Introdução
O crescimento da suinocultura brasileira nos últimos anos (Roppa, 2006) eleva a demanda por alimentos utilizados na composição das rações. Do mesmo modo, a demanda por milho e farelo de soja, principais componentes das rações, tem se elevado por se tratar de duas commodities utilizadas no mundo todo. Assim, alternativas alimentares ao milho e farelo de soja são de grande interesse para a cadeia produtiva de carne suína.
No processamento para extração do óleo, têm-se como principais subprodutos o farelo de soja, de elevado teor proteico e de baixa concentração de fibra, e a casca de soja, película que reveste o grão. Obtém-se ainda o resíduo da limpeza da soja, que pode, em determinadas situações, ser incorporado à casca de soja. Segundo Restle et al. (2004), como a casca de soja representa 7 a 8% do peso do grão de soja, estima-se produção de 3,7 milhões de toneladas no Brasil.
A composição química e energética da casca de soja apresenta variação significativa, pois não há padrão nas indústrias de moagem de soja (Moreira et al., 2009). Além disso, a presença de maior ou menor quantidade de vagem, de resíduos de caule, de partes da planta e de outros resíduos pode contribuir para aumentar essas variações.
Há limitações para o uso da casca de soja na alimentação de leitões, tendo em vista a correlação negativa entre o nível de fibras e a digestibilidade de alguns nutrientes e o aumento de processos de fermentação no trato gastrintestinal (Dilger et al., 2004). A casca de soja possui em torno de 75% de polissacarídeos não-amiláceos (PNA), 60% deles insolúveis (Lo, 1989; Dilger et al., 2004), e suínos não possuem enzimas específicas para digerir esses PNA e oligossacarídeos (rafinose e estaquiose) (Kim & Baker, 2003). Uma das soluções tem sido a utilização de enzimas exógenas para hidrolisar esses carboidratos.
Normalmente, as enzimas comerciais usadas como aditivos não contêm uma única enzima; ao contrário, são preparados enzimáticos com uma variedade delas (Ferket, 1993; Walsh et al., 1993), o que é desejável, uma vez que as rações são compostas por vários ingredientes (Campbell & Bedford, 1992). O uso de complexos enzimáticos contendo α-galactosidase permitiria aos nutricionistas formular rações considerando o nível energético adicional (Cleóphas et al., 1995), que, segundo Bedford (1996), eliminaria os problemas causados pelos PNA, oligossacarídeos e fatores antinutricionais.
Assim, realizou-se este trabalho com o objetivo de avaliar o efeito da adição de complexo enzimático sobre o valor nutritivo da casca de soja utilizada na alimentação de suínos na fase inicial (15 a 30 kg).
Material e Métodos
Foram conduzidos três experimentos na Fazenda Experimental de Iguatemi (FEI), pertencente ao Centro de Ciências Agrárias da Universidade Estadual de Maringá (CCA/UEM). A casca de soja foi obtida junto à Cooperativa Agroindustrial de Maringá – COCAMAR em 24 de outubro de 2005, na forma de casca de soja integral (a granel), denominada casca de soja suja, pois contém grãos de soja quebrados, pedaços de vagem e de caule (planta) e sementes de invasoras.
A casca de soja foi moída utilizando-se moinho martelo (28 martelos), movido por um motor de 20CV e 3.550 rpm e peneira com furos de 2,5 mm.
Utilizou-se um complexo enzimático contendo α-galactosidase (35,000 U/g), β-glucanase (1.100,000 U/g), galactomananase (110,000 U/g) e xilanase (1.500,000 U/g). Foram conduzidos três experimentos: no 1 e no 2, foram realizados ensaios de digestibilidade e no 3, um ensaio de desempenho.
No experimento 1, utilizaram-se 12 suínos, híbridos comerciais, machos castrados, com peso inicial de 22,49 ± 1,73 kg, distribuídos em delineamento inteiramente casualizado com quatro tratamentos e três repetições. A casca de soja substituiu 25% da ração-referência, à base de milho e farelo de soja e sem complexo enzimático, nos dois ensaios de digestibilidade. O complexo enzimático foi adicionado nos níveis de 200 e 300 mg/kg.
