INTRODUÇÃO
A pecuária de corte no Brasil Central caracteriza- se por dois períodos distintos. Um denominado período das águas que normalmente estende-se de outubro a março, na qual há condições favoráveis de temperatura e umidade para um bom desenvolvimento das pastagens possibilitando um bom desempenho dos animais, e outro denominado período das secas abrangendo os meses de abril a setembro na qual há um declínio acentuado na produção e valor nutritivo das pastagens, ocasionando perda de peso dos animais, aumentando a idade de abate.
Nessa época de escassez de forragens, algumas alternativas de alimentação do rebanho podem ser utilizadas visando minimizar os efeitos prejudiciais para um bom desempenho dos animais. Dentre elas, o uso da cana-de-açúcar é uma das mais utilizadas devido a algumas características dessa gramínea que tornam viável sua utilização, ou sejam: grande produção de forragem por unidade de área, baixo custo por quilo de matéria seca produzida, pico de produção no período seco do ano, não perde seu valor nutritivo com o avanço da maturidade e é amplamente cultivada no Brasil Central. Embora apresentando essas vantagens, a sua utiliza ção na prática é feita visando somente o fornecimento de matéria seca em uma época de escassez de forragem para manter o peso vivo ou evitar perdas de animais. Quando o seu uso visa um aumento na produção de carne ou leite, algumas medidas devem ser tomadas para que dietas a base de canade- açúcar preencham as exigências nutricionais dos animais.
Os teores muito baixos de proteína e minerais e o alto teor de fibra de baixa degradação ruminal seriam os principais fatores limitando a produção animal em dietas básicas de cana-de-açú- car (PRESTON, 1977). O teor de minerais na dieta pode ser facilmente corrigido com suplementação mineral, enquanto que o teor de proteína pode ser corrigido utilizando-se fontes de nitrogênio não protéico e/ou suplemento protéico.
Possuindo em sua composição um alto teor de carboidratos prontamente fermentescíveis, o uso de nitrogênio não protéico, principalmente na forma de uréia, tem sido amplamente utilizado para adequar o teor de proteína bruta dessa forrageira. No entanto, para um desempenho adequado dos animais visando maior produção de carne, somente o fornecimento de fontes de nitrogênio não protéico seria limitante, sendo necessário o fornecimento conjunto de suplementos ou concentrados com fontes de proteína vegetal.
O melhor desempenho de bovinos confinados alimentados com dietas básicas de cana-de-açúcar misturadas ou não com fontes de nitrogênio não protéico foi verificado quando se fez a suplementação com farelos de polidura de arroz, trigo, algodão e soja ou concentrados balanceados com milho moído e farelos de origem vegetal (LENG e PRESTON, 1976; LOPEZ e PRESTON, 1977; PATE, 1981; MELO, 1983; MOREIRA et al., 1987).
Os resultados de digestibilidade da matéria seca variando de 55 a 65%, indicam que a cana-de-açúcar pode ser considerada como um alimento de média a média-alta qualidade. Em estudo de digestibilidade comparando diversas forrageiras, MELOTTI, (1972) encontrou em ensaios com bovinos, coeficiente de digestibilidade da matéria seca de 62,8% para a cana forrageira, variedade IAC 3625. A composição química bromatológica apresentou baixos teores de proteína bruta (2,7%) e matéria mineral (3,7%) e altos teores de fibra bruta (26,7%) e extrativo não nitrogenado (63,4%).
PATE (1977) estudando o efeito da maturidade da cana-de-açúcar sobre o seu valor nutritivo, verificou um aumento no teor de matéria seca e conteú- do celular e um decréscimo no teor de proteína bruta, fibra bruta e digestibilidade da fibra bruta com o avanço do estágio de maturidade. A digestibilidade da matéria orgânica variou muito pouco, passando de 55,5% na primeira amostragem para 60,6% na última amostragem após 336 dias de crescimento. A digestibilidade ?in vitro? da fibra detergente neutro (FDN) diminuiu de 50,7% para 24,8% entre a primeira e a última amostragem. Esse decréscimo foi compensado pelo aumento do conteúdo celular que é uma fração altamente digestível, explicando a baixa alteração ocorrida na digestibilidade da matéria orgânica. PEREIRA et al. (2001) encontraram valores de 53,85 e 45,31% para a digestibilidade aparente da matéria seca utilizando bovinos alimentados com dietas à base de cana-de-açúcar suplementadas, respectivamente, com uréia ou cama de frango como fonte de proteína.
Quanto ao balanço de nitrogênio, alguns trabalhos mostram que o mesmo é positivo em bovinos recebendo dietas a base de cana-de-açúcar suplementadas com fontes protéico/energéticas de origem vegetal (MANZANO, 1982; BOIN et al., 1983; PATE et al., 1985; PEREIRA et al., 2001).
Neste sentido, o presente trabalho teve como objetivo estudar o efeito de diferentes suplementos na digestibilidade, balanço de nitrogênio e no desempenho de bovinos alimentados com dietas básicas de cana-de-açúcar.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi conduzido na Estação Experimental Central do Instituto de Zootecnia em Nova Odessa e constou de dois experimentos: um de digestibilidade e balanço de nitrogênio e o outro de desempenho em confinamento. Em ambos foram utilizados bovinos na fase de crescimento, machos castrados, 5/8 europeu x 3/8 zebu, com peso mé- dio de 275,0 e 190,0 kg e idade média de 26 e 20 meses, para o ensaio de digestibilidade e de desempenho, respectivamente. Os ensaios foram constitu ídos dos seguintes tratamentos: 1 ? cana-de-açúcar + farelo de soja; 2 ? cana-de-açúcar + uréia/sulfato de amônia + farelo de arroz; 3 ? cana-de-açúcar + uréia/sulfato de amônia + concentrado A; 4 ? canade- açúcar + uréia/sulfato de amônia + concentrado B. As dietas foram balanceadas para apresentarem 12% de proteína bruta na matéria seca.
