Quais as formas de uso de antimicrobianos em suínos?

O uso de antimicrobianos em suinocultura ocorre de diferentes formas: como promotor de crescimento, com fim preventivo/profilático, fim metafilático ou em doses terapêuticas. O uso tradicional como promotor de crescimento é o mais controverso, principalmente quando se utilizam classes de antimicrobianos importantes para o tratamento de infecções em humanos. Este uso dos princípios ativos em doses baixas e constantes via ração cria uma situação ideal para a seleção de estirpes resistentes a antimicrobianos e disseminação destas estirpes no ambiente intestinal dos animais (BARTON, 2014), devendo ser evitado ao máximo.

O uso preventivo/profilático (em uma fase da produção ou baia) de antimicrobianos também envolve na maior parte das vezes a administração dos ativos via ração ou água. A intenção é que o uso destes ativos ocorra quando há um surto de doença ou risco eminente de sua ocorrência e durante um curto período (5 a 10 dias). No entanto, em muitos casos trata-se de uma oportunidade de estender o uso dos ativos por vários ciclos de produção, e as doses utilizadas são bem maiores que as utilizadas como promotor de crescimento e geralmente próximas a doses terapêuticas.

O programa de medicação nesse caso é baseado no conhecimento prévio das doenças que ocorrem com frequência no rebanho nas diferentes faixas etárias e, de forma preventiva, os animais são medicados com um antimicrobiano ativo contra o agente, buscando evitar o surgimento dos sinais clínicos da infecção. No entanto, a manutenção dessa estratégia em médio e longo prazo, favorece a seleção de bactérias resistentes aos antimicrobianos utilizados e, dependendo do ativo, pode ocorrer a seleção de genes de resistência a diferentes classes de drogas simultaneamente (resistência cruzada ou seleção de elementos genéticos que codificam resistência a diferentes antimicrobianos). Uma forte evidência clínica da seleção de resistência se mostra pela necessidade constante de realizar trocas periódicas de princípios ativos, em função da perda de sua efetividade, bem como o aumento na quantidade de cepas multirresistentes presentes nos antibiogramas realizados.

O uso metafilático refere-se ao tratamento de um grupo de animais após surgirem sinais clínicos em alguns indivíduos e quando houver o risco da disseminação da infecção nos demais animais desse grupo. O embasamento para essa forma de administração é a ideia de que todos os animais do lote são similarmente suscetíveis e têm alto risco de serem infectados pelo patógeno, desenvolvendo assim o quadro clínico. Na prática, essa forma de uso muitas vezes se confunde com o uso preventivo ou profilático.

No uso terapêutico, busca-se o tratamento de infecções bacterianas já instaladas através da medicação de animais apresentando quadro clínico agudo. Nessa forma de uso, o tratamento via ração é bastante questionado, uma vez que animais doentes podem apresentar reduzido consumo de ração ou água, não ingerindo a quantidade adequada do ativo (BARTON, 2014; SILVA et al, 2013); por esse motivo, o ideal é que o uso terapêutico seja individual, por via oral ou injetável.

A legislação brasileira, tem restringido a utilização de antimicrobianos na produção animal, seja pela evidência de efeitos colaterais, como mutagênese, carcinogênese, ausência de evidências científicas sobre a sua funcionalidade e eficácia, bem como visando preservar princípios ativos para uso em saúde humana (Quadro 1).

Quadro 1 - Legislação brasileira de utilização de antimicrobianos na produção animal.

As seguintes classes de antimicrobianos são permitidas, buscando-se sempre manter o foco em sua utilização terapêutica:

--> Apramicina, espectinomicina, estreptomicina, gentamicina, kanamicina, neomicina

Atividade antibacteriana / Espectro de ação:

--> Bactericidas com ação na síntese proteica bacteriana

--> Age sobre bactérias Gram-negativas aeróbias (Escherichia coli, Salmonella enterica, Enterobacter spp.) e anaeróbias (Brachyspira hyodysenteriae), principalmente entéricas e sobre Staphylococcus spp.