Os animais foram alojados em gaiolas de metabolismo semelhantes às descritas por Pekas (1968). O ensaio foi de 13 dias: 8 de adaptação às gaiolas, às dietas e ao manejo, seguidos de 5 dias de coleta de fezes.
A ração-referência foi formulada seguindo os níveis nutricionais sugeridos pelo NRC (1998) para atender às exigências nutricionais de suínos na fase inicial (15 a 30 kg). A composição química e os valores energéticos dos alimentos foram baseados nas tabelas de Rostagno et al. (2005).
As rações foram fornecidas duas vezes ao dia: 55% às 8 h e 45% às 16h30. A quantidade diária foi preestabelecida de acordo com o consumo dos animais na fase de adaptação, com base no peso metabólico (PV0,75) de cada unidade experimental. As rações foram umedecidas com aproximadamente 100 mL de água para evitar desperdícios, reduzir a pulverulência e facilitar o consumo. O fornecimento de água foi fixado em 2,7 mL por grama de ração, fornecida após as alimentações diárias nos próprios comedouros.
Utilizou-se o método de coleta total de fezes, com adição de 2% de óxido férrico (Fe2O3) às rações como marcador do início e final do período de coleta. Os procedimentos gerais de manejo e alimentação dos animais, coleta e manipulação de fezes e urina foram semelhantes aos descritos por Fialho et al. (1979) e Moreira et al. (1994).
Como no experimento 1 não foi observada melhora na digestibilidade da casca de soja com adição de complexo enzimático, o que sugere insuficiência de enzima, foi conduzido outro ensaio de digestibilidade, semelhante ao anterior, utilizando 600 mg/kg de complexo enzimático. O aumento do nível de complexo enzimático foi proporcional ao da fibra dietética contida nas rações com casca de soja em comparação à ração-referência. Utilizaram-se 15 suínos, híbridos comerciais, machos castrados, com peso inicial de 22,36 ± 2,29 kg, distribuídos em delineamento inteiramente casualizado, com três rações: uma ração-referência e duas rações com complexo enzimático nos níveis de 0 ou 600 mg/kg, cada um com cinco repetições e um animal por unidade experimental.
Os teores de energia bruta das rações, cascas e fezes foram determinados em bomba calorimétrica adiabática (Parr Instrument Co., 1984). As composições químicas dos alimentos, das rações e das fezes foram determinadas conforme metodologias descritas por Silva & Queiroz (2002). A granulometria das cascas foi determinada segundo metodologia descrita por Zanotto & Bellaver (1996) e a composição aminoacídica foi obtida por meio de HPLC.
Os coeficientes de digestibilidade e os valores dos nutrientes digestíveis foram calculados utilizando-se a fórmula proposta por Matterson et al. (1965).
Os coeficientes de digestibilidade dos alimentos avaliados nos dois ensaios de digestibilidade foram submetidos à análise de variância utilizando-se o programa SAEG (UFV, 1997) e as médias, comparadas pelo teste F, de acordo com o modelo: Yij = μ + Ti + eij, em que: Yij = coeficientes de digestibilidade do animal j recebendo o tratamento i; μ = constante associada a todas as observações; Ti = efeito do tratamento i, em que i = nível do complexo enzimático; eij = erro aleatório associado a cada observação. No experimento 3, realizou-se análise de desempenho utilizando-se 60 leitões, machos castrados e fêmeas, híbridos comerciais com peso inicial de 15,07 ± 1,69 kg e peso final de 29,85 ±3,46 kg, no período de abril a maio de 2006.
