Introdução
A inseminação artificial é essencial para a eficiência produtiva demandada na suinocultura industrial. A análise de fatores relacionados à qualidade do sêmen – geralmente motilidade, morfologia e concentração espermática – está entre os itens mais importantes para o aperfeiçoamento das tecnologias de reprodução assistida. A avaliação da motilidade espermática é o principal parâmetro utilizado para selecionar os ejaculados (BERNARDI, 2008), sendo a rotina de análise de doses armazenadas uma importante ferramenta de controle de qualidade de doses produzidas pelas centrais de produção de sêmen. O sistema computadorizado de análise espermática (CASA - Computer-Assisted Sperm Analysis) possibilita uma avaliação mais rápida e objetiva da motilidade, fornecendo acesso a parâmetros espermáticos individuais (AMANN & WABERSKI, 2014). O sistema CASA tornou-se uma importante ferramenta na busca de informações correlacionáveis à eficiência reprodutiva suína, sendo o custo do equipamento um fator determinante na tomada de decisão sobre sua utilização. Dessa forma, diante da possibilidade de redução de custo operacional, o objetivo do trabalho foi comparar o uso de câmara de contagem versus lâminas e lamínulas para a análise de motilidade de doses de sêmen suíno com o sistema CASA.
Material e Métodos
Foram utilizadas 18 doses inseminantes provenientes de machos reprodutores suínos (AGPIC® 337). Após a coleta do ejaculado, o sêmen foi processado e doses com 1,5 bilhão de espermatozoides em 45 ml de volume total foram produzidas em diluente BTS (Beltsville Thawing Solution, Minitüb GmbH). A análise dos parâmetros de motilidade espermática (total, progressiva, rápida, lenta, circular, local) foi realizada após 24 h de armazenamento em uma conservadora de sêmen à temperatura média de 17,8ºC ± 0,49. Para a avaliação, 1 ml de cada dose foi incubada a 38ºC durante 10 minutos. Cada amostra foi avaliada no sistema CASA (AndroVision®, Minitüb GmbH) utilizando câmaras de contagem (Leja® - 20 μm profundidade) e lâminas+lamínulas (Precision®, 18x18 mm, 0,13-0,16 mm de espessura). A câmara foi preenchida por capilaridade com 3 μl de sêmen. Para a avaliação entre lâmina e lamínula, uma gota de 5 μl de sêmen foi disposta sobre a lâmina e coberta com a lamínula. Ambas foram avaliadas ao microscópio óptico sob objetiva de 20x e contraste de fase negativo. Os campos microscópicos dos diferentes métodos foram analisados das seguintes maneiras: Câmara - padrão-ouro, cinco campos; Lamínula1 - cinco campos distribuídos igualmente ao longo do raio equatorial da lamínula, da borda ao centro, conforme descrito por Nöthling & Santos (2012); Lamínula2 - cinco campos divididos em duas lâminas, cada uma com três e dois campos distribuídos igualmente ao longo do raio equatorial da lamínula da borda ao centro. Foi determinado o coeficiente de correlação de Pearson, ao nível mínimo de significância de 5% (P≤0,05), além do coeficiente de concordância da correlação (CCC) para avaliar a concordância (LIN, 1989) de análise entre os dois métodos com uso de lamínulas e a câmara Leja®.
Resultados e Discussão
De um modo geral, o método Lamínula2 apresentou maior número de variáveis espermáticas com correlação significativa com o método Câmara do que o método Lamínula1 (Tabela 1). No entanto, nenhum coeficiente de correlação ultrapassou o valor de 0,65 e, quando considerado o CCC entre os grupos Câmara e Lamínula2, os valores para motilidade total, progressiva e circular e BCF foram 0,591, 0,512, 0,508 e 0,540, respectivamente, sendo considerados de concordância moderada, de acordo com Landis & Koch (1977). Esses valores são considerados baixos em comparação ao estudo de Nöthling & Santos (2012), o qual avaliou a motilidade espermática de touros e observou CCCs altos, próximos a 0,9. Essa diferença poderia estar associada ao número de campos utilizados no presente estudo (cinco campos), o qual resultaria em médias imprecisas de motilidade pela análise de um número pequeno de subpopulações espermáticas. Foi sugerido que a média de motilidade de 12 campos distribuídos igualmente ao longo do raio equatorial da lamínula, da borda ao centro, é a que melhor representa a motilidade do sêmen bovino obtida em câmara de contagem (NÖTHLING & SANTOS, 2012). Porém, na rotina de processamento de sêmen suíno, a contagem de um número elevado de campos torna-se impraticável, pois o espermatozoide suíno tem alta suscetibilidade à baixa tensão de oxigênio existente entre lâmina+lamínula (BORTOLOZZO et al., 2005). Além disso, a manipulação, a exposição à luz e ao oxigênio por tempo prolongado podem desencadear processos de oxidação que reduzem a motilidade espermática (PINART & PUIGMULE, 2013). É possível que as diferenças observadas entre câmara e lâmina+lamínula possam também estar relacionadas com a profundidade das mesmas e à aderência da superfície de vidro com as células (MASSÁNYI et al., 2008), além de estimativas incorretas devido ao viés de amostragem entre as subpopulações. Apesar das dificuldades encontradas nas análises dos grupos Lamínula1 e Lamínula2 (falta de padronização da distribuição da gota e formação de bolhas), gerando necessidade de repetição de procedimentos, é importante ressaltar a maior viabilidade de repetir a análise em menor número de campos a cada vez. Na rotina de análise de doses armazenadas, cada partida deve ter uma dose retida para avaliação durante o período de armazenamento ou até mesmo além do período utilizado pelas granjas. Entretanto, com grande número de doses a serem analisadas, o uso de câmaras de contagem torna-se inviável devido ao custo, aproximadamente 28 vezes maior comparado ao de lâmina+lamínula. Assim, é importante continuar investigando maneiras de aperfeiçoar o método lâmina+lamínula, no intuito de viabilizar o uso da análise computadorizada para o controle da qualidade de doses inseminantes.
