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Persistência da lactação de bovinos leiteiros

Publicado: 24 de maio de 2013
Por: Lenira El Faro Zadra (Pesquisadora em Melhoramento Genético de Bovinos Leiteiros / APTA Regional Centro Leste - Secretaria da Agricultura – SP)
A curva de lactação é a representação gráfica da produção de leite de uma vaca a partir do parto até a secagem, quando então o animal prepara-se para uma nova lactação. A curva de lactação de um animal é composta por três fases: ascendente, pico e descendente. A ascendente é a fase em que a produção de leite aumenta, até atingir o seu ponto máximo (o pico da lactação), para então, passar para a fase de declínio da produção de leite até o momento da secagem. A maneira que a produção de leite cai após o alcance do pico da lactação determina se a curva de um animal é persistente. É desejável que a queda na produção após o pico seja suave, ou seja, que haja maior persistência da lactação.
A persistência da lactação é o componente mais importante da curva de lactação (WOOD, 1967), do ponto de vista econômico. Estudos têm constatado que vacas com maior persistência e com produções na fase pré-pico menos acentuadas possuem uma necessidade energética mais constante e equilibrada durante toda a lactação, permitindo uma melhor utilização de alimentos e reduzindo assim, os custos de produção (DEKKERS et al., 1998). Espera-se que vacas com curvas de lactação menos inclinadas tanto na fase ascendente quanto após o pico estão sujeitas a menor estresses fisiológicos, minimizando a incidência de problemas reprodutivos e metabólicos, o que também pode contribuir com a redução dos custos de produção na propriedade (TEKERLI et al., 2000).
Existem algumas maneiras de mensurar a persistência da lactação mas, nos últimos anos os modelos de regressão aleatória (MRA) têm sido empregados para o seu cálculo (JAMROZIK et al., 1997; DEKKERS et al., 1998; ). Estes modelos têm sido propostos para a avaliação genética de bovinos leiteiros e permitem estimar valores genéticos, ou PTAs (Habilidade predita de transmissão, que é metade do valor genético) para a produção de leite na lactação ou para períodos da curva de lactação. A persistência e o pico da lactação são componentes da curva de lactação possíveis de serem estimados por meio de MRA.
Na Figura 1 é possível visualizar as curvas de lactação de três fêmeas. As vacas 1 e 2 possuem o mesmo nível de produção inicial e o mesmo pico de produção, mas a produção de leite da vaca 1 declina de forma mais acentuada que a produção da vaca 2. A vaca 1 possui, portanto, uma lactação menos persistente que a da vaca 2. Por outro lado, a vaca 3, possui um declínio suave da produção de leite após o pico de lactação, apresentando boa persistência, mas o nível de produção é baixo, o que não pode não ser interessante para alguns sistemas de produção.
Figura 1. Curvas de lactação de vacas com maior e menor persistência da lactação.
Persistência da lactação de bovinos leiteiros - Image 1
As avaliações genéticas para reprodutores da raça Gir Leiteiro vêm empregando os modelos de regressão aleatória para avaliar os animais para persistência desde o ano de 2011 (ABCZ, 2011, 2012). Nestas avaliações o pico e a persistência da lactação foram analisados por meio de um modelo de regressão aleatória considerando-se apenas as primeiras lactações das vacas. Um total de 74.471 controles leiteiros pertencentes a 10.510 animais foram considerados na análise. O modelo animal empregado para as análises considerou as trajetórias aleatórias genético aditiva e de ambiente permanente de animal, além dos efeitos fixos de grupo de contemporâneas e, como covariáveis, a idade da vaca ao parto (efeitos linear e quadrático) e os polinômios de Legendre do número de dias em lactação de quarta ordem (trajetória média). Foi considerada heterogeneidade de variância residual contendo três classes de variâncias. Os grupos de contemporâneas foram compostos por: rebanho em que a ordenha foi realizada, ano e estação do controle leiteiro. As trajetórias aleatórias de animal e de ambiente permanente foram modeladas por meio de polinômios de Legendre de ordens quatro e cinco, respectivamente. Os componentes de (co)variância para os coeficientes de regressão aleatória foram estimados pelo Método da Máxima Verossimilhança Restrita, usando-se o pacote Wombat, desenvolvido por MEYER (2008).
As estimativas de herdabilidade para as produções de leite são apresentadas na Tabela 1 e nos dão a ideia de como a seleção para a produção em cada controle pode trazer ganhos genéticos para a característica produção de leite nas diversas fases da lactação. As correlações genéticas entre as produções de leite nos diferentes períodos da lactação foram todas positivas e variaram de 0,63 a 0,99, sugerindo que a seleção para a produção em determinados controles deve proporcionar ganhos genéticos para todos os períodos da lactação, mas estes serão de magnitudes distintas.
Tabela 1. Estimativas de herdabilidade para as produções de leite no dia do controle de vacas da raça Gir leiteiro.
Persistência da lactação de bovinos leiteiros - Image 2
Apesar da complexidade da metodologia que, aparentemente seria de uso teórico, o interessante maior é que esta pode ser empregada na prática, podendo gerar valores genéticos para as produções de leite em determinadas fases da lactação, para a produção acumulada na lactação e para a persistência da lactação. Para a raça Gir e para as raças Zebuínas ou cruzadas, de maneira geral, a avaliação genética e a seleção para a persistência da lactação são de grande importância, pois estas raças caracterizam-se por apresentar curvas com picos ocorrendo bem próximos ao parto da vaca e com baixa persistência e, como consequência, a vaca tende a permanecer em lactação por um período menor que o desejável (305 dias).
Nessa aplicação prática dos modelos de regressão aleatória empregados para a raça Gir Leiteiro, foram preditas as PTAs para o pico e para a persistência de lactação. A PTA-Pico foi obtida por meio da média das PTAs preditas entre os 30 e os 60 dias de lactação, que é a fase onde ocorreu o pico de produção, de acordo com a curva média observada na raça Gir. Touros com maiores valores de PTA-Pico indicariam maior nível de produção na fase ascendente da curva de lactação.
A PTA-Persistência foi obtida por meio da soma dos desvios das PTA preditas para os dias 30 até 270 dias de lactação, em relação à PTA predita para o pico de produção:
 Persistência da lactação de bovinos leiteiros - Image 3
A PTA-Persistência indica como é a queda da produção de leite após o pico de produção. Assim, reprodutores com maiores valores de PTA-Persistência devem ser utilizados quando o objetivo de seleção for o aumento de persistência na lactação.
Como verificado pela Figura 1, a persistência da lactação é importante, desde que haja também o nível de produção de leite, evitando-se as curvas de animais como a vaca 1. No caso da raça Gir leiteiro, cabe ressaltar que o touro deve ter uma PTALeite, ou seja, uma avaliação positiva para a produção de leite, pois esta é que garante uma mudança no nível de produção do rebanho, mas que esta esteja aliada à uma alta persistência de lactação. Touros com altas PTA-Persistência não terão, necessariamente, altas PTA-Leite.
Como os produtores poderão interpretar os resultados? Como a PTA-Persistência é obtida por meio da soma dos desvios das PTAs para produção entre os 30 até os 270 dias de lactação em relação à PTA-Pico, quanto mais positivo e maior o valor da PTA-Persistência, mais lento é o declínio da produção de leite após o pico, ou seja, mais suave é o declínio da produção de leite após o pico.
Na Figura 2 são representadas as curvas de lactação genéticas de dois touros, obtidas por meio de modelo de regressão aleatória. Ambos os touros possuem PTALeite positivas e altas, garantindo assim nível de produção total na lactação, mas o touro Sansão possui uma PTA-Persistência bem maior, com uma curva genética com pico de produção maior e mais tardio do que o Touro2. Vale ressaltar que o touro Sansão tem sido considerado o melhor touro Gir dos últimos 10 anos, sendo o primeiro do rank do sumário de touros avaliados pela ABCZ para produção de leite e, mais recentemente, para a persistência da lactação. Ambos os touros são grandes produtores de leite, com avaliação genética positiva e alta para a produção de leite. Entretanto, a persistência da lactação de ambos é diferente, devido às curvas de lactação de suas filhas.
Figura 2. Exemplos de curvas de lactação genéticas de dois touros da raça Gir Leiteiro.
Persistência da lactação de bovinos leiteiros - Image 4
Em resumo, a persistência da lactação, apesar de sua importância econômica, tem sido uma característica de difícil mensuração. Países como o Canadá, a Holanda e a Alemanha, dentre outros, têm adotado os modelos de regressão aleatória para avaliar os reprodutores para a persistência. Para o Brasil isso é possível e viável, mas as raças zebuínas e cruzadas possuem particularidades em suas curvas de lactação e a avaliação para a persistência da lactação deve estar atrelada à avaliação para o volume de leite produzido na lactação, pois o nível de produção dos animais destas raças ainda passa por processo de seleção genética, ou seja, os produtores ainda buscam melhorar a produção de leite na lactação dos animais de seus plantéis.
O autor vem realizando pesquisas na APTA empregando os modelos de regressão aleatória para dados longitudinais de bovinos leiteiros desde 2001, participando das avaliações genéticas realizadas pela ABCZ (Associação Brasileira de Criadores de Zebu), para características produtivas e funcionais da raça Gir Leiteiro.
 
