INTRODUÇÃO
Os machos reprodutores têm um papel cada vez mais decisivo dentro dos sistemas de produção de suínos. Embora dividam em exatos 50% com as fêmeas os genes da futura leitegada, a sua influência acaba tendo um peso maior. Primeiro, em termos de quantidade, já que o ciclo produtivo de um único macho é mais longevo do que o da matriz. Outra, é que as principais características de interesse econômico são oriundas dos machos (MARQUES, 2020). Nesse contexto, o perfil dos reprodutores a serem selecionados para formar o plantel nos centros de processamento de sêmen (CPS) representa uma tomada de decisão importante, pois grande parte do sucesso técnico e econômico da criação depende do nível genético dos reprodutores.
A inseminação artificial (IA), é utilizada de forma crescente pela suinocultura moderna e tecnificada, tornando-se um importante componente do manejo reprodutivo (TONIOLLI, 2010). É uma biotecnologia que contribui para o incremento da qualidade e quantidade de carne produzida. Com a crescente utilização de programas de IA, o macho reprodutor assume importante papel, pois, devido à sua importância na fertilidade e produtividade do plantel, tem grande impacto nos resultados econômicos da granja (VELLOSO, 2008).
Para atender a demanda de reprodutores com alto padrão genético, os aspectos de manejo reprodutivo devem, efetivamente, serem considerados nos CPS. Esses, incluem os cuidados com a higiene e manejo dos animais, uso de mão-de-obra dedicada e boas instalações, os quais são importantes para obtenção de melhor desempenho dos animais (MARQUES, 2020). Esses fatores acabam influenciando os aspectos qualitativos e quantitativos do ejaculado do reprodutor, ou seja, o manejo eficaz do ambiente do reprodutor é importante para reduzir o estresse térmico, a alta umidade ou temperaturas baixas que são prejudiciais, bem como alterações nos períodos de luminosidade e problemas de ingestão alimentar (MARTENS).
O objetivo deste capítulo é averiguar publicações e atualizações no setor de alojamento e coleta de sêmen de machos suínos, com o intuito de melhor elucidação sobre o manuseio de coletas e manejo de animais doadores, bem como a gestão operacional do processo.
SISTEMAS ACOPLADOS AO ALOJAMENTO E COLETA DE SÊMEN
Sistemas de alojamento de machos doadores de sêmen
A suinocultura pode ser considerada uma das formas mais efetivas de criação, predominando ainda sistemas de confinamento intensivo no Brasil para otimizar espaço e desempenho econômico e produtivo (BAPTISTA et al., 2011). Assim, é comum encontrar machos reprodutores alojados em sistemas de gaiolas, o que facilita as práticas de manejo (MESQUITA et al., 2011).
Já é bem descrito que sistemas de confinamento intensivo tem influência sobre a expressão do comportamento natural de suínos e podem comprometer sua saúde, porém, não há informações na literatura sobre a influência de condições de alojamento para machos reprodutores suínos. Além disso, fatores como a temperatura, o fotoperíodo e a nutrição podem impactar negativamente na qualidade de vida, levando a um desajuste na homeostase que pode refletir na reprodução destes (ALMEIDA, 2021).
Ao receber um reprodutor na granja, estamos introduzindo um animal de alto mérito genético, de elevado status sanitário e com responsabilidade mínima de produzir 7.000 leitões nascidos vivos/ano pela técnica da Inseminação Artificial (IA) intra-cervical ou 14.000 leitões nascidos vivos/ano pela técnica IA pós-cervical. Portanto, o local de alojamento dos machos é essencial para garantir sua produtividade (ARAUJO, 2017). Dessa forma, o principal objetivo de uma instalação de reprodutores deve ser proporcionar conforto e bem-estar, a fim de que a produção espermática seja favorecida (BENNEMANN, 2014).
