Explorar

Comunidades em Português

Anuncie na Engormix

Recessão mundial exigirá ajustes de produção em 2009

Recessão mundial exigirá ajustes de produção em 2009

Publicado: 26 de fevereiro de 2009
Por: Paulo Molinari, analista da Safras & Mercado
Após um 2008 excepcional temos agora que trabalhar com um 2009 mais acomodado e que exigirá tomadas de decisão de contenção da produção.
O ano de 2008 foi marcado pelos extremos. O suporte proveniente da demanda mundial, com o melhor ritmo de crescimento econômico dos últimos 30 anos e altíssima liquidez internacional, ofereceu lugar a uma das maiores crises econômico-financeira já registradas em nível mundial. Uma demanda acentuada, exportações recordes, preços mundiais de commodities sem precedentes e dólar desvalorizado ajudaram o Brasil a encontrar um excelente ritmo de crescimento econômico e saltos nas exportações em alguns segmentos do agronegócio. O setor carnes foi fortemente beneficiado com o quadro, alcançando volumes e receitas recordes na exportação, além da demanda interna sólida - a qual refletiu o quadro mundial. A estrutura de liquidez financeira mundial se rompeu; as linhas de crédito e de alavancagem financeira tornaram-se restritas; a economia mundial desenha uma forte recessão para 2009 e o perfil para o agronegócio mundial deverá acompanhar a trajetória externa, com reflexos naturais e evidentes para o Brasil. O agronegócio brasileiro e o setor carnes precisarão de ajustes na produção para o próximo ano. Ao que tudo indica, o setor deve se preparar para o pior e aguardar que ao longo do ano alguns indicadores melhorem e proporcionem uma visão de recuperação para 2010.  
O ano de 2008 representou o máximo grau de volatilidade em todos os segmentos da economia mundial. Não se pode afirmar que 2008 foi um ano ruim para o agronegócio mundial, tão pouco que o setor não conseguiu aproveitar o movimento expressivo de demanda gerada a partir do melhor ritmo de crescimento econômico dos últimos 30 anos. A demanda mundial superaquecida, uma liquidez de crédito alavancada e oferecendo suporte ao comércio internacional e fundamentos de oferta e demanda sólidos ofereceram um ano de recordes em fluxo de negócios, de exportações, de receita cambial e de preços em vários segmentos.

Grãos X Energia
O ano confirmou a séria expectativa em relação ao mercado de energia, ou seja, a demanda em crescimento elevado exige ofertas proporcionais de energia, nos quais os biocombustíveis continuaram, e continuarão, tendo reflexos diretos nos preços das commodities agrícolas e refletindo sobre os custos do setor carnes mundial. Os preços do petróleo atingiram US$ 147/barril, sendo o recorde dos recordes. O milho e a soja acompanharam o petróleo, a desvalorização do dólar e os naturais movimentos especulativos sobre os dados fundamentais, entre eles o clima. O milho atingiu máximas próximas a US$ 8.00/bushel, contra uma média histórica de US$ 2.00/bushel. A soja atingiu US$ 16/bushel, contra uma média histórica próxima a US$ 6.00/bushel. Com a forte valorização do dólar, fuga de capitais e queda no fluxo de crédito, o Brasil novamente registrou problemas graves em recompor a liquidez interna e o primeiro preço afetado foi o real, com forte desvalorização. Pelo menos, a crise mundial corrigiu uma grave distorção na economia brasileira, ou seja, a sobrevalorização do real.  Preços absurdamente altos, mas, que acompanharam a lógica econômica de demanda, os fundamentos em cada segmento de mercado e uma liquidez financeira elevada ao longo do primeiro semestre de 2008.

