Introdução
As estimativas de produções de leite provenientes dos diferentes sistemas em pastagem, confinamento ou misto não são precisas. De acordo com informações do Anualpec (2010), 90% do leite produzido no Brasil é de sistemas em pastagem e as gramíneas representam 85% de alimento volumoso consumido pelos animais.
As vantagens de se utilizar pastagem, como fonte principal de volumoso na alimentação animal, estão diretamente relacionadas com diminuição de custo de produção, que representa 70% dentro do sistema. Os animais passam a ser a ferramenta que cortará a gramínea, através do pastejo, reduzindo despesas com alimentos concentrados, combustíveis, mão-de-obra e instalações, especialmente aquelas destinadas ao abrigo de animais e maquinário. Além disso, as gramíneas tropicais, quando manejadas corretamente, tem alta capacidade de produção de massa seca no verão, com quantidade de nutrientes suficientes para manter os bovinos leiteiros em pastagem, pois o pastejo proporciona ao animal selecionar folhas, que é a parte da planta mais nutritiva.
As pastagens também contribuem para manter o solo coberto, diminuindo erosão e perdas de nutrientes por lixiviação, além de contribuírem para a diminuição dos transtornos provocados pelo acúmulo de dejetos provenientes de rebanhos leiteiros confinados.
Dados recentes da FAO (2010) mostram que o Brasil possui o segundo maior rebanho leiteiro do mundo com média de 22 milhões de cabeças e é o quinto maior País produtor de leite com média aproximada de 29 bilhões de litros/ano, porém nossa produtividade é baixa, devidos aos baixos índices zootécnicos e a má utilização das pastagens, o que nos deixa em 19º colocado no ranque mundial, conferindo ao nosso País 3% de presença no mercado Global.
Hoje, 85% de nossas pastagens encontram-se degradadas, praticamente todas poderiam ser recuperadas, ajudando no combate ao aquecimento global, e aliviando a pressão de desmatamento de florestas nativas. As gramíneas tropicais tem alta taxa de fotossíntese e com a recuperação dessas áreas aumentaria em 5 vezes a utilização de CO2 pelas plantas.
Para garantir o sucesso no manejo das pastagens e na produção de leite é necessário vários cuidados, desde a escolha de gramíneas, fertilidade do solo, adubação taxas de lotações, necessidade de sombra e água próximas aos piquetes, animais adaptados às condições da região, enfim, muitos componentes que interferem no sistema e que precisam ser gerenciados adequadamente.
Estacionalidade das gramíneas tropicais
Durante o verão, condições favoráveis de temperatura, disponibilidade de água e radiação, garantem elevados índices produtivos de gramíneas tropicais como os Panicum maximum, Brachiarias, Pennisetum purpureum, Cynodons, entre outros. No entanto, com a chegada do outono e inverno, a queda da temperatura, escassez de chuvas e a baixa luminosidade (fotoperíodo curto) limitam o crescimento vegetal, gerando um déficit entre a oferta e a demanda de massa seca.
Com o efeito provocado pela estacionalidade torna-se essencial o uso de alternativas de volumosos para ser utilizada neste período, como a produção de silagem, feno, utilização de resíduos e subprodutos da agroindústria, pastejo diferido, cana-de-açúcar, gramíneas anuais para o outono e inverno, suplementação a pasto, confinamento, adubação e irrigação, para complementar a alimentação dos animais durante o período de entressafra.
Qualidade de Forragem
O termo "qualidade de forragem" é mais bem definido pela produção animal, tendo relação direta com o consumo voluntário e digestibilidade dos nutrientes contidos nas plantas. No entanto, é necessário que a disponibilidade de alimento e o potencial dos animais não sejam fatores limitantes para a qualidade.
A qualidade da forragem pode ser determinada através de uma análise proposta por Van Soest que divide a planta em duas porções: conteúdo celular (composta basicamente por proteínas, lipídeos, pectina e CHO solúveis que são os açúcares) e parede celular (composta por hemicelulose, celulose, lignina, minerais e Nitrogênio ligada a lignina). De acordo com essa proposta, temos a fibra solúvel em detergente neutro (FDN) que é composta pela hemicelulose, celulose, lignina e a fibra solúvel em detergente ácido (FDA) que é composta pela celulose e pela lignina. A fração fibrosa da planta é extremamente importante para a produção e composição do leite. A fibra é responsável pela produção de acetato, que é um ácido graxo volátil produzido no rúmen, devido o processo de fermentação, e que tem como principal função a síntese de gordura no leite.
