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Uniformização no momento do alojamento na creche: vale a pena realizar este manejo?

Publicado: 27 de dezembro de 2021
Por: Jamil Faccin e Fernando Bortolozzo
Introdução
Um dos grandes desafios da suinocultura atual é a escassez de mão de obra qualificada para execução de manejos rotineiros nas granjas. A partir disto, os sistemas de produção estão priorizando manejos essenciais que geram resultado e questionando práticas outrora tidas como tradicionais, mas sem contribuição comprovada (BORTOLOZZO et al., 2015). Sistemas automatizados de ambiência e alimentação auxiliam muito na rotina de produção, no entanto, manejos como atendimento ao parto e classificação dos leitões por peso em creche e terminação exigem execução inteiramente dependente da mão-de-obra.
A produção de suínos com baixa variabilidade de peso traz benefícios para a cadeia, uma vez que a indústria requer e bonifica carcaças por uniformidade. Este fato está diretamente relacionado à fundamental padronização para um produto final de qualidade. No campo, baias com mínima variação de peso são mais eficientes no uso dos nutrientes da dieta (GONYOU, 1998). No entanto, a prática de classificar os animais por peso visando à formação de baias com baixa variabilidade, nas fases de creche e terminação, realizada de forma pontual ou constante, é uma atividade que exige muito esforço e empenho da equipe.
O estresse gerado pelo desmame faz com que uma grande parcela dos leitões sofra com um jejum devido à dificuldade de adaptação ao novo ambiente, alimento e companheiros de baia (MORMÈDE & HAY, 2003). Sabe-se que, por apresentarem menores reservas corporais, os leitões leves iniciam o consumo de ração antes que os demais (BRUININX et al., 2001). No entanto, existem poucas informações sobre o impacto do método de alojamento no consumo imediatamente após o desmame e no desempenho zootécnico subsequente.
Na fase de terminação, O’Quinn et al. (2001) observaram maior ganho de peso diário (GPD) para as baias que foram alojadas com alta variação de peso e, ao final, a variação foi semelhante à das baias uniformizadas ao alojamento. Já Van de Loo et al. (1997) relataram melhora no GPD para baias com maior uniformidade de peso. É possível que ao prover melhores condições de espaço, ambiente e/ou nutrição para baias uniformes de leitões leves, possa-se melhorar o desempenho desta classe de peso (BRUMM et al., 2002) e, consequentemente, o resultado e a variação de peso de um lote de animais classificados por peso. Porém, para animais na fase de creche, além de existirem poucos relatos, estes são conflitantes. Francis et al. (1996) relataram melhor desempenho das baias classificadas por peso devido à taxa de crescimento de leitões pequenos ser melhor quando alojados em baias de menor coeficiente de variação (CV). Já Cámara et al. (2016), apesar de observarem desempenho zootécnico similar entre baias de alta e baixa uniformidade, relataram uma tendência de maior eficiência alimentar a favor das baias com alta variabilidade de peso pós-desmame.
Com a lacuna existente sobre a real necessidade da prática deste manejo tradicional em granjas comerciais e por existir, apesar de poucos, alguns relatos que indicam dificuldade de manipulação do CV de uma população, é pertinente avaliar o manejo de classificação por peso ao alojamento.
Desafios para o consumo de alimento pós-desmame
Um dos fatores estressantes mais importantes para leitões recém-desmamados é a brusca alteração de dieta líquida (baseada em leite) para dieta sólida (baseada em cereais). Não obstante, isso ocorre concomitantemente à introdução em um novo ambiente, com alterações nos grupos, estabelecimento de hierarquia sociais, desafios sanitários, além da separação da porca, e o efeito desta combinação de fatores é negativo. Leitões nos dois primeiros dias de creche perdem até 10% do peso vivo e, muitas vezes, até o sétimo dia pós-desmame, este peso não é recuperado (DUNSHEA, 2003). O balanço entre ganho e perda de peso é altamente variável nesta fase e este fato pode ser comprovado quando se compara os últimos dias de lactação, quando os leitões apresentam uma taxa de crescimento de 200 a 300 g por dia e podem apresentar um período com um ganho de peso muito baixo, ou em alguns casos, inclusive, com perda de peso imediatamente após o desmame (BROOKS & TSOURGIANNIS, 2003). Desta forma, a principal consequência dos manejos e eventos negativos dos primeiros dias de creche é a redução ou até ausência de consumo voluntário do novo alimento imediatamente após o desmame (DONG & PLUSKE, 2007; PLUSKE et al., 1997).