As instalações para machos reprodutores devem permitir, por exemplo, a disposição dos animais cabeça a cabeça, uma vez que eles são retirados da gaiola pelo corredor frontal e retornam a ela por corredores na porção traseira da gaiola. Isso permite um fluxo contínuo de deslocamento dos reprodutores, pois não há encontro simultâneo de animais. Da mesma forma, o tipo de alojamento é outro fator importante. Embora, há poucas evidências sobre qual é o melhor tipo de sistema de alojamento, existe um consenso de que reprodutores alojados em baias individuais apresentam um índice menor de problemas reprodutivos e, consequentemente, uma vida reprodutiva mais longa, bem como melhor produção espermática (BENNEMANN, 2014). No entanto, no trabalho de Rezende (2021), foi avaliado se o alojamento dos machos reprodutores com mais espaço e enriquecimento ambiental, comparado ao sistema intensivo, poderiam apresentar efeito na qualidade do sêmen, nas características biométricas e histológicas dos testículos e epidídimos e na qualidade espermática da cauda do epidídimo. Esse estudo concluiu que as melhorias nas condições de alojamento dos reprodutores suínos, durante 30 semanas, não foram suficientes para apresentar efeitos benéficos sobre as características reprodutivas. No mesmo estudo foi observado a redução da porcentagem de defeitos totais espermáticos nos animais mantidos em baias com enriquecimento ambiental quando comparados àqueles mantidos em celas (REZENDE, 2021). Estes resultados indicam que se pode esperar melhora na qualidade espermática em função do bem-estar animal, mas que este efeito poderá ser notado somente após um período mais longo. Fato que ainda precisa ser comprovado em outros estudos com a manutenção dos animais por mais tempo nestas condições.
A literatura recomenda que, pelo menos, 20% dos animais sejam alojados em baias individuais e 80% em gaiolas individuais. Esse procedimento permite o manejo rotacionado de machos reprodutores com intervalos programados. Da mesma forma, machos reprodutores com alterações no sistema locomotor poderiam ser alojados no sistema de baias para auxiliar na sua recuperação (BENNEMANN, 2014). No entanto, o Cap III, Art. 9º Inciso IV publicado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), preconiza que os machos reprodutores suínos adultos sejam alojados em baias, cuja a área útil mínima destinada a cada animal deve ser igual ou superior a seis metros quadrados (MAPA, 2020).
O tipo de piso das instalações é o fator predisponente mais importante para as lesões de cascos. Características como pisos novos, abrasivos, rugosos, com buracos, pisos úmidos, vazados com espaçamento inadequado, quebrados ou com irregularidades podem influenciar o aparecimento das lesões (ALBERTON, et al., 2012). O piso compacto de concreto, apesar de proporcionar um melhor conforto ao reprodutor, não se torna prático em relação à condição de higiene e umidade ambiental, fatores que interferem, em longo prazo, na saúde dos cascos. Outro ponto a ser avaliado na utilização de um piso compacto é o aumento do risco de contaminação bacteriana do ejaculado devido à piora na condição de higiene do reprodutor (BENNEMANN, 2014). Já os bebedouros tipo chupeta mantêm a instalação mais seca do que o tipo taça, porém devem garantir uma vazão adequada, que corresponde a um mínimo de um litro por minuto (KUNZ, 2003).
Para machos reprodutores, as altas temperaturas ambientais influenciam negativamente a espermatogênese, causando redução na qualidade do sêmen e, consequentemente, problemas de fertilidade. É considerado estresse crônico quando os animais são submetidos a ambientes com temperaturas entre 26ºC e 29°C e umidade relativa acima de 80% por longo período. Em um estudo, observou-se aumento da temperatura escrotal e diminuição da motilidade espermática de 93% para 19% após a temperatura atingir 30°C (CASTRO, 2016). Assim, altas temperaturas aumentam as chances de anormalidades espermáticas que, consequentemente, irão reduzir o número de doses inseminantes por ejaculado. De forma prática, a manutenção de temperaturas variando de 20°C a 24°C é capaz de proporcionar um ambiente adequado para a produção espermática (BENNEMANN, 2014).
Devemos salientar que animais em desconforto térmico, podem reduzir seu desempenho reprodutivo (MESQUITA et al., 2011; FOPPA et al., 2014), resultando em alterações no comportamento sexual (HODEL et al., 2021), qualidade espermática, tamanho testicular e epididimário (HODEL et al., 2021; ELOY, 2007) e, por consequência, reduzir a qualidade da formação e armazenamento da célula espermática (HODEL et al., 2021).
