INTRODUÇÃO
A cadeia produtiva do leite pode ser encontrada, mesmo que em diferentes aspectos, em todas as regiões brasileiras, atuando como uma atividade geradora de renda, tributos e empregos. As mudanças econômicas ocorridas no início da década de 1990 contribuíram para torná-la um divisor de águas para a cadeia produtiva do leite. Essas mudanças exigiram rápidos ajustamentos estratégicos e estruturais do setor agroindustrial do leite (Reis et al., 2001). A partir deste período, profundas transformações ocorreram em todo o setor, as quais foram induzidas pela desregulamentação do mercado, pela política de abertura comercial, pela formalização do Mercosul, pela estabilidade macroeconômica, pela nova estrutura de produção e comercialização e também pelo crescente poder e discernimento do mercado consumidor, cada vez mais segmentado e exigente em qualidade, preços e variedade de produtos (Leite e Gomes, 2001; Zoccal, 2001).
Estes fatos trouxeram um aumento da concorrência em todos os elos do agronegócio e os têm forçado a implementar novas estratégias, visando obter ganhos de competitividade (Souza, 2000; Zoccal, 2001). Nesse sentido, novos procedimentos têm sido adotados, visando ao aperfeiçoamento da gestão de custos e o incremento dos níveis de qualidade, desde a matéria-prima até o produto final. Além disso, as relações que se estabelecem entre o setor agropecuário e os segmentos a montante e a jusante assumem, respectivamente, características de oligopólio e oligopsônio. Esta situação leva os produtores rurais a disporem de poucos recursos para negociarem seus interesses no interior da cadeia produtiva do leite, inclusive à menor capacidade de negociação de preços (Alencar et al., 2001).
Diante desse cenário, caracterizado por limitado poder de negociação no mercado, ou seja, por não conseguir controlar o preço do produto que vende, o produtor necessita administrar as variáveis que estão sob o seu controle. Sendo assim, de acordo com Fassio (2004), uma das alternativas de que dispõem os produtores de leite para se manterem na atividade é a redução dos custos de produção, cujo conhecimento é essencial para o efetivo controle da empresa rural e para o processo de tomada de decisão. Trata-se de uma estratégia para tornar seu produto competitivo. Dessa maneira, o resultado econômico em um mercado caracterizado por esta estrutura produtiva dependerá do gerenciamento dos custos de produção e da busca de ganhos de escala produtiva.
Consideradas a grande heterogeneidade da cadeia produtiva do leite no Brasil e a sua presença em todo o território nacional, é salutar a identificação de indicadores técnicos e econômicos que possam permitir a utilização da gestão de custos como um instrumento de competitividade da pecuária leiteira nacional, facilitando uma compreensão mais clara das reais capacidades de resistência dos produtores nas diferentes realidades em que se encontram.
Por meio deste estudo, avaliaram-se os custos e a escala de produção da pecuária leiteira nos cinco principais estados produtores de leite do Brasil. Especificamente, buscou-se estimar os custos de produção pela metodologia de "centro de custo". Dessa maneira, para efeitos de estimativa e análise de custos, o sistema global de produção de leite pode ser segmentado em diversos subsistemas interligados entre si. Buscou-se estimar também as funções de custo e a ocorrência de escala de produção.
METODOLOGIA
Referencial Teórico
Um empresário, no processo produtivo, diante de ampla variedade de possíveis combinações, procura coordenar os fatores de produção de acordo com determinada tecnologia, com o objetivo de alcançar um certo nível de produção que proporcione a máxima eficiência econômica, ou seja, maximizar o lucro ou minimizar os custos. Esta situação implica na determinação de uma escala ou tamanho ótimo que proporcione o menor custo unitário e, daí, a maior diferença entre custos e receitas.
A economia de escala surge a partir da divisão e da especialização do trabalho e dos fatores tecnológicos (Ferguson, 1989). Com a divisão e a especialização do trabalho na execução das tarefas, criam-se condições para o aperfeiçoamento na execução das mesmas. Diminuem-se, desta maneira, erros e desperdícios de tempo e de recursos produtivos.
Considerando-se que o custo total CT para se produzir e negociar determinado número de unidades de um produto é uma função somente de q, então, a função de custo total pode ser representada por CT = f(q). A partir da função do custo total, outros custos podem ser derivados. Assim, podem ser obtidos o custo variável médio, o custo total médio e o custo marginal.