A alta variação de peso e dos manejos que os leitões sofrem na lactação faz surgir a hipótese de que o consumo alimentar logo após o desmame pode apresentar uma grande variabilidade em uma população de leitões. Bruininx et al. (2001), através de estações computadorizadas, aferiram o consumo individual de leitões imediatamente após o alojamento na creche, com idade de 28 dias. Três pontos relevantes são apresentados na Figura 1. Primeiro, é confirmada a ideia da ocorrência de variação no intervalo entre o desmame e o momento do primeiro consumo de ração, com aproximadamente 10% dos leitões demorando mais de 40 horas para ingerir alimento e alguns levando quase 100 horas para tal. Segundo, o número de leitões que iniciam o consumo à noite (sem luz) é praticamente nulo. E por último, leitões leves ao desmame tendem a iniciar o consumo antes que os demais. Segundo Brouns & Edwards (1994), por apresentarem menores reservas corporais e participarem menos das disputas hierárquicas, os leitões pequenos buscam iniciar o hábito de consumo mais precocemente.
As consequências negativas de um baixo desempenho nos primeiros dias de creche estão relacionadas à incidência de diarreias, crescimento insuficiente e remoção por subdesenvolvimento (DONG & PLUSKE, 2007). Entretanto, nem todos os estudos que investigaram a influência da taxa de crescimento nos primeiros dias pós-desmame no desempenho subsequente confirmaram este fato. Kim et al. (2001) observaram que um maior GPD nas duas primeiras semanas de creche resultou em uma maior taxa de crescimento do desmame ao abate e necessidade de menos dias para atingir 110 kg de peso vivo. Já Wolter & Ellis (2001) relataram que o efeito positivo de um melhor desempenho de leitões recém-desmamados perdurou somente até a saída de creche, pois ao abate, independentemente do GPD inicial, o peso dos animais foi o mesmo. Porém, o peso ao desmame gerou um efeito mais duradouro, apresentando correlação positiva com peso final da fase de terminação.
Alguns estudos recentes indicam uma possível relação entre a taxa de crescimento nos primeiros dias de creche e a taxa de remoção. Faccin et al. (2016) demonstraram que o GPD na primeira semana pós-desmame possui interação com a categoria de peso ao desmame quando a variável analisada é subdesenvolvimento na creche. Leitões leves e médios tiveram probabilidade de remoção de, respectivamente, 21 e 10%, se não aumentassem de peso ao final da primeira semana. No entanto, quando estas duas categorias de leitões ganharam peso, independentemente da quantidade, nos primeiros sete dias de creche, a probabilidade de remoção foi de < 4%. Para leitões pesados, os percentuais foram os mesmos, ≤ 2,3%, independente do GPD na primeira semana. Este fato reforça a necessidade de buscar alternativas diferenciais para estímulo e melhoria do consumo logo após o desmame, principalmente para leitões de baixo peso (WILLIAMS, 2003).
Utilizando corante na ração como marcador fecal, Laskoski et al. (2016) estudaram o início de consumo na fase de creche. Leitões que não apresentaram o marcador nas fezes até 42 horas pós-desmame (indicando atraso no consumo) tiveram aproximadamente três vezes mais chance de apresentarem subdesenvolvimento que leitões que já demonstravam consumo prévio, independentemente do peso ao desmame. Portanto, um jejum prolongado gera prejuízos semelhantes para leitões de baixo, médio ou alto peso de entrada na creche
Uniformização no momento do alojamento na creche: vale a pena realizar este manejo? - Image 1
Outro fator que pode interferir no consumo alimentar imediatamente após o desmame é o grau de uniformidade do grupo, principalmente em baias que são alojadas com leitões de pesos muito semelhantes, conferindo baixo CV, e estes pertencendo ao terço de animais mais pesados ao desmame (BRUININX et al., 2001). Estes animais disputam a hierarquia da baia com mais intensidade e existe uma correlação negativa entre ocorrência de brigas e número de visitas ao comedouro, neste caso prejudicando o consumo alimentar voluntário nos primeiros dias de creche (NIELSEN et al., 1996). Corroborando com estes dados, Faccin (2017) observou que o terço de leitões mais pesados, quando classificados ao alojamento, retarda o início de consumo em relação aos médios e pequenos. Já em baias mistas, com alta variabilidade de peso ao alojamento, as três categorias de peso não apresentaram diferenças significativas no início de consumo pós-desmame (Figura 2).