Fisiologicamente o estresse é desencadeado por uma resposta no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, aumentando a concentração do cortisol sérico, um glicocorticoide produzido pelo córtex da adrenal em resposta à secreção do hormônio adrenocorticotrópico (ACTH) (MORGAN et al., 2019). A secreção do ACTH resulta na liberação dos glicocorticóides e de substâncias, como os opióides endógenos, que podem produzir beta-endorfinas pelas adrenais, que por sua vez, levam a alterações nos sistemas imunológico, reprodutivo, digestório, entre outros. As beta-endorfinas uma vez aumentadas bloqueiam as corticotrofinas e a secreção do hormônio luteinizante (LH) (ELOY, 2007). A secreção de hormônios opióides endógenos agem nas gônadas e estão envolvidos em mecanismos como o controle do apetite, esteroidogênese, espermatogênese, termorregulação e comportamento sexual, levando a alterações das características seminais e até mesmo nas variáveis biométricas de testículos e epidídimos (ELOY, 2007).
Sistemas de coleta manual e semiautomático
A coleta de sêmen dos suínos pode ser considerada o ponto de partida para uma dose inseminante de qualidade. Todos os procedimentos realizados têm como objetivo único prolongar ao máximo a viabilidade espermática, lembrando sempre que não é possível melhorar a qualidade de um ejaculado, mas somente mantê-la ou minimizar suas perdas (MARCHETTI & MELAGGI, 2014). Para isso se faz necessário considerarmos diversos aspectos, que serão abordados a seguir.
Local de coleta: o local de coleta deve possuir instalações com um bom nível de funcionalidade, permitindo um fluxo ideal de trabalho, desde a coleta até a saída das doses de sêmen, com conforto e segurança para funcionários e animais envolvidos nos trabalhos de produção. As instalações devem permitir a manutenção de um rigoroso padrão higiênico- -sanitário no laboratório e nas baias dos reprodutores (BORTOLOZZO et al., 2005).
Dentro de uma central de produção de sêmen, há basicamente três tipos diferentes de áreas de trabalho (TONIOLLI, 2010): a) a área contaminada, geralmente é formada por baias individuais de reprodutores (6 a 9m2), com pisos não abrasivos e nem muito lisos. Há separação, entre baias, por uma altura de 1,30m, com bebedouro automático e possibilidade de acesso ao solário. A sala de coleta de sêmen deve estar situada próxima ao laboratório, ligada a este por uma pequena janela comunicante, porém sem permitir o trânsito direto entre os dois ambientes. Fazem parte desta área contaminada, um manequim fixo de coleta, com altura regulável, uma gaiola para higienização pré-coleta dos reprodutores, um depósito de ração e materiais diversos, bem como corredores de manejo; b) A área intermediária, onde estão a sala de lavagem e preparação de material, provida de pia e cubas de inox, bancadas de alvenaria revestidas e piso de cerâmica, além dos banheiros e vestiários; c) A área limpa, é a sala de processamento e armazenagem de sêmen (laboratório). Esta sala deve ser revestida por material lavável (azulejo ou cerâmica), com balcões e armários revestidos por laminado plástico (fórmica), com uma boa iluminação e possibilidade de controle de temperatura ambiente (ar condicionado).
Os machos reprodutores suínos geralmente mostram interesse em montar em objetos estacionários. Portanto, uma fêmea em estro não é necessária na coleta de sêmen para inseminação artificial (IA) (ALTHOUSE et al., 2006). Os requisitos básicos para um bom manequim de coleta incluem a altura apropriada para montar e apoiar os membros anteriores do cachaço, a estabilidade estrutural e a durabilidade (ESTIENNE & HARPER, 2001). Um bom apoio ao redor do manequim é essencial para ajudar o cachaço a montar e evitar quedas durante o processo de coleta (ALTHOUSE et al., 2006). A baia de coleta de sêmen deve ter pelo menos duas ou três das paredes do perímetro construídas com tubos galvanizados de 2 polegadas de diâmetro. O tubo deve ter 36-42 polegadas de altura e ser colocado em intervalos de 11 a 12 polegadas no centro. Essas paredes de tubos perimetrais são um recurso de segurança que permite ao manipulador facilidade e disponibilidade de locais para entrar ou sair da área de coleta sem abrir um portão ou escalar uma parede, mas ainda manter o cachaço dentro da área do cercado (ESTIENNE & HARPER, 2001).