As rações experimentais (Tabela 1) foram calculadas para serem isoenergéticas, isolisínicas, isoproteicas, isocalcíticas e isofosfóricas, segundo os níveis nutricionais propostos pelo NRC (1998). O valor de energia digestível da casca de soja (2.071 kcal/kg) foi obtido anteriormente no experimento de digestibilidade (experimento 1). Avaliaram-se cinco rações: uma testemunha, à base de milho e farelo de soja, sem casca de soja, e quatro rações com 15% de casca de soja e complexo enzimático nos níveis 0, 200, 400 ou 600 mg/kg de ração (Tabela 1).
Tabela 1 - Composição centesimal, energética e química das rações experimental.
O delineamento experimental foi o de blocos casualizados, com cinco rações, seis blocos e dois animais por baia, constituindo a unidade experimental. Os animais foram pesados no início e ao final do experimento e o consumo total de ração foi computado para cálculo do consumo diário de ração, do ganho diário de peso e da conversão alimentar.
Os preços dos ingredientes utilizados nas dietas experimentais foram: milho grão, R$ 0,28/kg; farelo de soja, R$ 0,50/kg; casca de soja, R$ 0,18 (36% do valor do farelo de soja); óleo de soja, R$ 1,38/kg; fosfato bicálcico, R$ 1,54/kg; calcário, R$ 0,16/kg; sal comum, R$ 0,40/kg; lincomicina, R$ 17,00/kg; suplemento mineral e vitamínico inicial R$ 4,91/kg; L-lisina, R$ 7,12/kg; DL-metionina, R$ 12,41/kg; complexo enzimático, R$ 9,13/kg.
A viabilidade econômica da adição de complexo enzimático nas rações foi determinada pela relação custo de ração por quilograma de peso ganho (Yi), segundo Bellaver et al. (1985). Em seguida, foram calculados o índice de eficiência econômica e o índice de custo, proposto por Gomes et al. (1991). Os resultados foram submetidos à análise de regressão polinomial, utilizando o programa SAEG (UFV, 1997), de acordo com o seguinte modelo estatístico: Yij = μ + b1 (Ni-N) + b2 (Ni-N) + eijk, em que: Yij = valor observado das variáveis estudadas, relativo a cada unidade experimental j recebendo o nível i de complexo enzimático; μ = constante geral; b1 = coeficiente de regressão linear do nível de complexo enzimático sobre a variável Y; b2 = coeficiente de regressão quadrática do nível de casca de soja sobre a variável Y; Ni = níveis de complexo enzimático, em que i = 0, 200, 400 e 600 mg de CE/kg de ração; N = nível médio de complexo enzimático nas rações; eijk = erro aleatório associado a cada observação.
Foi utilizado o teste de Dunnett para comparar a ração testemunha a cada um dos níveis de complexo enzimático (0, 200, 400 e 600 mg de CE/kg), segundo Sampaio (1998), utilizando-se o nível de significância, o quadrado médio do resíduo e o número de repetições, da análise de variância global dos dados.
Resultados e Discussão
Os teores de aminoácidos analisados na casca de soja (Tabela 2) foram superiores aos obtidos por Dilger et al. (2004), exceto para metionina, treonina, cistina, glicina e serina, cujos valores foram semelhantes. Essas diferenças podem estar relacionadas às quantidades de grãos de soja misturados à casca durante o processamento industrial.
Tabela 2 - Composição de aminoácidos da casca de soja, do farelo de soja e do milho (matéria natural.)
Os valores de matéria seca (87,94%), energia bruta (3.632 kcal/kg), cinzas (3,76%), cálcio (0,44%) e fósforo (0,14%) da casca de soja moída em peneira de 2,5 mm (Tabela 3) foram superiores aos encontrados por Gentilini & Lima (1996), enquanto os de proteína bruta (13,17%), extrato etéreo (2,49%), fibra bruta (34,50%) e da atividade ureática (0,35) foram inferiores aos encontrados por esses autores. Por outro lado, foram inferiores aos observados por Quadros et al. (2007) ao estudarem a composição química da casca de soja moída (2,5 mm) de mesma origem que a utilizada neste estudo para MS (90,37%), PB (15,69%) e cinzas (5,75%). Neste mesmo estudo os valores de cálcio (0,52%), fósforo (0,28%), FDN (56,47%), FDA (42,09%) e atividade ureática (0,22) foram semelhantes, enquanto os de energia bruta (3.804 kcal/kg) e fibra bruta (30,44%) foram superiores.
