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Incluindo a sustentabilidade na formulação e produção de ração do futuro

Publicado: 30 de maio de 2013
Por: Marcio Ceccantini, Diretor Técnico da Adisseo para América do Sul; Roberto Neto e Rebeca Weigel
Todo dia somos bombardeados com novos termos, propostas, reportagens e preocupações sobre diversos temas relacionados à ambiência, aquecimento global, sustentabilidade e ecologia. Temos a tendência de colocar tudo no mesmo cesto, e considerar estes temas como distantes da nossa rotina de trabalho. Porém devemos saber discernir as questões mais relevantes, e considerar que trabalhar no setor de produção de ração tem uma forte relação com a sustentabilidade do planeta. Já temos sido cobrados por isto, e temos trabalhado muito para trazer as melhores soluções. Mas devemos ir além. Como técnicos do setor devemos esclarecer o público, defender nossas ações, mostrando que estamos desenvolvendo processos para uma produção de ração de qualidade, que permitirá ao mundo produzir carnes, um alimento essencial ao desenvolvimento humano, de forma sustentável.
Coerentemente a isto, vamos discutir alguns dos parâmetros mais importantes para a devida inclusão do tema sustentabilidade na rotina de formulação de rações de aves e suínos.
Inicialmente, seguem alguns dados práticos comuns do que se representa produzir ração em termos ambientais. Se considerarmos um galpão de frangos com 25.000 aves atingindo um peso de 2,5 Kg, com uma conversão alimentar de 1,8, teremos um consumo próximo a 112 t ração por ciclo. Para atender aos requerimentos nutricionais destas aves podemos utilizar por exemplo, 3 tipos de formulação (Tabela 1).
 
Incluindo a sustentabilidade na formulação e produção de ração do futuro - Image 1
 
Considerando uma produtividade média do milho em 7,5 t / ha; do farelo de soja em 3,0 t / ha; e do óleo de soja em 0,8 t/ha; tudo isto por safra, e considerando que um galpão de frango retira 6 lotes por ano; um único galpão de 25.000 aves consumiria a produção de 256 hectares de terra agriculturáveis para a primeira formula sem aminoácidos industriais. Com o uso da metionina, este consumo passa a 198 hectares, e usando mais lisina e treonina, este valor seria 185 hectares. Claro que aqui não estão consideradas as possibilidades de uma safrinha de milho, ou safras de inverno, todavia estas variações do produto da agricultura trazem uma boa ideia do que significa aplicar tecnologia para diminuir o consumo de recursos naturais para produção de ração.
Isto colocado, vamos tratar da inclusão da sustentabilidade na formulação e produção de ração.
Novas bases externas:
Formular ração não é mais um processo com base apenas na produtividade do rebanho, mas também na eficiência, na saúde animal, na seguridade do alimento produzido, no impacto ambiental, no bem estar animal, e na satisfação do consumidor, porque existe todo um controle via normas e requisitos éticos e ambientais.
Já em 1995, J. Elkington cunhou o termo “3 P” (people, planet, profits), onde tentava equilibrar estas três necessidades que pareciam incompatíveis. Hoje, estas relações se tornaram ainda mais complexas, pela força da opinião pública entre outras. É um novo processo que deve ser base para o desenvolvimento de uma nova fase do trabalho de produção de ração, denominada de “Nutrição Responsável”.
A “Nutrição Responsável” pode ser definida como o método de formular e produzir uma ração, tomando por base estes componentes externos, através da aplicação de tecnologia, uso responsável dos recursos naturais para a produção de um alimento saudável, seguro. E ainda assim é alimentar todas as camadas sociais de uma população que vai chegar a 9 bilhões de pessoas, de forma sustentável, e mantendo-se como uma atividade lucrativa para seus produtores.
Alguns pontos que possibilitam isto:
- Matérias-primas:
Avaliando a diversidade da produção agrícola, e a diversidade de nossas rações, podemos verificar que é possível aumentar a variedade de ingredientes, e para isto temos desenvolvido ferramentas que permitam melhor conhecer estes ingredientes ditos alternativos, para seu uso mais eficiente. Isto é importante, porque a diversidade da produção agrícola tem importância na manutenção dos sistemas ecológicos.