Seleção de reprodutores: antes de se pensar na linhagem do animal a ser introduzido numa criação comercial de suínos, deve-se atentar para os fatores que permitem ao animal exaltar suas qualidades naturais desejadas. Sabe-se que nenhuma linhagem será ótima, assim como nenhum animal será eficiente, se as condições gerais da criação, referentes à sanidade, alimentação, instalações e manejo, não forem adequadas. Por outro lado, tão ou mais importante do que a escolha da linhagem, é a seleção dos reprodutores, que irão constituir a base da criação. Os reprodutores são animais de grande valor na criação comercial de suínos, fundamentalmente por representarem o material genético disponível para a produção de leitões e, por esta razão, cuidados especiais devem ser adotados por ocasião destes animais (FÁVERO & IRGANG, 2003).
O objetivo da seleção é a busca constante de animais geneticamente superiores e capazes de transmitir à sua prole determinadas características, como comprimento e profundidade do corpo, aparelho mamário (número de tetos), estrutura óssea e aprumos, aparelho reprodutor, prolificidade, ganho de peso, conversão alimentar e qualidade de carcaça (MARCHETTI & MELAGGI, 2014).
Quarentena: é interessante salientar que do grande capital investido em um empreendimento de granja suinícola, o rebanho corresponde a grande parte, seja de animais matrizes e reprodutores ou mesmo de animais de produção. Por isso a suinocultura exige que a prevenção seja a maior e mais importante ferramenta de atuação sanitária na granja. Impedir a entrada de determinados patógenos e manter uma boa estabilidade sanitária e imunológica do rebanho pode ser a diferença entre o lucro e o fracasso da atividade, e por isso medidas de biosseguridade estão sendo cada vez mais adotadas nas granjas brasileiras. A adoção de protocolos de biosseguridade significa o desenvolvimento e implementação de normas rígidas que terão a função de proteger o rebanho contra a introdução de qualquer tipo de agente infeccioso, seja ele vírus, bactéria, fungo e/ou parasita, bem como manter a sanidade e aumentar a resistência dos animais aos desafios. Um programa efetivo de biosseguridade exige o desenvolvimento de vários itens e aspectos técnicos como restrição de visitas, programa de desinfecção e vacinação, entre outros. Mas dentre eles se destaca também o uso de quarentena. A quarentena consiste em manter isolados e sob observação animais recém-adquiridos, aparentemente sadios, mas que potencialmente podem ser portadores e difusores de diferentes agentes patogênicos (ESTIENNE & HARPER, 2001).
Os CPS atualmente necessitam comprar reprodutores constantemente, pois estes representam o material genético para o alcance de níveis de produtividade satisfatórios. Esta aquisição deve ser criteriosa e responsável, pois além dos aspectos genéticos se faz preponderante a segurança sanitária. A reposição deve ser feita de animais oriundos de granjas sanitariamente controladas, conforme vigente em lei e que apresentem certificado de garantia. O histórico de mercado do Fornecedor de Genética e sua postura frente a situações anteriores é um excelente indicador do teor de idoneidade e garantias que se pode esperar. Deve-se ter em mente sempre que, independentemente da origem, todos os animais adquiridos devem ser considerados suspeitos. Todos os reprodutores de reposição devem, necessariamente, passar por um período de quarentena antes de serem introduzidos na granja e terem contato direto ou indireto com os demais animais do rebanho (BENNEMANN, 2014).
A quarentena deve manter o animal isolado por um período suficiente para cobrir o tempo de incubação daquelas doenças cuja presença está se tentando monitorar, e ainda ser economicamente viável. O período de incubação das doenças dos suínos é bastante variável, tendo as principais um período de incubação de duas a dez semanas. Observa-se na literatura que o período sugerido para a realização da quarentena é tema controvertido e diferente entre os autores. De acordo com alguns autores, seis semanas seria o período ideal, para atender o período de incubação de várias doenças, e possível de se realizar na prática (RISTOW, 2003). Ristow (2003), recomenda manter os animais recém-adquiridos por no mínimo 45 dias (ou ideal de 60 dias) no quarentenário. Esses animais sempre deverão ser provenientes de granjas certificadas pelo MAPA. Na quarentena, faz-se coleta de sangue para exames sorológicos para Pleuropneumonia (App), Mycoplasma e até mesmo Doença de Aujezsky, dentre outros. Além do mais, iniciam-se os treinamentos ou condicionamentos dos doadores para as coletas de sêmen, logo após a chegada e adaptação dos machos, ou seja, cerca de três a cinco dias, sendo que esta prática não deve ser realizada na sala de coleta. Outra opção, em muitos empreendimentos suinícolas, é repor animais apenas três vezes ao ano, pois a medida diminui o risco de contaminação.