Em comparação aos resultados obtidos por Moreira et al. (2009), que avaliaram a casca de soja de mesma procedência deste estudo, os valores foram semelhantes para energia bruta (3891 kcal/kg), FDN (57,34%) e FDA (39,74%) da casca de soja moída (2,5 mm).
A solubilidade da PB em KOH (0,2%) da casca de soja ficou abaixo da faixa ideal (70 a 85%) estabelecida por Araba & Dale (1990) e Parsons (2000). O valor de 66,44%, entretanto, foi próximo dos recomendados para uso comercial, uma vez que Parsons et al. (1991) consideram 60% de solubilidade como valor crítico.
A atividade ureática, uma medida indireta da presença de fatores antinutricionais da soja, foi de 0,2 para casca de soja (peneira 2,5 mm), dentro da faixa considerada ideal (0,05 a 0,2), de acordo com Parsons (2000). No Brasil, são recomendados valores de atividade ureática de 0,05 a 0,3 para o farelo de soja (MAPA, 1990).
Tabela 3 - Composição química e energética e diâmetro geométrico médio da casca de soja moída em peneira de 2,5 mm (matéria natural.)
Na literatura, existem poucos trabalhos com avaliação nutricional da casca de soja, tanto em ensaios de desempenho como de digestibilidade. Além disso, a casca de soja é um subproduto com composição físico-química muito variável. Assim, a comparação de resultados muitas vezes é pouco consistente, com teores de proteína bruta que variam de 9,2 a 18,7% (Cole et al., 1999).
As condições de processamento dos subprodutos também podem resultar em grandes variações na composição dos alimentos (Albino & Silva, 1996), pois a casca de soja pode conter desde grãos de soja quebrados até sementes de invasoras, em diferentes proporções. A composição da casca de soja pode variar de acordo com o processo utilizado na sua obtenção, a variedade de soja cultivada, a região e a época de colheita, a regulagem das colheitadeiras, o tipo de colheita e a quantidade de resíduos de limpeza da soja incorporada.
No experimento 1 (Tabela 4), as dietas contendo complexo enzimático (200 ou 300 mg/kg) não apresentaram alteração (P>0,05) nos coeficientes de digestibilidade dos nutrientes da casca de soja.
Resposta semelhante à do experimento 1 foi observada no experimento 2 (Tabela 5), no qual os coeficientes de digestibilidade dos nutrientes da casca de soja não melhoraram (P≥0,05) com o uso do complexo enzimático, apesar de ter sido utilizado o triplo da concentração (600 mg/kg) de complexo enzimático recomendada (200 mg/kg).
Esses resultados não eram os esperados, pois o complexo enzimático utilizado é composto de α-galactosidase, galactomananase, xilanase e ß-glucanase, que promovem a hidrólise de polissacarídeos não-amiláceos solúveis, como os arabino-xilanos, ß-glucanos, α-galactosídeos e galactomananos, presentes na casca de soja, melhorando a ação das enzimas digestivas endógenas e aumentando a digestibilidade dos nutrientes, possivelmente porque a quantidade de polissacarídeos não-amiláceos da casca de soja é bem mais elevada que a do farelo de soja, alimento para o qual o complexo enzimático foi desenvolvido. Nesse sentido, seria necessária a adição de quantidades ainda mais elevadas de complexo enzimático que a utilizada (600 mg/kg).
Com base nos resultados de digestibilidade, não houve efeito (P>0,05) do complexo enzimático sobre os oligossacarídeos da casca de soja, uma vez que o valor da energia digestível da casca de soja não melhorou com a adição do complexo enzimático, mesmo no nível mais elevado (600 mg/kg).