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Interações sociais entre leitões A mistura de leitões
não familiarizados entre si, com destaque para o momento pósdesmame, está diretamente relacionada à ocorrência de brigas. Este tipo de interação social acaba por estabelecer a dominância hierárquica do grupo, mas as disputas podem impactar negativamente na rentabilidade da produção devido à alteração no quadro de bem-estar e diminuição da taxa de crescimento dos animais (STUKENBORG et al., 2011). O comportamento agressivo do suíno baseia-se em diversos fatores, como: espaço de baia disponível, sistema de alimentação, tamanho dos grupos formados, etc. (EWBANK & BRYANT 1972; HESSEL et al., 2014; SCHMOLKE et al., 2004). Ao considerar que o nível de agressividade é dependente, também, do tamanho e peso dos animais do novo grupo formado, afinal, leitões maiores tendem a dominar indivíduos menores (RUSHEN, 1987), a ocorrência de disputas sociais deve ser levada em conta quando se questiona e avalia a prática de uniformização de leitões em fase de creche.
Neste contexto, destacam-se relatos de que a incidência de disputas foi menor em grupos de leitões cujo coeficiente de variação do peso era maior (TINDSLEY & LEAN, 1984), indicando que a relação de dominância se determina de forma mais estável e rápida em grupos de leitões com grande variação de peso. Rushen (1987) formou baias compostas por quatro leitões, sendo que em metade dos grupos os animais apresentavam grande diferença de peso (24,3%) e nas demais baias tal variação era pequena (1,6%). O autor encontrou diferença principalmente em relação à duração das disputas, enfatizando-se que os grupos cujo peso apresentava menor coeficiente de variação exibiram disputas mais longas. Diante disto, sugere-se que a interação entre leitões de diferentes tamanhos caracteriza-se por uma maior facilidade dos indivíduos em julgar a capacidade de briga do adversário. Em contrapartida, o cenário de disputas em grupos de alta uniformidade se agrava, com destaque para as baias de animais maiores, uma vez que estes tornam as brigas mais equilibradas e, portanto, mais prolongadas devido ao seu alto potencial de dominância (D’EATH, 2002).
O comportamento agressivo do suíno também se baseia em fatores, como espaço de baia disponível. Ewbank & Bryant (1972) avaliaram o efeito de três densidades (0,56; 0,77 e 1,19 m2 por leitão) sobre o comportamento agressivo de leitões com oito semanas de idade. Observou-se, maior ocorrência de disputas em baias com menor espaço/leitão, provavelmente devido à maior frequência de contato ocasionada pela diminuição de área de baia. Outro potencial fator desencadeante de brigas é o sistema de alimentação, uma vez que a competição por alimento é julgada como inerente ao comportamento dos suínos. Sendo assim, Hessel et al. (2014) avaliaram a relação entre diferentes frequências de arraçoamento (três e nove vezes ao dia) e o comportamento de leitões em fase de creche e terminação. Como ambos os grupos receberam a mesma quantidade diária de alimento, o grupo submetido à maior frequência exibiu um comportamento mais agressivo dos animais, assim como maior grau de lesões de pele. Mencionase, ainda, a influência do tamanho dos grupos formados sobre a interação social de leitões, sugerindo-se que grupos com um maior número de animais tendem a exibir um comportamento mais agressivo devido ao desafio de relembrar o resultado de disputas anteriores, resultando na necessidade de reforçar a dominância frequentemente (LI & WANG, 2011). Contudo, os estudos exibem resultados não tão sólidos, ressaltando-se a dificuldade de compreender a verdadeira organização social em grupos grandes (TURNER et al., 2001).