Condicionamento dos doadores para coleta de sêmen: os machos pré-púberes chegam aos CPS com uma idade média de 150 a 170 dias. Ainda na quarenta devem iniciar o treinamento de salto no manequim. Após a quarenta, o treinamento deve ser realizado diretamente na sala de coleta e na sequência dos demais reprodutores (antes da higienização/limpeza da sala) (BORTOLOZZO et al., 2005). O macho deve ser apresentado ao manequim, diariamente, durante 10 a 15 minutos. É importante que o macho seja conduzido tranquilamente ao local onde se encontra o manequim, e, preferencialmente, após a limpeza das instalações, quando o ambiente estiver calmo (MARCHETTI & MELAGGI, 2014). Nesses momentos, o coletador deve estimular o cachaço a saltar no manequim. A regulagem de altura do manequim deve estar de acordo com a altura do macho. No momento do salto, deve-se proceder a coleta. Posteriormente, esse animal deve ser submetido a coletas com intervalos de uma semana para manter o condicionamento ao salto (BORTOLOZZO et al., 2005).
Caso o macho não salte após 15 dias, pode-se repetir o treinamento com um manequim móvel, no local de alojamento do macho. Normalmente, 90 a 95% dos machos demonstram sucesso no treinamento, aceitando a coleta no manequim (MARCHETTI & MELAGGI, 2014). Caso o animal não salte nas sessões realizadas na baia de alojamento, é possível a exposição do macho frente a uma fêmea em estro. Ao saltar na fêmea em estro, deve-se proceder com a fixação do pênis e tenta-se transferir o doador para cima do manequim, colocado previamente ao lado, onde a coleta deverá ser concluída (BORTOLOZZO et al., 2005).
O horário para realização do treinamento também deve ser apropriado. Deve-se optar por treinar os machos nos períodos com temperaturas confortáveis, pois a atividade sexual pode ser influenciada pelo estresse por frio ou calor (SURIYASOMBOON et al., 2005). O treinamento durante e após a alimentação deve ser evitado, pois nesses períodos os animais no entorno ficam mais agitados, tirando a atenção do macho, que poderá tentar fugir da baia de treinamento. Além disso, após a alimentação ocorre diminuição da atividade dos animais. Os machos experientes normalmente interagem menos com o manequim e montam rapidamente após entrar na sala de coleta de sêmen (LEVIS & REICKS, 2005). Dessa forma, um macho experiente poderá ser colocado na baia durante o treinamento para montar no manequim e ser observado por outro macho inexperiente, e esse manejo irá auxiliar o aprendizado (RODRIGUES, 2013).
Para facilitar o treinamento, os machos que têm dificuldade para montar devem ser alojados em locais onde é possível visualizar a coleta de sêmen de outros animais. Em último caso, se o animal não apresentar libido, uma alternativa pode ser a administração de prostaglandinas. As prostaglandinas podem acelerar o processo de treinamento dos machos que não apresentam motivação sexual (ZAMORA et al., 2010). Ryu et al. (2007), avaliaram o efeito da prostaglandina no treinamento para coleta de sêmen de machos inexperientes da raça Duroc, que não conseguiam montar no manequim. Logo após a aplicação das injeções, esses autores observaram que houve um efeito positivo no treinamento, entretanto, Estienne et al. (2007), afirmaram que a administração de prostaglandina não alterou o comportamento sexual.
