A visão sistêmica como princípio básico
Antes de se propor qualquer ação para a resolução dos problemas ambientais da suinocultura é necessário que esta seja vista como um sistema, e não em partes fragmentadas. A visão fragmentada tem contribuído para a não resolução dos problemas e, em alguns casos, para a intensificação destes. Cita-se o exemplo da prática de alguns profissionais e instituições de focarem suas ações somente em sistemas de tratamento, sendo estes somente um elo do complexo processo de viabilização ambiental da produção de suínos.
Mas o que seria ver a suinocultura como um sistema? O profissional que irá atuar na resolução dos problemas deverá ter o conhecimento das variáveis zootécnicas e comerciais que envolvem a produção de suínos e as ferramentas ambientais disponíveis, destacando-se que mais importante do que conhecer estas ferramentas é saber qual o conceito intrínseco a estas. Assim, o foco das ações não deve ser o dejeto, mas toda a unidade produtiva de suínos que compreende, entre outros, a geração e o manejo dos dejetos.
Um exemplo simples está relacionado ao manejo da água na criação. Quanto mais este recurso for adicionado ao dejeto, maior o volume a ser armazenado e/ou tratado, aumentando os custos do produtor com estes sistemas e também maior o volume a ser distribuído, sendo este um dos custos que, atualmente, mais penalizam o suinocultor, o da distribuição dos dejetos. Cabe ao técnico, estabelecer estas relações e transmitir os conhecimentos ao produtor, inserindo ações corretivas do manejo no projeto a ser proposto.
Conhecimentos a serem considerados na proposição do projeto
Seguir algumas regras básicas antes da proposição do projeto podem auxiliar na eficiência deste, garantindo a viabilização ambiental da granja no longo prazo e conseqüentemente sua legalização.
Neste momento não há espaço para suposições, deve-se ter certeza, e esta somente poderá ser alcançada na busca do conhecimento técnico na literatura e na visita, por quantas vezes for necessária, à criação. Durante a visitação três informações devem ser levantadas obrigatoriamente. O nível de instrução da(s) pessoa(as) que irá(ão) manejar os dejetos, a disponibilidade de mão-de-obra para o manejo dos dejetos e a disponibilidade de recursos financeiros do produtor.
Os seguintes conhecimentos e condições devem ser observados pelo técnico para a elaboração do projeto:
- conhecer o manejo produtivo dos suínos e como funcionam as relações produtivas/econômicas nesta cadeia;
- estabelecer as relações entre os recursos naturais e a suinocultura;
- ter conhecimento dos conceitos fundamentais das Ciências Ambientais, destacando os de poluição e contaminação, impacto ambiental, bacias hidrográficas, entre outros;
- conhecer toda a legislação ambiental que influi na suinocultura o que abrange, além das normativas estaduais para o licenciamento da atividade, a Política Nacional de Meio Ambiente, o Código Florestal, a Política Nacional de Recursos Hídricos, a Resolução n. 357/05 do CONAMA, o Decreto n. 4.954/04 e a Instrução Normativa n. 15/05, ambos do Mapa, entre outras;
- caracterizar, quantitativamente e qualitativamente, todos os resíduos gerados pela suinocultura (dejetos, carcaças, camas, embalagens, etc.);
- caracterizar todo o ambiente que está ao redor da produção, como recursos hídricos, solo, fauna e flora, residências, etc. e realizar uma análise dos possíveis impactos que a suinocultura poderia causar neste ambiente (ver Resolução n. 01/86 do CONAMA);
- avaliar o manejo nutricional da granja, promovendo alterações, caso necessárias, que irão refletir em um dejeto com menor potencial poluente. Todas as rações utilizadas devem estar, rigorosamente, balanceadas; os equipamentos para o arraçoamento dos animais devem ser os mais propícios para cada categoria animal e serem instalados, seguindo as especificações técnicas do fabricante; deve-se prezar por manejos nutricionais que conduzam a altos índices produtivos e menor gasto de ração, como a alimentação em fases e alimentação líquida, o balanceamento das rações por aminoácidos e a utilização de fitase. As variáveis de conforto animal também podem influenciar no consumo de ração, portanto os animais devem estar dispostos em ambientes ideais as suas exigências fisiológicas;
