Introdução
Diversas transformações, dentre outros fatos, têm contribuído para que os produtores de leite reflitam sobre a necessidade de administrarem bem a atividade, tornando-se mais eficientes e, conseqüentemente, competitivos; abandonando o amadorismo e assumindo posição de empresário, independente do tamanho do seu sistema de produção de leite. Um produtor empresário precisa, dentre outras coisas, considerar a informação como um insumo de grande importância, conhecer o mundo onde está inserido o seu sistema de produção (da porteira para fora) e, também, conhecer bem o seu sistema de produção (da porteira para dentro). Conhecer o sistema de produção e quanto custa o litro do leite produzido é ponto de grande importância.
Os dados obtidos da apuração dos custos de produção têm sido utilizados para diferentes finalidades, tais como: estudo da rentabilidade da atividade leiteira; redução dos custos controláveis; planejamento e controle das operações do sistema de produção do leite; identificação e determinação da rentabilidade do produto; identificação do ponto de equilíbrio; e instrumento de apoio ao produtor no processo de tomada de decisões seguras e corretas (LOPES e CARVALHO, 2000). Dados de custo de produção têm sido utilizados também para cálculo dos valores econômicos para características de gado de leite (MADALENA, 2000; MARTINS et al, 2003; BUENO et al 2004), bem como para quantificar ineficiências econômicas (GOMES et al, 1989; KUMBHAKAR et al 1989; BRAVO-URETA e RIEGER 1991; TUPY e YAMAGUCHI, 2002). De acordo com TUPY et al (2003), uma vez quantificada a ineficiência, seus fatores determinantes poderão ser identificados e muitos prejuízos evitados.
Por não conseguir controlar o preço do produto que vende, o produtor necessita administrar as variáveis que estão sob o seu controle. Trata-se de uma estratégia para tornar seu produto competitivo, atingindo menores custos de produção. O seu resultado econômico em um mercado caracterizado pela concorrência depende do gerenciamento dos custos de produção do leite e dos ganhos de escala (REIS et al, 2001).
Vários pesquisadores têm-se preocupado em estimar o custo de produção e estudar a viabilidade econômica da produção de leite. Entretanto, poucos mostraram quais componentes exerceram maior influência, não identificaram o ponto de equilíbrio dos sistemas de produção do leite e nem mesmo verificaram a influência de fatores sobre o custo de produção do leite.
Dentre os fatores que podem influenciar a viabilidade da atividade está o tipo de sistema de criação adotado pelos pecuaristas, ou seja, em regime de pastejo, semi-confinado ou confinado. Assim, o objetivo desta pesquisa foi estudar a rentabilidade da atividade leiteira de sistemas de produção de leite na região de Lavras/MG, nos anos 2004 e 2005, analisando a influência do tipo de sistema de criação sobre o custo de produção do leite. Pretendeu-se, ainda, identificar os componentes que exerceram maior influência sobre os custos finais da atividade e identificar o ponto de equilíbrio.
Material e Métodos
Os dados utilizados no presente estudo foram provenientes de 17 sistemas de produção de leite localizados na região de Lavras, sul do Estado de Minas Gerais, coletados durante o período de janeiro de 2004 a dezembro de 2005.
A pesquisa considerou duas etapas diferentes no levantamento das informações. Em uma etapa, utilizando-se um questionário e caderneta de campo, foi realizado o inventário completo dos bens das propriedades estudadas, apurando valor e vida útil de cada ativo, sendo, posteriormente, alocados em um dos seguintes grupos: benfeitorias, máquinas, veículos, equipamentos e implementos, ferramentas e rebanho. Nas situações nas quais o pecuarista não dispunha de informações referentes ao valor e data de aquisição, para a estimativa dos valores atuais, bem como da vida útil restante, foi adotado o critério proposto por LOPES et al (2004a).
Quanto às benfeitorias, cada uma foi medida sendo atribuído um estado de conservação objetivando auxiliar na estimativa do valor atual. Em função da área, do estado de conservação e do padrão de acabamento foi estimado um valor por m2 de construção. O valor atual utilizado foi produto do valor do m2 pela área da benfeitoria (LOPES et al 2004a).