Os fatores climáticos, a adubação e a irrigação, a espécie de gramínea, a altura pré-pastejo, relação folha/colmo e a idade da planta influenciam diretamente a qualidade das plantas. Sabe-se que pastagens "passadas", que apresentam alta proporção de material senescente, tem alta porcentagem de lignina e baixos teores de proteína, o que trás como conseqüência baixo consumo pelos animais, baixa produção de leite e baixo teor de gordura. Enquanto que pastagens bem manejadas apresentam altos teores de hemicelulose, celulose e proteína, favorecendo assim, o consumo dos animais a produção e conseqüentemente a gordura no leite.
? Irrigação – alguns resultados de pesquisa têm mostrado que a irrigação não é garantia de sucesso para diminuir a estacionalidade das pastagens, pois, para as gramíneas tropicais, o principal fator não seria a falta de água, mas sim a baixa luminosidade. Além disso, alguns trabalhos têm revelado que a irrigação no período chuvoso pode ser vantajoso, devido alguns períodos de veranicos que ocorrem nesta época.
? Adubação – é necessária, principalmente para as gramíneas mais exigentes em fertilidade do solo, como Tanzânia, Mombaça, Tifton – 85, capim Elefante, Aveia, entre outras. O que vai definir a quantidade de adubação será a condição do solo, a exigência da espécie escolhida e a taxa de lotação que será utilizada.
? Idade, altura e relação folha/colmo das plantas – as gramíneas tropicais de crescimento cespitoso (ereto) crescem muito rápido no período das águas e, portanto, quanto mais idade as plantas tem, maior será a altura, menor será a quantidade de folhas em relação aos colmos, maior será a produção de massa de forragem e menor será a qualidade da pastagem. Esses componentes influenciam diretamente no consumo dos animais, e comprometem a estrutura do dossel, pois, a cada ciclo que passa, a pastagem terá mais colmo e menor valor nutricional.
? Espécies – as gramíneas são divididas em dois grupos: temperadas (C3) e as tropicais (C4), e elas podem ser perenes ou anuais. A maior vantagem das gramíneas tropicais é que elas possuem alta capacidade de produção de forragem quando comparadas às temperadas, porém as gramíneas C3 apresentam maior valor nutricional. O que vai definir a escolha das espécies são a região, o tipo de solo, o clima e claro, o objetivo do produtor. Algumas gramíneas anuais podem ser utilizadas como alternativas de pastagem no período seco do ano em algumas regiões. O híbrido de sorgo-sudão (Sorghum bicolor x Sorghum sudanense) e o milheto (Pennisetum americanum) são gramíneas tropicais anuais que vêm se destacando por apresentarem maior flexibilidade de época de plantio, alto potencial produtivo, alto valor nutritivo e alto desempenho animal. Essas duas gramíneas são mais tolerantes ao fotoperíodo curto e a temperaturas mais baixas, mas não são resistentes a falta de chuva e, portanto, precisam ser semeadas em entre fevereiro e março. A aveia, o triticale e o azevém são gramíneas temperadas anuais que podem ser semeadas sobre o Tifton ou Tanzânia, esta técnica é denominada de sobressemeadura. Essas espécies necessitam de temperaturas baixas e irrigação, e por isso, elas são muito utilizadas no Sul do Brasil.
Pastagem Rotacionada
Esta técnica de manejo é baseada na divisão da área de pastagem em piquetes, no período de ocupação e período de descanso, e se caracteriza por um manejo onde os animais permanecem constantemente em uma área com água, sombra e mineral e tem acesso limitado à área de pasto, que vai sendo mudada conforme um planejamento prévio.