Comportamento sexual durante a coleta de sêmen: um dos principais fatores relacionados com o sucesso na reprodução é a libido dos machos (PINHO et al., 2013). Nesse contexto, é fundamental observar a motivação e competência para realizar o acasalamento sexual; as interações entre o ambiente e o animal; e as concentrações de hormônios esteróides (HEMSWORTH & TILBROOK, 2007). De acordo com Flowers (2008), a maioria das pesquisas a respeito do comportamento sexual dos machos foram realizadas no final de 1970 e envolveu comparações entre machos puros e mestiços em testes de comportamento sexual, em que os machos foram expostos a nulíparas em estro. Nestes estudos, os animais de raça pura apresentavam menos libido que seus mestiços. Em outro estudo, o macho permanecia em uma baia sozinho por cinco minutos e depois uma fêmea sexualmente receptiva era colocada na baia. Durante as avaliações, que duraram 15 minutos, foram registrados os comportamentos de cortejo de cada macho, como: contato naso-nasal, cheirar a fêmea, farejar a região genital, cantar (emitir uma curta série de grunhidos característicos), montar e o tempo de ejaculação (HEMSWORTH et al., 1983). Já Frydrychová et al. (2011), utilizaram uma metodologia denominada escore de libido para classificar o comportamento sexual de machos coletados com a utilização de manequim. Esses autores consideraram por meio de escores o interesse do animal pelo manequim, as tentativas de salto e monta correta, ereção e ejaculação. Assim, por meio dessa metodologia é possível saber sobre o comportamento sexual e a destreza dos machos durante a monta.
Coleta propriamente dita de sêmen: é realizada pelo método da mão enluvada (HANCOCK & HOVEL, 1959). Após a escolha do macho a ser coletado, este deve ser conduzido com tranquilidade para a sala de coleta. Algumas centrais utilizam uma sala de pré- -coleta, onde é realizada a eliminação do conteúdo dos divertículos prepuciais, principalmente urina. É extremamente importante que o coletador não faça essa limpeza com a mesma luva que será utilizada na coleta. O uso de uma sobreluva, ou luva higiênica, evita a contaminação da luva de coleta com as secreções prepuciais ou qualquer outro tipo de agente contaminante. Depois da higiene pré-coleta, a sobreluva é retirada e, no momento em que o reprodutor inicia a exposição do pênis, o coletador fixa a extremidade do pênis, deixando cerca de dois a três centímetros livres para que o ejaculado não escorra sobre a luva (MARCHETTI & MELAGGI, 2014). O pênis não deve ser tracionado. Ao completar a exteriorização, o pênis pode ser posicionado lateralmente para facilitar a coleta (BORTOLOZZO et al., 2005).
O ejaculado possui quatro fases distintas (Adaptado de BORTOLOZZO et al., 2005; MARCHETTI & MELAGGI, 2014):
– Fase das Glândulas Uretrais: esta fase é composta pelos primeiros 10 a 15mL liberados, provenientes das glândulas uretrais, cuja função é limpar a uretra para a passagem das demais fases. Deve sempre ser descartada para reduzir a contaminação do ejaculado.
– Fase Rica: apresenta aspecto leitoso a leitoso denso e contém aproximadamente 70% do total de espermatozoides do ejaculado, o qual é determinado pelas vesículas seminais.
– Fase Pobre: apresenta aspecto seroso e é intermediária entre a fase rica e as secreções uretrais. É o restante do número de espermatozoides e do volume produzido pelas vesículas seminais. Às vezes pode ser observada alternadamente com a fase rica.
– Fase Gelatinosa: esta fase é composta pela secreção das glândulas bulbo-uretrais. É liberada lentamente e representa a fase final da ejaculação, cuja função é servir de tampão da cérvice, o que evita o refluxo do sêmen.
Em geral, a fração rica do ejaculado tem sido a parte incluída na elaboração das doses inseminantes, devido à crença de que a parte final do ejaculado (fração pós-espermática caracterizada pelo alto volume de plasma seminal e baixa concentração espermática) teve um efeito deletério na qualidade do esperma durante a manutenção da dose. É verdade que alguns estudos confirmaram esse fato, mas avaliando o efeito de cada fração do ejaculado separadamente (revisado por Höfner et al., 2020), mas não avaliando o possível efeito sinérgico das diferentes frações como um todo na conservação das doses de sêmen, fertilidade e tamanho da prole (VÁZQUEZ, et al. 2022). Para corroborar este fato, Vázquez et al. (2022) realizaram um estudo preparando três tipos diferentes de doses seminais de acordo com as frações incluídas durante a coleta do ejaculado: 1) Dose seminal F1: inclui a fração rica do ejaculado; 2) F2: F1 mais a fração de transição entre a fração rica e a fração pobre; 3) F3: F2 mais a fração pobre. Os resultados da análise seminal mostraram que os 3 tipos de doses mantiveram uma qualidade espermática semelhante, sem que as frações ejaculadas incluídas afetassem qualquer parâmetro.
