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Benefícios e limitações do uso de probióticos na nutrição de leitões: revisão e análise crítica

Publicado: 16 de janeiro de 2023
Por: Esther Ramalho Afonso. Departamento de Nutrição e Produção Animal- VNP. Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia - USP
Sumário

O desmame dos leitões é um período de grande desafi o que gera queda de desempenho dos animais, por infl uência de inúmeros fatores estressantes. A queda da imunidade pode causar desequilíbrio intestinal, tornando os animais mais susceptíveis a agentes patogênicos entéricos, com consequente queda no desempenho. O uso de antibióticos na alimentação animal, principalmente em suínos e aves, tem despertado ampla discussão nos vários segmentos da produção animal, dadas às restrições impostas pela Comunidade Europeia. Por outro lado, a utilização de probióticos como aditivos promotores de crescimento nas criações intensivas apresentam uma tendência mundial de crescimento, embora os estudos científi cos apresentem resultados contraditórios. Este artigo tem por objetivo sistematizar informações sobre a utilização de probióticos em leitões.

À medida que a população humana mundial cresce, há um incremento por alimentos de origem animal, o que interfere na produção destes produtos e, portanto, os aspectos sociais, ambientais e de segurança alimentar devem ser considerados. Particularmente na produção de suínos, o comércio internacional movimentou 581 mil toneladas de carne e gerou uma receita anual de US$ 1,49 bilhões, sendo os principais países importadores o Japão, Federação Russa, México, Coréia do Sul e Hong Kong (ABIPECS, 2013). O Brasil neste mercado internacional se situa dentre os que apresentam crescimento na produção e exportação de carne suína, havendo uma constante busca por novos mercados, como a União Europeia.
O quadro atual proporciona desafi os nos diferentes segmentos da cadeia agroindustrial da carne suína, os quais se deparam com barreiras econômicas, políticas e sanitárias. Neste panorama, as boas práticas de produção de suínos devem ser efetuadas nas granjas devido a imposições da legislação europeia, como o uso de alimentos transgênicos, ao bem estar animal e o banimento completo da adição de antibióticos como promotores do crescimento na alimentação animal (USDA; USEPA, 1999).
A utilização indiscriminada de promotores do crescimento (antibióticos e quimioterápicos) empregados na suinocultura vem sendo questionada por proporcionar a possível seleção de estirpes de bactérias resistentes aos antimicrobianos, ou ainda por representar risco de toxidade ou alergias para os seres humanos (PALERMO, 2006). Apesar da comprovada capacidade de aumentar o desempenho zootécnico dos suínos, quando utilizados em doses subterapêuticas como micro ingredientes nas dietas, a adição de antibiótico, como promotor do crescimento nas rações, foi proibida pelos países da União Europeia desde 2006 (BRUGALLI, 2006), e muitos desses antibióticos tiveram seu uso restrito a forma terapêutica, sob prescrição do médico veterinário.
O desmame dos leitões é considerado uma fase crítica no sistema intensivo de produção de suínos, representada por situações estressantes devido a alterações ambientais, que geram queda da resposta imune, desequilíbrios da microbiota intestinal e consequente susceptibilidade a agentes infecciosos (ALEXOPOULOS et al., 2004). Nesta fase, a ausência de utilização de antibióticos na forma profi lática pode causar prejuízos à atividade devido a queda no desempenho dos animais. O presente trabalho por objetivo a sistematização das informações sobre a utilização de probióticos em leitões.
1.1 Probiótico
A palavra probiótico é derivada do grego “Pro”: “a favor” e “bio”: “vida”, portanto, “a favor da vida” (GHADBAN, 2002). Crawford (1979) defi niu probiótico como uma cultura de microorganismos vivos específi cos implantados no trato digestivo do animal com o alimento. Probióticos são estirpes específi cas de várias espécies de microorganismos que agem como auxiliares na recomposição da microbiota intestinal, diminuindo a ocorrência de microorganismos patogênicos, podendo ser administrados oralmente aos leitões, tanto individualmente, como incorporados na ração farelada ou peletizada, ou produzidos em cápsulas, pasta, pó ou grânulos (FULLER, 1989; COMPÊNDIO BRASILEIRO DE ALIMENTAÇÃO ANIMAL, 1998).
Os probióticos devem ter como características: exercer efeito benéfi co ao animal hospedeiro; não ser patogênico e/ou tóxico; ser capaz de sobreviver ao metabolismo digestivo intestinal; manter-se viável durante a estocagem e uso nas dietas; conter células viáveis; ser isolado ou detectado em seu hospedeiro, e ter boa palatabilidade e/ou não interferir nas propriedades sensoriais (COLLINS; GIBSON, 1999).
