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Treonina Rações Matrizes Lactação

Treonina digestível em rações para matrizes suínas em lactação

Publicado: 30 de julho de 2012
Por: Vladimir Fortes de Oliveira; Juarez Donzele; Márvio Lobão Teixeira de Abreu; Rita Flávia Miranda de Oliveira; Bruno Alexander Nunes Silva; Alysson Saraiva.
Sumário

RESUMO

Sessenta matrizes suínas pluríparas (média de quatro partos) de linhagem comercial, com peso inicial de 262,7 ± 22,50 kg, foram utilizadas para avaliar o efeito de níveis de treonina digestível sobre os desempenhos produtivo e reprodutivo durante 16,02 ± 1,17 dias de lactação. Os animais foram distribuídos em delineamento inteiramente casualizado, com 4 tratamentos e 15 repetições, considerando a matriz a unidade experimental. As rações foram formuladas com quatro níveis de treonina digestível (0,608; 0,646; 0,684 ou 0,722%, correspondentes a relações de 64, 68, 72 e 76%, respectivamente, com a lisina digestível). Os níveis de treonina digestível avaliados não influenciaram o consumo diário de ração, que foi de 4,7 kg/animal. O consumo diário individual de treonina digestível variou de forma linear entre os níveis de treonina testados. Não houve efeito dos níveis de treonina digestível da ração sobre os desempenhos produtivo e reprodutivo das porcas em lactação. O nível de 0,608%, correspondente à relação treonina digestível:lisina digestível de 64%, atende às exigências de treonina digestível de matrizes suínas durante a lactação.

Palavras-chave: aminoácidos, exigências nutricionais, suínos


Introdução
O baixo consumo de ração pelas fêmeas suínas na fase de lactação pode ocasionar perda de peso e prejudicar os desempenhos produtivo e reprodutivo da matriz. A perda de peso de matrizes lactantes é composta principalmente de tecido adiposo e protéico e pode levar a maior intervalo desmama-cio, menor taxa de parto e menor número de leitões nascidos, em razão da menor taxa de ovulação (Andries, 2004).
Estudando o impacto sobre a nutrição de aminoácidos durante a lactação, Jones & Stahly (1999) concluíram que a restrição de aminoácidos durante a lactação aumenta a mobilização de tecido protéico de matrizes suínas.
A perda excessiva de proteína é responsável por metade dos prejuízos na reprodução pós-desmama, enquanto a perda excessiva de gordura corporal representa menos de um quarto dos danos reprodutivos nesse mesmo período (Clowes et al., 2005).
Além do consumo de aminoácidos, o balanço aminoacídico das rações também tem sido estudado. Segundo Kim et al. (2001), em matrizes com baixo consumo de ração e alta taxa de mobilização tecFidual durante a lactação, a treonina é o segundo aminoácido limitante. Por outro lado, em matrizes com alto consumo durante a lactação e baixa taxa de mobilização, a valina é o segundo aminoácido limitante em rações à base de milho e farelo de soja. Em ambos os casos, a lisina é o primeiro aminoácido limitante. Desse modo, a ordem dos aminoácidos limitantes está relacionada ao que se pode esperar em mobilização de tecidos das matrizes durante a lactação.
No Brasil, as médias de temperatura são mais altas que as de países de clima temperado, o que limita o consumo de ração pelas matrizes suínas, principalmente no verão. Assim, são observados consumos de ração próximos de 5 kg/dia, valor inferior ao de 7 kg/dia observado em países de clima temperado.
Este estudo foi conduzido para avaliar níveis de treonina digestível em rações para matrizes em lactação, considerando os desempenhos produtivo e reprodutivo da matriz e o desempenho da leitegada.
 
Material e Métodos
O experimento foi conduzido na Fazenda Água Limpa, localizada em Jequeri, Minas Gerais, em julho de 2004. Utilizaram-se 60 matrizes suínas híbridas de linhagem comercial (Landrace × Large White) distribuídas em delineamento experimental inteiramente casualizado com 4 tratamentos e 15 repetições, considerando a matriz a unidade experimental. Como tratamentos, avaliaram-se rações com 0,608; 0,646; 0,684 ou 0,722% de treonina digestível, correspondentes às relações treonina digestível:lisina digestível de 64, 68, 72 e 76%, respectivamente.
As matrizes foram distribuídas nos tratamentos de acordo com o peso e a ordem de parto, de forma a se obter maior homogeneidade entre os tratamentos. Para isso, foram agrupadas segundo a ordem de parto: no primeiro grupo, foram incluídas as fêmeas de primeiro parto; no segundo, as fêmeas de segundo a sétimo partos; e no terceiro, as matrizes de sétimo parto em diante. As matrizes de cada grupo foram distribuídas, eqüitativamente, nos níveis de treonina de forma que em cada grupo fosse mantido o mesmo número de fêmeas de cada um dos três grupos por ordem de parto.
As rações experimentais foram formuladas à base de milho e farelo de soja e suplementadas com minerais e vitaminas (Tabela 1) para atender às exigências nutricionais mínimas descritas por Rostagno et al. (2000), exceto de valina e treonina.
 
