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Melhoria da qualidade do leite em propriedade leiteira: uma abordagem inicial

Publicado: 28 de outubro de 2011
Por: Luiz Francisco Zafalon; Marco Aurélio Carneiro M. Bergamaschi; Patricia Perondi Anchão Oliveira
Resumo
A sanidade animal deficiente é um dos fatores que afeta negativamente a qualidade do leite bovino. Dentre as doenças relacionadas com a qualidade do leite, a mastite é a mais importante por estar amplamente distribuída nos rebanhos e ser reconhecida como de erradicação impossível, dependendo da etiologia da doença. Este trabalho foi realizado para obter o diagnóstico de situação da doença em um rebanho bovino leiteiro, que é o passo inicial e fundamental para a adoção de medidas preventivas eficazes. Amostras de leite de 53 animais de um rebanho de 135 vacas em lactação foram investigadas quanto à presença de microrganismos. Houve a identificação de microrganismos causadores de mastite em 39 amostras (73,6%), enquanto que em 12 (22,6%) foram encontrados resultados negativos e em duas (3,8%) ocorreram contaminações. Staphylococcus aureus foram os microrganismos de maior ocorrência e apresentaram resistência in vitro a três princípios ativos. Todos os isolados foram resistentes à penicilina, enquanto 54% e 4% dos isolados foram resistentes à gentamicina e à ciprofloxacina, respectivamente. Os principais microrganismos identificados como causadores de mastite foram os de origem contagiosa. A partir destes resultados, medidas de controle contra a doença podem ser propostas para atuar sobre as fontes de infecção e a transmissibilidade dos patógenos, com a detecção de animais doentes e o tratamento adequado, quando conveniente.
Abstract
Imperfect animal health is one of many factors that can affect negatively milk quality. Among diseases related to milk quality, mastitis is considered the most important because of its wide distribution among herds and the impossibility of eradication, depending on the etiology of infection. The objective of this study was to make a survey of mastitis situation in a dairy herd, which is the first and fundamental step in order to take preventive actions. Milk samples from 53 animals from a herd of 135 milking cows were investigated for the presence of microorganisms. Mastitis causing bacteria were identified in the 39 milk samples (73.6%), while results were negative for 12 samples (22.6%) and contaminations occurred in two samples (3.8%). Staphylococcus aureus were the microorganisms with higher occurrence in the milk samples and presented in vitro resistance to three antimicrobials. All isolates were resistant to penicillin, while 54% and 4% were resistant to the gentamicin and ciprofloxacin, respectively. The major etiological agents identified as cause of mastitis were contagious microorganisms. From these results, measures to control the disease can be propose to act upon infection sources and pathogen transmissibility, detecting and treating mastitic cows, when pertinent.
Introdução
O leite é considerado o mais nobre dos alimentos pela sua composição rica em proteínas, gorduras, carboidratos, sais minerais e vitaminas. Segundo Noal (2006), é o sexto produto agropecuário brasileiro, com uma produção de vinte e três bilhões de litros em 2003, que coloca o Brasil como o sexto maior produtor mundial e equivale a aproximadamente 66,5% do volume de leite produzido pelos países do Mercosul.
O processamento térmico do leite não resulta em melhoria nas suas características quando ele é obtido de forma inadequada na sua fonte de produção. Medidas para assegurar a qualidade e a segurança do leite e dos derivados devem ser iniciadas na fazenda e, para isso, é necessária a adoção de boas práticas de produção. Entretanto, certos procedimentos, quando adotados de forma inadequada ou ignorados resultam em risco para a saúde do consumidor, como os perigos químicos representados, dentre outros, pelo emprego disseminado de antimicrobianos no tratamento da mastite, sem obediência aos períodos de carência (BRITO et al., 2004).
A mastite é uma inflamação da glândula mamária e estima-se que 90 a 95% dos seus casos tenham origem infecciosa (DOMINGUES e LANGONI, 2001). A doença apresenta-se sob duas formas, a clínica, na qual os sintomas são evidentes e a sua visualização é facilmente identificável (BRITO e BRITO, 1998); e a subclínica, em que não há sinais aparentes de sua presença, sem alterações no leite ou no úbere do animal. A forma subclínica da doença é de prevalência superior e pode se espalhar no rebanho, o que causará prejuízos ao produtor e comprometerá a qualidade do leite e a saúde do animal (FONSECA e SANTOS, 2000). Além disso, é responsável por aproximadamente 70% das perdas relacionadas com a mastite e reduz a secreção de leite em até 45% (HARMON, 1994).