A ruptura da crise
Um item chamava a atenção da economia mundial, ou seja, os problemas com o subprime (hipotecas de risco) nos Estados Unidos. Uma alavancagem financeira baseada no setor imobiliário que já havia dado sinais de estrangulamento em agosto de 2007. Mas, como a economia mundial avançava em velocidade acentuada e havia a chegada de um período eleitoral nos EUA em 2008, parece que este quadro foi neutralizado politicamente e “arrastado” ao longo do ano. Enquanto se concentrou apenas em um problema setorial nos Estados Unidos a situação pôde ser discutida sem reflexos para a economia mundial. Porém, neste segundo semestre de 2008 o “caos” atingiu o sistema financeiro mundial. O atraso nas soluções para o subprime nos EUA contaminou os demais segmentos do setor financeiro e também a economia real. O sistema de crédito foi fortemente afetado. Uma crise de confiança nas instituições e nos governos se instalou. O risco de um ciclo de concordatas sem precedentes passou a dominar o sistema financeiro mundial. Os governos bancaram o problema anunciando fortes injeções de capitais nos EUA, Europa e Ásia. Bilhões de dólares foram injetados no sistema financeiro para tentar recompor o crédito e a liquidez. Mas, com uma crise de confiança sempre é difícil se retomar a liquidez.
As medidas chegaram tarde para a economia real, talvez tivessem que ser adotadas em 2007 e não um ano depois. Os Bancos Centrais falharam na fiscalização e acompanhamento do sistema financeiro. A economia real passou a ser afetada de forma direta e a crise atingiu o comércio, as indústrias e o nível de emprego. Neste segundo semestre de 2008, após um boom de crescimento, temos a instalação de um processo recessivo mundial e que afetará os países emergentes de forma direta ou indireta.
As commodities foram afetadas de várias formas. Inicialmente, por tendências fundamentais, ou seja, se haverá uma recessão a demanda vai ceder e, portanto, os preços também. Qualquer alta de preços nas commodities, sem lastro no consumo, implicará em retração da demanda global. O dólar passou a se valorizar acentuadamente e derrubar os preços das commodities. O petróleo retornou ao nível inferior a US$ 60/barril, patamar de meados de 2007, mas ainda muito acima da média histórica. O milho voltou aos preços de US$ 3.80/bushel, também patamares de meados de 2007 e acima da média histórica. O mesmo ocorreu com a soja, retornando à faixa de US$ 8.50/9.00/bushel. Alguns insumos que também alavancavam os preços das commodities começaram a ceder em preços em dólar, como os fertilizantes e químicos. Ou seja, os preços das commodities cederam, mas os custos tendem a ceder também.

