes e estão em densidades de 107 a 109 UFC/g de mucosa. No ceco e cólon são observadas quantidades similares de Lactobacillus, Bifidobacterium e Enterococcus, além de Bacteroides e Eubacteriaceae (DINIS, 2010).
Há além desses gêneros a presença de gramnegativos conhecidos por coliformes fecais. Esse grupo inclui três gêneros: Escherichia, Enterobacter e Klebsiella. Sendo a Escherichia coli a espécie mais conhecida (SILVA,1997).
O hospedeiro para estar saldável necessita de um equilíbrio entre as bactérias benéficas e patogênicas em sua microbiota intestinal. O ideal é uma relação lactobacillus:coliformes de 1,3 ou maior, onde os lactobacillus spp. no cólon, obtidos no reto, sejam maiores que 9 log ufc/g e os coliformes menores que 7 log ufc/g. Se for obtido um índice menor que 1,3 é indicativo de que o leitão poderá apresentar diarreia (CUBILLOS, 2018).
Níveis de lactose em dietas de leitões pósdesmame
A lactose (dissacarídeo: Glicose + Galactose) corresponde a quase 50% dos sólidos totais do leite bovino, sendo a principal fonte de energia deste alimento (FOX, 1997).
Bertol et al. (2000) avaliaram quatro níveis de inclusão de lactose (0, 7, 14 e 21%) na dieta préinicial de leitões desmamados aos 21 dias de idade, objetivando definir o melhor níve de lactose nesta idade. As dietas experimentais foram fornecidas por 14 dias pós-desmame. O ganho de peso e o consumo de ração aumentaram linearmente e a conversão alimentar (CA) reduziu linearmente com o aumento dos níveis de lactose na dieta. Logo, concluíram que a suplementação da dieta com lactose nas duas primeiras semanas após o desmame melhorou o desempenho dos leitões. Porém ressalvaram que o melhor nível de inclusão de lactose deve ser definido mediante uma avaliação financeira, devido ao custo adicional desta suplementação.
Molino (2011) também avaliou diferentes níveis de inclusão de lactose (0, 4, 8 e 12% de lactose) na nutrição leitões desmamados aos 21 dias de idade do desmame aos 49 dias de idade. A lactose na dieta proporcionou maior diversidade e equilíbrio microflora intestinal. Além disso, houve um aumento no quantitativo de Lactobalillus spp. em relação ao total de microrganismos intestinais quando aumentou a percentagem de lactose das rações até 8%. Com isso, concluiu que nível de lactose a ser usado em rações para leitões desmamados aos 21 dias é de 8%.
Souza et al. (2014) estudaram a utilização do soro de leite bovino in natura para alimentar leitões desmamados aos 23 dias de idade. O experimento se baseou em cinco níveis de inclusão de soro de leite líquido (0, 7, 14, 21 e 28%). Foram avaliados consumo de ração, conversão alimentar e ganho de peso médio diário. Concluíram que é viável a inclusão de até 7% soro de leite in natura.
Soares (2018) conduziu um experimento com objetivo de avaliar os efeitos de dois níveis de proteína bruta (20 e 24%) e três níveis de lactose (8, 12 e 16%), no desempenho, na concentração de ureia sérica e na morfologia intestinal de leitões desmamados aos 21 dias de idade. Não observou interações entre os níveis de proteína bruta e lactose para o consumo de ração médio diário e ganho de peso médio diário. Contudo, a inclusão de 12% de lactose na ração de leitões, dos 21 aos 35 dias de idade, promoveu melhorias na morfologia intestinal, sendo estas melhorias mais evidentes quando os animais consumiram dietas com 24%.
Composição nutricional do soro de leite bovino
O soro de leite é um subproduto agroindustrial que representa 80 a 90% do volume total do leite na produção de queijos, sendo constituído de aproximadamente 55% dos nutrientes do leite. Apresenta forma líquida com coloração amareloesverdeado e composto por água, lactose, proteínas solúveis, sais minerais e vitaminas hidrossolúveis (ALVES et al., 2014).
Os sais minerais do leite são fosfatos, citratos, cloretos, sulfatos, carbonatos, bicarbonato de sódio, potássio, cálcio e magnésio e outros vinte em quantidades menores (FOX, 1997). Após a fabricação do queijo, permanece grande parte da proteína (96 %) e da lactose do leite (94%) no soro (Tabela 1).