Na outra etapa, as propriedades foram visitadas no início de cada mês para coleta de dados referentes às produções, despesas realizadas e receitas apuradas no mês anterior. A coleta de dados deu-se em cadernetas de campo especificamente preparadas para esse fim. Tais dados foram cadastrados no software Custo Bovino Leite® (LOPES et al. 2002), aplicativo esse utilizado para o processamento eletrônico dos dados, bem como na análise de rentabilidade dos sistemas de produção. Tal software contemplou as duas estruturas de custo de produção: Custo Total de Produção, que envolve o custo fixo e variável, utilizada por REIS (1999b) e Custo Operacional, proposta por MATSUNAGA et al. (1976).
Os itens que compõem o custo operacional efetivo de produção do leite foram divididos em grupos: mão-de-obra, alimentação (concentrado, volumoso e mineral), sanidade, reprodução, ordenha, impostos, energia e despesas diversas (LOPES et al, 2004a).
Para evitar duplicidade de lançamento de despesas a análise não considerou a depreciação de matrizes, uma vez que o sistema avalia o custo de produção da atividade como um todo e os custos de cria e recria de fêmeas de reposição, assim como os de manutenção de vacas secas também foram contemplados pela mesma.
Visando a análise da influência do tipo de sistema de criação, sobre o custo de produção do leite, os 17 sistemas de produção foram alocados em um de três tipos de sistemas de criação: em regime de pastejo, semi-confinado ou confinado, cada qual com quatro, dez e três sistemas de produção, respectivamente.
A alocação de cada sistema de produção, quanto ao tipo de sistema de criação, foi realizada, principalmente, em função da alimentação dos animais lactantes.
Nos sistemas de produção em regime de pastejo, durante a estação seca do ano, as matrizes receberam, no cocho, a alimentação concentrada, na proporção de 1kg de ração para cada 3 a 4kg de leite, bem como a alimentação volumosa, que, em alguns sistemas de produção foi silagem de milho (Zea mays, L.), em outros cana-de-açúcar (Sacharum oficcinarum, Linn) e ou capim elefante (Pennisetum purpureum, Schum) picados. Os animais tiveram ainda acesso a pastagens, que se encontravam em condições bastante precárias com praticamente nenhuma disponibilidade de alimentos. Na estação chuvosa, os animais foram suplementados com concentrados, nas mesmas proporções da estação seca, e a alimentação volumosa consistiu apenas em pastagens com forrageiras do gênero Brachiaria e ou nativas (pastagens naturais).
Nos sistemas de produção em semi-confinamento, durante a estação seca do ano, os animais receberam, no cocho, a alimentação concentrada, na proporção de 1kg de ração para cada 3kg de leite, bem como a alimentação volumosa, que, em alguns sistemas de produção foi silagem de milho (Z. mays, L), em outros cana-de-açúcar (S. oficcinarum, Linn) e ou capim elefante (Pennisetum purpureum, Schum) picados. Os animais tiveram ainda acesso a pastagens com pouca disponibilidade de forrageiras do gênero Brachiaria e ou nativas (pastagens naturais). Na estação chuvosa, os animais eram suplementados com concentrados, nas mesmas proporções da estação seca, e com alimentação volumosa, durante ou logo após as ordenhas. No restante do dia, tinham acesso às mesmas pastagens, sendo que dessa vez com disponibilidade de forrageiras o suficiente para não ocorrer super pastejo.
Nos sistemas de produção em confinamento, durante todo o ano, os animais receberam, no cocho, a alimentação concentrada, na proporção de 1kg de ração para cada 3kg de leite, bem como a alimentação volumosa (silagem de milho, Zea mays). Os animais tiveram ainda acesso a pastagens com pouca disponibilidade de forrageiras do gênero Brachiaria.
Os índices produtivos e econômicos foram comparados por meio de análises descritivas, utilizando o aplicativo MS Excel®, e agrupados em tabelas, objetivando uma melhor comparação, discussão e apresentação dos resultados (LOPES et al 2004b).