Variação de peso na produção de suínos
As variações biológicas entre os indivíduos existem e são a base da seleção natural, artificial e do melhoramento genético das variáveis de desempenho zootécnico. Mesmo que fosse possível minimizar as causas genéticas e ambientais das variações, ainda existiria uma alta amplitude de taxas de crescimento e, consequentemente, peso vivo nas granjas comerciais (ELLIS et al., 2016).
É natural e sabido que a variação de peso corporal está relacionada à vida do suíno desde seu desenvolvimento no ambiente intrauterino. Ao competirem por fatores bioquímicos, os conceptos buscam por sobrevivência e, quando na fase fetal, buscam maior superfície placentária visando um melhor desenvolvimento (FOXCROFT & TOWN, 2004). Isto resulta, ao nascimento, em leitões com menor peso médio ao nascer e com um CV no peso da leitegada próximo de 20 - 25% (MILLIGAN et al., 2001). Desta maneira, o leitão mais pesado de um grupo de nascidos pode pesar até três vezes mais que o leitão mais leve. Existe também, um efeito na variação de peso ao nascimento oriundo do tamanho da leitegada. Quiniou et al. (2002) demonstraram que o aumento de nascidos de ≤11 para ≥16 leitões está ligado a uma redução no peso médio dos leitões ao nascimento de 1.59 para 1.36 kg, sendo que a cada leitão adicional, em média, há uma redução de 35 g nos demais da leitegada. O resultado disto é um aumento na porcentagem de leitões com peso inferior a 1 kg de 7 para 23%, elevando a variabilidade de peso e reduzindo o percentual de sobrevivência. Como os sistemas de produção vinham sofrendo com este impacto, nos últimos três anos, a variável peso ao nascer recebeu atenção especial nos programas de seleção genética e, nos primeiros dois anos desta ação, foi possível elevar em 60 g o peso médio ao nascimento (HERRING, 2016). A variação de peso tende a reduzir ao desmame, atingindo patamares entre 10 e 20% e chegar próximo a 8 e 15% ao abate (DRITZ & HANCKOK, 2002), muito devido a perdas ao longo da vida dos suínos, pois animais com desempenho insuficiente tendem a apresentar maior chance de morte ou descarte (REHFELDT & KUHN, 2006).
Antes dos sistemas de produção adotarem o manejo all-in-all-out, as consequências negativas que a variação de peso e crescimento geram estavam “escondidas” (PATIENCE et al., 2004). Isto porque, com a produção em fluxo contínuo, somente os animais mais pesados eram enviados ao abate, mascarando a amplitude de pesos individuais de um mesmo lote. A partir dessa constatação, a variação de peso passou a ser investigada como um importante indicador de produção e rentabilidade. Morrison & Deen (2000) entendem que o nível de variação de peso de um determinado lote de suínos está relacionado com o desempenho zootécnico, ou seja, um CV acima do esperado tende a indicar uma piora na performance de um grupo de animais. Claramente, um CV baixo aliado a um peso médio insuficiente não é o desejado, portanto, é necessário e estratégico entender como mensurar a variabilidade para criar ações que visam melhorar a performance produtiva dos rebanhos (PATIENCE et al., 2004).
Um fato de muita relevância quando se discute variação de peso é que muitas empresas atendem mercados distintos com, muitas vezes, diferentes exigências de peso corporal dos animais, e o fato de não se atingir as especificações do peso almejado de cada comprador pode comprometer a rentabilidade de um sistema de produção (O’QUINN et al., 2001; PATIENCE & BEAULIEU, 2006). Este ponto está relacionado tanto com a compra de animais para abate como com animais em saída de creche para terminação. Analisando dados de abatedouros canadenses, Patience et al. (2004) observaram que apenas 53,4% das carcaças atingiam a “janela” ótima de lucratividade, de 85 a 95 kg e que 67,9% alcançavam uma amplitude ainda satisfatória financeiramente para o sistema de produção (85 a 100 kg). Utilizando os custos de produção e rentabilidade da época, assim como os padrões de carcaças recomendados pela indústria, os autores estimaram que o percentual de carcaças que não atingiam o peso almejado onerava a cadeia produtiva em U$ 6,9 milhões anuais.