TABELA 1- Concentração e distribuição média dos componentes do leite no soro de leite
MATERIAL E MÉTODOS
Todos os métodos utilizados para a manipulação dos suínos durante a realização desta pesquisa seguiram os princípios éticos da pesquisa com animais (CONCEA, 2016) e foram aprovados pela Comissão de Ética no Uso de Animais de Produção (CEUAP) da Universidade Federal de Viçosa (protocolo 90/2018) e pelo Comitê de Ética de Uso de Animais (CEUA) do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia do Espirito Santo (n° de registro 23154.000896/2018- 14).
A pesquisa foi realizada no Setor de Animais de Médio Porte do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (IFES) Campus Itapina. Realizou-se uma pesquisa experimental de caráter quantitativo.
Foram delineados por blocos ao acaso, com dois tratamentos: Um sem a adição de soro de leite bovino in natura (tratamento B) e outro com a adição de soro (tratamento A). Cada tratamento teve 12 repetições. As repetições foram divididas em 4 blocos. Cada bloco teve duração de 21 dias, sendo iniciado o próximo bloco somente quando atendido o número de animais necessários com mesma idade e peso e após a limpeza e desinfecção das instalações. Foram distribuídos 4 animais por unidade experimental, totalizando 96 leitões desmamados aos 28 dias de idade.
Os animais foram alojados em creches coletivas, suspensas a 1m do solo, com piso parcialmente ripado (tendo 1,5 m² concretado e 15m² em piso de plástico vazado). Pé direito com 3,0m de altura e telhado tipo Eternit. Todas as baias foram equipadas com bebedouro tipo chupeta e comedouros semiautomáticos com capacidade de 25kg de ração. Nas baias que receberam soro de leite bovino, foi inserido um bebedouro tipo canaleta, removível, com capacidade para 4 kg para o fornecimento de soro.
Durante o experimento a temperatura média dentro da sala foi de 24,65º C, sendo a temperatura mínima 21,51º ± 0,25º C e a máxima de 27,48º ± 0,46ºC. A temperatura foi aferida por um datalog (instalado no centro do galpão) programado para aferir temperatura e humidade de hora em hora.
As rações experimentais foram oferecidas à vontade sendo elaborada de acordo com a idade dos animais: pré-inicial de 28 a 35 dias de idade e inicial de 36 a 49 dias de idade, as rações foram formuladas para atender as exigências nutricionais descritas por Rostagno et al. (2017) (Tabela 2) e foram produzidas na fábrica de ração do IFES campus Itapina-ES. O fornecimento de ração e pesagem de sobra de ração foi realizado diariamente.
O soro foi fornecido com o limite diário de 6 Kg por repetição. Essa quantidade foi definida juntamente com o setor de agroindústria mediante a disponibilide de processamento de soro oriundo de queijo tipo Minas Frescal. O soro foi processado 3 vezes por semana (segundas, quartas e sextas-feiras) e estocado em temperatura de até 5ºC, por período máximo de 48h, atendendo a Instrução Normativa SDA - 62, de 26/08/2003. O fornecimento de soro aos animais e a pesagem da sobra de soro foi realizada três vezes ao dia.
Foram coletadas amostras de no máximo 100 gramas de fezes diretamente da ampola retal de um leitão por unidade experimental no início do ensaio, com 7, 14 e 21 dias pós-desmame. Cada amostra foi armazenada em potes coletores esterilizados e mantida refrigerada para ser analisada em laboratório, para contagem de Unidades Formadoras de Colônias (UFC) para coliformes e lactobacillus. Essas amostras foram preparadas e diluídas, adicionando-se 1 g de fezes em 99 ml de solução-tampão fosfato pH 7,2, obtendo-se uma diluição inicial de 1:100. Após diluições sucessivas até 10-8, procedeu-se o plaqueamento nos meios específicos.
Para avaliação da microbiota acidolática, foi utilizado o agar APT para Lactobacillus e para coliformes, o VRB (Violet Red Bile Agar). As amostras foram diluídas até 10-8, plaqueadas em duplicata e incubadas a 37ºC, por 48 horas (APT) e 24 horas (VRB) (SANTOS et al., 2003). As colônias foram contadas manualmente, e os resultados obtidos, expressos como log na base 10 da contagem por grama do peso das fezes. Seguindo os trabalhos de Cubillos (2016).
Para as variáveis de desempenho (ganho de peso, consumo de ração e conversão alimentar) e análises microbiológicas (UFC de lactobacillus e coliformes) a baia foi considerada uma unidade experimental. Os dados obtidos foram avaliados pelo pacote ANOVA utilizando limites de 5% de probabilidade. O programa estatístico computacional utilizado foi R Core Team (2018).