Resultados e Discussão
Um resumo dos recursos disponíveis em 17 sistemas de produção da região de Lavras, MG, agrupados em função do tipo de sistema de criação, do período de janeiro de 2004 a dezembro de 2005, é apresentado na Tabela 1. Tais recursos foram úteis nas análises e discussões dos resultados encontrados nesta pesquisa. Na Tabela 2 pode ser observado um resumo da análise de rentabilidade da atividade leiteira desses sistemas de produção. Pelos valores de desvio padrão, pode-se constatar que os sistemas estudados foram bem diferentes entre si.
Tabela 1: Recursos disponíveis em 17 sistemas de produção, agrupados em função do tipo de sistema de criação, (período de 24 meses).
Tabela 2: Resumo da análise de rentabilidade da atividade leiteira de 17 sistemas de produção, agrupados em função do tipo de sistema de criação, em R$ (período de 24 meses).
A receita total durante o período de estudo foi de R$139.876,36; R$122.359,03 e R$520.223,99, o que correspondeu a soma dos valores apurados com a venda de leite (86,17; 86,38; e 83,82%), animais (13,09; 11,66 e 12,54%) e subprodutos (0,65; 1,96; e 3,64%), para os sistemas de criação em regime de pastejo, semi-confinado e confinado, respectivamente (Tabela 3). As diferenças existentes entre os três sistemas de criação podem ser explicadas em função das quantidades de leite produzidas, pois, nesse estudo, as maiores produções, coincidentemente, foram dos sistemas de produção em confinamento. Quanto à venda de subprodutos (esterco), 75%, 33,4% e 80% dos sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente, não o comercializaram, justificando as pequenas contribuições na receita bruta. Em todos os sistemas de produção, pelo menos parte desse sub produto foi utilizado como adubo orgânico em capineiras. De acordo com LOPES et al (2004a), o fato dele ser utilizado no próprio sistema de produção, embora, em um primeiro momento significa redução da receita, representou também uma redução nas despesas com manutenção das capineiras. Nas visitas às propriedades foi observado que há bastante desperdício desse subproduto, devido às condições inadequadas de armazenamento. Tal fato pode também justificar a pequena comercialização e, conseqüente diminuição da rentabilidade.
Tabela 3: Contribuição de cada item na receita em 17 sistemas de produção, agrupados em função do sistema de criação, em % (período de 24 meses).
As produtividades de leite por ha/ano de 3.517,65kg nos sistemas de produção em regime de pastejo, embora baixas, são bem maiores quando comparadas aos 1.839,80kg e 2.762,86kg dos semi-confinados e confinados, respectivamente. Esses índices obtidos pelos sistemas de produção semi-confinados e confinados, aliados aos das quantidades de matrizes por ha (0,57 e 0,52, respectivamente) evidenciam que as áreas estão com suas capacidades produtivas ociosas, principalmente nestes últimos sistemas de produção. As produções médias diárias de leite foram de 323,64; 288,87; e 1.105,13 kg, com uma produtividade de 9,82; 9,17; e 15,01kg por matriz em lactação, para os sistemas de produção em regime de pastejo, semiconfinados e confinados, respectivamente.
Em um sistema de produção em regime de pastejo, o custo variável médio foi superior ao preço de venda do leite, em outro foi igual, não sendo possível se calcular o ponto de equilíbrio. Dos quatro sistemas em regime de pastejo, em dois o custo variável médio foi menor que o preço de venda. Nestes, o ponto de equilíbrio foi de 923,71kg/dia e a produção média diária foi de 149,72kg.
Os dez sistemas de produção em semi-confinamento apresentaram custo variável inferior ao preço de venda do leite, permitindo, então, se calcular o ponto de equilíbrio, que foi de 505,35kg. Nestes sistemas a produção média diária foi de 288,87kg. No grupo confinados, em dois dos três sistemas de produção o custo variável médio foi inferior ao preço de venda do leite, e o ponto de equilíbrio foi de 1.600,75kg/dia. Nesses, a produção média diária foi de 1.419,75kg. Esses índices evidenciam que muitos esforços gerenciais e até mesmo tecnológicos devam ser feitos objetivando aumentar as médias diárias de leite, sem contudo aumentar o custo variável médio, que uma vez majorado, aumentará ainda mais o ponto de equilíbrio. De acordo com LOPES et al (2004a), uma alternativa é aumentar a eficiência produtiva, ou seja, a produtividade por matriz, otimizando assim as despesas com mão-de-obra, medicamentos, inseminação artificial, impostos fixos, energia e diversas. Tais despesas, aumentando-se a produtividade por matriz, não serão majoradas.