Em todas as rações, foram conferidas as relações aminoacídicas entre os demais aminoácidos essenciais digestíveis e a lisina digestível a fim de se assegurar que, em todos os tratamentos, nenhum outro aminoácido estivesse limitante na ração. Foram utilizadas relações superiores às preconizadas com base na proteína ideal para fêmeas em lactação e os níveis de treonina digestível foram obtidos por meio da suplementação de L-treonina (98% de treonina) em substituição proporcional ao amido. A ração e a água foram fornecidas à vontade.
As matrizes foram pesadas no dia do parto e à desmama, que ocorreu no 16º dia após o parto. A espessura de toucinho foi medida por meio de aparelho de ultra-som modelo RENCO Sono Grader, no dia no parto e à desmama, a 6,5 cm da linha dorsal na região da 10ª costela (P2), tomando-se como resultado a média de três mensurações seguidas.
Após a desmama, as matrizes foram levadas ao setor de gestação, onde foi iniciado o manejo de detecção de cio. A identificação do cio foi realizada com a presença de um macho à frente das fêmeas, que foram testadas duas vezes por dia (manhã e tarde) quanto ao reflexo de tolerância ao macho. O cio foi confirmado quando a fêmea se manteve estática e receptiva à presença do macho.
Como o número de leitões pode influenciar a produção de leite e a mobilização de proteína corporal da matriz (Kim et al., 2001), as leitegadas foram equalizadas (10 e 11) no terceiro dia após o parto para evitar variações nas respostas dos animais que não fossem decorrentes dos níveis de treonina estudados. A pesagem dos leitões foi realizada após a equalização e à desmama. Os leitões foram submetidos ao manejo tradicional (corte de dentes e cauda, cura do umbigo ao nascimento e aplicação de ferro dextrano no terceiro dia) e receberam a ração pré-inicial a partir do terceiro dia de vida.
Nos leitões, avaliou-se o ganho de peso médio diário e, nas matrizes, avaliaram-se os consumos de ração, de treonina digestível e de lisina digestível, a perda de peso, as perdas de proteína e de gordura corporal, a variação na espessura de toucinho, a produção de leite e o intervalo desmama-estro.
A perda de proteína foi estimada considerando as quantidades de proteína corporal no início e ao final do experimento, segundo equação preconizada por Whittemore & Yang (1989): proteína corporal = -2,3 + [0,19 × peso corporal (kg)] [0,22 × ETP2 (mm)]. A perda de gordura corporal foi estimada a partir das quantidades de gordura corporal no início e ao final do experimento, segundo a equação de Whittemore & Yang (1989): gordura corporal = -20,4 + [0,21 × peso corporal (kg)] + [1,5 × ETP2 (mm)].
A produção de leite pela porca foi estimada utilizando-se a equação proposta por Noblet & Etienne (1989): produção de leite (g/dia) = (2,42 × ganho de peso da leitegada (g/dia) + (78,2 × peso da leitegada à equalização (kg) + (26 × número de leitões à desmama).
Para todos os parâmetros avaliados (matrizes e leitões), foram considerados como períodos inicial e final do experimento os dias da equalização dos leitões nas leitegadas e do desmame, respectivamente.
As análises estatísticas dos dados de desempenho produtivo e reprodutivo das matrizes e do desempenho dos leitões foram realizadas utilizando-se o programa computacional SAEG (Sistema de Análises Estatísticas e Genéticas), versão 8.0 (UFV, 2000), por meio dos procedimentos para análises de variância e regressão.
 
