O programa nutricional de creche corresponde, aproximadamente, de 20 a 25% do custo de ração do suíno terminado e, além disso, o peso ao final da creche está diretamente relacionado com o peso ao abate. Portanto, o programa nutricional da fase de creche merece atenção especial.
Para maximizar o lucro nesta fase, o grande objetivo do programa de nutrição deve ser estimular ao máximo o consumo de ração na primeira semana após o desmame com dietas de alta palatabilidade e realizar uma transição o mais rápido possível para dietas mais simples, muito similares às da fase de terminação. Visto que fontes lácteas e proteínas de alta qualidade após o desmame possuem um custo muito elevado, estes ingredientes devem ser reduzidos rapidamente após o desmame. O farelo de soja possui um menor custo comparado aos ingredientes especiais das primeiras semanas após desmame, portanto, sua inclusão deve ser aumentada gradualmente.
Ao formular rações para leitões de creche, é fundamental levar em consideração o custo da ração pelo kg ganho e, principalmente, a receita sobre os custos da ração (adaptado do inglês “Income Over Feed Cost”) ou, em outra palavra, o lucro. De nada adianta formular rações para maximizar o desempenho, se no final das contas, o lucro do sistema de produção não estará sendo otimizado.
Antes de abordarmos a fase de creche, uma pergunta frequente dos produtores é: devo fornecer ração antes do desmame ou não? Quando o fornecimento de ração antes do desmame é realizado, 55% desta ração é consumida nos últimos 3 dias antes do desmame. Ao redor de 70% dos leitões consomem a ração fornecida antes do desmame, e o impacto na creche é uma melhoria de 5% no ganho de peso diário. O tipo de comedouro para leitões pré-desmame é muito importante, para que haja pouco desperdício. O comedouro com melhor resultado é o que possui uma tulha para armazenagem da ração (Sulabo et al., 2010). Na tomada de decisão, deve ser levada em consideração a disponibilidade de mão de obra e a qualidade dos comedouros disponíveis para a realização deste manejo.
A idade ao desmame é um fator muito importante na formulação de rações para fase de creche, pois impacta o desempenho de leitões e também a lucratividade. A estimativa é de que entre 15 e 25 dias de idade ao desmame (Main et al., 2005), o lucro aumenta de U$0.50 a U$1.00 para cada dia de aumento na idade ao desmame.
Como sabemos, não existe mágica na produção de suínos. Os animais precisam de ração, água e ambiente de qualidade. Ração à vontade na fase de creche desde a primeira hora após o alojamento na creche é essencial. Ainda observamos muitas granjas com comedouro tipo calha com pouco espaço por leitão na fase de creche. Isto prejudica imensamente o peso final nesta fase. Antigamente, se sugeria a restrição de ração na primeira semana após o desmame para diminuir a diarreia. No entanto, isto não é recomendado. Para solucionar tal problema deve ser feita uma análise crítica da qualidade e inclusão dos ingredientes utilizados.
Leitões recém-desmamados estão em uma fase de extrema dependência de energia, portanto a maximização do consumo de ração é fundamental. Com o aumento do consumo de ração na primeira semana, o fluxo da digesta irá diminuir a proliferação de bactérias no intestino e diminuir a incidência de diarreia. Leitões que consomem menos de 200 gramas por dia na primeira semana após o desmame possuem de 18 a 34 vezes mais chance de apresentar diarreia do que leitões que consomem 200 a 250 gramas por dia no mesmo período (Madec et al., 1998).
Baseado no desenvolvimento do sistema digestivo do leitão após o desmame, as granjas têm trabalhado com 3 a 4 dietas na creche. Irei descrever a visão macro do programa nutricional com 3 dietas. Sendo a primeira fase de 5.5 a 7 kg, a segunda de 7 a 11 kg e a terceira de 11 a 25 kg de peso vivo dos leitões.