Ao se estudar o comportamento dos custos no longo prazo, considera-se período de tempo longo o bastante para que todos os recursos sejam passíveis de alterações. Embora a produção se dê no curto prazo, o longo prazo relaciona-se ao planejamento e às escolhas futuras de alternativas de produção, inclusive quanto ao tamanho do empreendimento. Assim, o conjunto das curvas de custo total médio no curto prazo (CTMeCP) determina a curva de custo médio no longo prazo (CMeLP), ou seja, a curva envelope ou a curva envoltória.
A conformação da curva de CMeLP é de interesse na medida que fornece informações sobre o processo de produção em um período específico. Nas sucessivas situações de custos mínimos no curto prazo, um nível de produto, q, indica o tamanho de instalação ou escala de operação em que os custos médios mínimos em curto prazo e em longo prazo coincidem, ou seja, a escala ótima de produção. Este ponto se expressa pela igualdade:
CMeLP = CMaLP = CTMeCP = CMaCP
Sendo assim, a escala ótima é indicada pelo volume de produção em que se satisfaz a condição de associação da expansão da produção com eficiência econômica crescente, com a obtenção de custos médios mínimos. (Ferguson, 1989; Nicholson, 1998; Varian, 1994).
Em princípio, um sistema de produção pode ser considerado como uma incógnita, em que os insumos e os produtos são conhecidos e mensuráveis, embora o processo de transformação dos insumos em produtos seja desconhecido (Yamaguchi et al., 2002).
Entretanto, de acordo com Gastal (1980), uma análise realizada pelo processo de segmentação do sistema global permite desvendar alguns dos subsistemas que compõem o processo de produção, em que cada um corresponde a uma parte do processo de transformação. Nesse sentido, o processo utilizado na estimativa dos custos nesta pesquisa refere-se à consideração metodológica levantada por autores como Tupy et al. (2000) e Yamaguchi (2000), que considera o uso da segmentação da produção de leite em subsistemas interligados entre si, aqui denominados de centros de custos. Assim, este método leva em consideração subsistemas como a produção de leite, a produção de animais para reposição, a produção de alimentos, dentre outros, conforme exemplifica a Figura 1.
FIGURA 1. Centros de custos de produção de leite.
A Figura 1, dessa maneira, representa sucintamente a estrutura na qual baseou-se e organizou-se o conjunto de planilhas para controle do custo de produção do leite elaboradas pelo CNPGL/EMBRAPA que serviram de base para esta pesquisa. Nos subsistemas de produção de cana-de-açúcar, pastagens, silagens de milho e de capim são considerados os custos devido à manutenção, colheita e distribuição, benfeitorias e instalações, equipamentos, administração, consultorias e outras despesas, além de remuneração e depreciação. No subsistema de custo de mão-de-obra, incluem-se as despesas com ordenhador e com o trabalho de manejo (salário, 13º salário e encargos sociais), bem como o salário do administrador. Nos subsistemas de custos de instalações, máquinas e equipamentos, têm-se os dispêndios relacionados às salas de ordenha e de leite, curral de espera e de manejo, rede hidráulica, reservatórios de água, tanque de resfriamento, balança de pesagem de animais, galpão e armazém, escritório, botijão de sêmen, etc.
O subsistema de fêmeas de reposição possibilita estimar o custo total de manutenção anual do rebanho de fêmeas de reposição e o custo por novilha de reposição até o parto. Assim, neste subsistema, consideram-se as despesas com insumos, como leite para bezerro, concentrados, silagem, sal mineral, medicamentos, mão-de-obra, instalações, maquinário, despesas de manutenção, energia elétrica, combustíveis, etc.
Finalmente, o subsistema utilizado para o custo de produção de leite leva em conta, como principais itens, as despesas de mão-de-obra, incluindo o trabalho familiar, despesas com alimentação, reprodução, produtos veterinários, dispêndios com instalações, máquinas e equipamentos, animais de produção, pastagens e despesas gerais.
Sendo assim, analisaram-se, nesta pesquisa, os custos de produção de leite apurados pela metodologia de centros de custos, a partir da perspectiva da análise segmentada do sistema global de produção, conforme sugerido por Yamaguchi et al. (2001).
Modelo analítico
A base teórico-analítica deste estudo se fundamenta na teoria dos custos de produção. A escolha da forma funcional deve considerar, além da capacidade desta para a constatação de economia de escala, as propriedades inerentes ao comportamento dos custos.
As formas funcionais quadrática, cúbica e potência foram testadas para representar o comportamento do custo total. A escolha da forma apropriada buscou verificar a hipótese de formato em U para a curva de custo médio por meio dos modelos quadrático e cúbico, ou, se não, com o modelo potência.