Coleta semiautomática de sêmen: a coleta de sêmen semiautomática, também chamada de sistema handsfree (mãos livres), é realizada através da fixação do pênis pelo coletador somente no primeiro momento, quando o pênis é posicionado em uma estrutura chamada cérvice artificial que em seguida é acoplada ao manequim. Há um suporte para o copo coletor, o que permite que o operador possa acompanhar duas ou mais coletas ao mesmo tempo. Além de otimizar o tempo de serviço, este sistema proporciona melhores condições de trabalho e menores riscos de contaminação do ejaculado, visto que o sêmen é depositado diretamente no copo e o contato humano é mínimo. Alguns reprodutores não se adaptam ao sistema semiautomático e a coleta deve ser feita manualmente, através da técnica da mão enluvada (VÁZQUEZ, et al. 2022).
Em outro estudo, foram analisadas diferentes técnicas de fixação do pênis durante a coleta semiautomática. A técnica em que o pênis foi fixado diretamente na cérvice artificial foi descrita como “Tradicional”, já a técnica proposta pelos autores, em que a cérvice foi previamente fixada pela mão enluvada e posteriormente fixado na cérvice artificial, foi denominada de “Método Ajustado” (PASCHOAL et al., 2021). Para tanto, foram separados em dois cenários: o grupo “A” = baixos níveis de contaminação bacteriana no sêmen e grupo “B” = altos níveis de contaminação bacteriana no sêmen. Os autores concluíram que o método ajustado apresentou uma redução da carga bacteriana dos ejaculados, principalmente no grupo B, que apresentou altos desafios de contaminação.
Cuidados higiênicos na coleta e processamento do ejaculado suíno: a contaminação bacteriana pode ocorrer tanto durante a coleta como no processamento do mesmo (ALTHOUSE et al., 2000). Segundo Weitze (2008), é quase impossível uma coleta de sêmen livre de qualquer contaminação. Dias et al. (2000) compararam dois métodos de higienização pré-coleta e coleta do ejaculado. Os resultados demonstram que a maior frequência de limpeza do macho e das instalações, além de uma melhor higienização pré-coleta e correta fixação do pênis, contribuem para a redução da contaminação bacteriana do sêmen. Quando os cuidados de higiene foram tomados, a média de contaminação encontrada no ejaculado foi de 500 UFC mL-1 (Unidades Formadoras de Colônia por mL), ao passo que nas coletas sem estes cuidados a média de contaminação subiu para 18.000 UFC mL-1. Os principais cuidados a serem tomados para diminuir a contaminação bacteriana durante a coleta são a limpeza do macho, a adequada higienização prepucial pré-coleta com sobre-luva, a adequada fixação do pênis, o descarte dos primeiros jatos do ejaculado, a utilização de luvas descartáveis específicas para cada coleta, a utilização de filtros para separação da porção gelatinosa do ejaculado, o descarte dos filtros antes do envio da amostra para o laboratório e a habilidade do coletador para realizar o procedimento (ALTHOUSE et al., 2000; BORTOLOZZO & WENTZ, 2005).
A contaminação química proveniente das luvas de látex utilizadas na coleta, também desempenha um importante papel na redução da viabilidade espermática. Esta contaminação poderá ocorrer caso o ejaculado entre em contato com as mesmas, em função de procedimentos errôneos no momento da fixação do pênis (BORTOLOZZO e WENTZ, 2005). Scheid et al. (1995) relataram que as luvas empregadas na coleta podem possuir substâncias tóxicas aos espermatozoides, que levam à redução no percentual de células espermáticas móveis.
Após a coleta do ejaculado, durante o processo de análise e elaboração das doses inseminantes, os fatores que podem ser relacionados com a contaminação bacteriana são, em geral, os de origem não-animal. Desses fatores, a água parece ser o mais preocupante, pois, nela as bactérias se multiplicam exponencialmente, inclusive naquelas submetidas a processos de purificação, formando biofilmes nesses sistemas de tratamento e, consequentemente, contaminando o diluente (NESS et al., 2007).