Tabela 4 - Coeficientes de digestibilidade e nutrientes digestíveis da casca de soja1, com ou sem complexo enzimático, em leitões na fase inicial.
O período de adaptação dos animais às rações em experimentos de digestibilidade utilizando alimentos fibrosos suplementados com enzimas exógenas para leitões provavelmente tenha que ser maior, tendo em vista a necessidade de adaptação da microbiota intestinal aos elevados níveis de fibra (Cowieson et al., 2006).
Do mesmo modo, a metodologia com 25% de casca de soja em substituição à ração-referência provavelmente não é adequada para avaliar a digestibilidade dos nutrientes desse ingrediente (Villamide, 1996). Apesar de os altos níveis de substituição (25%), acima dos níveis práticos de inclusão (15%) nas rações, fornecerem estimativas do valor nutritivo mais acuradas e com menor erro, também aumenta a probabilidade de interação entre os ingredientes testados e a ração basal. Portanto, é possível que a metodologia com níveis crescentes de substituição da ração-referência pelo alimento teste (casca de soja) seja mais adequada por ser um alimento com elevado nível de fibra (Villamide, 1996).
A utilização de enzimas exógenas em pequenas quantidades poderia interferir temporariamente nas secreções endógenas do animal (Kim et al., 2003; Cowieson et al., 2006). Cowieson et al. (2006), trabalhando com frangos de corte, sugeriram a possibilidade de interferência das enzimas exógenas nessas secreções, causando aumento das perdas endógenas (enzimas, sais biliares, microbiota intestinal), sobretudo em experimentos de curta duração com avaliação do valor nutricional de alimentos.
Kim et al. (2003), trabalhando com adição de complexo enzimático (α-1,6-galactosidase, β-1,4-mananase, β-1,4manosidase) em dietas à base de milho e farelo de soja, e não casca de soja, para leitões na fase inicial (11,05 kg), verificaram diminuição significativa da concentração de rafinose e estaquiose durante a passagem pelo intestino delgado com o uso dessas enzimas. Estudando o efeito do mesmo complexo enzimático sobre a digestibilidade de dietas à base de milho e farelo de soja para suínos, Kim et al. (2006) verificaram melhora na digestibilidade ileal da matéria seca e energia bruta com o nível de 0,05% de suplementação enzimática.
Assim, novos estudos deveriam ser conduzidos observando essas ponderações na formatação dos experimentos para melhorar a avaliação do valor nutricional da casca de soja, um alimeno fibroso.
No experimento 3 (Tabela 6), a adição de 15% de casca de soja às dietas, independentemente do nível de complexo enzimático, causou redução (P<0,05) no consumo diário de ração e no ganho diário de peso dos animais em comparação àqueles consumindo dieta sem casca de soja, mas não houve efeito (P>0,05) dos níveis de complexo enzimático sobre essas variáveis. A casca de soja, ao alterar as carcaterístias físicas e/ou químicas da ração, reduz o consumo de ração, o que reflete no ganho de peso. Além disso, a adição do complexo enzimático não foi eficiente para superar este problema.
Tabela 5 - Coeficientes de digestibilidade e nutrientes digestíveis da casca de soja1 com ou sem complexo enzimático para leitões na fase inicial (na matéria natural) experimento 2.