Para que a função quadrática seja coerente com a teoria do custo, o coeficiente do termo quadrático (β2) deve ser positivo, sendo, então, o custo marginal crescente com a produção e o custo médio apresentando a forma em U:
CT = β2q2 + β1q + β0 + ε,
em que CT é o custo total de produção (R$), q a produção anual (litros), β's os coeficientes estimados e ε é o termo do erro que se admite possuir as propriedades usuais.
Na alternativa cúbica, espera-se do coeficiente do termo cúbico (β3) sinal positivo e do coeficiente do termo quadrático (β2) valor nulo ou negativo, o que gera curvas de custo marginal e custo médio em forma de U:
CT = b3q3 + b2q2 + b1q + b0 + ε,
em que ε é o termo do erro que se admite possuir as propriedades usuais, os β's são os coeficientes a serem estimados, q a produção anual (litros) e CT o custo total de produção (R$).
Para o modelo de função potência, os coeficientes β0 e β1 devem possuir sinais positivos. Entretanto, situações podem se configurar conforme a estimativa do coeficiente β1:
CT = β0q β1 .
Se a estimativa do coeficiente β1 for maior que a unidade, o custo total aumenta a taxas crescentes com o crescimento da produção, sendo também crescente o custo marginal, enquanto o custo médio decresce. Sendo o coeficiente β1 menor que um e maior que zero, o custo total cresce a taxas decrescentes com o aumento da produção, enquanto o custo marginal e o custo médio decrescem continuamente, sem apresentar um ponto mínimo.
O coeficiente β1 representa a elasticidade custo (Ec) em relação à produção, isto é, a variação proporcional no custo resultante de uma variação proporcional na produção.
Tendo por referência a elasticidade custo da produção, pode ser auferido o tipo de retorno à escala (RE), uma vez que este é o inverso da elasticidade custo, bem como a ocorrência de economia ou deseconomia de escala (EE).
Dado que:
RE = 1 / Ec,
então, se RE for maior, igual ou menor que a unidade, têm-se retornos crescentes, constantes ou decrescentes à escala.
Dado que:
EE = 1 – Ec,
então, o comportamento da empresa em relação ao nível de operação é economicamente eficaz quando EE é positivo, ou seja, estão ocorrendo economias de escala nos níveis operados. Se EE é negativo, há deseconomias de escala.
Neste estudo, foi utilizado o método dos mínimos quadrados ordinários (MQO) para ajustar os modelos econométricos propostos. A avaliação da qualidade do ajustamento dos dados foi efetuada por meio do coeficiente de determinação (R2), o qual aufere a proporção da alteração na variável dependente estimada, que é explicada pelo comportamento da variável independente. Também a estatística F foi empregada para avaliar estatisticamente a significância da relação entre as variáveis custo total e quantidade produzida. Na avaliação dos coeficientes estimados, além da coerência dos sinais, o teste t mediu a significância destes para o modelo.
Região do estudo e dados básicos
Os dados utilizados neste estudo foram cedidos pelo Centro Nacional de Pesquisa em Gado de Leite da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (CNPGL/EMBRAPA); eles foram coletados em junho de 2002 e referem-se ao período de agosto de 2000 a julho de 2001. São derivados do processamento de informações de natureza estrutural, tecnológica e econômica de 162 propriedades rurais localizadas nos principais estados produtores de leite do país, ou seja, os estados de Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul.
O custo alternativo teve como referência a taxa de juro real de 6% ao ano. A remuneração anual do capital investido em terra foi de 3%, tomando-se como base o valor de venda do hectare na região em que se localizava a propriedade. Para o fator benfeitorias e os demais fatores, foi estipulada a taxa de 6% a.a. sobre o valor médio.
A composição do grupo de produtores observados resultou da seleção intencional destes em função da disponibilidade de dados que atendessem aos objetivos propostos.
Em consonância com estes objetivos, optou-se pela caracterização dos estratos com base nos estados onde estão localizados os produtores. Essa caracterização também se mostrou mais adequada devido ao fato de, nas observações que compõem o estudo, predominarem fortemente as características tecnológicas e econômicas relacionadas aos grandes produtores, desaconselhando qualquer caracterização dos estratos por níveis de produção diária de leite.
Este fato pode ser observado na Tabela 1, que demonstra as freqüências relativas do número de produtores de leite estudados por estrato de produção diária e a distribuição percentual da produção. Considerou-se, para efeitos de comparação, a definição dos sistemas de produção utilizada pelo SEBRAE-FAEMG (1996).