--> Via oral: desafios entéricos por E. coli na fase neonatal (enterobactérias), bem como no período pós-desmame

--> Injetável: infecções gênito-urinárias, infecções sistêmicas

-->  Via oral: baixa absorção intestinal e pouca distribuição nos tecidos

-->  Injetável: elevada absorção, acima de 90% de biodisponibilidade, porém pouca ação nos sistemas respiratório e nervoso

-->  Atividade dose-dependente / Elevada excreção renal

-->  Nefrotóxico com prolongado uso parenteral, bem como quando utilizado com medicamentos potencialmente danosos aos rins (cefalosporinas, diuréticos) / ototóxico.

--> Florfenicol, tiamfenicol

-->  Primariamente bacteriostático, inibindo a síntese proteica bacteriana, podendo ser bactericida para algumas espécies (Pasteurella spp., por exemplo).

-->  Atua sobre bactérias Gram-negativas aeróbias ou microaerófilas como Actinobacillus pleuropneumoniae, Pasteurella multocida, Bordetella bronchiseptica, Glaesserellaparasuis e Salmonella Choleraesuis, bem como sobre algumas Gram-positivas (Streptococcus suis), porém apresenta pouca ação sobre enterobactérias.

Via oral / injetável: eficiente no tratamento do complexo das doenças respiratórias dos suínos associado a A. pleuropneumoniae, P. multocida, S. suis, B. bronchiseptica

Via oral / injetável: elevada absorção e distribuição nos tecidos, inclusive placenta

Atividade dose-dependente / Elevada excreção renal

Doses acima de 4,4 mg / kg peso, comprovadamente podem causar danos fetais e problemas reprodutivos.

Pode-se observar edema perianal e prolapso retal, os quais se resolvem assim que o tratamento é descontinuado.

Flavomicina

Bactericida que inibe síntese da parede celular bacteriana

Age predominantemente sobre bactérias Gram-positivas (Clostridium perfringens, Staphylococcus spp., Streptococcus spp.).

Promotor de crescimento

Via oral: baixa absorção / Excreção predominantemente fecal

Baixa toxicidade

São bactericidas, interferem na síntese da parede bacteriana.

Amplo espectro, atuando sobre bactérias Gram-negativas aeróbias (Escherichia coli, Salmonella enterica, Pasteurella multocida, Actinobacillus pleuropneumoniae), Gram-positivas aeróbias (Streptococcus suis, Listeria monocytogenes, Erysipelothrix rhusiopathiae) e anaeróbias (Clostridium perfringens).

Septicemias, colibacilose, salmonelose, pneumonias bacterianas

São usadas como bases livres por via oral (se ácido resistentes), ou para uso parenteral, como sais em solução aquosa.

Baixa absorção intestinal por via oral e baixa distribuição nos tecidos por essa via.

Facilidade em atravessar a barreira hematoencefálica durante processos inflamatórios

Atividade tempo-dependente / Excreção predominantemente renal

Predispõe à colite por Clostridium difficile se utilizado em leitões recém-nascidos.

Salinomicina

Bacteriostático, que age sobre bactérias Gram-positivas.

Promotor de crescimento

Via oral: rápida absorção e metabolização / Excreção predominantemente fecal

Salinomicina apresenta-se neuro e miotóxica quando fornecida aos suínos juntamente com tiamulina, em função da interferência negativa na excreção da salinomicina, principalmente se a somatória das dosagens de ambos antimicrobianos for superior a 6,0 mg / kg peso. Recomenda-se intervalo de 7 dias no fornecimento de cada princípio ativo.

Lincomicina

Bacteriostático que inibe a síntese proteica bacteriana, podendo ser bactericida, dependendo da concentração utilizada.

Age sobre bactérias Gram-positivas aeróbias e anaeróbias, bem como sobre Mycoplasma hyopneumoniae, Brachyspira spp., Lawsonia intracellularis.

Comumente associa-se à espectinomicina para aumentar o espectro de ação, principalmente sobre bactérias Gram-negativas

Via oral / injetável: auxiliar no controle do Mycoplasma hyopneumoniae, Brachyspira spp., Lawsonia intracellularis

Apresenta boa absorção intestinal, bem como boa distribuição nos fluídos e tecidos, inclusive placenta, porém sem atuação no sistema nervoso central, mesmo durante os processos inflamatórios.