O custo operacional total (COT) de R$115.876,43; R$83.508,56; e R$410.554,99, para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente, foi obtido pela soma do custo operacional efetivo (desembolso), com o custo de depreciação dos bens patrimoniais e com a remuneração da mão-de-obra familiar (Tabela 2). Embora não seja um desembolso, o valor referente a depreciação representa uma reserva de caixa que deveria ser feita para se repor os bens patrimoniais (instalações, equipamentos etc.) ao final de sua vida útil. A receita do período permitiu que essa reserva fosse feita, bem como que a mão-de-obra familiar fosse remunerada nos três grupos. Isso significa que ao final da vida útil do bem, em permanecendo constantes as condições atuais, o pecuarista teria recursos monetários para a aquisição de um novo bem substituto, não havendo uma descapitalização a médio prazo.
No presente estudo, a depreciação foi responsável por 5,63; 14,99; e 5,13% do COT, para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinado e confinado, respectivamente. Esses resultados demonstraram que no sistema de produção em confinamento houve uma maior otimização da estrutura física. LOPES et al. (2001) estudando um sistema de produção em semi-confinamento, com produção média de 288,87kg de leite /dia, constatou que a depreciação representou 17,29% do COT. Embora na literatura não exista informação sobre qual seria um bom valor para esse indicador técnico, pode-se dizer que, a eficiência de utilização dos bens dos patrimônios dos sistemas de produção estudados nesta pesquisa foi superior ao sistema estudado por esses pesquisadores.
O custo operacional efetivo de R$104.810,06; R$66.765,84; R$390.711,20, para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente, representou o desembolso médio no período de 24 meses feito para custear a atividade. Os itens que compõem o custo operacional efetivo de produção do leite foram divididos em grupos, cada qual responsável pelos percentuais encontrados na Tabela 4. A divisão das despesas em grupos, de acordo com LOPES e LOPES (1999) permite o monitoramento das despesas do sistema de produção de leite, auxiliando o técnico e o produtor em uma análise mais detalhada.
Tabela 4: Contribuição de cada item no custo operacional efetivo de 17 sistemas de produção, agrupados em função do sistema de criação, em % (período de 24 meses).
Quanto à mão-de-obra, o menor percentual de 14,53 nos sistemas de produção em regime de pastejo pode ser explicado pelo fato de apenas dois terem contratado funcionários, predominando a mão-de-obra familiar. Assim, diminuiu-se o desembolso com mão-de-obra, reduzindo a contratação de pessoal. Outro aspecto que deve ser considerado e que explica esse menor percentual é que nos sistemas em regime de pastejo a suplementação volumosa é pequena e apenas na época da seca, exigindo menor número de serviços por vaca (18,14:1), quando comparados aos outros grupos. Vale salientar que o fato dos próprios animais realizarem a colheita das forrageiras diminui a necessidade de mão-de-oba. O índice de 16,86:1 encontrado nos sistemas de produção em semi-confinamento, considerando que as necessidades de mão-de-obra para arraçoamento dos animais é menor, quando comparada aos sistemas em confinamento (11,74:1), aliado ao fato de que ainda há mão-de-obra familiar em um dos sistemas de produção, evidenciam que esse importante componente do custo de produção está sub-utilizado, caracterizando um ponto de estrangulamento dos sistemas em confinamento.
A alimentação foi responsável por 60,95; 54,92 e 52,23% das despesas operacionais efetivas dos sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente. No último grupo, o valor foi inferior aos 65,38% encontrados por Lopes et al (2002) ao estudar a rentabilidade de um sistema de produção em confinamento, sugerindo uma maior eficiência nesse quesito. Embora não tenha sido encontrado na literatura resultados de pesquisas científicas apontando um valor para tomar-se como parâmetro, o índice obtido pelo grupo em regime de pastejo evidencia uma ineficiência na utilização das pastagens. Essa ineficiência pode ser constatada também, embora em menor grau, nos sistemas em semiconfinamento, quando comparado com o índice obtido pelos sistemas em confinamento, pois uma parte da alimentação daqueles vem das pastagens.