Tabela 1 – Correlação entre três métodos de análise para características de motilidade (Mot) de sêmen suíno em sistema computadorizado.
*P<0,05; ** P<0,01; *** P<0,001.
DP: desvio padrão; CORR: coeficiente de correlação; CCC: coeficiente de concordância da correlação; ALH: amplitude de deslocamento lateral da cabeça BCF em relação ao traçado médio: frequência com que o traçado real cruza o traçado médio; DAP: distância percorrida do traçado médio; DSL: distância percorrida em linha reta; DCL: distancia percorrida real; VAP: velocidade do trajeto médio; VCL: velocidade em linha curvilínea; VSL: velocidade em linha reta; LIN (Linearidade): VSL/VCL; WOB (Wobble): VAP/VCL.
Conclusões
Apesar de haver concordância entre os métodos, os valores estão abaixo do necessário para garantir que o método de câmara possa ser substituído pelo método com lâmina+lamínula, sobretudo em situações em que a precisão da informação é essencial. Por outro lado, é possível que o aperfeiçoamento do método lâmina+lamínula resulte em grau de precisão suficiente para a análise de variáveis como motilidade total e progressiva, na rotina de controle da qualidade de doses inseminantes, em centrais de inseminação.
Referências Bibliográficas
1. AMANN, R. P.; WABERSKI, D. 2014. Computer-assisted sperm analysis (CASA): Capabilities and potential developments. Theriogenology, (81): 5-17.
2. BERNARDI, M. L. 2008. Tecnologias aplicadas no exame do ejaculado suíno para a produção de doses de sêmen de alta qualidade. Acta Scientiae Veterinariae, (36) (Supl 1): 5-16.
3. BORTOLOZZO, F. P.; BENNEMANN, P. E.; BERNARDI, M. L.; WENTZ, I. 2005. Coleta do ejaculado. In: BORTOLOZZO, F. P.; WENTZ, I. (Ed.). Suinocultura em Ação - Inseminação artificial na suinocultura tecnificada. Porto Alegre: Palotti, v.2, cap. 6, p.57-67.
4. LANDIS J. R.; KOCH, G. G. 1977. The measurement of observer agreement for categorical data. Biometrics, 33(1): 159-74.
5. LENZ, R.W.; KJELLAND, M.E.; VONDERHAAR, K.; SWANNACK, T.M.; MORENO, J.F. 2011. A comparison of bovine seminal quality assessments using different viewing chambers with a computerassisted semen analyzer. American Society of Animal Science, (89): 383-388.
6. LIN, L. I. 1989. A concordance correlation coefficient to evaluate reproducibility. Biometrics, 45(1): 255- 268.
7. MASSÁNYI, P.; CHRENEK, P.; LUKÁC N.; MAKAREVICH, A.V.; OSTRO, A.; ŽIVCAK, J.; BULLA, J. 2008. Comparison of different evaluation chambers for analysis of rabbit spermatozoa motility parameters using CASA system. Slovak Journal of Animal Science, (41) (Supl 2): 60-66.
8. NÖTHLING, J.O.; SANTOS, I.P. 2012. Which fields under a coverslip should one assess to estimate sperm motility? Theriogenology, (77): 1686-1697.
9. PINART, E.; PUIGMULE, M. 2013. Factors affecting boar reproduction, testis function, and sperm quality. In: BONET, S.; CASAS, I.; HOLT, W.; YESTE, M. (Ed.) Boar reproduction: fundamentals and new biotechnological trends. Berlin: Springer, p. 109-204.
***O TRABALHO FOI ORIGINALMENTE APRESENTADO DURANTE O XVII CONGRESSO ABRAVES 2015- SUINOCULTURA EM TRANSFORMAÇÂO, ENTRE OS DIAS 20 e 23 DE OUTUBRO, EM CAMPINAS, SP.