Além disto, o uso de ingredientes do que Nick Dale chamou “reciclagem de nutrientes não consumíveis” são essenciais para o melhor uso de nossos recursos. Neste sentido, o retorno do uso de farinhas de origem animal especialmente em rações de aves é fator para este sistema. O uso de produtos reaproveitados da indústria de alimentos humanos e da produção de biodiesel são outros fatores fundamentais para melhorarmos nossos processos.
Em termos de matérias-primas as pesquisas vão bem mais longe ainda.
O uso de algas tem grande potencial. Diferentes algas apresentam bom valor nutricional, como: Proteínas em % da matéria seca (MS): algas marrons: 5 a 11%; algas vermelhas: 30 a 40%; algas verdes: 20%; micro algas: 12 a 65 %. Lipídios em algas: 1 a 3% da MS; e ricas em Ômega 3 e 6. Fibras: 32 a 50 % da MS, sendo que algas marrons têm alto percentual de B-glucanos, algas verdes em arabinogalacturana; e algas vermelhas em ágar e xilano.
Também se avalia o uso de proteínas de insetos nas rações, especialmente de insetos como o Hermetia illucens, ou o T. molitor, que tem 40 a 57% de proteína e 18 a 35% de lipídios em suas composições. Os problemas ainda encontrados para seu uso são as dificuldades para produção de insetos em larga escala, a variabilidade de sua composição, e a baixa digestibilidade de alguns componentes.
- Requerimentos nutricionais:
Neste item temos parâmetros que devem ser revistos como é o caso do uso das vitaminas, devido à melhora da conversão alimentar nos últimos 20 anos, que não foi seguida pela variação de consumo de vitaminas para aves e suínos.
Novos parâmetros que vem sendo considerados são o Fosforo Fitico, o teor de Polisacarídeos Não Amiláceos (PNA), e o uso de Energia Líquida tanto para aves quanto para suínos. Tudo com o intuito de melhorar a eficiência das rações, tornando-as, portanto, menos consumidoras de recursos naturais.
Ainda em requerimentos nutricionais, estamos buscando rever alguns níveis nutricionais a fim de encontrar melhoras em pontos antes não tão enfatizados, como por exemplo, o aumento dos níveis de aminoácidos buscando maior eficiência do sistema imune, e valores nutricionais ou aditivos que possam alterar a atuação do sistema nervoso entérico para um melhor sistema de digestão e absorção.
Também a diminuição das necessidades proteicas pelo melhor equilíbrio de aminoácidos são desejáveis, como apresentado nos trabalhos de Gloaguen et. al. 2013, que trabalharam com rações de suínos com menos de 14 % de proteína, e alto inclusão de AA industriais.
- Aditivos nutricionais e tecnológicos:
A maioria dos diversos aditivos atuam positivamente na melhora da sustentabilidade de nosso sistema. Alguns como as enzimas já são amplamente utilizados, e vêm produzindo informações em um altíssimo sobre as interações de ingredientes / digestão / nutrientes. Este setor tem contribuído na melhora da digestibilidade, e, portanto, diminuindo o consumo de ingredientes, mas principalmente diminuído o desperdício. O uso de enzimas ainda traz a possibilidade de utilização de novos ingredientes de menor valor nutricional, ou de baixa digestibilidade, e no futuro poderão ser utilizados para viabilizar o uso de insetos como fontes proteicas. Será a vez das queratinases que permitirão o aproveitamento da fração de queratina presente nos insetos. Neste caso, ainda há necessidade de um desenvolvimento de produtos enzimáticos.
Outro exemplo deste potencial das enzimas está na adição de fitases que liberam cerca de 50% do fosforo fítico presentes em uma ração. A adição de complexos de carbohidrolases podem aumentar este percentual em 10 a 20%. E assim como neste exemplo, outras enzimas mais eficientes e principalmente combinações enzimáticas virão nos próximos anos para melhorar estes processos de digestão.
