Palavras-chave: bem-estar, comportamento, desempenho, objetos, suínos.
Introdução
A suinocultura, assim como outras cadeias produtivas do agronegócio, desenvolveu-se expressivamente nas últimas décadas. O setor passou por profundas alterações tecnológicas e estruturais, visando ao aumento da produtividade e à redução dos custos de produção. As exportações brasileiras de carne suína passaram de 34.868 toneladas em janeiro de 2014 para 38.411 toneladas em dezembro do mesmo ano ABIPECS (1). No que se refere ao Brasil, no mês de janeiro a abril de 2015, o país exportou 112.343.879 kg de carne suína, sendo que Santa Catarina foi responsável por 37,83 % do volume exportado (2). Perante a crescente e intensificada produção de suínos, nota-se que alterações comportamentais surgem como consequência, visto que por vezes, o bem-estar dos animais é de baixo grau em sistemas de criação intensiva. O enriquecimento ambiental é apresentado como um método efetivo do manejo que busca aumentar a qualidade de vida dos animais em confinamento, melhorando o bem-estar psicológico e fisiológico, através de alterações ambientais. Assim, o enriquecimento ambiental consiste em uma forma de propiciar melhor condição de vida aos animais, reduzindo os fatores estressantes que afetam o desempenho (3). Em determinados períodos de maior demanda produtiva, os leitões são desmamados precocemente nas maternidades, chegando ao produtor com baixo peso, inferior a cinco kg. Esses leitões representam um desafio do ponto de vista de manejo e alimentação, pois requerem extremo cuidado com a temperatura ambiental e o manejo alimentar. Por vezes, produtores recebem animais de diferentes origens, sendo os leitões menores responsáveis por diminuições nos índices de desempenho médio da propriedade. Considerando que os estudos na área de bem-estar vêm se intensificando, uma vez que este tem sido um importante critério para as exportações nacionais, o presente trabalho propõe-se a utilizar o enriquecimento ambiental como auxiliar no ganho de peso de leitões de baixo peso corporal no sistema vertical de crechário.
Material e métodos
O trabalho foi desenvolvido durante o período de quinze de janeiro a cinco de março de 2015, em uma propriedade localizada no município de Arabutã, Santa Catarina, na qual possui implantado o sistema vertical de crechário com capacidade de alojamento de 1700 leitões. Para o experimento foram utilizados 280 leitões, separados ao alojamento em oito baias, em grupos de machos ou fêmeas, leves ou pesados, recebendo ou não enriquecimento ambiental. Os grupos foram alojados em uma das laterais do galpão, devido à incidência de raios solares ser distinta. As baias possuíam 12,18 m2 e altura de 80 cm, com divisória de grades e piso misto, sendo a área ripada de 8,54 m2 com grades de ferro e a área sólida de concreto de 3,64 m2. Utilizou-se a lotação de 3,0 leitões por metro quadrado, ou seja, 35 animais por baia.
As baias continham quatro bebedouros tipo chupeta com regulagem de altura e comedouro automático. A alimentação foi ad libitum, sendo semanalmente pesadas as quantidades fornecidas e as sobras, a fim de mensurar o consumo voluntário. O controle da temperatura foi realizado manualmente e o sistema de ventilação mínima era acionado no período noturno e diurno quando necessário. A temperatura foi registrada diariamente ao meio dia durante todo o experimento. Nos grupos de animais aos quais o enriquecimento foi aplicado, foram empregados materiais como: garrafas pet suspensas, bolas de borracha, espelhos, bambolês, pneus e garrafas pet ao chão. Os objetos foram introduzidos semanalmente, sendo a ordem a descrita acima e não foram retirados até o término do experimento, exceto em caso de avarias. A metodologia utilizada para a avaliação comportamental dos leitões foi a amostragem focal por intervalo, com observações pontuais em intervalos de 10 minutos durante 24 horas por período integral. No dia do alojamento, foram escolhidos o leitão mais pesado e o mais leve de cada baia, como padrões para visualização do comportamento. Assim, essa avaliação baseou-se no comportamento de 16 suínos sob os dois tratamentos propostos (com ou sem enriquecimento), ou seja, dois suínos de cada baia, sendo que os mesmos foram pesados individualmente e observados semanalmente, totalizando cinco observações e pesagens durante o período de creche nas baias de animais pesados e seis observações e pesagens nas baias de animais leves. Além disso, todos os leitões da baia foram pesados em conjunto para mensuração de variáveis de desempenho. Foram avaliados os seguintes padrões comportamentais: interação com o objeto proposto como enriquecimento ambiental, interação com o colega (outro animal), interação com o ambiente, bebendo, alimentando-se, urinando ou defecando, inativo (dormindo ou deitado), ativo (em pé ou movimentando-se) e estereotipias como: aerofagia, mordendo cauda, perseguição a outro leitão (brigas), cabeçada em outro leitão ou no ambiente, esfregar barriga de outros leitões e sucção do umbigo (10). Os comportamentos observados foram anotados em tabelas específicas para cada tipo de atividade e os comportamentos de estereotipias, quando existentes, eram descritos em tabelas individuais. O desempenho zootécnico dos leitões foi avaliado por meio do ganho médio diário de peso, do consumo de ração, da conversão alimentar. Os leitões foram alocados aos tratamentos conforme um delineamento em blocos casualizados com dois tratamentos (com ou sem enriquecimento ambiental) e duas categorias de pesos (leitões leves ou pesados). Os resultados das variáveis de comportamento dos leitões foram analisados através do teste qui-quadrado com nível de significância de 5 %. As variáveis de desempenho zootécnico foram submetidas à análise de variância, utilizando um modelo linear generalizado, sendo 5% o nível de significância adotado (9). Os dados foram analisados no programa Minitab versão 16.