TABELA 1. Freqüência relativa do número de produtores de leite estudados, por estrato de produção diária e distribuição percentual da produção, agosto de 2000 a julho de 2001.
A caracterização dos estratos também se baseou em indicadores econômicos e de produtividade, tendo sido testadas estatisticamente as diferenças entre os estados estudados. Para tanto, efetuou-se a análise de variância dos indicadores considerados, utilizando-se o sistema computacional Statistics Package for the Social Science (SPSS for Windows). Se a análise de variância rejeitou a hipótese nula, pelo menos a 5% de probabilidade, testou-se a hipótese de igualdade das médias por meio do teste de Tukey, a 5% de probabilidade.
Segundo Fassio (2004), o conhecimento de indicadores econômicos das explorações agropecuárias e da propriedade como um todo possibilita a identificação de possíveis pontos de estrangulamento no processo produtivo, fornecendo subsídios à ação do extensionista e à tomada de decisão pelo produtor rural. Além disso, permite estabelecer as bases para a elaboração de projetos que visam minimizar as deficiências identificadas, propondo-se medidas técnicas e administrativas, bem como se avaliando a necessidade de investimentos e crédito.
Nesse sentido, para cada variável, além das informações sobre a média, também foram apresentados os coeficientes de variação, em %, para que se pudesse visualizar o grau de heterogeneidade nos estratos de produção e em todo o grupo de produtores analisados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Indicadores econômicos dos produtores de leite em estudo
A caracterização da pecuária leiteira em estudo foi elaborada a partir da análise dos custos de produção. Os custos de produção foram calculados segundo metodologia proposta por meio de planilhas desenvolvidas pelo CNPGL/EMBRAPA.
A análise econômica dos produtores pesquisados torna possível a caracterização da atividade em estudo. Estas informações são relevantes à medida que permitem a identificação de fatores limitantes à evolução do processo produtivo e à medida que possibilitam a identificação de ameaças ou oportunidades nos estados estudados, levando-se em conta os contrastes e peculiaridades observados entre estes estratos. Neste sentido, traçou-se o perfil da produção nos estados estudados, considerando-se o nível de produção, a produtividade média por vaca em lactação e os resultados econômicos das propriedades observadas.
A análise concentrou-se num grupo de 162 produtores. Destes, 42 eram do estado do Rio grande do Sul e os 120 restantes estavam divididos igualmente pelos estados de Minas Gerais, Paraná, Goiás e São Paulo, sendo 30 em cada um deles. Assim, são apresentadas nesta seção as estimativas de alguns parâmetros que possibilitam sintetizar o diagnóstico econômico da produção leiteira nos estados em estudo.
Observa-se, na Tabela 2, que, considerando-se os custos totais médios, apurados para o centro de custo de produção de leite, foram observadas médias de de R$ 0,28/litro para o estado de Goiás, R$ 0,30/litro para Minas Gerais, R$ 0,27/litro para o Paraná, R$ 0,27/litro para o estado do Rio Grande do Sul e R$ 0,34/litro para São Paulo.
TABELA 2. Custo total médio, por estado produtor, em R$/litro, agosto de 2000 a julho de 2001.
Observa-se que os custos totais médios do subsistema leite para os estados estudados, apurados pela metodologia de centro de custos, apresentaram-se significativamente iguais entre si, com exceção do estado de São Paulo, que apresentou um custo significativamente superior ao dos demais.
O volume de produção é um indicador muito importante por exercer grande influência sobre o comportamento dos custos de produção. Os dados da Tabela 3 mostram a produção média diária e a produção média anual dos referidos estados produtores.
TABELA 3. Produção média diária e anual das propriedades estudadas, por estado produtor, agosto de 2000 a julho de 2001.
O estado do Paraná apresentou o maior nível de produção, sendo 90% e 84%, respectivamente, superior ao dos estados de Goiás e de São Paulo, que apresentaram a menor média diária. Os estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul apresentaram níveis de produção intermediários entre os estados estudados.
A obtenção de maiores níveis de produtividade é condição necessária para um desempenho econômico eficiente. Nesse sentido, considerou-se, neste trabalho, a produtividade média diária por vaca em lactação. Os dados da Tabela 4 indicam que, considerando-se trezentos dias de lactação por vaca/ano, conforme metodologia utilizada por SEBRAE-FAEMG (1996), a presente pesquisa encontrou uma produtividade média de 9,86 litros/vaca em lactação/dia para o estado de Goiás, 12,32 para Minas Gerais, 18,91 para o Paraná, 18,77 para o Rio Grande do Sul e 14,41 para São Paulo. A produtividade média global foi de 15,14 litros/vaca em lactação/dia. A produtividade média diária foi obtida por meio do ajuste dos dados da pesquisa, transformando a produção anual para produção por período de lactação de 10 meses.