Mas existem outros aditivos que ainda carecem de uma inclusão mais generalizada, mas que tem grande potencial na melhora da qualidade da digestão como prebióticos, probióticos, e acidificantes.
Outros aditivos como aminoácidos industriais Isoleucina e Valina, já disponíveis, trarão maiores ganhos em eficiência, lucratividade e sustentabilidade.
Minerais quelatados, dipeptideos, lisofosoflipideos também têm apresentado dados para alguns usos específicos, porém certamente mais amplos que as atuais utilizações, e que contribuirão para a melhora da eficiência, e diminuição dos desperdícios.
- Processos de fabricação:
São duas linhas de trabalho neste ponto que afetam a questão da sustentabilidade da produção de ração:
.Uso do NIRS: que permite melhor conhecer o ingrediente que será utilizado na produção de ração, e em tempo de ter suas variações nutricionais corrigidas na formulação.
.Processamentos dos ingredientes têm sido questionados. Seja a simples moagem de ingredientes ou a peletização, estes processos estão sendo revistos em seus gastos energéticos para avaliações da necessidade deste gasto, comparativamente aos ganhos, mas do ponto de vista não apenas de desempenho, e sim do consumo de recursos naturais (Umar faruk et al 2011; Svihus et al). Nesta linha, também podemos destacar o uso da extrusão para melhora do desempenho, mas que pode afetar negativamente alguns outros ingredientes; e assim tem-se discutido o uso de extrusão apenas sobre o milho, ocasionando uma diminuição do consumo de energia na produção de ração.
Também novas avaliações do uso de alimentação líquida para suínos, sob a ótica do consumo de recursos naturais, devem ser realizadas.
- Métodos de formulação
Todos os pontos anteriormente citados vão desembocar em valores para a formulação, de modo que os ganhos de eficiência e as economias antes apresentadas sejam transformados em fatores de aumento de sustentabilidade.
Somados a isto, poderemos vir a adicionar parâmetros não nutricionais à formulação das rações, que são os fatores intrínsecos à produção, armazenamento e logística dos ingredientes. Assim, por exemplo, um farelo de soja produzido na Bahia e exportado diretamente dali para a Europa deverá ter uma melhor aceitação que um farelo de soja da Bolívia, não apenas pelo menor custo de frete, mas também pelo menor consumo de diesel para seu transporte. O milho deverá ter a preferência de uso sobre o trigo pela menor necessidade de área plantada para a produção da mesma quantidade de Kcal.
Um interessante estudo produzido pelo grupo de Aminoácidos da FEFANA, em conjunto com o INRA da França, elaborou um estudo com uma serie de parâmetros dos ingredientes utilizados na produção de ração na Europa, e as respectivas produções de gases de efeito estufa para cada ingrediente. Indo ainda mais a fundo, o estudo avaliou diferentes formulações de aves e suínos tomando parâmetros de sustentabilidade como base ou não, e concluiu que é possível economizar cerca de 6% na produção de gases de efeito estufa, 43% na ecotoxicidade terrestre, e 9% da ocupação territorial, entre outros parâmetros para rações de frangos, por exemplo (ver Tabela 1).
 
 
Conclusão:
Relações mais complexas de exigência vão continuar existindo e aumentando. Cabe aos profissionais do setor envolverem-se não apenas na formulação de rações mais eficientes e lucrativas, mas também em buscarem tecnologias que tornem a produção de ração de aves e suínos, e por conseguinte a produção de carne, em linha com as necessidades e exigências do consumidor. Além disto, devem demonstrar aos órgãos de comunicação, o valor dos esforços realizados, e o porquê das práticas utilizadas, comprovando a viabilidade do setor para alimentar as atuais 7 bilhões de pessoas do mundo, de forma segura e sustentável.
Tópicos relacionados:
Autores:
Marcio Ceccantini
Colégio Brasileiro de Nutrição Animal (CBNA)
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