Atividade tempo-dependente / Excreção renal e fecal

Pode causar prolapso retal, em decorrência do uso prolongado.

Josamicina, kitasamicina/leucomicina, tildipirosina, tilmicosina, tilosina, tilvalosina, gamitromicina, tulatromicina (triamilídeo)

Bacteriostáticos que inibem a síntese proteica bacteriana.

Age sobre bactérias Gram-positivas aeróbias e anaeróbias, bem como sobre Mycoplasma hyopneumoniae, Brachyspira spp., Lawsonia intracellularis.

Alguns princípios ativos, como tilmicosina e tulatromicina, têm ação comprovada contra bactérias Gram-negativas envolvidas no quadro respiratório, como Actinobacillus pleuropneumoniae, Pasteurella multocida, Glaesserella parasuis.

Via oral / injetável: controle da enteropatia proliferativa, disenteria suína, bem como complexo das doenças respiratórias dos suínos, em que haja envolvimento dos agentes citados.

Apresenta boa absorção intestinal, bem como boa distribuição nos tecidos, principalmente pulmões, porém tem pobre distribuição no sistema nervoso central.

Atividade tempo-dependente / excreção predominantemente fecal

Baixa toxicidade de modo geral, podendo causar diarreia, edema retal, prolapso retal parcial, em decorrência do uso prolongado.

Avilamicina

Bacteriostático que inibe a síntese proteica bacteriana.

Age sobre bactérias Gram-positivas entéricas (Clostridium perfringens).

Promotor de crescimento

Princípio ativo de baixíssima absorção e elevada metabolização

Excreção predominantemente fecal

Baixa toxicidade

Amoxicilina, amoxicilina + ácido clavulâmico, ampicilina, penicilina

Bactericidas que interferem na síntese da parede celular bacteriana.

Ação sobre bactérias Gram-positivas aeróbias (Staphylococcus spp., Streptococcus spp., Listeria monocytogenes, Erysipelothrix rhusiopathiae) e anaeróbias (Clostridium spp.), bem como Gram-negativas aeróbias (E. coli, Salmonella enterica, Glaesserella parasuis, Pasteurella multocida).

Infecções sistêmicas, como erisipela, salmonelose, meningoencefalite estreptocócica, infecções geniturinárias, pneumonias bacterianas, infecções por Clostridium spp., infecções cutâneas

Rápida absorção e distribuição nos diferentes tecidos, incluindo pulmões, pleura, líquido sinovial, sistema nervoso central, sistema geniturinário

Atividade dose-dependente / excreção predominantemente renal

Baixa toxicidade, porém penicilina procaína pode induzir aborto e sintomas nervosos, e uso oral da ampicilina pode causar profundas alterações na flora intestinal.

Fosfomicina

Bactericida que inibe a síntese da parede celular.

Amplo espectro, atuando sobre bactérias Gram-positivas aeróbias (Enterococcus spp., Staphylococcus spp.), bem como Gram-negativas (E. coli, Salmonella spp.)

Via oral: infecções entéricas

Absorção moderada, sendo mais relevante no duodeno

Excreção predominantemente fecal, quando administrado via oral

Baixa toxicidade

Tiamulina e valnemulina

Bacteriostáticos que inibe a síntese proteica bacteriana, porém em determinadas doses podem ser bactericidas para alguns agentes.

Age sobre bactérias Gram-positivas aeróbias e anaeróbias, bem como sobre Mycoplasma hyopneumoniae, Brachyspira spp., Lawsonia intracellularis.

Atua também contra bactérias Gram-negativas envolvidas no quadro respiratório, como Actinobacillus pleuropneumoniae e Glaesserella parasuis.

Via oral / injetável: controle da enteropatia proliferativa, disenteria suína, bem como complexo das doenças respiratórias dos suínos, onde haja envolvimento dos agentes citados.