O peso ao desmame pode ser um bom estimador de desempenho no futuro e da necessidade de dias para atingir o peso desejado de abate (WOLTER & ELLIS, 2001). O peso médio de um grupo de leitões desmamados depende de muitos fatores como, por exemplo, o peso ao nascimento, genética, consumo de ração da matriz, idade, ambiência, entre outros (MUNS et al., 2016). Por haver relação entre peso médio e CV, ações que almejam melhorar o peso ao desmame podem, indiretamente, reduzir a variabilidade de um lote de leitões (MAIN et al., 2004).
Todos os manejos que visam reduzir a variação de peso dos leitões ao desmame, saída de creche e abate, estão relacionados a dois pontos essenciais: aumento do peso médio do grupo ou estratégias especiais para o percentual (5 – 25% dependendo do sistema) de leitões mais leves (TOKACH, 2004). Uma das ações que parece realmente exercer um efeito considerável na redução do CV é o aumento da idade de desmame. Main et al. (2004) observaram que esta prática resultou em redução da variação de peso ao fim do período de creche e também com 156 dias pósdesmame. Aumentar a idade ao desmame reduz o CV por meio de dois pontos, uma vez que a variação do peso aumenta conforme média de idade ao desmame é reduzida, e que leitões mais jovens crescem mais lentamente que leitões mais velhos nas fases de creche e terminação (TOKACH, 2004).
Além de manejos ineficientes, a alta variabilidade de peso e desempenho pode ser resultado de leitões que marcadamente crescem mais lentamente que os demais, mesmo em condições ideais de ambiente e nutrição (DOUGLAS et al., 2014a). Aumentar o peso da fração de leitões mais leves parece ser uma estratégia lógica para a redução da variação de peso do grupo. Entretanto, ações que visam tal efeito são pouco eficientes e trabalhosas. Kummer et al. (2015) forneceram a leitões neonatos suplementos vitamínico, mineral e proteico. Neste estudo, não foram encontradas diferenças em peso ao desmame nem consumo de colostro, apenas uma melhora na sobrevivência para uma faixa de leitões que nasceram com 1 a 1,2 kg, confirmando a complexidade em manipular o peso dos leitões ao desmame. Já Wolter et al. (2002a) relataram que ao fornecer um substituto de leite, durante a fase de lactação, aos leitões de baixo peso ao nascer aumentou, aproximadamente, 900 g/leitão ao desmame. No entanto, esta diferença, em comparação com os leitões do tratamento controle, não foi mantida e se diluiu no período de creche e terminação.
O fornecimento de ração para os leitões ainda na fase de aleitamento, conhecido como creep feeding é uma prática comum nas granjas de todo o mundo. Como uma fonte suplementar de nutrientes, este manejo pode resultar em melhor ganho de peso dos leitões na maternidade, aumentando o peso de desmame (MAVROMICHALIS, 2006). Com esta informação, supõe-se que a variação de peso ao desmame possa ser reduzida. Entretanto, Sulabo et al. (2010) não observaram diferenças entre os CV do peso das leitegadas que receberam creep feed a partir do terceiro dia de vida em relação às que não receberam. Apesar de nem todos os leitões de uma mesma leitegada apresentar consumo, o ganho de peso dos que comprovadamente comeram a ração foi maior na fase de creche. Assim, esta estratégia pode gerar resultados positivos na redução da variação de peso na creche, uma vez que está relacionada com melhoria de desempenho nesta fase (BRUININX et al., 2002). No entanto, fica dependente do percentual de leitões que consomem a ração na maternidade sendo que, muitas vezes, este valor é baixo quando não se investe em comedouros adequados, na complexidade e qualidade da dieta, em flavorizantes e, até mesmo, na qualidade do ambiente (SULABO, 2009).