As despesas com medicamentos representaram 6,12; 4,03; e 6,17 % do custo operacional efetivo, dos sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente (Tabela 4).
Quanto às despesas com inseminação artificial (sêmen, nitrogênio líquido, além de outros materiais), o percentual obtido de 0,20 nos sistemas de produção em regime de pastejo está muito baixo devido ao fato de apenas dois dos quatro adotarem essa tecnologia, o que pode ser deduzido pelo alto desvio padrão (Tabela 4). Dois sistemas de produção em semiconfinamento realizaram inseminação artificial durante o período estudado. Nos confinados, o percentual foi de 0,64, sendo inferior ao 1,02 relatado por LOPES et al (2002).
As despesas com aquisição de soluções pré e pós dipping, detergentes ácidos e alcalinos, papel toalha, desinfetantes e demais produtos utilizados na ordenha representaram 0,37 e 2,45% das despesas operacionais efetivas, para os sistemas de produção semiconfinados e confinados, respectivamente. Observa-se que a diferença, em termos percentuais está muito grande, o que pode ser explicado pelo fato de dois dos dez sistemas de produção em semi-confinamento não tiveram gastos com esses materiais, o que também aconteceu com todos os sistemas de produção em regime de pastejo. Esses resultados podem evidenciar pouca preocupação com a obtenção higiênica do leite por 76,4% dos pecuaristas. O valor 2,45 está próximo de 2,88% obtido por LOPES et al (2002).
Impostos considerados fixos como o ITR e IPVA representaram apenas 0,43; 1,04 e 0,15% das despesas operacionais efetivas para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente. Embora esses impostos sejam despesas operacionais, também fazem parte do custo fixo, pois o valor do IPVA do automóvel, por exemplo, independe da quantidade de leite produzida. Assim, tal despesa é mais "diluída" nas maiores produções, justificando o menor percentual no grupo confinado, que, coincidentemente teve a maior produção.
No grupo energia, o qual representou 3,91; 8,34 e 7,26%, para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente, foram consideradas as despesas com energia elétrica e combustíveis.
Foram consideradas despesas diversas aquelas que não se enquadraram nos grupos mencionados anteriormente, tais como frete do leite, taxas e impostos variáveis em função da produção, despesas com manutenção de benfeitorias, máquinas e equipamentos. Os valores encontrados foram de 13,47; 10,28 e 11,72% para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente. O pequeno valor desse último se justifica pois um dos sistemas de produção beneficia o leite produzido não existindo, portanto, a despesa frete. Vale salientar também que alguns laticínios têm oferecido um desconto no frete daqueles produtores que entregam maiores quantidades de leite.
O custo total (CT), que representou a soma dos custos fixos (CF) e dos custos variáveis (CV), foi de R$146.540,28; R$117.918,71 e R$ 489.782,17 para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente. As diferenças existentes entre os três sistemas de criação podem ser explicadas em função das quantidades de leite produzidas. Pela subtração do custo total da receita, nos três grupos (Tabela 2) mostra que todos os custos variáveis puderam ser pagos, que a reserva referente à depreciação pode ser realizada. Mas o capital investido em bens e terra não foi completamente remunerado apenas no grupo em regime de pastejo. Tal fato evidencia que estes sistemas de produção estão se descapitalizando ao longo do tempo.
Os custos fixos, que são compostos pela remuneração da terra, remuneração do capital investido, remuneração do empresário, impostos considerados fixos (ITR e IPVA) e depreciação do patrimônio totalizaram R$36.739,00; R$45.454,65 e R$92.462,49, nos sistemas de criação em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente. Esses custos não representaram desembolso (com exceção dos impostos), mas representam o que a atividade deveria remunerar para ser competitiva com outras atividades econômicas e não descapitalizar o pecuarista ao longo dos anos. Se esses custos não forem contemplados, o pecuarista poderá, a longo prazo, perder o patrimônio e se endividar.