Bactérias e fungos podem ser utilizados como probióticos. As espécies de bactérias mais utilizadas são dos gêneros Lactobacillus, Bacillus, Streptococcus e de levedura a Saccharomyces cerevisiae, podendo conter apenas uma espécie de microorganismo ou mais que uma pode estar associada (TURNER et al., 2001).
Os resultados de desempenho de animais alimentados com rações contendo probióticos ainda são inconsistentes, tanto em suínos quanto em aves (NRC, 1998). Entretanto, alguns fatores que podem interferir na possível ação do probiótico incluem a espécie de microorganismo utilizado, o “status” sanitário da granja e a temperatura das instalações. Ainda, fatores ligados à exposição do alimento ao calor e umidade excessiva durante a armazenagem, ou mesmo durante a fabricação também devem ser aventadas.
1.2. Mecanismo de ação dos probióticos
O mecanismo de ação dos probióticos ainda não foi totalmente esclarecido, e admite-se diversos mecanismos possam atuar isoladamente ou em associação (COPPOLA; GIL TURNES, 2004). Um deles é a exclusão competitiva, que surgiu do conceito de “competição por sítios de ligação”. Os microorganismos do probiótico passam a ocupar os sítios de ligação, estabelecendo certa prevalência na microbiota intestinal, aderindo-se assim ao epitélio e vindo consequentemente difi cultar a adesão dos microorganismos patogênicos. Além dos probióticos voltados para o mecanismo de exclusão competitiva, há os que podem exercer outros mecanismos, como o efeito biológico que é a disponibilidade de um ambiente de baixa tensão de oxigênio, que desfavorece o crescimento de bactérias enteropatogênicas. Os probióticos podem ser aplicados na água ou pela via oral para leitões no primeiro dia de vida, com o objetivo de colonizar o trato gastrointestinal e estabilizar a microbiota evitando-se assim a instalação de patógenos (HOOGE, 1999).
Outro mecanismo de ação do probiótico é o de antagonismo direto, que se dá pela produção de ácidos orgânicos, ou substâncias antibióticas como bacteriocinas, nisina, acidofi lina, peróxido de hidrogênio entre outros. Os probióticos podem possuir, ainda, ação de imunomodulação do hospedeiro, indicando estimulo específi co e não específi co no sistema imune. No entanto este mecanismo ainda não está totalmente esclarecido (KAILA et al., 1992).
Os probióticos também apresentam efeito nutricional, e a sua ação baseia-se na difi culdade criada para a fi xação de patógenos por exclusão competitiva com menor produção de amônia, toxinas e aminas pelos patógenos havendo a proteção do epitélio intestinal. Os resultados com a utilização de probióticos em suínos tem apresentado resultados controversos, possivelmente pela grande variação do “status” sanitário do sistema de produção, pois os promotores do crescimento só exercem seu efeito sob condições de desafi o (MILES, 1993; VANBELLE et al., 1990;).
1.3. Microbiota intestinal
Ao nascimento, a microbiota intestinal do leitão é considerada estéril, porém após três horas do nascimento já é detectada uma pequena população microbiana. Inicialmente há a exposição no canal do parto, já que o trato vaginal da fêmea contem uma fl ora diversifi cada, incluindo gêneros de Bifi dobacterium, Lactobacillus, Staphylococcus e Corynebacterium. A microbiota se completa posteriormente em função do contato com agentes presentes no meio ambiente e nas fezes maternas. Neste período, ocorrem desenvolvimento e crescimento acelerados, permitido pelo rápido progresso na ontogenicidade, a fi m de suprir o neonato com nutrientes e proteção através dos processos de digestão e absorção, que afetam signifi cativamente o crescimento e produtividade nas fases subsequentes (CRANWELL, 1995). Há ganho de peso intestinal, atribuído principalmente ao desenvolvimento da mucosa intestinal.
O aumento de peso, também pode ser decorrente da hipertrofi a das células, devido à endocitose não seletiva de imunoglobulinas colostrais e outras macromoléculas, como hormônio do crescimento, originando aumento da síntese proteica e hiperplasia das células da cripta, sendo o tamanho e o número de enterócitos muito variável. O desenvolvimento da mucosa intestinal decorre de dois eventos citológicos associados: renovação, onde com a proliferação e diferenciação das células localizadas na cripta e ao longo dos vilos, e; perda celular, extrusão que ocorre no ápice dos vilos. Estes eventos garantem a manutenção dos vilos pois quando ocorre alguma resposta intestinal a algum agente há um desequilíbrio que altera a altura dos vilos (MAIORKA, 2001).
Os microorganismos que colonizam inicialmente o intestino delgado são: Escherichia coli não patogênica, espécies de clostrídios e estreptococos e Lactobacillus spp., em menor quantidade, já que não há secreção de ácido clorídrico nas primeiras horas de vida (BAYNES, 1986).