Apresenta boa absorção intestinal, bem como boa distribuição nos tecidos, principalmente pulmões, porém pobre distribuição no sistema nervoso central.

Atividade é dose e tempo-dependente / excreção fecal e renal.

Pode causar prolapso retal, em decorrência do uso prolongado.

Colistina (polimixina), bacitracina de zinco, bacitracina metilenodisalicilato (BMD) e enramicina

Bactericidas que interferem negativamente na formação da parede celular bacteriana.

Polimixinas (colistina): ação restrita a bactérias Gram-negativas

Polipeptídeos (bacitracinas e enramicina): ação restrita a bactérias Gram-positivas

Desafios entéricos pelas bactérias sensíveis, como desafios por E. coli no pós-desmame (colistina) e Clostridium spp. (bacitracina e enramicina)

Baixa absorção intestinal / excreção predominantemente fecal

Baixa toxicidade por via oral, porém altamente tóxicos no uso parenteral

Ciprofloxacina, enrofloxacina, marbofloxacina, norfloxacina

Bactericidas que inibem a síntese de ácidos nucleicos pelas bactérias.

Amplo espectro, atuando sobre bactérias Gram-negativas aeróbias (E. coli, Salmonella enterica, Pasteurella multocida, Actinobacillus pleropneumoniae) e Gram-positivas, assim como Mycoplasma spp. e Chlamydia spp.

Via oral / injetável: tratamento do complexo das doenças respiratórias dos suínos, infecções geniturinárias, infecções entéricas e sistêmicas

Rápida absorção e distribuição nos diferentes tecidos (trato respiratório, geniturinário, fluído sinovial)

Atividade dose-dependente / excreção predominantemente renal

Possibilidade de causar danos à cartilagem articular de animais jovens

Ftalilsulfatiazol, sulfaclorpiridazina, sulfadiazina, sulfadimetoxazol, sulfadimetoxina, sulfametazina, sulfadoxina, sulfamerazina, sulfametoxina, sulfapiridina, sulfametoxipiridazina

Comumente associam-se as sulfas com trimetoprim (TMP), em função do efeito sinérgico dessa associação.

Bacteriostáticos que inibe a síntese do ácido fólico pelas células bacterianas e bactericidas quando associados ao trimetoprim

Amplo espectro de ação, agindo sobre bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, aeróbias e anaeróbias, porém não atuam sobre Mycoplasma sp., exceção quando associadas ao trimetoprim.

Tratamento de infecções intestinais, respiratórias, geniturinárias, articulares, bem como meningoencefalites

Rápida absorção e distribuição nos diferentes tecidos, inclusive líquido sinovial e cefalorraquidiano; exceção às “sulfonamidas entéricas” (ftalilsulfatiazol, por exemplo), as quais apresentam baixa absorção.

Atividade dose-dependente / excreção predominantemente renal

Cristalização no trato urinário, em decorrência de doses elevadas e/ou desidratação dos animais tratados

Virginiamicina

Bactericida que inibe a síntese proteica bacteriana.

Age sobre bactérias Gram-positivas aeróbias e anaeróbias.

Promotor de crescimento

Baixa absorção intestinal, atuando principalmente no sistema digestório.

Excreção predominantemente fecal

Baixa toxicidade

Clortetraciclina, doxiciclina, oxitetraciclina, tetraciclina

Bacteriostáticos que inibem a síntese proteica bacteriana.

Amplo espectro, com ação sobre bactérias Gram-positivas aeróbias (Erysipelothrix rhusiopathiae, Listeria monocytogenes, Trueperella pyogenes, Streptococcus spp.), Gram-negativas aeróbias ou microaerófilas (Actinobacillus spp., B. bronchiseptica, G. parasuis, P. multocida) e anaeróbias (Fusobacterium necrophorum, Leptospira spp.), bem como Mycoplasma spp.

Doxiciclina tem ação comprovada frente à Lawsonia intracellularis.

Tratamento de infecções respiratórias, sistêmicas, geniturinárias, leptospirose

Rápida absorção intestinal e ampla distribuição nos tecidos

Excreção predominantemente renal

Baixa toxicidade