Tais custos fixos, que representaram 26,26; 37,14 e 17,77% do custo total nos sistemas de criação em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente, estão muito altos, exceto no grupo confinado, quando comparados aos 16,08%, encontrados por Almeida Júnior et al. (2002). Esses resultados evidenciam que os investimentos certamente encontramse dimensionados para uma produção de leite muito maior do que a média encontrada.
Os custos variáveis, que são compostos pelo custo operacional efetivo, excetuando impostos considerados fixos (ITR e IPVA), pela remuneração do capital de giro e pela mãode- obra familiar, totalizaram R$109.801,28; R$72.464,06 e R$397.319,68. As diferenças existentes entre os três tipos de sistemas de criação podem ser explicadas em função das quantidades de leite produzidas.
Observa-se pelos indicadores de eficiência econômica margem bruta (receita bruta menos custo operacional efetivo) e líquida (receita bruta menos o custo operacional total) que tais resultados foram satisfatórios (positivos) evidenciando que a atividade leiteira, nos diferentes tipos de sistema de criação, tem condições de sobreviver no curto e médio prazo, respectivamente. Quando se analisa pelo indicador de eficiência econômica resultado (receita bruta menos custo total) os resultados foram satisfatórios, evidenciando que a atividade leiteira conseguiu remunerar o capital, exceto no grupo em regime de pastejo (Tabela 2).
Dos quatro sistemas de produção em regime de pastejo, nenhum teve margem bruta negativa evidenciando que o que foi apurado com a venda de leite, animais e subprodutos (esterco) foi suficiente para cobrir as despesas operacionais efetivas (alimentação, mão-deobra, sanidade etc). Em um, a margem líquida foi negativa, sendo então, a receita suficiente para cobrir as despesas operacionais efetivas, mas não para fazer as reservas necessárias para substituição dos bens ao término de suas vidas úteis (depreciação), estando, portanto, os produtores se descapitalizando a cada ciclo produtivo. Em apenas um o resultado foi positivo, evidenciando que além de cobrir todas as despesas, o empresário conseguiu remunerar o capital em níveis acima da caderneta de poupança, não se descapitalizando.
Dos dez sistemas de produção em semi-confinamento, nenhum teve margens bruta e líquida negativa evidenciando que o que foi apurado com a venda de leite, animais e subprodutos (esterco) foi suficiente para cobrir as despesas operacionais efetivas e o valor referente a depreciação. Em cinco o resultado foi positivo, evidenciando que além de cobrir todas as despesas, o empresário conseguiu remunerar o capital em níveis acima da caderneta de poupança, não se descapitalizando.
Dos três sistemas de produção em confinamento, um obteve margem bruta, líquida e resultado positivo. Outro teve as margens positivas e resultado negativo, enquanto que outro teve apenas a margem bruta positiva obtendo margem líquida e resultado negativo.
A lucratividade foi de -4,76; 3,63 e 5,85%, significando que, para cada R$100,00 investidos, houve uma perda de R$4,76 e ganhos de R$3,63 e R$5,85, enquanto que a rentabilidade foi de 0,27; 2,84 e 0,40%, nos sistemas de criação em regime de pastejo, semiconfinados e confinados, respectivamente. Pela lucratividade, pode-se comparar com outros sistemas de produção de leite, analisando qual foi o mais lucrativo e, pela rentabilidade, podese comparar com atividades diferentes, mostrando a melhor opção de investimento, como por exemplo, com a caderneta de poupança, que no período de 24 meses obteve uma taxa real de juros de 12%. Nesse caso, a aplicação em caderneta de poupança teria sido melhor negócio para os pecuaristas. Tal comparação é feita apenas para se ter um referencial e não objetiva sugerir ao pecuarista que abandone a atividade e invista em caderneta de poupança. Alguns cuidados deverão ser observados antes de optar pela desativação ou abandono de uma atividade, pois uma parcela significativa dos custos fixos continuarão a existir ainda por um período de tempo. É importante verificar a composição dos custos e índices técnicos, e observar se há possibilidade de melhor remanejamento dos fatores de produção e técnicas que poderão permitir minimizar custos e ou aumentar a produtividade.