Além da redução na produção de leite e das alterações na sua composição, o que caracteriza a mastite subclínica é o aumento na contagem de células somáticas (CCS). Há também o aumento nos teores de proteínas séricas, diminuição nos teores de caseína, lactose, gordura e cálcio do leite, com alteração de rendimento na produção de derivados lácteos e redução do tempo de prateleira do produto final (GIANOLA et al., 2004; NIGHTINGALE et al., 2008).
Nos casos de mastite infecciosa os patógenos estão divididos em dois grupos: contagiosos e ambientais. Os contagiosos são aqueles em que a própria vaca é a fonte de infecção, e os patógenos se instalam no canal do teto, na glândula mamária ou sobre a pele para se multiplicarem. Os patógenos ambientais são chamados oportunistas e estão presentes no ambiente em que o animal vive. De acordo com Harmon (1994), os principais agentes causadores da mastite subclínica em bovinos são: Staphylococcus aureus, Streptococcus agalactiae, coliformes, Streptococcus spp., enterococos, Pseudomonas spp., Arcanobacterium pyogenes, Serratia spp., estafilococos coagulase negativa e Corynebacterium bovis. As bactérias do gênero Staphylococcus são as mais frequentemente responsabilizadas pela mastite (LANGONI, 2007).
Um dos fatores considerados para o controle das mastites é a resistência dos agentes etiológicos aos antimicrobianos. O sucesso na terapia é prejudicado pelo crescente número de estirpes resistentes aos medicamentos usados. Uma vez que a terapia com antimicrobianos está entre as principais condutas para controlar a mastite, é fundamental que o produtor solicite periodicamente levantamentos de suscetibilidade antimicrobiana dos principais microrganismos isolados dos casos da doença nos rebanhos. Em algumas ocasiões, a não efetivação de tratamento pode proporcionar a manutenção de fontes de infecção no rebanho, fato esse que poderia acarretar futuramente um maior comprometimento da qualidade e da quantidade de leite produzido (ZAFALON e NADER FILHO, 2006). Além disso, a prevenção de novos casos de mastite requer o conhecimento de aspectos sobre a higiene do ambiente, os procedimentos de ordenha, os microrganismos responsáveis pela doença e as pessoas que se envolvem com os animais e com o manejo (HOE e SORIANO, 2006).
Este trabalho teve como objetivo efetuar um diagnóstico de situação epidemiológica para verificar os principais microrganismos envolvidos na etiologia infecciosa da mastite subclínica de vacas em lactação de um rebanho leiteiro de manejo típico da região central do Estado de São Paulo. Além disso, objetivou-se determinar os perfis de resistência in vitro dos patógenos isolados. Tais informações são fundamentais para estabelecer a conduta futura relacionada aos procedimentos de controle de qualidade do leite e de boas práticas de produção.
Material e Métodos
O diagnóstico de situação foi realizado no Setor de Produção de Leite da Embrapa Pecuária Sudeste em São Carlos, SP, cujas coordenadas geográficas são latitude sul 22º 01' e longitude oeste 47º 53', altitude média de 856 m acima do nível do mar, temperatura média anual entre 16,3oC e 23ºC e precipitação média anual de 1.502 mm. O rebanho em lactação era formado por 135 vacas da raça Holandesa que foram mantidas em pastagem de capim mombaça e tanzânia e, na época das águas, receberam concentrados conforme o nível de produção, desde que essa fosse superior a 10 litros, duas vezes ao dia. Durante o período de seca e na dependência de suas necessidades, as vacas receberam suplementos com silagem de milho ou cana-de-açúcar e concentrado. Além da ingestão forçada de suplementos minerais no concentrado, foi fornecida água à vontade.