TABELA 4. Produtividade média diária por vaca em lactação, por estado produtor, agosto de 2000 a julho de 2001.
Os estados do Paraná e do Rio Grande do Sul apresentaram melhor desempenho em relação à produtividade, seguidos pelo estado de São Paulo. O pior desempenho foi apresentado pelo estado de Goiás. Minas Gerais apresentou um desempenho superior apenas ao do estado de Goiás.
No estudo realizado pelo SEBRAE-FAEMG (1996), constatou-se produtividade média, em Minas Gerais, de 4,9 litros/vaca em lactação/dia, enquanto Reis (1992) observou 5,0 litros/vaca ordenhada/dia. Marques et al. (2002) obtiveram média de 7,7 litros/vaca em lactação/dia e Fassio (2004) encontrou média de 11,39 litros/vaca em lactação/dia. Entretanto, no presente estudo, a produtividade de Minas Gerais superou estes levantamentos.
Gomes (1996), além disso, propõe três níveis de produtividade de leite para a região Sudeste: a produção abaixo de 4,93 litros/vaca em lactação/dia, entre 4,94 e 7,57 litros/vaca em lactação/dia e acima de 7,57 litros/vaca em lactação/dia. Tomando-se esta classificação como referência, observa-se melhor desempenho de produtividade para os produtores deste estudo.
É importante ressaltar que comparações com outros estudos são relativas, já que a metodologia geral é o levantamento de produção e produtividade estaduais globais, enquanto neste estudo incluem-se somente produtores comerciais.
Analisando-se os dados da Tabelas 5, relacionam-se as produtividades dos rebanhos e os volumes de produção. Com exceção dos estados de Minas Gerais e São Paulo, as maiores produtividades acompanharam o aumento do nível de produção, demonstrando que maiores produtividades em relação a vacas em lactação são cruciais para se obterem escalas de produção. Percebe-se também a relação entre os níveis de produção, a produtividade e os custos estimados nas propriedades, seja considerando a relação custo fixo sobre o custo total ou os custos totais médios da produção de leite.
TABELA 5. Volume médio de produção, produtividade, percentual do custo fixo sobre o custo total e custo total médio, por estado produtor, agosto de 2000 a julho de 2001.
Segundo Marques et al. (2002), produtores com maiores escalas de produção apresentam uma relação CFT/CT expressivamente mais baixa. Analisando-se os dados da Tabela 5, observa-se que os estados com maior volume de produção realmente demonstraram esta redução quando comparados aos estados com menor volume de produção. Além disso, a forte influência da escala de produção na relação CFT/CT pode ser percebida pelo fato de, apesar da boa produtividade, São Paulo ter apresentado um baixo desempenho neste indicador. Pode-se observar que, mesmo considerando um bom desempenho em relação ao custo total médio, Goiás também apresentou uma alta relação CFT/CT.
Segundo Fassio (2004), uma menor relação CFT/CT pode ser explicada por um maior grau de especialização dos rebanhos. Em plantéis especializados, onde predominam matrizes com alto potencial de resposta aos insumos variáveis, maiores gastos com os referidos recursos são justificados. Dessa maneira, a utilização de um nível tecnológico mais elevado, expresso pelos maiores índices de produtividade e maiores volumes de produção, relaciona-se diretamente com a diluição dos custos fixos na composição do custo total.
Gomes (1996) observou que a proporção CFT/CT para produção diária em torno de 50 litros é de 40% a 50%, caindo para 20% a 25% para escalas maiores, em torno de 600 litros/dia. No presente estudo, considerando a média geral, de 735 litros/dia (Tabela 3), a proporção CFT/CT foi de 28,43% (Tabela 5).
Na Tabela 6 tem-se o desempenho econômico da produção leiteira nos estados pesquisados, especificando-se os valores médios dos custos de produção unitários do leite, bem como o resultado da receita por unidade de produção.
TABELA 6. Desempenho econômico dos estados produtores de leite pesquisados, agosto de 2000 a julho de 2001.