É perceptível que leitões que nascem com baixo peso apresentam desempenho inferior aos demais durante as fases seguintes. É possível que nas fases de crescimento e terminação, fornecer condições que favoreçam um melhor desempenho zootécnico, incluindo instalações e manejos dos 20% leitões mais leve do grupo reduza o CV do peso (SCHINKEL et al., 2004). Contudo, estas estratégias envolveriam logística diferenciada e necessitariam uma análise econômica para discriminar a produção e captar as vantagens que a redução da variação de peso poderia gerar (TOKACH, 2004). Estima-se que, em geral, o CV do peso vivo de animais em fase final de terminação reduza aproximadamente 0,7% para cada 10 kg de aumento de peso (ELLIS et al., 2016).
Outro ponto importante a ser considerado é a capacidade dos leitões de alterarem de categoria de peso ao longo da vida. Sendo assim, basear-se somente no peso ao nascer para indicar o potencial de crescimento nas fases seguintes parece ser um equívoco. Este fato é confirmado através do percentual de leitões que permanece em sua classe de peso ao nascimento, o qual é menor que o número de animais que aumentam ou diminuem uma ou mais classes até a idade de abate (Figura 3) (DOUGLAS et al., 2014b; MAGNABOSCO et al., 2015).
Uniformização no momento do alojamento na creche: vale a pena realizar este manejo? - Image 3
Ao se discutir desempenho de suínos em creche e terminação, algumas informações são primordiais. Tais como o tamanho do grupo, espaço de comedouro por suíno e densidade das baias. Porém, não é há relatos que comprovem o efeito destes fatores no CV do peso final. Schmolke et al. (2003) não observaram diferenças em desempenho e variação de peso final de suínos na fase de terminação quando variaram o tamanho do grupo de 10 a 80 indivíduos por baia. Comparando 2 e 4 cm lineares de comedouro por leitão, Wolter et al. (2002b) não observaram diferenças significativas no CV de leitões ao final das fases de creche e terminação. Já ao avaliar o espaço físico disponível por suíno em um sistema wean-to-finish, Wolter et al. (2003) constataram que ao aumentar de 0,3 m² para 0,6 m² por suíno por 12 a 14 semanas pós-desmame, não alterou o CV das baias em nenhum momento até próximo à idade de abate.
Manejo de classificação por peso nas diferentes fases de produção
Já nas primeiras horas de vida os leitões podem ser submetidos à classificação devido à alta variação no seu peso corporal. Este manejo, recomendado que seja realizado entre 6 e 24 horas pós-nascimento, visa, além de disponibilizar tetos para todos os nascidos, uniformizar as leitegadas por tamanho, dando chance de melhor desenvolvimento, principalmente para leitões que nasceram com baixo peso (BIERHALS et al., 2012). Apesar da alta exigência de mão-de-obra e do risco de transmissão de doenças entre leitegadas, a eficiência e necessidade desta prática é sustentada pela melhora significativa, especialmente da sobrevivência pré-desmame (STEWART & DIECKMAN, 1989).
Em condições comerciais, ao serem desmamados, os leitões são alojados em baias de uma sala de creche, compondo um lote de idade semelhante. A ação de classificar os animais por tamanho é comum, ocorrendo de forma empírica e formando baias de animais com pesos aproximados, o que resulta em baias com baixa variação de peso inicial (CÁMARA et al., 2016). Esta prática muitas vezes é repetida ao se realizar o alojamento na terminação, quando na produção em três sítios (O’QUINN et al., 2001). No entanto, os pesos e o desempenho zootécnico dos leitões que compõem um lote seguem uma curva normal, sendo muito difícil alterar esta distribuição, fato que contribui para o atingimento do peso final desejado em diferentes idades de cada suíno, reduzindo, assim, a rentabilidade da sala e prejudicando logísticas e, também, o vazio sanitário (PEINADO et al., 2008).