Os procedimentos de manejo de ordenha utilizados no rebanho, previamente às colheitas das amostras, foram: descarte dos primeiros jatos de leite, lavagem dos tetos com posterior higienização com os produtos disponíveis à base de cloro e secagem com papel toalha. Após a ordenha, os tetos dos animais foram higienizados com produtos à base de iodo ou de clorexidina, em concentrações recomendadas pelos fabricantes. A ordenha foi efetuada em sistema mecânico de circuito fechado, duas vezes ao dia, com início às 4 h e às 16 h. A produção média de leite por vaca, no período do experimento, foi de 20 kg.
Para as colheitas de amostras de leite destinadas aos exames microbiológicos, selecionou-se um total de 53 animais com diferentes contagens de células somáticas, superiores e inferiores a 200.000 células/mL de leite. O leite para a CCS foi colhido a partir de uma amostra representativa da produção total do animal na primeira ordenha do dia, em frascos de 60 mL com uma ou duas pastilhas de bronopol. Essas amostras foram enviadas a laboratório pertencente à Rede Brasileira de Laboratórios de Qualidade do Leite para a contagem celular por citometria de fluxo, com o equipamento Somacount 300®.
Alíquotas de leite foram colhidas assepticamente para o exame microbiológico, de acordo com os procedimentos recomendados pelo National Mastitis Council (HARMON et al., 1990). Assim, para cada animal selecionado, após a limpeza do óstio papilar de cada teto com álcool etílico 70% (v/v) foram colhidos em torno de 10 mL de leite em tubos de ensaio esterilizados, com o cuidado de retirar quantidade igual de leite de cada quarto mamário. Essas amostras foram encaminhadas imediatamente aos laboratórios da Embrapa Pecuária Sudeste para o isolamento e a identificação de bactérias.
No laboratório, 10 microlitros de cada amostra de leite foram semeados sobre a superfície de placas de Petri com ágar acrescido de sangue de ovinos a 5%. Após a incubação a 37oC durante 24 a 72 horas, os microrganismos foram identificados (HARMON et al., 1990) de acordo com os procedimentos descritos a seguir.
As colônias classificadas como cocos Gram-positivos, dispostos ou não sob a forma de cachos de uva foram submetidas às provas da catalase e da coagulase lenta com plasma de coelho (HOLMBERG, 1973). As cepas catalase e coagulase positivas foram, então, submetidas à prova para verificação da produção de acetoína e utilização ou não da maltose e da trealose. As amostras que se mostraram positivas a essas provas foram classificadas como Staphylococcus aureus (HOLT et al., 1994).
As colônias que, semeadas em ágar sangue e incubadas a 37oC por 24 ou 48 horas, apresentaram-se pequenas, lisas, translucentes, com formato de cone, circundadas ou não por uma zona esverdeada ou clara de eritrócitos descoloridos ou células lisadas, respectivamente, reconhecidas como cocos Gram-positivos arranjados em cadeias, quando subcultivados em meio líquido e negativas à prova da catalase foram identificadas como pertencentes ao gênero Streptococcus (INTERNATIONAL DAIRY FEDERATION, 1981; HARMON et al., 1990; KONEMAN et al., 2001).
As colônias que evidenciaram formas circulares, brancas, cremes ou opacas em ágar sangue, após 48 horas de incubação a 37oC, reconhecidas como bastonetes Gram-positivos pleomórficos que se apresentaram sob a forma de paliçada e “letras chinesas” foram submetidas à prova da catalase e verificação da produção de hemólise para diferenciação entre Corynebacterium spp. e Arcanobacterium pyogenes (ZAFALON, 2003).
Colônias que se mostraram cinzas e grandes após 24 horas de incubação a 37oC em ágar sangue e reconhecidas como bastonetes Gram-negativos foram semeadas em ágar Eosin Methylene Blue (EMB). Em EMB, os coliformes produzem colônias fermentadoras de lactose negras ou que possuem centros escuros com periferias transparentes incolores, enquanto as não fermentadoras de lactose são incolores (HARMON et al., 1990; KONEMAN et al., 2001).