A análise da Tabela 6 demonstra que o custo variável médio é maior nos estados de São Paulo e Minas Gerais. Os dados da Tabela 6 também demonstram que os produtores dos estados de São Paulo e de Minas Gerais apresentaram um preço médio recebido superior ao dos produtores dos demais estados. O preço médio recebido pelo leite de maneira geral foi de R$ 0,35 por litro. Percebe-se que os custos variáveis médios são cobertos pelo preço médio recebido em todos os estados. Isso indica que a pecuária leiteira nos estados estudados tem condições de continuar a produzir no curto prazo.
Observando-se os dados da Tabela 7, identifica-se que os preços recebidos pelos produtores foram suficientes para cobrir os seus custos totais médios, possibilitando-lhes, no curto prazo, a permanência na atividade. No longo prazo, entretanto, tal situação estimulará a entrada de novos produtores no mercado. Os dados da Tabela 7 também evidenciam que o estado de Minas Gerais apresentou um resultado significativamente melhor em relação aos demais estados estudados.
TABELA 7. Resultado econômico dos estados produtores de leite pesquisados, agosto de 2000 a julho de 2001.
A função de custo total
Para verificação de ocorrências de economias de escala foram ajustadas as funções de custo total. O ajustamento estatístico dos dados de custo total e quantidade produzida de leite foi processado pelo sistema estatístico SPSS. Os modelos nas formas quadrática e cúbica foram desconsiderados, por não se ajustarem econometricamente aos dados levantados nos estados em estudo. Além disso, os parâmetros estimados para estes modelos apresentaram sinais incoerentes com a teoria ou não significantes.
A função na forma de potência foi selecionada por atender tanto à coerência dos sinais quanto à significância estatística das estimativas e da regressão. Os resultados do ajustamento estatístico do custo total e quantidade produzida para os estados estudados, tanto individualmente quanto de maneira geral, estão sintetizados na Tabela 8. O resultado geral refere-se ao ajustamento estatístico dos dados de maneira global, considerando os produtores de todos os estados.
TABELA 8. Estimativas da função de custo, nos estados pesquisados, agosto de 2000 a julho de 2001.
Segundo o teste t aplicado, os coeficientes estimados apresentaram os sinais esperados e de significância de 5%. Os valores observados para a estatística "F" indicam que a regressão foi altamente significativa.
De acordo com os coeficientes de determinação ajustados (R2 Aj.), observa-se que a estimativa do custo total foi influenciada pela especificação do volume de produção com diferentes intensidades entre os estados estudados.
De maneira geral, a produção de leite influenciou em 92,11% as variações nas estimativas do custo total.
Os melhores ajustamentos para a função de custo total. por estado e geral, corresponderam às seguintes expressões:
CTGO = 1,983123 q 0,837317
CTMG= 0,329197 q 0,990838
CTPR = 0,489584 q 0,950354
CTRS = 0,435580 q 0,960220
CTSP= 0,474377 q 0,971441
CTGERAL = 0,591924 q 0,940425
As elasticidades de custo total, representadas pelos β1's, apresentaram-se menores que a unidade, indicando taxas decrescentes de crescimento do custo total com a quantidade produzida, ou seja, os gastos com fatores de produção resultaram em maior volume de produção.
Dessa maneira, pode-se afirmar que variações proporcionais na produção são alcançadas com variações menos que proporcionais nos insumos utilizados.
Para todos os estados estudados, o custo total variou menos que proporcionalmente em relação à produção, indicando taxas de crescimento decrescentes do custo total em função do aumento no volume produzido, o que corresponde a taxas de rendimentos crescentes à escala de produção.
A função de custo total, no período estudado, está sintetizada geometricamente na Figura 2. Percebe-se que o custo total cresce menos que proporcionalmente em relação ao volume de leite produzido. Este comportamento foi semelhante em todos os estados produtores estudados.
FIGURA 2. Representação da curva de custo total, para todos os estados, agosto de 2000 a julho de 2001.
As funções de custo total médio e custo marginal
Partindo das funções ajustadas para o custo total, foram obtidas as equações do custo total médio para os estados estudados. De acordo com as características das funções de custo médio e custo marginal, observa-se que o custo médio e o marginal decrescem à medida que o volume de produção aumenta, apresentando tendência única de decrescimento, o que também evidencia economias de escala. As funções de custo médio e marginal obtidos foram as seguintes:
Os sinais negativos dos expoentes expressam o comportamento decrescente dos custos médios à medida que o volume de produção aumenta. A curva representativa dos estados (Figura 3) apresenta-se sempre decrescente. Embora não identifique um ponto de menor custo, sua inclinação negativa indica que as propriedades analisadas estão tendo ganhos de escala, isto é, os custos unitários decrescem com o aumento da produção.
