INTRODUÇÃO
O acelerado crescimento e a industrialização do setor produtivo de proteínas animais resultaram no surgimento de inúmeras localidades no mundo onde as populações dos rebanhos superam a sua capacidade de suporte. Nessas regiões, a agropecuária passou a ser frequentemente associada à poluição dos mananciais de água e do solo, em decorrência do aporte expressivo de nutrientes, matéria orgânica, patógenos, resíduos de medicamentos, além da emissão de gases contribuintes de efeito estufa e maus odores (Steinfeld et al., 2006). Apesar dos resíduos animais apresentarem alto potencial impactante, por outro lado, os mesmos são ricos em nutrientes e matéria orgânica, os quais tradicionalmente têm sido empregados na adubação de lavouras ao longo de séculos. No entanto, esta prática sempre foi realizada de forma empírica, negligenciando o balanço dos nutrientes e subutilizando o potencial dos dejetos como insumo capaz de suprir parte da demanda agrícola pelos fertilizantes minerais.
A compostagem é uma técnica milenar que resulta em um adubo/condicionador de alta qualidade físico-química e biológica, cujos benefícios produtivos e ambientais são amplamente conhecidos. O desenvolvimento da compostagem dos dejetos de animais criados em grande escala apresenta o potencial para resgatar uma prática que, até então, se encontrava restrita a nichos de mercado, muitas vezes implantados com baixo grau tecnológico e falta de mecanização. No caso dos dejetos de suínos, a viabilização da compostagem só é possível pela agregação de fonte de carbono capaz de corrigir a relação C/N e a umidade, a fim de se atingir índices próximos àqueles considerados ideais para dar partida ao processo de compostagem, ou seja, C/N = 25 a 35 e umidade = 50 a 60% (Bernal et al., 2009).
O substrato comumente utilizado para a compostagem de dejetos de suínos é a maravalha. No entanto, o aumento da demanda por co-produtos celulósicos (camas de aviários, geração de energia, compensados entre outros), alavancou o preço de comercialização da maravalha na ordem de 197%, entre 2001 e 2006, na região de Lages - SC (Simioni & Hoeflich, 2009). Essa tendência gerou um déficit pela matéria-prima, que se agravaria com o surgimento de uma nova demanda na região. A falta de substrato tem sido recorrentemente apontada como um gargalo para a viabilização da compostagem em grande escala como alternativa para a mitigação do impacto ambiental da suinocultura no Estado de Santa Catarina.
O azevém, por sua vez, é uma cultura de inverno bastante difundida no Sul do Brasil, usualmente empregada em sistema de plantio direto em rotação com milho, soja e feijão entre outros. Portanto, a palha de azevém constitui-se em uma matéria-prima rapidamente renovável e abundante nessa região.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar e comparar o desempenho da palha de azevém frente à maravalha, como substrato para a compostagem dos dejetos de suínos.
MATERIAL E MÉTODOS
Os experimentos foram conduzidos em uma Plataforma de Compostagem construída na Embrapa Suínos e Aves (27°18´46" S, 51°59´16" O) em Concórdia, SC. A plataforma consiste de uma estrutura de estufa de (8,0 x 12,0 m) construída com cobertura em PVC transparente, piso e muretas internas em alvenaria e portões frontais metálicos. A instalação foi dividida longitudinalmente por duas muretas internas de 0,80 m de altura, ficando a área localizada ao meio, livre para trânsito de pessoas e equipamentos (Figura 1). As duas áreas laterais, ambas com 2,5 m de largura, foram utilizadas como áreas para experimentação, aonde foram montadas celas com dimensões internas de 2,5 m x 1,5 m x 0,8 m, utilizando madeirites para separar as leiras. Em cada cela, foram providenciados caimentos no piso de forma a direcionar o escorrimento do chorume para drenos individuais. Em cada uma dessas celas foi montada uma pilha de compostagem.
As matérias-primas utilizadas para a composição da biomassa foram maravalha de pinus e dejetos de suínos oriundos de uma unidade demonstrativa localizada ao lado da unidade experimental, composta de 14 matrizes em regime de ciclo completo. Amostras de dejetos foram coletadas a cada impregnação e analisadas no laboratório de análises físicoquímicas da Embrapa Suínos e Aves, utilizando metodologias padronizadas (APHA/AWWA/WEF, 1998). As aplicações dos dejetos aos substratos foram feitas de forma parcelada, intercaladas em uma semana até se atingir a proporção de 6 litros de dejeto para cada 1 kg de substrato. Na primeira aplicação foram adicionados o equivalente a 40% do total a ser impregnado, na segunda 30%, na terceira 20% e na última 10%. Utilizaram-se dois parâmetros para monitorar o desempenho da compostagem nos dois tratamentos estudados: a temperatura desenvolvida no interior das leiras e a emissão de CO2 e CH4, que mede, indiretamente, a mineralização da matéria orgânica promovida pela atividade microbiológica.