A visão para 2009
Entramos em 2009 com o foco recessivo. Todos os mecanismos impostos pelos Bancos Centrais ainda parecem incapazes de recuperar o ambiente e recompor crédito e demanda interna, evitando o crescimento do nível de desemprego e queda de renda geral. A recessão está instalada e o reflexo sobre os preços das commodities já é evidente. A intensidade deste processo recessivo e a sua duração é o ponto em discussão neste momento, já que a trajetória já esta definida. Em princípio, a economia mundial deverá sair de um ritmo de crescimento de 5% ao ano para menos de 2% em 2009.
Este ponto modifica razoavelmente a visão para 2009 em relação a 2008. Enquanto a economia real não apontar para uma curva de inversão, a situação poderá se manter complicada do ponto de vista da produção e do comércio mundial no agronegócio. E este é o ponto central para este ano. Certamente, não se trata da primeira e nem da última recessão mundial a ser registrada. Este é um processo normal dentro do capitalismo. Os motivos da crise podem ser discutidos e os procedimentos para evitar uma depressão também. Mas, após um 2008 excepcional temos agora que trabalhar com um 2009 mais acomodado e que exigirá tomadas de decisão de contenção da produção. É mais prático e menos arriscado entrar em um processo recessivo com uma produção ajustada ao potencial de demanda do que assumir posições elevadas de produção, buscando ganhar mercado com preços mais baixos. A crise é de demanda e não de preço. A recessão afetará demanda em alguns pólos fundamentais para o setor carnes brasileiro como Estados Unidos, Rússia, Europa e Japão.
O agronegócio mundial estava avançando na produção para equilibrar a oferta ao ritmo frenético de demanda mundial. Todos os países procuraram investir em produção para fazer frente à demanda. O Brasil alcançou três recordes consecutivos de produção de milho, dois no segmento soja, produção e exportações recordes nas carnes de frango e suína, um abate de bovinos em constante crescimento a ponto de gerar uma queda acentuada no rebanho nacional.  Este movimento positivo elevou os níveis de investimentos no agronegócio brasileiro e as produções de milho e do setor carnes encontraram um foco de expansão para 2009.
Safra
A safra de verão 2008/09 terá efeitos negativos da crise financeira mundial devido à retração da demanda. O câmbio desvalorizado acentuadamente ajuda a reequilibrar alguma variável de preço interno, mas, o quadro recessivo mundial continua contendo a demanda. A safra de milho 2008/09 terá retração no plantio do verão, refletindo custos elevados. A safrinha 2009, certamente, não terá tempo suficiente para reverter o quadro de preços internos em deterioração e a desmotivação do produtor em plantar diante do quadro mundial e os estoques nacionais. O Brasil estará entrando em 2009 com um estoque de milho que é o maior desta década de 2000, ou seja, quase 6 milhões de toneladas. Se o Brasil não conseguiu atingir a meta de exportações de 10 milhões de toneladas em 2008 terá que fazê-lo em 2009, ou o governo assumir grande parcela de compra interna.
O setor carnes se preparou para um 2009 novamente de fluxos de demanda excepcionais e não poderia ser diferente diante dos acontecimentos nos últimos dois anos. O setor avícola tem uma capacidade instalada para novamente elevar a produção em mais 10% em 2009 e a suinocultura em 5%. Somente a pecuária poderá não encontrar crescimento devido a sua fase cíclica.  Contudo, o setor carnes enfrentará vários problemas na exportação no primeiro semestre de 2009, entre eles:
- a queda nos preços em dólar, assim como em todas as commodities. Os preços cederão rapidamente acompanhando a valorização do dólar. A desvalorização do real ajudará a compor margens;
- os principais importadores de carne brasileira estão entrando em forte recessão: Estados Unidos maior comprador de carne bovina industrializada brasileira, Rússia maior importador de carne in natura bovina e suína, Europa maior preço agregado, Japão maior comprador de carne de frango, etc.
 - todos os países importadores estão desvalorizando as suas moedas, o que inibe a importação;
 - a demanda interna poderá ceder pouco, mas, haverá também alguma acomodação da demanda interna em 2009.

Reequilibrar a produção
Dentro deste ambiente, as baixas do milho e da soja não podem ser vistas como um simples fator de impulsão à produção do setor carnes. Elevar a produção substancialmente para o primeiro semestre de 2009 refletirá em uma elevação do risco do setor no Brasil. A queda de volumes na exportação é uma trajetória inevitável e que implicará em excedentes internos elevados se não houver um ajuste na projeção de crescimento da oferta. Esta correção de rota, sem dúvida, é difícil dentro da estrutura de cada segmento, mas, se faz necessária para evitar o caos de sobreoferta interna ao longo de 2009. Desta forma, é mais salutar ao setor reequilibrar a trajetória de produção aguardando um primeiro semestre difícil e retomar a alavancagem da produção dentro de uma mudança de ambiente externo ao longo do segundo semestre de 2009. 
* Texto originalmente publicado na edição 1173/2008, da revista Avicultura Industrial, da Gessulli Agribusiness. 
Tópicos relacionados:
Autores:
Paulo Molinari
Recomendar
Comentário
Compartilhar
Profile picture
Quer comentar sobre outro tema? Crie uma nova publicação para dialogar com especialistas da comunidade.
Usuários destacados em Suinocultura
Marcos Rostagno
Marcos Rostagno
Nutreco
Ciencia, Innovación, Servicios Técnicos - Salud y Nutrición Avícola y Porcina
Estados Unidos
S. Maria Mendoza
S. Maria Mendoza
Evonik Animal Nutrition
Evonik Animal Nutrition
Gerente de Investigación
Estados Unidos
Ricardo Lippke
Ricardo Lippke
Boehringer Ingelheim
Estados Unidos
Junte-se à Engormix e faça parte da maior rede social agrícola do mundo.