FIGURA 3. Representação da curva de custo total médio, para todos os estados, agosto de 2000 a julho de 2001.
Estes resultados estão de acordo, em parte, com o pressuposto geral da teoria econômica, no qual o custo médio inicialmente decresce com a quantidade produzida até atingir um ponto de mínimo, a partir do qual passa a crescer com a produção.
Dessa maneira, neste caso, não há a possibilidade de determinarem-se os níveis ótimos de produção, que ocorre no ponto onde o custo médio é mínimo.
Esta conformação da curva de custo médio indica que volumes maiores de produção são significativos para empresas de produção de leite, no sentido de levarem à maior eficiência econômica. Além de maiores níveis de produção proporcionarem ganhos de escala, este formato de curva de custo médio indica que os estados estudados estão operando com ociosidade na capacidade produtiva e que, portanto, menores custos médios ainda poderão ser alcançados. O melhor aproveitamento da capacidade produtiva da instalação, evitando a ociosidade produtiva, permite ao produtor diluir seus custos e buscar eficiência técnica, administrativa e econômica.
Economias de escala ( EE)
Os indicadores de retorno à escala (RE) e de economia de escala (EE) estão apresentados na Tabela 9.
TABELA 9. Elasticidade custo, retorno à escala e economia de escala para os estados estudados, agosto de 2000 a julho de 2001.
Para todos os estados observaram-se valores de retorno à escala maiores que a unidade, havendo, portanto, retornos crescentes à escala, confirmando os resultados obtidos para os custos totais e custos médios. Segundo os indicadores de economias de escala (EE), que se apresentaram positivos, as empresas estudadas estão operando com tamanhos de plantas que viabilizam a obtenção de economias de escala, conforme ilustrado na Figura 3.
O estado de Goiás apresenta possibilidade de ganhos em relação ao aumento do volume de produção. Os estados de Minas Gerais e de São Paulo possuem os menores indicadores de retorno à escala.
CONCLUSÕES
Neste trabalho, analisaram-se dados de 162 pecuaristas oriundos dos cinco principais estados produtores de leite. O período de estudo compreendeu de agosto de 2000 a julho de 2001.
O conhecimento das relações entre produção e custo e sua aplicação no gerenciamento da empresa rural permite melhorar a competitividade dos produtos agrícolas. O estudo das economias de escala propicia o conhecimento da eficiência com que são alocados os recursos produtivos.
Os indicadores empregados para a definição do perfil econômico das propriedades estudadas apontaram índices de produtividade por vaca em lactação superiores às médias de estudos anteriores, bem como à média nacional, sinalizando investimentos em insumos e manejo com vistas ao incremento da produtividade. Os indicadores econômicos também revelaram que os custos totais crescem a taxas decrescentes com o incremento da produção. As menores relações entre os custos fixos totais e os custos totais ocorreram exatamente naqueles estados com maior volume de produção.
A análise pela metodologia de centros de custos ainda evidenciou que, quando apurados somente os custos relacionados ao subsistema leite, os preços recebidos são suficientes para remunerar o produtor em todos os estados. Dentre os estados analisados, São Paulo foi o que apresentou os menores resultados.
O estado de Goiás, apesar, em termos relativos, do baixo volume de produção e da baixa produtividade, apresentou um custo significativamente semelhante àqueles estados com maiores volumes de produção. Tal situação, possivelmente, ocorre em virtude do menor custo de alguns fatores de produção disponíveis na região, compensando seu baixo desempenho produtivo. O estado de Minas Gerais foi aquele que apresentou a melhor remuneração para o pecuarista. Apesar de ter apresentado a segunda menor produtividade dentre os estados estudados, percebe-se que o alto volume de produção contribuiu para uma redução no custo total médio.
Ficou evidente a ocorrência de ganhos com a escala de produção, tendo em vista a redução dos custos médios para maiores níveis de produção, bem como os indicadores de rendimentos à escala crescentes e de economias de escala, indicando ganhos com o crescimento da produção. Os gastos com fatores de produção resultaram em maior volume de produção. Os resultados evidenciam que os casos estudados compõem-se de produtores que buscam maior eficiência produtiva e que, ainda, possuem possibilidades de ganho no que se refere a melhores combinação, alocação e aproveitamento dos recursos gerenciais e produtivos.