Para a medida da temperatura, foram introduzidos termopares de Cobre-Constantan no interior de cada uma das leiras a uma profundidade de 30 cm, as leituras foram feitas diariamente no mesmo horário (10:00 h). As medidas de emissão de CO2 e CH4 se deu através metodologia de câmara estática em três pontos/leira, com leituras tomadas durante 3 minutos/ponto, realizadas diariamente no período da manhã. O equipamento utilizado foi um medidor portátil de gases, equipado com detetor infravermelho para metano e gás carbônico (Draeger modelo X-AM 7000) e os dados obtidos foram tratados a fim de se expressar os resultados em fluxo do gás por área (Sommer & MØller, 2000).
Após 105 dias, foram coletadas amostras compostas das leiras as quais foram encaminhadas para análises no laboratório utilizando metodologias oficiais para os parâmetros (AOAC, 1995): potássio (K), nitrogênio (N), fósforo (P) e pH.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Durante a aplicação dos dejetos aos substratos, os chorumes recolhidos nos drenos das celas corresponderam a 7,5% (v/v) do dejeto aplicado na maravalha e 29% na palha, demonstrando a maior capacidade de retenção da maravalha. Após as medidas, o líquido foi reintroduzido às correspondentes leiras até cessar o escorrimento.
Na Figura 2 apresentam-se os resultados do monitoramento da compostagem com ambos os substratos avaliados. Através dos resultados demostra-se que a compostagem na qual se utilizou a palha como substrato ocorreu mais rapidamente, atingindo maiores picos de temperatura, possivelmente em decorrência da sua maior biodegradabilidade (fração orgânica com menor teor ligno-celulósico) e porosidade (Sommer & MØller, 2000). A estabilização da leira pode ser observada através da redução da emissão de C-CO2 e CCH4 após o 50o dia, a qual cessou, definitivamente, a partir do 65o dia. Paralelamente, a temperatura no interior da leira nesse período foi caindo nitidamente até atingir equilíbrio com a temperatura ambiente do interior da plataforma.
Na Figura 3 mostra-se a emissão acumulada no período avaliado, comprovando a estabilização da biomassa com palha pela formação do platô, tanto para CO2 como CH4. A Tabela 1 mostra os teores de macronutrientes contidos no composto resultante dos tratamentos. No tratamento com maravalha os teores de macronutrientes foram menores que o da palha, possivelmente pela contribuição dos nutrientes contidos na palha e a perda de massa resultante da maior degradação desta comparada com a maravalha.
CONCLUSÃO
A palha de azevém pode substituir a maravalha como substrato na co-compostagem de dejetos de suínos, apresentando mais rápida estabilização, maiores picos de temperaturas e teores de macronutrientes no composto. Entretanto, a maravalha confere à biomassa maior capacidade de absorção dos dejetos e menor variabilidade térmica por ser mais isolante. A avaliação de blends de substratos se faz necessária para se buscar aliar as vantagens de ambas as matérias-primas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
STEINFELD, H.; GERBER, P.; WAAENAAR, T.; CASTEL, V.; ROSALES, M.; HAAN, C. Livstock long shadow – environmental issues and options. Roma: FAO, 2006, 391 p.
BERNAL, M.P.; ALBUQUERQUE, J.A.; MORAL, R. Composting of animal manures and chemical criteria for compost maturity assessment. A review. Bioresource Technology. v. 100, p. 5444-5453, 2009.
SIMIONI, F.; HOEFLICH, V.A. Cadeia produtiva de biomassa de origem florestal no Planalto Sul de Santa Catarina. Floresta. V.39, n.3, p.501-510, 2009.
APHA/WEF/AWWA. Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. 19ed. New York: APHA/AWWA/WEF, 1998. 1268 p.
SOMMER, S.G.; MØLLER, H.B. Emissions of greenhouse during composting of deep litter from pig productions – effect of straw content. Journal of Agricultural Sciences. v. 134, p. 327-335, 2000.
AOAC: Official Methods of Analysis of AOAC International. ed. 16, v. 1-2, Arlington, Virginia: Patricia Cunniff, 1995.
Figura 1. Esquema da plataforma de compostagem.
Figura 2. Temperatura no interior das pilhas e emissão de C-CO2 e C-CH4 na cocompostagem de dejetos de suínos com maravalha e palha de azevém.
Figura 3. Emissão acumulada de C-CO2 e C-CH4 no período avaliado (85 dias).
Tabela 1. Composição dos compostos obtidos a partir da co-compostagem de dejetos de suínos com (a) maravalha e (b) palha de azevém em base seca.