A ingestão contínua de leite nas primeiras horas contribui para a redução do pH estomacal proporcionando condições para o crescimento de microorganismos anaeróbios benéfi cos (SANCHES, 2004). Posteriormente, as bactérias facultativas removem o oxigênio e as bactérias anaeróbias se tornam dominantes no intestino delgado e no intestino grosso, correspondendo a uma população de 90% de bactérias Gram positiva de Bacteróides, Eubacterium, Bifidobacterium, Fusibacterium, Propionibacterium e Clostridium (SALANITRO et al., 1977).
A fi xação das bactérias no epitélio intestinal, inclui dois tipos de população bacteriana: o primeiro é a associação de células epiteliais, como os Lactobacillus acidophilus e a E.coli, e, o segundo bactérias como a Streptococcus faecium que ocorrem livremente no lúmen intestinal e que se multiplicam a taxas rápidas, para não serem eliminadas pelo peristaltismo (KROGFELT, 1991).
1.4. Fatores envolvidos no desmame de leitões
O desmame é um período de desafi o. Normalmente há uma queda de desempenho dos animais, pois estão sujeitos a fatores estressantes, sendo os principais: perda de contato com a mãe, adaptação à dieta sólida, mudança de ambiente, mistura com outras leitegadas e, desafi o imunológico. A queda da imunidade pode causar desequilíbrio intestinal, tornando os animais mais suscetíveis a agentes patogênicos entéricos, principalmente Enterobacteriaceae, E. coli e Clostridium (MORES et al., 1998).
Durante o período de desmame é observada uma diminuição no crescimento dos animais, devido ao baixo consumo de ração (MCCRACKEN et al., 1999; SMINCK, 2003). No trato digestivo imaturo, ocorre secreção inefi ciente de enzimas digestivas ao longo do trato gastrointestinal e a presença de secreção de ácido clorídrico, bicarbonato e muco não permitem a digestão e absorção de nutrientes (MCCRACKEN et al., 1999).
Na desmama ocorre uma queda na produção de ácido clorídrico no estômago, devido à ausência da lactose que serve de substrato para o Lactobacillus, como consequência, ocorre à digestão incompleta e o quimo alimentar inadequadamente acidifi cado, geralmente pela presença do farelo de soja (alergênico) na ração pós desmame, leva a alterações na estrutura do epitélio intestinal (LINDEMAN, 1986). Ademais, a digestão incompleta proporciona um meio ideal para bactérias patogênicas que contribuem para ocorrência de diarreia pós-desmame (CAMPABADAL et al., 1995; MOLLY, 2001).
Decorrido 24 horas do desmame já é observada uma atrofi a das vilosidades e o aumento da profundidade das criptas, devido à maior descamação dos enterócitos. Esta atrofi a origina perdas na atividade de algumas enzimas, como, sacarase, lactase e isomaltase, as quais acabam interferindo na absorção de nutrientes dada à digestão incompleta de carboidratos e proteínas (MILLER et al., 1984).
Leitões que ao nascimento receberam pela via oral antes da ingestão do colostro o probiótico contendo Lactobacillus reuteri (1,5x109UFC/g) e Bifi dobacterium pseudolongum (1,5x109UFC/g) em condições experimentais apresentaram aumento signifi cativo no ganho de peso médio diário, com refl exos no peso médio aos 14 dias (AFONSO et al. 2013).
Corrêa (2008) administrou Lactobacillus reuteri (1,5x109 UFC/g) e Bifidobacterium pseudolongum (1,5x109 UFC/g) a leitões via oral antes da ingestão do colostro, e não constatou efeito signifi cativo para as variáveis; peso médio e ganho de peso médio diário. Abe et al. (1995), utilizara colônias de Bifi dobacterium pseudolongum e Lactobacillus acidophilus como probióticos em leitões na fase de aleitamento e creche e evidenciaram, maior ganho de peso na fase de aleitamento. Constatações semelhantes foram ainda obtidas por Sarra et al. (1983), que observaram melhor desenvolvimento dos leitões que receberam Lactobacillus acidophilus e Streptococcus faecium na primeira semana de vida.
A fisiologia do sistema digestório de leitões é complexa, e a sua alimentação é um desafi o para os nutricionistas. A utilização de probiótico ameniza o estresse pós-desmama, contribui para a manutenção das condições adequadas do trato gastrointestinal e melhora o desempenho do animal.
2. Considerações fi nais
A tendência mundial de diminuição ou até mesmo de substituição total do uso de antibióticos na alimentação animal traz grande importância para as investigações que tratam do emprego dos probióticos como substituto destes quimioterápicos.
Publicado originalmente na revista mv&z, de produção animal. Acesso disponível em: crmvsp.gov.br

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Autores:
Esther Ramalho Afonso
Augusto Gameiro
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Aníbal de Sant'Anna Moretti
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