Referências
ABCZ. Sumário de Touros Raças Gir e Gir Mocha, aptidão Leiteira. 2011, 9a. edição. Uberaba - MG.
ABCZ. Sumário de Touros Raças Gir e Gir Mocha, aptidão Leiteira. 2012, 10a. edição. Uberaba - MG.
DEKKERS, J.C.M.; TEM HAG, J.H.; WEERSINK, A. Economic Aspects of Persistence of Lactation in Dairy Cattle. Livestock Production Science, 53:237-252, 1998.
Jamrozik, J., L. R. Schaeffer and J. C. M. Dekkers. Genetic evaluation of dairy cattle using test day yields and random regression model. J. Dairy Sci., 80:1217-1226. 1997.
Meyer K. WOMBAT: a tool for mixed model analyses in quantitative genetics by restricted maximum likelihood (REML). J Zhejiang Univ Sci B., 8(11):815-821. 2007.
Tekerli, M., Z. Akinci, I. Dogan and A. Akcan. Factors affecting the shape of lactation curves of Holstein cows from the Balikesir province of Tukey. J. Dairy Sci., 83:1381-1386. 2000.
WOOD, P.D.P. Algebraic model of the lactation curve in cattle. Nature. 216:164- 165, 1967.

***O trabalho foi originalmente publicado pela Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo. 
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