Utilizando fêmeas e machos castrados com peso médio ao desmame de 7,5 kg, Cámara et al. (2016) alojaram baias com um ou dois desvios padrão do peso médio do grupo de leitões. Na fase de creche, que neste estudo compreendeu do dia 28 ao 77º dia de vida, baias mais uniformes não apresentaram melhorias em CRMD e GPD quando comparadas às baias com menor uniformidade. Inclusive, houve uma tendência de melhor CA em, aproximadamente, 39 g a favor das baias com leitões de dois desvios padrão da média. Contudo, ao avaliar o grupo de animais, ou seja, todas as repetições de cada tratamento ao fim da fase creche, as baias com apenas um desvio padrão inicial apresentaram menor CV (12,0% vs. 15,7%).
Bruininx et al. (2001) avaliaram, também na fase creche, o desempenho de leitões desmamados com 27 dias em baias com peso homogêneo, de pequenos, médios e grandes e de baias que continham um terço de cada categoria de peso. Das variáveis de performance zootécnica, apenas observou-se uma pequena melhora na eficiência alimentar (Ganho:Consumo) de, aproximadamente, 20 g para o grupo das baias mais uniformes quanto ao peso do desmame. Entretanto, este estudo avaliou a fase de creche somente até o 34º dia pós-alojamento. Peso médio, GPD e CRMD foram semelhantes entre os tratamentos, fato que, de certa forma, faz com que o manejo de classificação por peso dos leitões a fim de gerar baias uniformes não produza benefícios suficientes para justificar sua real necessidade.
Em uma granja comercial no sul do Brasil, Faccin (2017) comparou baias classificadas por peso ao alojamento da creche e baias de peso misto. As variáveis de desempenho zootécnico não apresentaram diferenças, apenas o CV final das baias, que foi menor para baias classificadas (13,3% vs. 15,6%). No entanto, a variação de peso entre as populações foi praticamente a mesma, 15,8% e 16,2%, para classificados e mistos, respectivamente (Tabela 1).
No início da fase de terminação, brigas e agressões decorrentes de disputas pela dominância do novo espaço tendem a gerar mais injúrias corporais que nas fases anteriores (O’CONNELL et al., 2005; WEARY et al., 2002). O fato de classificar os animais por peso nesta fase pode não contribuir, sob nenhum aspecto, com a redução da variação de peso final, pois segundo Tindsley et al. (1984) e Gonyou (1998), o crescimento do suíno tende a seguir uma direção rumo a uma variação de peso final comum, sendo assim, reduzir a variabilidade inicial das baias não contribui para um menor CV ao final da fase de terminação. O’Quinn et al. (2001) compararam baias classificadas com alto e baixo CV de peso no momento do alojamento na terminação, 9,5 e 4,2%, respectivamente. Ao longo do período experimental de 91 dias, esta diferença foi sofrendo uma redução ao ponto de, no final, os grupos apresentarem o mesmo CV de peso. Os animais de baias com maior variação inicial apresentaram melhor taxa de crescimento e peso final, concluindo que não existe vantagem na realização deste manejo ao alojamento na terminação.
Uniformização no momento do alojamento na creche: vale a pena realizar este manejo? - Image 4
Discute-se muito a respeito do desempenho do terço de leitões mais leves em todas as fases de produção. Pelo fato de possuírem menor força física, estarem mais susceptíveis a enfermidades e serem geralmente submissos na hierarquia da baia, avaliar o desempenho destes animais quando submetidos a diferentes manejos é uma óptica pertinente (SORNSEN, 1998). Porém, ações de uniformizações e classificações de suínos ao alojamento de creche e terminação não parecem interferir no desempenho dos leitões desta classe de peso. Brumm et al. (2002), em um sistema wean-to-finish, removeram para outras baias os cinco leitões mais leves de grupos de 20 suínos na terceira semana pós-desmame, ou no meio do período de terminação, com o objetivo de melhorar o desempenho destes primeiros. Entretanto, ao comparar estas ações ao grupo de animais que não sofreram classificações do desmame ao abate, observaram que o CV, a taxa de crescimento, o consumo diário de ração e a conversão alimentar não foram alterados. Os autores ainda concluem que é possível que diferentes planos nutricionais para os animais leves poderiam resultar em melhor performance para esta prática de classificação. Mais tarde, Brumm et al. (2006) realizaram o mesmo experimento, porém removendo os animais mais pesados das baias. Os resultados não foram diferentes dos anteriores, indicando que uma vez que uma população é alojada na creche ou terminação, práticas que ambicionam melhorar a performance com classificações por peso ao longo das fases de crescimento improvavelmente atingem este objetivo.