Resultados e discussão
A escolha do tipo de enriquecimento a ser utilizado em uma granja é pessoal, sendo dependente da situação econômica e organizacional da mesma. Uma maneira de renovar a novidade do objeto de enriquecimento é substituir o antigo por um novo (4). Essa orientação foi a base para a escolha dos objetos para o enriquecimento ambiental do presente estudo, conforme demonstrado na Figura 1. A Figura 2 demonstra os padrões comportamentais dos suínos observados. O padrão comportamental com maior frequência foi o inativo, que compreendia a atividade dormindo ou deitado. A frequência desse comportamento pode ser explicada pelos atuais sistemas de produção a que os leitões estão submetidos, onde o espaço restrito das instalações e o tipo de piso inibem a característica etológica de fuçar. GRANDIN e JONHSON (6) mencionam que os suínos passam 52% do dia em recinto semi-natural fuçando e 23% do tempo pastando e investigando o ambiente. Os leitões da categoria leve com ou sem enriquecimento ambiental, alimentaram-se mais se comparado aos leitões pesados. Isso pode ser justificado pelo baixo peso de desmame dos leitões que leva às empresas integradoras instituir os comedouros - maternidade na qual são disponibilizados papinhas e substituto do leite. No presente estudo os leitões da categoria leve permaneceram na granja somente uma semana a mais (6 semanas) que a categoria pesada (5 semanas), ou seja, reduzindo o custo para o produtor na fase de creche e consequentemente reduzindo as desigualdades no tempo de entrada e saída no sistema de terminação. Segundo KUMMER et al (7), a diferença de peso na entrada da fase de terminação entre os leitões da classe de peso leve e pesada pode representar até 4 semanas a mais para atingir o peso de abate. Segundo MC CRACKEN, et al.,(8), o enriquecimento ambiental aplicado a leitões com baixo peso no sistema de creche permite diminuição das alterações sociais e ambientais,e consequentemente resultam em diminuição no retardo do desenvolvimento dos leitões durante os primeiros dias após o desmame. O comportamento ativo incluía se o leitão estava em pé ou movimentando-se (caminhando) e foi semelhante em todas as baias na qual se aplicou o trabalho. Comportamentos como urinar ou defecar foram expressos com menor frequência, assim como bebendo, interação com colega, interação com ambiente e estereotipias. Isso está relacionado ao método de avaliação comportamental empregado, que em muitos casos mascarou comportamentos que ocorreram no período compreendido entre os intervalos estipulados. Tal fato poderia ser alterado adotando outra metodologia, tal como a amostragem de todas as ocorrências. Nas condições do presente estudo, não foram observadas diferenças entre a aplicação ou não do enriquecimento ambiental (P≥0,05) para as variáveis ganho de peso (Tabela 1), consumo de ração diário (Tabela 2) e conversão alimentar (Tabela 3). Apesar de não se ter encontrado melhoras no desempenho produtivo, observou-se diminuição do tempo de inatividade ao enriquecer as baias de leitões. Medidas de enriquecimento ambiental aumentam comportamentos naturais específicos da espécie, tal como o investigativo (11). Vale ressaltar que embora o quesito novidade tenha sido bastante importante para os resultados de interação com os objetos, os leitões não abandonam completamente o objeto anterior, uma hipótese é que isso ocorra pela característica comportamental dos suínos de estipular hierarquia, deste modo os animais dominados passam a aproveitar a oportunidade de interagir com um objeto a partir do momento na qual os dominantes disputam objeto novo introduzido. Uma das maiores preocupações por parte das empresas e produtores é a analogia do uso de enriquecimento com aumento da atividade do leitão levando à menor ganho de peso e pior conversão alimentar (5). Esta relação não foi notada no estudo, de modo que se verificou que os animais interagiram com todos os objetos e que, embora não se tenham encontrado melhoras no desempenho produtivo, também não se constataram perdas. Deste modo, observou-se que a introdução dos objetos de enriquecimento contribuiu de forma muito positiva, diminuindo as vocalizações pós-desmame, comum neste período e o vício de sucção e brigas, estereotipias comumente observado em granjas com sistema de crechário, logo, enriquecer o ambiente pode favorecer o bem estar especialmente nos casos de leitões desmamados abaixo do peso.