Comparando-se os retornos à escala entre os estados estudados, percebe-se que o estado de Goiás é o que apresenta maior possibilidade de ganhos em relação ao aumento do volume de produção e ao melhor aproveitamento dos fatores produtivos. O estados de Minas Gerais e de São Paulo possuem os menores indicadores de retorno à escala, indicando que estes estados encontram-se em um ponto no qual devem procurar melhorar os níveis de produtividade antes de buscarem aumentos dos níveis de produção.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALENCAR, E.; GRANDI, D. S.; ANDRADE, D. M.; ANDRADE, M. P. de. Complexos agroindustriais, cooperativas e gestão. Organizações Rurais e Agroindustriais, Lavras, v. 3, n. 2, p. 30-44, jul./dez. 2001.
FASSIO, L. H. Estrutura de custos e shut down point da produção leiteira: um estudo de Minas Gerais. 2004. 113p. Dissertação (Mestrado em Administração)-Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG
FERGUSON, C. E. Microeconomia. 20.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. 610p.
GOMES, S. T. A economia do leite. Coronel Pacheco: EMBRAPA-CNPGL, 1996. 140p.
GASTAL, E. Enfoque de sistemas na programação da pesquisa agropecuária. Rio de Janeiro: IICA, 1980. 207p.
LEITE, J. L. B.; GOMES, A. T. Perspectivas futuras dos sistemas de produção de leite no Brasil. In: GOMES, A. T.; LEITE, J. L. B.; CARNEIRO, A. V. (Ed.). O agronegócio do leite no Brasil. Juiz de Fora: EMBRAPA / CNPGL, 2001. p. 207-240.
MARQUES, V. M.; REIS, R. P.; SÁFADI, T.; REIS, A. J. dos. Custos e escala na pecuária leiteira: estudo de casos em Minas Gerais. Ciência e Agrotecnologia, Lavras, v. 26 n. 5, p. 1027-1034, set./out. 2002.
NICHOLSON, W. Microeconomic theory: basic principles and extensions. 7.ed. Fort Worth: Dryden, 1998. 821p.
REIS, R. P. Estrutura produtiva da pecuária leiteira sob condições de intervenção: um estudo de caso em Minas Gerais. 1992. 151p. Tese (Doutorado em Economia Rural)- Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG.
REIS, R. P.; MEDEIROS, A. L. e MONTEIRO, L. A. Custo de Produção da Atividade Leiteira na Região Sul de Minas Gerais. Organizações Rurais e Agroindustriais, Lavras, v. 3, n. 2, p. 45-54, jul./dez. 2001.
SERVIÇO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS DE MINAS GERAIS. FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. Relatório da pecuária leiteira do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1996. 2v.
SOUZA, D. P. H. de. Análise da estrutura de custo e preço de sobrevivência dos principais sistemas de produção de leite. 2000. 85p. Dissertação (Mestrado em Economia Rural)-Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG.
TUPY, O.; ALVES, E. R. de A.; ESTEVES, S. N.; SCHIFFLER, E. A. Método para controle e análise de custo de produção de leite. São Carlos: EMBRAPA PECUÁRIA SUDESTE, 2000. 35p. (Circular Técnica, 26)
VARIAN, H. R. Microeconomia: princípios básicos. 2.ed. Rio de Janeiro: Campus, 1994. 710p.
YAMAGUCHI, L. C. T. Custo de Produção do Leite: um novo enfoque. Boletim do Leite, Piracicaba, v.7. n.76, p. 1-2, jul. 2000.
YAMAGUCHI, L. C. T.; MARTINS, P. do C.; CARNEIRO, A. V. Produção de leite no Brasil nas três últimas décadas. In: GOMES, A. T.; LEITE, J. L. B.; CARNEIRO, A. V. (Ed.). O agronegócio do leite no Brasil. Juiz de Fora: EMBRAPA/CNPGL, 2001. p. 33-48
YAMAGUCHI, L. C. T.; MARTINS, P. do C.; CARNEIRO, A. V.; MACHADO, A. D. C. Custo de produção do leite: abrindo a caixa preta. Curvelo: Cooperativa Agropecuária de Curvelo. EMBRAPA/CNPGL, 2002. 72p.
ZOCCAL, R. Leite em números. In: GOMES, A. T.; LEITE, J. L. B. CARNEIRO, A. V. (Ed.). O agronegócio do leite no Brasil. Juiz de Fora: EMBRAPA/CNPGL, 2001. p. 241- 262.
***O trabalho foi originalmente publicado pela Embrapa Gado de Leite / Organizado pelo Centro de Inteligência do Leite (CILeite)