Dificilmente algum manejo específico consegue reduzir a variação de peso de um determinado grupo de animais. Contudo, a estratégia de “abate segregado”, ação que visa o envio para o abate da porção de animais mais pesados de um lote, pode resultar em menor variação de peso ao abate (DEDECKER et al., 2005). A redução na variabilidade de peso é devido ao aumento de espaço que os animais mais leves são submetidos ao final do período de terminação, melhorando seu desempenho e atingindo maior peso quando comparados a animais leves que são transportados ao abate juntamente com o grupo dos mais pesados (FLOHR et al., 2016). Ao enviar ao abate 25 ou 50% dos animais mais pesados das baias, 19 dias antes dos demais, DeDecker et al. (2005) relataram melhor taxa de crescimento dos remanescentes (inicialmente mais leves) na ordem de 10%, devido ao aumento de espaço físico de baia e disponibilidade de comedouro, e não ao efeito da classificação que ocorrera indiretamente.
Do ponto de vista prático, a classificação por peso permite que a fração de animais menores receba condições, nutrição e manejos diferenciados. Mas, apesar disto, prejudica a obtenção dos benefícios que o carregamento segregado para terminação ou abate gera. Pois quando realizados estes manejos, em baias classificadas, resultam em baias vazias e não no aumento do espaço físico para os leitões mais leves remanescentes do lote. Dependendo da logística de produção é possível que a classificação por peso após o desmame seja estratégica. Para melhor compreensão, cita-se o exemplo de uma instalação de creche, com capacidade para 2400 leitões, que é responsável pelo alojamento de duas terminações de 1200 suínos, podendo-se, assim, enviar para uma delas a metade de leitões anteriormente classificados como “grandes”. Assim, reduz-se o período necessário para atingimento do peso de abate, otimizando o uso das instalações (O’QUINN et al., 2001).
Os relatos existentes referentes ao manejo de classificação por peso com o intuito de formar baias com menor CV são discutíveis, pois apenas na fase de maternidade os resultados são consistentes. No entanto, a diferença em desempenho zootécnico encontrada em alguns estudos é de grau leve e nem sempre é a favor deste manejo. Em muitas situações, para atingir menor variabilidade nos indicadores de produção, os sistemas precisam ser especialmente desenhados para se extrair ao máximo as vantagens de uma produção com maior uniformidade (TOKACH, 2004).
A criação de suínos com alta variação de peso gera prejuízos financeiros e zootécnicos à cadeia de produção (ELLIS et al., 2016; PATIENCE et al., 2004). O alto percentual de animais fora do peso almejado pelo mercado e a menor eficiência dos nutrientes da dieta são os principais motivos (GONYOU, 1998). No entanto, estratégias amplamente utilizadas visando à redução da variação de peso necessitam ser reavaliadas quanto à sua prática, pois o manejo de classificar os leitões por peso com objetivo de formar baias com maior uniformidade indica não afetar significativamente a perfformance, o consumo alimentar logo após o desmame e o CV de peso ao final da fase de creche.
Considerações Finais
O manejo de classificação dos leitões por peso visando formar baias muito homogêneas é uma prática tradicional na produção de suínos. Talvez, quando se teve conhecimento da importância da variação de peso, muitos profissionais da área imaginaram que reduzindo a variação “intra-baia” fosse possível gerar um grupo de suínos mais uniformes ao final de uma fase. Entretanto, estudos em cenários comerciais de creche e terminação comprovam que mesmo que as baias iniciem com menor CV, não há praticamente efeito nenhum em indicadores zootécnicos e na variabilidade do grupo que será enviado para a terminação ou ao abate. Uma abordagem prática pode sustentar a realização do manejo, porém, não existem motivos suficientes que indiquem como essencial a ação de classificar os leitões por peso ao alojamento.
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Autores:
Fernando Bortolozzo
Universidad Federal Do Rio Grande do Sul UFRGS
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Jamil Faccin
Alltech
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