A conversão alimentar melhorou de modo linear (P=0,03) com a inclusão do complexo enzimático, o que sugere melhor utilização dos nutrientes da casca de soja com a adição do complexo enzimático. Esse resultado pode estar relacionado à ação do complexo enzimático sobre os oligossacarídeos e PNA presentes na casca de soja e no farelo de soja, que reduzem o desempenho. Esse resultado foi semelhante aos obtidos por Kim et al. (2003), que trabalharam com adição de 0,10% de complexo enzimático (α-1,6-galactosidase, β-1,4-mananase, β-1,4-manosidase) em dietas à base de milho e farelo de soja para leitões com peso inicial médio de 11,05 kg durante um período experimental de cinco semanas. Os autores também não observaram diferenças para o ganho de peso e consumo diário de ração. Por outro lado, Kim et al. (2006), utilizando complexo enzimático (composto por α-1,6-galactosidase, β-1,4-mananase, β-1,4-manosidase), 0,05%, para suínos com peso médio de 24,1 kg, durante quatro semanas, não observaram efeito sobre o consumo de ração, o ganho de peso e a conversão alimentar. Contudo, esses mesmos autores, utilizando animais mais pesados, com peso médio inicial de 64,1 kg, observaram melhora apenas para o ganho de peso.
Estudando o efeito da enzima α-galactosidase em dietas contendo milho, cevada ervilha e farelo de soja para suínos, Baucells et al. (2000) observaram melhora na conversão alimentar, resultado semelhante ao observado por Kidd et al. (2001), que estudaram a suplementação com enzima α-galactosidase de dietas à base de milho e farelo de soja para aves e encontraram melhora apenas na conversão alimentar.
Conforme a quantidade de casca de soja e de fibras aumentou nas dietas, foi necessário adicionar óleo de soja para mantê-las isoenergéticas, uma vez que a casca de soja é um ingrediente pobre em energia em comparação ao milho. Uma diferença entre os ingredientes das rações utilizadas nos ensaios de digestibilidade e desempenho é a presença do óleo de soja nas dietas com casca de soja para promover o balanço energético. A presença de gordura na dieta torna o esvaziamento gástrico mais lento, em virtude do reflexo no duodeno decorrente da presença de lipídios na luz intestinal (Hunt & Knox, 1968). Isso pode sugerir que o atraso no esvaziamento gástrico resultaria em taxa de passagem mais lenta pelo intestino delgado. Além disso, as gorduras podem aumentar a digestibilidade ileal de aminoácidos (Li & Sauer, 1994), uma vez que o tempo requerido para digestão de proteína e/ou absorção de aminoácidos é um fator limitante. Esse maior tempo de trânsito pelo intestino delgado pode ter beneficiado também a ação das enzimas exógenas sobre o substrato e, com isso, melhorado a conversão alimentar.
O custo de ração por quilograma de suíno produzido com as rações com complexo enzimático nos níveis 0, 200 e 400 mg/kg foi maior (P<0,05) que o obtido com a raçãoreferência, sem casca de soja, entretanto, o da ração com 600 mg/kg foi semelhante (P>0,05) ao da ração-referência (Tabela 7). Assim, o uso de complexo enzimático no nível de 600 mg/kg pode resultar em mesmo custo de ração por quilograma de suíno produzido em comparação à ração à base de milho e farelo de soja, sem casca de soja. Essa melhor resposta pode ser reflexo da melhora na conversão alimentar (Tabela 6) da dieta contendo 15% de casca de soja e suplementada com complexo enzimático no nível de 600 mg/kg.
Os resultados gerais deste trabalho sugerem necessidade de adaptações na metodologia de avaliação da digestibilidade de alimentos fibrosos com o uso de enzimas exógenas para viabilizar a avaliação exata do efeito desses aditivos sobre o aproveitamento de alguns nutrientes pelos animais jovens.
Tabela 6 - Desempenho de leitões na fase inicial alimentados com rações contendo casca de soja com ou sem complexo enzimático
Tabela 7 - Avaliação econômica das rações experimentais fornecidas a leitões na fase inicial.
Agradecimentos
À COCAMAR, pela casca de soja fornecida; à Uniquímica, pelo fornecimento do complexo enzimático; e ao laboratório da Degussa, pelos aminogramas realizados.
Conclusões.
A utilização de complexo enzimático composto por α-galactosidase, β-glucanase, galactomananase e xilanase não afeta a digestibilidade da casca de soja, mas melhora a conversão alimentar de leitões (15 a 30 kg) alimentados com dietas contendo 15% de casca de soja.
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