Testes de sensibilidade in vitro foram realizados, a partir da técnica de difusão em disco em placas de ágar Mueller-Hinton frente a 12 antimicrobianos representados pela rifampicina (30 μg), cloranfenicol (10 μg), vancomicina (30 mg), clindamicina (2 μg), eritromicina (15 μg), penicilina (10 UI), oxacilina (1 mg), cefepima (30 μg), tetraciclina (30 μg), gentamicina (10 μg), ciprofloxacina (5 μg) e sulfametoxazol (25 μg). Decorridas 24 horas de incubação a 35oC foi realizada a aferição dos halos de inibição formados em torno dos respectivos princípios ativos, segundo o National Committee for Clinical Laboratory Standards (NCCLS, 2005).
Resultados e discussão
Informações sobre as doenças de animais e os patógenos que podem ser transmitidos ao consumidor por meio da ingestão do produto são fundamentais para a montagem de esquemas de controle e de medidas preventivas contra os agentes infecciosos envolvidos. A análise do leite secretado por vacas em lactação objetiva determinar o estado sanitário desses animais. Um diagnóstico de situação da mastite no rebanho, em conjunto com o estudo dos principais agentes bacterianos causadores da doença, estão entre as medidas fundamentais para alcançar a melhoria da qualidade do leite em uma propriedade. Para o controle da doença, informações preliminares precisam ser de conhecimento do produtor de leite e de técnicos para que medidas iniciais de controle possam ser tomadas.
Neste trabalho, das 53 amostras de leite analisadas, houve identificação de microrganismos em 39 (73,6%) das amostras, enquanto que em 12 (22,6%) foram encontrados resultados negativos e em duas (3,8%) ocorreram contaminações. Todos os casos de mastite foram subclínicos.
S. aureus foi o microrganismo de maior ocorrência nas amostras de leite dos animais investigados no rebanho. Isoladamente, ele foi encontrado em 25,5% (13/51) das amostras e, dentre as associações de microrganismos identificadas, o S. aureus estava presente em 80% (12/15) delas (Figura 1). Dentre as amostras de leite que apresentaram isolamentos microbiológicos, em 29,4% (15/51) houve isolamento de mais de um tipo de microrganismo. A ocorrência de S. aureus foi superior à dos demais microrganismos, com 25 isolamentos de um total de 54 (46,3%) (Figura 2). S. aureus também foi o patógeno mais encontrado por Reis et al. (2003) em vacas com mastite subclínica, correspondendo a 23,0% do total de isolamentos. Entretanto, Brito et al. (1999), ao analisarem 6.315 amostras de leite de vacas em lactação, detectaram Corynebacterium spp. como o microrganismo mais isolado.
Houve o isolamento de microrganismos do gênero Corynebacterium em 13 (24,1%) amostras de leite (isoladamente e em conjunto), de estafilococos coagulase negativa em 8 (14,8%) e de Streptococcus spp. em 6 (11,1%) (Figura 2). Assim como o S. aureus, todos esses microrganismos são de origem contagiosa. Nessa forma da doença, os episódios são geralmente subclínicos e a fonte primária dos agentes é a própria glândula mamária das vacas infectadas, com os seus respectivos quartos mamários. Nesses casos, a disseminação no rebanho ocorre durante a ordenha, transmitindo-se o agente de um quarto infectado para os outros sadios, seja pelas mãos do ordenhador ou por panos, esponjas de uso múltiplo ou copos das teteiras, quando a ordenha é mecânica (LANGONI, 2007).
Na forma subclínica e contagiosa, a contagem mensal de células somáticas dos animais do rebanho é uma atividade rotineira para identificar as infecções e, às vezes, há relação entre o padrão mensal de contagem e os microrganismos causadores da doença. Nos casos de mastites contagiosas, o aumento do número de lactações do animal pode intensificar a elevação do número de células somáticas (RODRIGUES et al., 2007).
Melhoria da qualidade do leite em propriedade leiteira: uma abordagem inicial - Image 1
Melhoria da qualidade do leite em propriedade leiteira: uma abordagem inicial - Image 2
Naqueles animais em que foram isolados microrganismos a partir das amostras de leite, verificou-se média de CCS igual a 635.000 células/ mL de leite nas amostras com isolamento de S. aureus. As médias de CCS em animais nos quais estafilococos coagulase negativa, Corynebacterium spp e Streptococcus spp foram isolados foram de 560.000, 500.000 e 445.000 células/mL de leite, respectivamente (Figura 2). Apesar de valores médios próximos, dentre esses três grupos de microrganismos houve maior isolamento de corineformes, como já mencionado anteriormente.