Figura 1. Leitões interagindo com os objetos do enriquecimento ambiental.
1. Leitões interagindo com a garrafa pet suspensa.
2. Leitões interagindo com a bola.
3. Leitões interagindo com o espelho.
4. Leitões interagindo com o pneu.
5. Leitões interagindo com os bambolês.
6. Leitões interagindo com garrafa pet ao chão.
Figura 2. Padrões comportamentais de leitões leves ou pesados em fase de creche, com e sem enriquecimento ambiental em suas instalações.
Tabela 1. Peso vivo (kg) de leitões leves ou pesados em fase de creche, com ou sem enriquecimento ambiental em suas instalações.
1- Erro padrão;
2- P- probabilidade ≥ 0,05.
Tabela 2. Consumo diário (kg) de leitões leves ou pesados em fase de creche, com ou sem enriquecimento ambiental em suas instalações.
1- Erro padrão;
2- P- probabilidade ≥ 0,05.
Tabela 3. Conversão alimentar (kg) de leitões leves ou pesados em fase de creche, com e sem enriquecimento ambiental em suas instalações.
1- Erro padrão;
2- P- probabilidade ≥ 0,05.
Conclusões
O uso do enriquecimento ambiental como medida para melhorar o bem-estar de leitões desmamados com baixo peso é próspero e eficiente, uma vez que tal método, segundo o estudo realizado não demonstrou ganhos e nem, principalmente, perdas no desempenho zootécnico. Deste modo, provavelmente o uso do enriquecimento melhorou o bem-estar dos leitões, constatação visualizada, apesar de não ter-se mensurado indicadores fisiológicos, como o cortisol. No entanto é fundamental considerar a viabilidade econômica e as condições de operacionalização do enriquecimento na granja.
Referências
1. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA PRODUTORA E EXPORTADORA DE CARNE SUÍNA. Exportações brasileiras de carne suína jan / dez 2014 x jan / dez 2013. Acessado em 15 mar. 2015. Online. Disponível em: http://abipecs.com.br.
2. ASSOCIAÇÃO CATARINENSE DE CRIADORES DE SUÍNOS. Exportações de Carne Suína 2015. Acessado em 09 abr. 2015. Online. Disponível em: http://www.accs.org.br
3. CAMPOS, J. A. Bem-estar de suínos confinados associado a comportamento, sistema imunológico e desempenho. 2009. 91f. Tese (Pós-Graduação em Engenharia Agrícola). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, Minas Gerais, 2009.
4. GIFFORD, A.K.; CLOUTIER, S.; NEWBERRY, R.C. Objects as enrichment: Effects of object exposure time and delay interval on object recognition memory of the domestic pig. Applied Animal Behaviour Science, Elsevier, Amsterdam, v. 107, n. 3-4, p. 206-217, Nov., 2007.
5. GRANDIN, T. Environmental enrichment for confinement pigs. In: 1988 ANNUAL MEETING PROCEEDINGS, 1988, Kansas City, Missouri. Anais… p 119-123, 1988. Acessado em 26 mai. 2015. Online. Disponível em: http://www.grandin.com
6. GRANDIN, T.; JOHNSON, C. Bem-estar dos animais. São Paulo: Rocco, 2009. 336p.
7. KUMMER, R.; GONÇALVES, M. A. D.; LIPPKE ,R. T.; PASSOS, B.M.F.; MARQUES, P.; MORES ,T.J.; Fatores que influenciam o desempenho dos leitões na fase de creche. Acta Scientiae Veterinariae. 37 (Supl 1): s195-s209, 2009.
8. MC CRACKEN,B.A.;GASKINS,H.R.;RUWE-KAISER,P.J.; KLASING,K.C.; JEWELL,D.E. Diet-Dependent and Diet-Independent Metabolic Responses Underlie Growth Stasis of Pigs at Weaning.Journal of Nutrition ,v.125,p.2838-2845,1995.
9. MCKENZIE, J.; GOLDMAN, R.N. The student edition of minitab for windows manual. V.12. Softcover ed. Belmont: Addison-Wesley Longman, Incorporated, 1999. 592p
10. PINHEIRO, J. V. A pesquisa com bem estar animal tendo como alicerce o enriquecimento ambiental através da utilização de objeto suspenso no comportamento de leitões desmamados e seu efeito como novidade. 2009. 67 f. Dissertação (mestre em Ciências) – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia. Departamento de Nutrição e Produção Animal. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.
11. SARUBBI, J. Bem estar animal não se restringe às instalações e equipamentos: o uso de novas tecnologias. In: fórum integral de suinocultura: teoria e prática do bem estar animal na produção de suínos, 1, 2011, Curitiba. Anais... p. 36-50.
***Anais da IX Jornada de Iniciação Científica (JINC) - Embrapa / Concórdia, SC 2015.