Outros fatores a serem considerados durante o exame e processamento do ejaculado são os materiais não descartáveis utilizados na avaliação e processamento do sêmen, como os termômetros e as pipetas. Esses materiais acabam sendo, muitas vezes, fonte de contaminação cruzada, uma vez que só são limpos e desinfetados ao final do dia e são utilizados de ejaculado em ejaculado.
Além dos fatores relacionados com os materiais utilizados, o ambiente laboratorial também é importante. O ar circulante deve ser filtrado sistematicamente, com o intuito de diminuir a circulação das bactérias (ALTHOUSE e LU, 2005). Nesse contexto, deve-se utilizar produtos descartáveis no contato com o sêmen, a desinfecção diária dos materiais não descartáveis com detergente não-residual, desinfecção do chão ao final do dia, preparação de produtos a serem utilizados diariamente e instalação de luzes Ultra-Violeta para limpeza das superfícies do laboratório (ALTHOUSE et al., 2000). Por conseguinte, uma das etapas que demandam maior atenção durante o processo de produção de doses de sêmen é o momento da coleta do ejaculado, já que é identificada como o ponto mais crítico para a contaminação bacteriana (ALCKMIN, 2019). Sendo que, o macho pode ser a fonte primária de contaminação.
Em um experimento realizado na FAVET-UFRGS, com intuito de avaliar a contaminação bacteriana através da contagem de UFC do sêmen suíno submetidos a dois métodos de higienização pré-coleta e coleta do ejaculado constatou-se que, uma melhor higienização pré-coleta e correta fixação do pênis deixando 1-2cm da extremidade livre, contribuem para a redução da contaminação bacteriana (BORTOLOZZO & WENTZ, 2005).
Frequência de coletas: a frequência de coletas deverá seguir parâmetros fisiológicos da espécie e características particulares de cada reprodutor. De uma maneira geral, pode ser usado como regra o seguinte esquema: machos jovens (até 12 meses de idade) = de uma coleta/semana até três coletas/duas semanas. No caso de machos adultos (maiores de 12 meses) = duas coletas/semana (TONIOLLI, 2010).
O intervalo entre coletas é um dos fatores externos importantes, exigindo uma atenção frequente do responsável pelas Unidades de Difusão Genética. Uma frequência de coletas excessiva do ejaculado pode afetar o processo de espermatogênese e consequentemente a qualidade do sêmen, bem como intervalos excessivamente longos também produzem um efeito negativo, devido ao acúmulo excessivo de espermatozoides no epidídimo (ALCKMIN, 2019). Dornelles et al. (2019), realizaram um estudo avaliando a frequência de coletas de sêmen em machos suínos jovens submetidos a intervalos entre coletas de 2 até 7 dias em diferentes tratamentos. Eles concluíram que machos suínos, no início da vida reprodutiva, podem ser submetidos a intervalos entre coletas de no mínimo 2 dias, sem comprometer a motilidade total das células espermáticas. Porém, os melhores resultados são obtidos a partir de uma frequência de coletas a cada 7 dias, ocasionando maiores valores de motilidade total, células morfologicamente sadias, com membrana íntegra e menores danos pelo efeito da peroxidação lipídica. Nesta mesma linha de pensamento, é interessante salientar que em relação a frequência de coletas devemos considerar a existência de diferenças individuais na produção espermática, tanto em machos jovens como em adultos (BORTOLOZZO et al., 2005). Os autores concluíram ainda que dessa forma, em doadores com uma boa produção espermática, é possível aumentar o ritmo de coletas sem que haja prejuízo ao macho, nem à relação custo-benefício do número de doses produzidas por coleta.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O doador de sêmen deve ser livre de doenças, de estresse, e quaisquer fatores patogênicos que possam prejudicar a espermatogênese, as características espermáticas com a motilidade total e minimizar os defeitos morfológicos da célula espermática. Os sistemas de alojamento e de coleta de sêmen devem permitir a manutenção de um rigoroso padrão higiênico-sanitário, a fim de minimizar a contaminação bacteriana e oferecer um ambiente confortável para que os animais consigam expressar, ao máximo, seu potencial reprodutivo.
Publicado originalmente na revista Ciência Animal e Veterinária: tópicos atuais em pesquisa - ISBN 978-65-5360-411-7 - Vol. 2 - Ano 2023. Acesso disponívem em: Editora Científica Digital - www.editoracientifica.com.br