Na interpretação dos resultados deve-se levar em consideração que as altas contagens de células somáticas relacionadas com estafilococos coagulase positiva e com bactérias do grupo coliforme (1.380.000 e 2.360.000 células / mL, respectivamente) (Figura 2) são originadas de associações com Corynebacterium spp e Streptococcus spp, respectivamente, o que torna difícil responsabilizar unicamente determinado microrganismo por estas contagens. Além disso, contagens superiores relacionadas com outros microrganismos também ocorreram, porém os dados estão representados por médias geométricas que demonstraram ser inferiores, pelo fato de mais de um animal estar acometido por esses microrganismos, o que pode dar uma falsa impressão de que eles afetam de maneira menos grave a glândula mamária.
O controle de infecções causadas por S. aureus, um dos principais agentes etiológicos responsabilizados pela mastite, segue os princípios gerais recomendados para o controle da forma contagiosa da doença. Quando realizado com a cooperação do gerente ou do dono da propriedade e dos ordenhadores, pode ser garantia de sucesso, com um declínio de novas infecções intramamárias seguido por um período regular, que dura aproximadamente seis meses, após o qual o número de novas infecções pode ser influenciado pelos exames de vacas secas e novilhas, que antes não estavam na linha de ordenha.
Podem ser citados como pontos principais em programas de controle de infecções intramamárias por S. aureus: mudança na sequência de ordenha para a retirada do leite de vacas doentes por último; segregação das vacas infectadas; amostragem de leite de quartos individuais para o diagnóstico de S. aureus; terapia da vaca seca; terapia dos animais em lactação, restringida em animais nos primeiros 60 dias em lactação e para vacas com menos de quatro lactações (ZECCONI e PICCININI, 1999).
Hoe e Soriano (2006) destacam cinco pontos para reduzir os níveis de mastite subclínica nos rebanhos, quando causada por S. aureus, S. agalactiae, S. dysgalactiae, S. uberis, estafilococos coagulase negativa e micoplasmas, que são: boa higiene de ordenha; rápido tratamento de casos de mastite clínica com antimicrobianos; tratamento em todas as vacas que secam com antimicrobiano apropriado; higienização dos tetos após a ordenha; manutenção regular do equipamento de ordenha.
O Corynebacterium bovis, apesar de ser considerado um “patógeno menor” e com baixa virulência, pode produzir elevação significativa da CCS, além de determinar quadros clínicos da doença e surtos de mastite subclínica. O tipo de mastite causada pelo C. bovis é a contagiosa, pois a transmissão ocorre principalmente no momento da ordenha. C. bovis foi isolado com alta frequência da superfície e da extremidade dos tetos de vacas com infecção antes e após a ordenha, o que mostra a eliminação do agente pelos quartos infectados e a possibilidade de contaminação de quartos mamários não infectados (ZANI e COSTA, 2005).
No presente estudo, em 12 animais os resultados microbiológicos foram negativos, apesar de nove deles apresentaram a CCS superior a 200.000 células/mL (média de 630.000 células/mL). Entre as causas da ausência de isolamentos, pode-se mencionar a possibilidade de microrganismos serem eliminados intermitentemente ou serem eliminados em baixas concentrações; a não detecção dos agentes etiológicos infecciosos por exames bacteriológicos usuais; a influência de enzimas e proteínas lácteas como a lisozima e lactoferrina, que podem dificultar a detecção do patógeno; e a presença de endotoxinas bacterianas e compostos bioativos, liberados por células inflamatórias que podem prejudicar a sobrevivência bacteriana (NUNES et al., 2008).
Os perfis de resistência dos agentes mais isolados no rebanho, S. aureus e de Corynebacterium spp., estão apresentados nas Tabelas 1 e 2, respectivamente.
S. aureus apresentaram resistência in vitro a três princípios ativos. Todos os isolados foram resistentes à penicilina, enquanto 54% e 4% dos isolados foram resistentes à gentamicina e à ciprofloxacina, respectivamente. Resultados semelhantes foram observados por Nader Filho et al. (2007), ao estudarem 72 cepas de Staphylococcus aureus isoladas de casos de mastite bovina clínica e subclínica, quando detectaram que a penicilina foi o fármaco menos eficiente, com apenas 2,8% das amostras sensíveis.