TABELA 2: Composição centesimal das rações experimentais para dois períodos
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Desempenho
Não foi observada diferença significativa (P> 0,05) para consumo de ração e ganho de peso diário, porém, foram encontrados ganhos ao avaliar conversão alimentar (P< 0,05) (Tabela 3).
TABELA 3: Desempenho de leitões desmamados consumindo soro de leite bovino in natura dos 28 aos 49 dias de idade
Ao converter o volume de soro em matéria seca, considerando 6,7% (BALDASSO, 2008), os animais consumiram média de 94,135 g em matéria seca de soro diariamente, ao somar esse quantitativo ao consumo médio diário de ração, receberam diariamente média 729,465 g de alimento (ração + soro). Apesar de não apresentar ganhos significativos (P< 0,05) os animais que receberam soro de leite bovino in natura, consumiram média de 15,57% a menos de ração, o que corresponde a 117,2 g diárias, sem perda de peso (P> 0,05) comparado a testemunha.
Aferindo o consumo diário total, aos animais que foi fornecido ração e soro de leite bovino in natura, consumiram em matéria seca 12,90% de soro de leite diariamente; 7,74% de lactose diariamente, considerando presença 4,32% (BALDASSO, 2008) deste carboidrato no soro de leite bovino in natura.
Apesar de não ter obtido ganhos significativos para consumo de ração e ganho de peso, houve diferença (P< 0,05) ao comparar a conversão alimentar. Esses resultados se assemelham com os achados de Souza et al. (2014) que também obtiveram ganhos na conversão alimentar ao incluir 7% de soro de leite em sua forma natural na alimentação de suínos pós-desmame.
Considerando a possiblidade da lactose presente no soro de leite ter influenciado na conversão alimentar, esses dados são diferentes dos encontrados por Molino (2011) que relatou que diferentes níveis de lactose não influenciaram significativamente o ganho de peso e consumo de ração e conversão alimentar e de Bertol et al. (2000) que perceberam um aumento linear (P< 0,05) no GPD e CRD e redução linear na CA nos primeiros 14 dias pós-desmame ao trabalhar com 4 níveis de lactose (0, 7, 14 e 21%) na alimentação de leitões desmamados aos 21 dias. Os autores relataram que o aumento no GDP obtido com o acréscimo dos níveis de lactose da dieta, ocorreu principalmente em consequência de aumento no CRD, indicando que a lactose atua como uma espécie de palatabilizante, estimulando o consumo de ração.
Os leitões preferiam consumir primeiro o soro e depois a ração, provavelmente devido à palatabilidade do soro, logo, mediante ao volume de soro consumido, havia diminuição de apetite e menor procura pela ração. Mesmo assim não houve diferença significativa (P> 0,05) referente ao consumo de ração e ganho de peso diário. Os suínos nessa fase normalmente têm baixo desempenho devido à imaturidade de seu sistema gastrointestinal (MARTINS et al., 2018). Animais adultos, ajustam o pH gástrico através da secreção de ácido clorídrico pela células parietal. A situação em leitões recém-desmamados é um pouco diferente, pois eles apresentam pH gástrico elevado e mais variável em relação aos animais adultos (ROSTAGNO, PUPA, 2018). Logo, há baixa atividade enzimática, havendo alta taxa de passagem principalmente de proteínas intactas que não serão absorvidas no intestino e serão utilizadas como substrato para bactérias patogênicas (CANIBE, JANSEN, 2009). Com isso, a manutenção de peso nesse caso pode ser atrelada a presença da lactose no soro de leite bovino fornecido a esses animais, pois possivelmente ocorreu produção de ácido láctico por microrganismos benéficos que utilizaram a lactose do soro como substrato, com a baixa do pH esse ambiente não é propício para a proliferação de microrganismos patogênicos como E. Coli e Salmonela (ROSTAGNO, PUPA, 2018), esse mecanismo de defesa provavelmente protegeu os leitões de infecções entéricas, diminuindo a taxa de passagem, melhorando a capacidade de absorção de nutrientes e evitando a perda de peso. Além disso, produtos lácteos são conhecidos por melhorarem o desempenho e a eficiência alimentar em leitões mediante sua palatabilidade e digestibilidade (THACKER, 1999). Leitões durante os primeiros dias pós-desmame têm respostas significativas à inclusão de 20 a 40% de lactose, estes níveis podem ser reduzidos para 10 a 15% nas semanas seguintes sem comprometer o desempenho (MAHAN et al., 2004).