Como o objetivo da primeira dieta da creche é maximizar o consumo de ração, o custo será elevado, pois terá altas inclusões de lactose e proteínas especiais (plasma animal, farinha de peixe, farinha de sangue, subprodutos da produção de heparina, concentrados de soja, entre outros). Além disso, a lisina digestível nesta dieta será mais elevada do que nas outras rações de creche. O custo da primeira dieta, normalmente, corresponde a apenas 15% do custo total do programa de nutrição da creche, por isso mesmo tendo um alto custo, os benefícios de auxiliar os leitões no processo de desmame com alto consumo de ração e menor taxa de refugagem são mais importantes que o custo. O uso de farelo de soja ou não na primeira dieta é motivo de discussão entre nutricionistas ao redor do mundo. Baseado nas nossas pesquisas e experiências de campo, consideramos importante utilizar, pelo menos, uma pequena inclusão de farelo de soja na primeira dieta para iniciar a adaptação dos leitões às dietas subsequentes. No entanto, é importante considerar a qualidade do farelo de soja disponível em cada situação.
É recomendado que a primeira dieta seja peletizada, para aumentar o consumo de ração. Para auxiliar no processo de peletização, devido à alta inclusão de lactose e proteínas especiais, a inclusão de 2-3% de gordura se faz necessária. Vale ressaltar que a inclusão de gordura nesta primeira dieta visa estritamente a peletização, pois os leitões não possuem uma quantidade de lípase suficiente para utilizar esta gordura.
A quantidade da primeira dieta fornecida por leitão irá variar com a idade ao desmame. Por exemplo, para leitões desmamados com 5.5 kg, recomenda-se 2 kg por leitão na primeira fase. No entanto, para leitões desmamados com 7 kg, recomenda-se pelo menos 0.5 kg por leitão.
A segunda dieta corresponde a 25% do custo do programa de nutrição da creche e é basicamente uma transição entre a primeira e a terceira dieta. Esta dieta é composta de uma quantidade menor de lactose e proteínas especiais, e uma maior inclusão de farelo de soja.
Em relação aos promotores de crescimento, a prática e as pesquisas sugerem que o uso de óxido de zinco nas primeiras duas dietas é de extrema importância para diminuir diarreia após o desmame e melhorar o desempenho, melhorando o ganho de peso entre 5 e 10%.
Por fim, como a terceira dieta corresponde de 55 a 65% do custo do programa de nutrição e é composta basicamente de milho e soja, muito similar às dietas da fase de crescimento e terminação, é de extrema importância adaptar os leitões para iniciar o consumo desta ração o mais precocemente possível. Por isso pequenos ajustes na formulação desta dieta trazem grandes resultados econômicos. Apesar de existir uma melhora em desempenho ao utilizar lactose e proteínas especiais nesta fase, não existem benefícios econômicos. A única característica especial desta dieta é o uso de sulfato de cobre como promotor de crescimento.
O tamanho de partícula recomendado para fase de creche é de 500-600 micra. Tamanhos de partícula maiores que 600 micra irão prejudicar a digestibilidade dos nutrientes e tamanhos de partícula menores que 500 micra em dietas fareladas irão gerar uma diminuição no consumo de ração dos leitões.
Por fim, os pontos chaves para maximizar o lucro na nutrição de leitões na fase de creche são utilizar uma dieta complexa na primeira fase após o desmame para estimular o consumo de ração e realizar uma transição para dietas a base de milho e soja o mais rápido possível dentro da realidade de cada sistema de produção.
Márcio Gonçalves, formado em Medicina Veterinária pela UFRGS, trabalhou com produção de suínos nos Estados Unidos e no Brasil. Atualmente, é assistente de pesquisa e realiza seu PhD em nutrição aplicada de suínos na Kansas State University (EUA). O Med. Vet. Gonçalves é fundador dos podcasts SuinoCast e CerdoCast, de educação continuada na suinocultura (marcio@k-state.edu).
Fonte: Suinocultura Industrial
Referências
Madec, F., Bridoux, N., Bounaix, S., & Jestin, A. (1998). Measurement of digestive disorders in the piglet at weaning and related risk factors. Preventive veterinary medicine, 35(1), 53-72.
Main, Rodger G., Steve S. Dritz, Mike D. Tokach, R. D. Goodband, and Jim L. Nelssen. "Effects of weaning age on growing-pig costs and revenue in a multi-site production system." Journal of Swine Health and Production 13, no. 4 (2005): 189.
Sulabo, R. C., J. Y. Jacela, M. D. Tokach, S. S. Dritz, R. D. Goodband, J. M. DeRouchey, and J. L. Nelssen. "Effects of lactation feed intake and creep feeding on sow and piglet performance." Journal of animal science 88, no. 9 (2010): 3145-3153.
Esse artigo técnico foi originalmente publicado em Suinocultura Industrial.