Melhoria da qualidade do leite em propriedade leiteira: uma abordagem inicial - Image 3
Dentre os princípios ativos testados contra Corynebacterium spp., todos os isolados demonstraram sensibilidade à rifampicina, à eritromicina, à vancomicina e ao cloranfenicol, enquanto 8% dos isolados apresentaram resistência à tetraciclina e à gentamicina (Tabela 2).
Melhoria da qualidade do leite em propriedade leiteira: uma abordagem inicial - Image 4
Apesar do tratamento alopático da mastite subclínica com antimicrobianos não ser comumente realizado durante a lactação, existem casos em que esse tipo de terapia é indicado, principalmente quando a redução da qualidade do leite leva à rejeição da matériaprima pela indústria. Deve-se considerar a relação custo/benefício do tratamento, além da necessidade de se efetuar o mesmo de forma adequada e com higiene (ZAFALON, 2003). Além disso, testes para examinar a suscetibilidade dos agentes bacterianos envolvidos com os casos de mastite são fundamentais.
Em programas de controle da mastite recomenda-se, em uma primeira visita ao rebanho, definir o problema, os fatores envolvidos, planejar e implementar mudanças de manejo e ferramentas de monitoramento. É importante fazer uma reunião com o produtor, conhecer a propriedade e observar as práticas de ordenha. Deve-se fazer um inventário de medidas já tomadas, caso tenham ocorrido, e os efeitos que apresentaram sobre o rebanho. As observações durante a ordenha objetivam o registro das atuais práticas e dos aspectos de higiene, assim como a verificação do comportamento das vacas. Em conjunto com o ordenhador ou o responsável pela ordenha, devem ser discutidas a maneira como os tratamentos contra a mastite são realizados, a necessidade de descartes no rebanho e a situação para a reposição de animais. A CCS do tanque é influenciada positivamente quando são descartadas vacas com elevadas contagens. Medidas preventivas como a desinfecção do teto após a ordenha não funcionarão para reduzir a CCS do leite de conjunto de uma propriedade, se no rebanho permanecerem vacas com altas contagens celulares, não curadas ou não descartadas. Como exemplo para o descarte de animais, se 50% do rebanho é de novilhas, a maioria das bezerras não é vendida e a sua mortalidade não é alta, então 25% das vacas poderão ser descartadas anualmente (INTERNATIONAL DAIRY FEDERATION, 2007).
A intervenção de um técnico em uma propriedade leiteira deve estar fundamentada em reduzir as novas infecções intramamárias; reduzir as durações das infecções; e reduzir a taxa de incidência de mastite clínica. Devem-se evitar mudanças bruscas no manejo, e as recomendações devem ser feitas de acordo com a facilidade de implementação; os efeitos da mudança; e o custo. Deve-se dar prioridade a condutas mais fáceis e menos onerosas e que podem ter grande efeito, como a correta higienização pós-ordenha. E na maioria das propriedades, evitar um número excessivo de recomendações. A adoção dessas recomendações e os seus efeitos precisam ser avaliados e, em casos de mudanças da situação existente, ajustes técnicos podem ser necessários.
Conclusões
A ocorrência de agentes infecciosos como S. aureus e Corynebacterium spp. foi alta, o que mostra a importância desses patógenos na etiologia da mastite subclínica contagiosa em bovinos, também no rebanho estudado. Medidas de controle contra a doença podem ser propostas para atuar sobre a fonte de infecção, como a detecção de animais doentes e o tratamento adequado, efetuado a partir dos resultados de exames microbiológicos para identificação dos agentes causadores e da análise dos seus respectivos perfis de resistência a antimicrobianos.
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Luiz Francisco Zafalon
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Comentário
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Marcos Goulart Pereira
23 de enero de 2012
Prezados Autores Saudações Parabens pelo artigo. Caso seja possivel, existem divergencias quanto ao uso do antibiograma para a conduta terapeutica, pois os padrões empregados diferem da rotina veterinaria, por serem padrões para humanos. Na vivencia prática, qual a abordagem que um profissional de campo deve assumir? Obrigado,
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