O período de descanso é dependente da gramínea escolhida, pois esse período é importante para o crescimento das plantas. O período de ocupação é o tempo em que os animais permaneceram em cada piquete, e tem influencia direta na produção e composição do leite. Resultados de pesquisa mostram que o período de ocupação ideal é de um dia, pois a produção de leite não oscila, e que o máximo que se deve utilizar é três dias de ocupação.
Alguns conhecimentos são necessários para esse tipo de manejo. A capacidade de suporte de uma pastagem vai influenciar diretamente na taxa de lotação, ou seja, é preciso saber quanto determinada espécie tem capacidade de produzir massa (kg/ha) e quantos animais poderão ser colocados para pastejarem naquela área. Também é importante saber quanto desta produção será ofertado aos animais, e essa oferta depende de qual categoria animal (novilhas, vacas de baixa produção, vacas de alta produção) estará sendo utilizada no sistema, pois cada categoria tem uma exigência diferente e, portanto, um consumo diferente.
Todas essas informações são necessárias para que não haja subpastejo e nem superpastejo na pastagem. O Subpastejo está relacionado com alta disponibilidade de forragem e alta produção por animal, no entanto, há um desperdício de forragem e uma baixa produtividade, além de afetar negativamente a estrutura do dossel. O Superpastejo é o contrário, e a conseqüência maior será a degradação da pastagem, pois a planta não tem reservas suficientes de carboidratos na raiz para suportar por muito tempo esse excesso de intensidade de pastejo.
Diante disto, Watson em 1947, propôs um manejo das plantas conforme a interceptação de luz da pastagem. Isso significa que quando as plantas interceptam 95% da radiação solar, elas fazem fotossíntese na mesma proporção que respiram, é quando elas atingem o máximo de crescimento sem que ocorram perdas por senescência, e este pesquisador chamou esse ponto de índice de área foliar crítico.
Alguns pesquisadores têm questionado o uso de dias de descanso fixo, pois as gramíneas tropicais no verão crescem rapidamente e quando se fixa os dias de descanso, não há interesse pelo máximo aproveitamento das plantas, fator determinante na qualidade da pastagem.
Para facilitar o manejo da pastagem foi estabelecido alturas pré-pastejo das gramíneas no momento em que as plantas interceptavam 95% de luz, com isso o sistema de pastagem rotacionada torna-se mais flexível, a medida que um piquete atinge a determinada altura deve ser pastejado primeiro.
Os resultados de produção de leite nesse novo ajuste do sistema de pastagem rotacionada são poucos, algumas fazendas têm adotado o método com a ajuda de técnicos. No entanto, existem algumas dúvidas de manejo no dia a dia da fazenda, por exemplo: o que fazer com os piquetes que passarem da altura ideal no período das águas; o que fazer com animais se as plantas não atingirem a altura recomendada; como ajustar a taxa de lotação?
A porcentagem de folhas pré e pós pastejo (momento entrada e saída dos animais da área) da pastagem é outro fator extremamente importante. A quantidade de folhas pré pastejo está relacionada com a altura das folhas e com a decapitação do meristema apical pelos animais em pastejo, pois, com a eliminação do meristema apical ocorre maior brotação lateral e basal, ou seja, maior produção de folhas.
A quantidade de folhas pós pastejo também é muito importante, pois as folhas remanescentes (folhas que ficam após o pastejo) são responsáveis por fazer a fotossíntese, proporcionando a recuperação e crescimento das plantas para o próximo ciclo, caso essa quantidade de folhas seja pequena, as plantas levaram mais tempo para se recuperarem, portanto, a quantidade de folhas pós pastejo é dependente da altura de saída das plantas. Em experimento realizado por Lima, et al., (2006) foi verificado que a porcentagem de folhas pré e pós pastejo aumentaram linearmente a produção de leite.
Conclusão
A combinação do manejo correto das pastagens e dos animais é o segredo para o sucesso da produção de leite em pastagens.
Referências
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LIMA, M.L.P.; et al. Produção de leite de vacas mestiças em pastagens de capim-elefante e capim-Tanzânia em São Paulo. Boletim de Indústria Animal, Nova Odessa, v.63, n.3., p.217-226, 2006.
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***O trabalho foi originalmente publicado no Espaço Pesquisa & Tecnologia da APTA Regional / Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo.