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Nutrição Leitões Creche

Nutrição de Leitões de Creche: Uma fase de investimento

Publicado: 6 de março de 2012
Por: Marcos Tsé (zootecnista e doutor em Ciência Animal pela ESALQ/USP e Consultor Técnico da Nutron Alimentos.)
A ração, nas diferentes fases de crescimento do suíno, pode conter inúmeros ingredientes, que permitem aos nutricionistas manipular a dieta de maneira que os nutrientes neles contidos possam alcançar as exigências nutricionais dos animais. Isso se torna desafiador principalmente na fase de creche, uma vez que os leitões, nessa etapa, são retirados de suas mães em menos de 24 horas, recebem dietas com diferentes texturas (de líquida para sólida) e são submetidos a novos parâmetros de hierarquia, com um ambiente mais desafiador do ponto de vista sanitário.
Um dos entraves para o máximo desempenho de leitões na fase de creche é o limitado consumo de ração logo após o desmame. Assim, para estimular o consumo de ração é comum a adoção de dietas complexas (Tabela 1), o que possibilita minimizar um menor desempenho nesse período. Um melhor consumo nessa fase proporciona melhor ganho diário de peso e revela a vantagem de interferir positivamente na fase de crescimento e terminação, podendo reduzir em até quatro dias a idade no peso de abate desses animais (Dritz et al., 1996). Como exemplo, um estudo conduzido na Inglaterra, no qual cinco mil animais foram acompanhados do desmame até o abate, revelou que os leitões que tiveram maior ganho de peso pós-desmame alcançaram o peso de abate mais cedo, como mostra o Gráfico 1. Este texto tem o objetivo de mostrar alguns pontos importantes que cercam a nutrição de suínos na fase de creche, para prover ao leitão máximo crescimento.
Nutrição de Leitões de Creche: Uma fase de investimento - Image 1
Estratégias para melhorar o desempenho pós-desmame
Em razão da mudança brusca de ambiente e de ração a que os leitões muito jovens (em média 21 dias de idade) são submetidos após o desmame, o nutricionista deve levar em consideração as limitações e progressos no desenvolvimento do sistema digestório do leitão, aliado ao uso de ingredientes altamente digestíveis e com boa qualidade. O potencial de ganho de peso dos animais na creche vai depender do potencial genético dos animais, bem como o status sanitário submetido e a composição da dieta.
Para se obter máximo desempenho na fase de creche e, consequentemente, ao longo da vida do suíno, é necessária a adoção de um programa efetivo de alimentação com dietas contendo ingredientes de altíssima qualidade. O consumo de um leitão nessa fase representa apenas 2,6% do total de ração no abate, mas o desempenho nessa fase de creche pode influenciar em até 30% o ganho de peso dos animais até o abate (Cole e Varley, 2000). Dessa maneira, evidencia-se que a creche é uma fase de investimento, com máxima relação custo-benefício ao longo da vida do animal.
Deve-se ressaltar que a fase de creche é apenas transitória, curta e com custo relativamente baixo no que se refere à alimentação, quando comparada ao período total de vida de um suíno (considerandose fases de creche, crescimento e terminação). Por isso, a utilização de rações complexas pode ser uma estratégia importante para visar ao consumo e máximo desempenho dos leitões na creche. Uma dieta complexa de leitão pode incluir inúmeros ingredientes, como leite em pó, concentrado proteico de soro, lactose cristalina, soro de leite, plasma sanguíneo, células sanguíneas, farinha de peixe, acidificantes, nucleotídeos, zinco e cobre orgânicos, levedura, pa- latabilizantes, aromatizantes e açúcar, entre muitos outros, totalizando mais de 30 ingredientes.
A escolha dos ingredientes apropriados para compor uma dieta complexa de leitão passa pela análise de qualidade da matéria-prima (fornecedor), condições de armazenamento e mistura de ingredientes na fábrica de ração. A manipulação desses ingredientes em condições não ideais pode acarretar perda biológica de alguns nutrientes e, portanto, diminuição na qualidade e na digestibilidade final da dieta. Isso pode causar impacto negativo no consumo de ração pós-desmame, uma vez que existe correlação linear positiva entre digestibilidade e consumo de ração dos animais (quanto mais digestível a dieta, melhor é o consumo dos animais).
No sentido de proporcionar uma dieta de alta digestibilidade e com ingredientes nobres, o plasma pode ser uma alternativa interessante. É oriundo do processamento de extração do sangue dos animais (suíno ou bovino) no frigorífico, em que os componentes sanguíneos são separados, filtrados, secos (spray-dried) e destinados à alimentação animal. O plasma seco pelo processo spray-dried, quando mal armazenado, pode perder suas propriedades biológicas, pois existe a possibilidade de oxidar (Brook e Ratcliff, 2006). Trabalhos demonstram que leitões tratados com 5% de plasma suíno tiveram maior ganho diário de peso e melhor conversão alimentar em relação aos animais não tratados (Derouchey et al., 2004). Como o plasma possui proteínas especiais que protegem o animal de fatores estressantes, como os microrganismos encontrados no meio, espera-se que animais com maior desafio sanitário tenham melhores respostas à inclusão desse ingrediente. Outros benefícios do uso de plasma na dieta de leitões podem ser os aumentos da superfície das vilosidades intestinais e das atividades de enzimas, melhorando, portanto, o processo digestivo e propiciando ao leitão absorver mais eficientemente os nutrientes da dieta.