A Tabela 5 apresenta os custos médios de produção por quilograma de leite. O preço médio recebido por kg de leite foi de R$0,51; R$0,49 e R$0,55, para os sistemas de produção em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente, evidenciando que as empresas compradoras de leite remuneram melhor as maiores quantidades, pois, coincidentemente, os sistemas do grupo confinados, foram os maiores produtores. Verifica-se que os valores médios de venda de R$0,51; R$0,49 e R$0,55, para os sistemas de criação em regime de pastejo, semi-confinados e confinados, respectivamente, foi suficiente para cobrir as despesas operacionais efetivas e as variáveis em todos os grupos; não sendo suficientes para cobrir integralmente os custos totais em nenhum dos três tipos de sistemas de criação.
Tabela 5: Custos médios de produção, por quilograma de leite, de 17 sistemas de produção, agrupados em função do tipo de sistema de criação, em R$ (período de 24 meses).
A Tabela 6 apresenta os custos médios de produção por quilograma de "leite virtual". O termo "leite virtual", criado por LOPES e LOPES (1999), significa a quantidade de leite, em kg, resultante da conversão dos valores apurados com as vendas de animais e esterco em leite. Esse valor pode ser tomado como referência para o produtor avaliar se a atividade leiteira como um todo, principalmente a cria e recria de animais, está sendo viável economicamente. Verifica-se que os valores médios de venda foram suficientes para cobrir as despesas operacionais totais (que envolve as despesas efetivas, com depreciação e mão-deobra familiar). As despesas referentes ao custo total (custo fixo e custo variável) não foram totalmente cobertas nos sistemas semi-confinado e confinado, evidenciando que parte do custo fixo, principalmente a remuneração do capital investido, não foi coberto.
Tabela 6: Custos médios de produção por quilograma de "leite virtual", de 17 sistemas de produção, agrupados em função do tipo de sistema de criação, em R$ (período de 24 meses).
Dentro do preconizado por Lopes (2003), considerando um custo total do leite de R$0,57 (Tabela 5) e o valor de venda de R$0,49, no grupo sistemas de criação em semiconfinamento, a atividade leiteira não foi viável economicamente, pois o produtor teve um prejuízo de R$0,08 por kg de leite (R$0,49 – R$0,57). Nesse caso específico, produzir leite não foi uma atividade viável. Nesse custo total de R$0,57/kg de leite foram computadas todas as despesas, inclusive da criação das bezerras e demais categorias animais. Mas, nesse período, os produtores pesquisados venderam alguns animais. O software CU$TO BOVINO LEITE, utilizado no processamento eletrônico dos dados desta pesquisa, realizou a conversão dos valores apurados com as vendas de animais em leite e calculou o custo total do "leite virtual" que, nesse caso, foi de R$0,47 (Tabela 6). Assim, quando se considerou a venda de animais, a atividade foi rentável em R$0,02 por kg de leite (R$0,49 – R$0,47). Esse resultado, encontrado nesta pesquisa, vem mostrar que, em algumas situações, pode ser verdadeira a afirmação comum feita por muitos produtores de leite: "Produzir leite é mau negócio. O que é bom negócio são as crias. As crias sim, valem a pena."Os resultados encontrados nesta pesquisa que apontam um resultado positivo (Tabela 2), mesmo sendo o custo total superior ao preço de venda (Tabela 6) vêm confirmar a importância e aplicabilidade da estimativa do "leite virtual".
Conclusões
Diante dos resultados concluiu-se que: a) o tipo do sistema de criação influenciou o custo total de produção do leite e, portanto a lucratividade e rentabilidade, sendo os sistemas de produção em semi-confinamento os que apresentaram os menores custos totais unitários; b) o tipo do sistema de criação influenciou os "pesos" dos itens componentes do custo operacional efetivo da atividade leiteira, sendo esses diferentes em cada um dos três sistemas estudados; c) na análise econômica, por apresentar margem líquida e resultado positivo, nos sistemas de criação confinado e semi confinado, conclui-se que a atividade leiteira tem condições de produzir no longo prazo e os pecuaristas estão se capitalizando. No entanto, no sistema em regime de pastejo os pecuaristas têm condições de produzir no médio prazo, estando se descapitalizando no longo prazo.
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**O trabalho foi originalmente publicado durante o SOBER - XLVI Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural - Rio Branco – Acre, 20 a 23 de julho de 2008.