Resultados e Discussão
O consumo diário de ração (CDR) das matrizes não foi influenciado (P>0,05) pelos níveis de treonina digestível da ração (Tabela 2). Resultados semelhantes foram observados por Cooper et al. (2001), que, avaliando diferentes relações (40 a 65%) treonina digestível:lisina digestível, não observaram diferenças no consumo de ração pelos animais.
Treonina digestível em rações para matrizes suínas em lactação - Image 3
Os animais utilizados neste estudo apresentaram consumo de ração médio diário de 4,85 kg, valor superior e inferior, respectivamente, aos recomendados por Rostagno et al. (2005) para porcas primíparas e pluríparas em lactação.
O consumo de treonina digestível aumentou de forma linear (P<0,05), segundo a equação  = -5,8364 +57,2619 X (r2 = 0,80), de acordo com o aumento dos níveis de treonina, fato relacionado à ausência de variação no consumo diário de ração e ao aumento dos níveis de treonina digestível das rações. O menor consumo de treonina digestível observado neste estudo, de 29,54 g/dia, foi similar aos valores propostos por Cooper et al. (2001), de 29, 30 e 31 g/dia para redução da mobilização de tecido corporal de fêmeas de primeiro, segundo e terceiro partos, respectivamente, durante a lactação.
Os níveis de treonina da ração não influenciaram (P>0,05) o consumo de lisina digestível pelos animais, fato justificado pela ausência de variação do consumo médio diário de ração pelos animais e pelo fato de as rações terem sido isolisínicas. As matrizes apresentaram consumo de lisina digestível médio diário de 46,05 g, valor acima e abaixo dos valores mínimos de 44,51 e 50,85 g, recomendados por Rostagno et al. (2005), respectivamente, para porcas de primeiro parto e pluríparas em lactação.
Do mesmo, os níveis de treonina digestível da ração não influenciaram (P>0,05) a perda de peso das matrizes no período de lactação. Resultados semelhantes foram observados por Cooper et al. (2001), que não verificaram variação na perda de peso corporal das matrizes quando os níveis de treonina digestível da ração variaram de 0,210 a 0,670%, correspondentes a relações de 40 a 65% com a lisina digestível.
A ausência de efeito sobre a perda de peso das porcas pode ser justificada pela falta da necessidade de mobilização de tecidos corporais para suprir a demanda de aminoácidos para produção de leite. Segundo Kim & Easter (2003), quando não há disponibilidade suficiente de aminoácidos provenientes da ração, a fêmea mobiliza tecido corporal para disponibilizar aminoácidos para produção de leite.
A reduzida perda de peso dos animais neste estudo pode ser explicada pela duração do período de lactação estudado e pelo perfil nutricional das rações experimentais, mais precisamente seu conteúdo em lisina.
Estudos têm comprovado (Cooper et al., 2001) que o período de maior desgaste para a fêmea é a terceira semana de lactação, quando a demanda por nutrientes para a produção de leite é mais alta. Como as porcas neste experimento foram desmamadas em média aos 16 dias, é possível que os animais não tenham experimentado este período de maior desgaste corporal.
O consumo de lisina pelas porcas em lactação é um parâmetro importante na determinação do grau de mobilização de tecido corporal. Segundo Clowes et al. (2003), 35 g de lisina digestível/dia é a necessidade mínima deste aminoácido, abaixo da qual ocorre intensa mobilização de tecido corporal para atendimento das necessidades de lisina para produção de leite. Como neste estudo as porcas apresentaram consumo médio diário de 46,05 g de lisina, as necessidades mínimas de lisina foram quase totalmente atendidas pela dieta, havendo necessidade de pouca mobilização de tecido corporal, o que pode ser confirmado pela reduzida perda de peso corporal (3,6%).
Em condições de intensa mobilização de tecido corporal, a treonina passa a ser o aminoácido mais limitante, depois da lisina, em rações para porcas em lactação (Kim et al., 2001; Kevin et al., 2003; Soltwedel et al., 2003). Estudando relações entre treonina digestível e lisina digestível, Kim et al. (2001) observaram que, para matrizes cuja perda de peso não é significativa (abaixo de 12% do peso corporal), a relação entre treonina digestível: lisina digestível é de 59%, enquanto, para fêmeas com perdas de peso de 30%, a relação entre esses aminoácidos é de 62%.