Outro ingrediente comumente usado para leitões é a levedura, microrganismos unicelulares que se desenvolvem durante o processo de fermentação do álcool, são processados e secos pelo processo de spray-dried, tentando preservar suas propriedades biológicas. As leveduras possuem, em sua composição, carboidratos de parede celular (β-glucanos e mananoligossacarídeos − MOS), que previnem a colonização de bactérias e influenciam no sistema imunológico dos animais. Os MOS são compostos indigestíveis, utilizados como substrato para o desenvolvimento das bactérias benéficas do intestino. Isso proporciona ao nutricionista um ingrediente não somente válido por seu teor proteico e digestibilidade aos animais mas também como uma alternativa eficiente para animais presentes em ambientes com alto desafio sanitário, pois as leveduras promovem uma resposta complexa de defesa ao animal. Esee ingrediente pode substituir em até 15% do farelo de soja para leitões recém-desmamados sem alterar o desempenho (Araújo et al., 2006). Variações na quantidade usada na dieta de leitões é atribuída à variação em sua composição, em função da natureza do substrato utilizado, processamento, secagem, grau de aeração do meio e espécie de levedura.
Ainda em relação ao uso de ingredientes específicos para leitões, lácteos são importantes aliados dos nutricionistas, na expectativa de minimizar os efeitos alergênicos causados pelas proteínas da soja, logo após o desmame. A inclusão desses produtos lácteos na dieta de leitões está associada a sua alta digestibilidade de nutrientes e à diminuição dos efeitos complicadores de sabor e odor da mudança brusca de dieta que ocorre nos animais logo após o desmame.
A proteína oriunda do soro do leite é qualitativamente superior à de outros produtos, sendo alta a disponibilidade de seus aminoácidos (Bertol et al., 1996). Associado à melhoria do valor biológico da dieta, o aumento da inclusão dos produtos lácteos pode favorecer a concentração dos nutrientes e a expressão do potencial genético do animal, constatado pelo acúmulo de massa corporal (Trindade Neto et al., 2002). A inclusão de lácteos traz benefícios também no aumento da atividade de enzimas, o que possibilitaria melhor hidrólise da fração proteica e de carboidratos da dieta no intestino, resultando absorção dos nutrientes.
Os trabalhos com leitões revelam melhor desempenho na fase de creche quando incluem produtos lácteos até níveis de 40% (Trindade Neto et al., 1999; 2002). A superioridade do uso de produtos lácteos pode advir das características biológicas desses ingredientes. Mais recentemente, a formulação de dietas para leitões recém-desmamados explorando-se o conteúdo de proteína láctea contido nos produtos lácteos proporcionou aos animais melhor conversão alimentar (Tse et al., 2010), como mostra a Tabela 2.
Outros ingredientes que têm sido utilizados na melhora do desempenho dos leitões são o zinco e o cobre. Na fase de creche, podemos elencar basicamente dois tipos de diarreia: nutricional e patogênica. A diarreia nutricional é decorrente do fornecimento ao leitão de dietas com a presença de ingredientes de difícil digestão. A diarreia patogênica, por sua vez, ocorre por ocasião de microrganismos oportunistas do meio, que diminuem a imunidade e provocam algum efeito deletério no desempenho.
Nutrição de Leitões de Creche: Uma fase de investimento - Image 2
Estudos revelam que a inclusão de 3.000 a 4.000 ppm de zinco na forma de óxido de zinco na dieta de leitões ajuda a controlar a diarreia e a melhorar o desempenho (Poulsen, 1995; Hill et al., 2001). Esse mineral é benéfico ao leitão, pois interfere, na resposta do sistema imune do animal e na integridade e permeabilidade da barreira epitelial.
O cobre, por sua vez, é fornecido nas rações em doses de até 250 ppm. O modo de ação do cobre como promotor do crescimento pode ser atribuído a uma influência positiva desse mineral sobre a microflora intestinal, sobre o estímulo ao consumo de alimento ou até mesmo para a observação de efeito aditivo entre os antibióticos colocados na ração, de cobre tanto na forma complexada (Cu-metionina) quanto na forma de sulfato de cobre (Coffey et al., 1994).
Um dos maiores entraves fisiológicos para os leitões desmamados é sua capacidade limitada de produzir ácido clorídrico. Uma maneira eficiente de contornar essa situação é fornecer, na dieta, ácidos orgânicos, que favorecem e auxiliam a digestão dos ingredientes. O possível mecanismo de ação para os ácidos orgânicos na melhora do desempenho é o aumento na digestibilidade dos nutrientes e a melhora da eficiência da digestão de dietas à base de proteínas vegetais. Geralmente, os ácidos mais comumente usados nas dietas de leitões são o fumárico, o cítrico, o málico e o benzoico, entre outros, geralmente incluídos na dose de 1 a 2%.
Existe, entretanto, variação na ação dos diferentes ácidos orgânicos. Aegundo Gonzales (2002), a promoção de crescimento (promotor de crescimento) determinada pelo uso de ácidos orgânicos pode se dever a um efeito inibidor do desenvolvimento de fungos nas matérias-primas e rações; efeito inibidor da proliferação de enterobactérias (Salmonella e Escherichia coli) no intestino; potencializador dos ganhos nutricionais das dietas, promovido pelo aumento da disponibilidade dos nutrientes; benefício causado pela redução do pH do estômago e parte superior do intestino delgado de leitões após o desmame.
Além de todos esses ingredientes, outros ainda devem ser considerados, como cereais processados, dietas líquida, peletizada ou extrusada, e enzimas, entre outros. Enfim, a maneira de se extrair de um leitão o máximo desempenho está em respeitar sua fisiologia digestiva e assegurar que todos os ingredientes que compõem a ração estejam sendo devidamente manuseados, armazenados e incluídos nas doses apropriadas.
Considerações finais.
Inúmeros são os ingredientes que compõem uma ração de creche, o que reflete sua complexidade. Portanto, uma atenção especial deve ser dada a nutrição dos leitões, o que engloba desde a qualidade da matéria-prima até a mistura dos ingredientes, pois isso não somente trará benefícios para essa fase como também para o animal até o abate. É imprescindível que o produtor entenda e conheça a forte inter-relação que existe entre a fase de creche e as seguintes, pois só assim entenderá que uma dieta mais cara na fase de creche não é desperdício de dinheiro e sim investimento para o futuro... dos animais, é lógico!
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Autores:
Marcos Tsé
UNESP - Universidad Estatal Paulista
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Mario Francisco De Morais
6 de marzo de 2012