Se a opção para o manejo dos dejetos for a utilização como adubo, deve-se conhecer o local e dimensões das áreas ocupadas com cada cultivo com seu respectivo manejo, quantidade, freqüência, forma de disposição e tipo de fertilizante utilizado e cronograma de aplicação destes; as necessidades nutricionais das culturas que serão plantadas; observar as formas de transporte e aplicação de resíduos no solo a fim de se evitar as perdas de nutrientes por escoamento superficial e percolação, com isto a freqüência, quantidade e época de aplicação devem ser consideradas em conjunto; o manejo que deve ser realizado para reduzir o impacto desta adubação na emissão de odores e poluentes, os tipos de sistemas de armazenamento de dejetos disponíveis; deve-se elaborar um Plano de Manejo de Nutrientes (baseado no princípio do balanço de nutrientes) para realização desta adubação;
- avaliar os sistemas de tratamento de resíduos disponíveis, optando por aquele que será o mais adaptado ao perfil do produtor e àrealidade da produção;
- as instalações devem ser a mais adequadas a fim de viabilizar o manejo dos dejetos. Isto inclui: canaletas de condução dos dejetos bem dimensionadas e protegidas contra a entrada de água das chuvas ou outras; drenagem do terreno, fazendo com que as águas de escorrimento não atinjam as instalações de armazenamento e tratamento de dejetos; as instalações devem ser dimensionadas respeitando os princípios de conforto animal. Com isto, os animais ficarão menos estressados, havendo uma otimização do uso da água e da ração;
- estudar outras atividades que poderão se integrar ao manejo ambiental da suinocultura, como produção de grãos e pastagens, reflorestamentos, produções consorciadas com piscicultura, entre outras, pois estas são necessárias para viabilização ambiental;
- observar o manejo dos resíduos e detectar se as práticas predispõem à riscos a saúde humana e animal. Deve ser promovido o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e isolamento e sinalização de áreas e instalações propensas a riscos;
As propriedades vizinhas e a realidade produtiva e ambiental da microbacia hidrográfica onde a granja se localiza, também devem ser observadas. Após as observações, destacar os pontos de maior risco ambiental, pois serão estes os primeiros a serem considerados no conjunto de ações propostas.
O projeto também deve conter um plano de monitoramento de suas ações, onde constem indicadores que serão mensurados a fim de avaliar a eficiência e eficácia destas ações e, caso necessário, mudanças devem ser propostas a fim de promover a melhoria do manejo ambiental.
Observa-se que muitos projetos são delineados e aplicados, mas não monitorados. Isto tem acarretado vários problemas ambientais, originários de granjas que, na teoria, estariam viáveis ambientalmente, mas na prática isso não se verifica. Exemplificando-se, pode-se citar os vários casos de expansão de plantéis nas granjas onde o projeto de viabilização não foi modificado após a expansão, uma das conseqüências é a falta de capacidade dos sistemas de armazenamento e/ou tratamento para a nova quantidade de dejetos gerados, com isto o tempo de armazenagem e/ou retenção hidráulica não é mais compatível com as exigências legais e ambientais.
Uma outra justificativa para o acompanhamento do projeto ambiental da granja é a intensa dinâmica das práticas e tecnologias ambientais, pois como estas estão em constante evolução, a proposição de viabilização feita no presente, pode não ser a melhor no futuro. Verifica-se que a atualização dos conhecimentos e do projeto são imprescindíveis para que a suinocultura se desenvolva sem a promoção de impactos ambientais e para que o suinocultor tenha sempre disponível o que existir de mais adequado para sua realidade.
Destaca-se que na avaliação de custo das intervenções contidas em um projeto como este, deve-se também prezar por uma avaliação sistêmica, ou seja, não somente calcular o custo de um sistema de tratamento ou de distribuição de dejetos como adubo, mas como uma intervenção nutricional reduzirá o custo deste sistema de tratamento ou alterações no manejo hídrico da granja refletirão no volume de dejetos produzidos e redução dos custo de distribuição.
O técnico nunca deve esquecer que quanto mais conhecimento tiver, mais opções terá disponíveis para tomar suas decisões, assim, a iniciativa pela busca de conhecimentos e informações deve ser uma constante.