As perdas de proteína corporal, tanto absoluta como relativa, não foram influenciadas (P>0,05) pelos níveis de treonina digestível estudados, o que está coerente com os resultados de perda de peso corporal dos animais. Uma vez que as necessidades de aminoácidos dos animais para mantença e produção de leite foram atendidas quase integralmente pela dieta, a mobilização de proteína corporal durante todo o período estudado foi em média de 1,57 kg, o que representou 3,64% do peso corporal. Neste nível de mobilização de proteína corporal, espera-se que aumentos na concentração de treonina da ração não resultem em resultados significativos sobre a mobilização de proteína do corpo. Entretanto, Silva et al. (2003) verificaram menor perda de peso e de proteína corporal, além de menor intervalo desmama-cio, em fêmeas alimentadas com ração com baixo teor de proteína bruta suplementada com aminoácidos sintéticos para maior relação treonina digestível:lisina digestível.
Como observado para perda de proteína corporal, os níveis de treonina digestível da ração também não influenciaram (P>0,05) a perda de gordura corporal dos animais, resultado justificado também pela ausência de efeito dos níveis de treonina da dieta sobre a perda de peso corporal das matrizes durante o período estudado. Do mesmo modo, Johnston et al. (1993) analisaram a resposta de matrizes suínas aos níveis protéicos durante a lactação e verificaram que não houve diferença significativa na perda de gordura corporal desses animais.
A espessura de toucinho pós-desmame e a perda de espessura de toucinho dos animais não foram afetadas (P>0,05) pelos níveis de treonina da ração, o que está de acordo com os dados observados para perda de gordura corporal. Resultados semelhantes foram obtidos por Cooper et al. (2001), que, avaliando níveis de treonina para animais de alta capacidade produtiva em fase de lactação, não observaram diferença significativa na espessura de toucinho no final do período de lactação.
Não se observou efeito (P>0,05) dos níveis de treonina sobre a produção de leite das matrizes. Essa produção, afetada principalmente pelo consumo de energia, é pouco sensível aos níveis de aminoácidos ingeridos, uma vez que a mobilização de proteína corporal pode atender a necessidade de aminoácidos para a síntese de leite. A ausência de diferenças no consumo de ração das porcas entre os níveis de treonina avaliados e o fato de as rações serem isocalóricas justificam a ausência de efeito dos níveis de treonina da ração sobre a produção de leite dos animais.
O intervalo desmama-estro dos animais também não foi influenciado pelos níveis de treonina digestível das rações, o que confirma relatos de Clowes et al. (2003) de que a matriz suína lactante é capaz de suportar até 12% de perda de peso corporal (a perda observada neste estudo foi em média de 3,6%) sem prejuízos na função reprodutiva.
O prejuízo na função reprodutiva pode ser explicado, em parte, pelo fato de que, durante a mobilização de proteína corporal para atendimento das necessidades de aminoácidos da fêmea, a maior taxa de mobilização de proteína tecidual (em porcentagem de peso) ocorre no trato reprodutivo e o tecido muscular é o maior doador quantitativo de aminoácidos (Kim & Easter, 2003). Ainda segundo Clowes et al. (2003), altas taxas de perda de proteína corporal estão associadas às dificuldades na maturação nuclear e citoplasmática de oócitos in vitro, o que não parece ser o caso das matrizes em estudo, pois o intervalo desmama-estro médio observado (de 4,39 dias) pode ser considerado adequado para sistemas de criação intensiva de suínos, portanto, é indicativo de que não houve prejuízo da função reprodutiva dos animais.
Durante o período de lactação, o metabolismo de aminoácidos prioriza a produção de leite (Kim & Easter, 2003), de modo que o não atendimento das necessidades em aminoácidos por meio da ração provoca mobilização de proteína do corpo do animal. O grau de mobilização tecidual observado (Tabela 3) indica que a necessidade de aminoácidos dos animais foi quase completamente atendida pela dieta. O consumo de lisina médio diário observado, de 46,05 g, é superior ao valor de 27 g/dia, que, segundo Jones & Stahly (1999) e Yang et al. (2000) é o limite mínimo, abaixo do qual pode haver prejuízo na produção de leite e no ganho de peso da leitegada.
O número de leitões desmamados não variou (P>0,05) entre os níveis de treonina digestível estudados, o que significa que as rações não influenciaram a taxa de mortalidade dos leitões durante a lactação.
O ganho de peso dos leitões e das leitegadas não foi influenciado (P>0,05) pelo aumento do consumo de treonina pelas matrizes em lactação, o que está coerente com os dados de produção de leite das porcas neste estudo. Silva et al. (2003) também não observaram diferenças no desempenho das leitegadas quando aumentaram a relação treonina digestível:lisina digestível da ração.
 
Conclusões
O nível de 0,608% de treonina digestível, correspondente à relação treonina digestível:lisina digestível de 64%, atende às exigências produtivas e reprodutivas de treonina digestível de matrizes suínas lactantes com perdas de peso de 3,6% durante período médio de lactação de 16,14 dias.
 
Literatura Citada
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