Gostei da materia, pois enriquecer mais ainda ao criadores, principalmente os pequenos e iniciantes na suinocultura . OUTRAS MATERIAS SERÃO BEM VINDAS
abraços

Mario Francisco de Morais

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Mauricio Andreoli
6 de marzo de 2012

Prezado Marcos,

Parabéns pela clareza na abordagem desse assunto complexo.
Você comenta que a desmama é um entrave fisiológico devido a capacidade limitada de produção de ácido clorídrico pelo leitão, idéia da qual concordo plenamente.
Entretanto, percebo que estamos nos atendo muito à digestibilidade e nobreza de certos ingredientes mas esquecendo da interferência dos mesmos sobre a capacidade tamponante das rações. Muitas vezes formulamos uma ração de excelente qualidade porém com capacidade tamponante tão alta que, apesar do uso de ácidos orgânicos, é dado mais um entrave á frágil produção do ácido estomacal do que nutrindo como imaginamos.
As doses de ácidos orgânicos oferecidos no mercado muitas vezes se baseiam em viabilidade economica e não na potencialidade de sua ação de redução dessa capacidade tamponante. Por outro lado, vejo algumas formulações que exigiriam doses altíssimas desses ácidos, pois o formulador não se atentou á capacidade tamponante e o resultado é baixo rendimento + diarreia.
Considero importante uma maior atenção a esse componente quando da discussão sobre nutrição de creche.
Grande abraçol

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Eduardo Von Atzingen
S.O.S. Suínos
6 de marzo de 2012

Dr. Marcos, Parabéns, bom trabalho, mas me permita dois comentarios, o SEGREDO de consumo na primeira semana, pós desmame, começa ainda nas duas semanas antes da desmama, na maternidade. E outra observação, me parece extremamente sub dimensionado um consumo de 2,6% de rações na creche, período de 21 a 63 dias, para um peso medio de 6,4 a 22 kg sendo um ganho de 15,6 kg em 42 dias, se considerarmos um consumo médio recria + terminação de 200 kg de ração, teríamos por volta de 5,2 kg de consumo? Na pratica, no dia dia da granja, temos um consumo na creche, proximo de 10 a 12% que seria por volta de 10 a 12% das rações recria + terminação.

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Débora B. Braz
MCassab
6 de marzo de 2012

Parabéns pelo artigo !

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