Por outro lado, os animais que não receberam soro de leite também não perderam peso. Isso pode indicar que uma semana após o desmame esses animais apresentavam trato gastrointestinal capaz de realizar digestão de todos os nutrientes. Após o desmame ocorre um aumento acentuado na atividade das enzimas, principalmente devido à presença de substrato e também por uma resposta adaptativa intrínseca independente do consumo de alimento, já a atividade da lactase tende a diminuir nesse mesmo período. Dessa forma, o trato intestinal do leitão adapta-se gradativamente a outras fontes de carboidratos, tornando possível a redução do nível de lactose na dieta em torno de 10 a 14 dias após o desmame (BERTOL et al., 2000).
Microbiota gastrointestinal
Os resultados das análises microbiológicas de fezes dos animais são apresentados na tabela 4.
Não foi observada diferença significativa na avaliação da microbiota gastrointestinal (P> 0,05) para primeira e segunda coleta, enquanto nas coletas três e quatro houve diferenças na relação lactobacillus spp.:coliformes fecais (L:C) (P< 0,05) (Tabela 5).
TABELA 4- Resultados das análises microbiológicas (log de UFC/g) nas fezes de leitões consumindo ou não soro de leite in natura dos 28 aos 49 dias de idade
TABELA 5: Relação Lactobacillus spp.: Coliformes fecais (log de UFC/g) nas fezes de leitões consumindo ou não soro de leite in natura dos 28 aos 49 dias de idade
Estes resultados estão de acordo com os achados por Molino (2011) que relatou que leitões alimentados com diferentes níveis de lactose dos 21 aos 35 dias de idade tiveram sua microbiota intestinal afetada pelos tratamentos, verificou que a presença da lactose na dieta proporcionou maior diversidade e equilíbrio microbiano intestinal, e que levou a um aumento na quantidade de lactobacillus spp. em relação aos demais microrganismos intestinais ao aumentar a porcentagem de lactose até o nível 8%.
Houve uma diminuição de UFC/ g de fezes nas análises microbiológicas na terceira e quarta coleta ocasionou a elevação na relação L:C. Essa redução pode ter ocorrido mediante a manutenção de substratos para microrganismos benéficos que mediante a fermentação desses substratos reduz o pH do meio dificultando a proliferação dos coliformes fecais.
Esses resultados também foram encontrados por Augusto et al. (2014) que realizaram um experimento com animais desmamados aos 21 dias de idade, com o objetivo de avaliar os efeitos das fontes de carboidratos (lactose ou maltodextrina) e dos pesos dos leitões ao desmame, sobre os valores de pH do conteúdo do estômago, cólon e reto, e contagem de coliformes totais, Escherichia coli e Lactobacillus spp na digesta do íleo e do ceco. Verificaram que as contagens de coliformes foram menores (P< 0,05) no íleo dos animais que receberam rações com lactose, o que sugere que essa fonte de carboidrato não é importante apenas pela sua elevada palatabilidade e digestibilidade, mas, provavelmente, também pela sua ação no controle do crescimento de microrganismos indesejáveis.
As bactérias benéficas colaboram na digestão de nutrientes, proteção da mucosa e combatem outras bactérias patogênicas conhecidas como enterobactérias e/ou coliformes fecais. Quanto maior a quantidade de flora intestinal benéfica no leitão, menor é a possibilidade de diarreia, dado que a concentração de lactobacillus spp. indica uma boa saúde intestinal (CUBILLOS, 2016).
A melhora da saúde intestinal dos leitões atribuído à presença da lactose nas rações ocorre devido à fermentação microbiana deste carboidrato ao longo do intestino. Durante a lactação a lactose é a principal fonte de energia da leitegada (ROPPA, 1998), contudo após o desmame este carboidrato apresenta outras funções importantes. Durante o período posterior a desmama a capacidade de digestão da lactose mediante a ação da lactase está em constante declínio, sendo que a maioria deste carboidrato será utilizada como substrato principalmente pelos lactobacillus spp. intestinais (MOLINO, 2011).
CONCLUSÃO
O soro de leite bovino na forma in natura pode ser utilizado para leitões em fase pós-desmame, pois melhora a conversão alimentar e a relação lactobacillus spp.:coliformes fecais.
PUBLICADO ORIGINALMENTE NA REVISTA ELETRÔNICA NUTRI.TIME, EM MARÇO/ABRIL DE 2021.
Vol. 18, No 02, mar/abr de 2021
ISSN: 1983-9006
www.nutritime.com.br