Durante o período experimental os animais receberam sal mineral à vontade.
A relação uréia/sulfato de amônia foi de 9:1 (9,0 gramas de uréia/1,0 grama de sulfato de amônia por kg de cana fresca). Os concentrados nos tratamentos 3 e 4 foram balanceados, respectivamente, com rolão de milho (79,8%) + farelo de soja (20,2%) e rolão de milho (49,8%) + farelo de soja (20,2%) + quirera de arroz (30,0%) de modo a apresentarem teor de proteína bruta semelhante ao do farelo de arroz. A quantidade de farelo de soja no tratamento 1 foi calculada considerando a porcentagem de matéria seca e a ingestão da cana-de-açúcar, e o teor de proteína do farelo de soja. A quantidade de farelo de arroz e dos concentrados nos tratamentos 2, 3 e 4 foram os mesmos do farelo de soja para o tratamento 1. As dietas foram mantidas isoproteíças adicionando a mistura uréia/sulfato de amônia a canade- açúcar.
No ensaio de digestibilidade e balanço de nitrog ênio foram usados oito animais em um delineamento em quadrado latino (2 quadrados, 4 x 4, oito animais) e o método de coleta total de fezes e urina, em gaiolas metabólicas. Foi conduzido em 4 períodos de 30 dias, sendo a coleta de alimento oferecido, sobras, fezes e urina feita nos últimos nove dias de cada período. Nos primeiros 21 dias os animais permaneciam em baias individuais com bebedouros automáticos e cochos de alvenaria nos quais foi fornecido o alimento e a mistura mineral. Após 21 dias de adaptação as dietas experimentais, foram pesados e colocados nas gaiolas para a coleta. A quantidade de alimento oferecida foi o suficiente para ocorrer pequena sobra (aproximadamente 5% do oferecido). No final do período de coleta os animais foram pesados após jejum completo de 18 horas. As amostras de alimentos, sobras, fezes e urina foram coletadas diariamente, armazenadas em congelador e combinadas no final de cada período. As amostras compostas de alimento, sobras e fezes foram secas em estufa com ventilação forçada a 65o C e moídas em moinho de martelos com peneira de 1 mm. A urina foi coletada em baldes plásticos, acidificada e pesada diariamente para cada animal, homogeneizada e retirada uma alíquota de 5% do total. Essas alíquotas foram colocadas em vidros e armazenadas em congelador. Após o período de coleta foram descongeladas, combinadas por animal, homogeneizadas e subamostradas, sendo feita a determina ção de nitrogênio. A quantidade de farelo de soja no tratamento 1 foi calculada considerando a porcentagem de matéria seca e a ingestão da canade- açúcar, e o teor de proteína do farelo de soja.
No ensaio de ganho de peso vivo foram utilizados 36 animais distribuídos em doze baias (três animais/ baia) em um delineamento em blocos ao acaso com quatro tratamentos e três repetições. As quantidades dos farelos e dos concentrados foram calculadas como descrito para o ensaio de digestibilidade, sendo as correções feitas semanalmente. A quantidade diária de alimentos e das sobras fornecida aos animais era pesada e anotada. Amostras semanais da cana-de-açúcar exclusiva ou pulverizada com a mistura uréia/sulfato de amô- nia e das sobras foram coletadas e combinadas por período de 28 dias. Os ingredientes que compunham a ração concentrada bem como os farelos de soja e arroz e os respectivos concentrados foram amostrados por ocasião da batida da ração. O volumoso foi fornecido duas vezes ao dia (8:00 e 15:00horas) enquanto que os farelos de soja e arroz e os concentrados foram fornecidos uma única vez pela manhã visando forçar os animais a uma ingestão completa dos mesmos. Os animais foram pesados no inicio e a intervalos de 28 dias após jejum completo de 18 horas. O experimento teve a duração de 107 dias, após um período preliminar de 30 dias, durante o qual os animais em cada tratamento receberam as respectivas dietas experimentais visando uma melhor adaptação, receberam vermífugo e foram vacinados contra a febre aftosa. As análises dos alimentos foram feitas usando-se os métodos descritos no A.O.A.C. (1984).
A análise de variância foi feita utilizando-se o modelo estatístico SAS (1979). As médias dos tratamentos foram comparadas pelo teste de Tukey (5%).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na Tabela 1 encontra-se a composição química bromatológica dos ingredientes e das dietas experimentais.
O teor de matéria seca da cana-de-açúcar (28,69%) é semelhante aos encontrados por CREEK et al. (1976) e PATE (1981). Quando foi feita a adi- ção da solução aquosa de uréia/sulfato de amônia houve um decréscimo no teor de matéria seca (26,14%).
A adição da mistura uréia/sulfato de amônia elevou o teor de proteína bruta da cana-de-açúcar de 2,92% para 11,11%, como pode ser observado na Tabela 1. O farelo e a quirera de arroz apresentaram teores de amido de 38% e 70%, respectivamente, na matéria seca. Os teores de extrato etéreo foram semelhantes entre os suplementos, com exce- ção do tratamento 2 que foi maior devido ao alto teor desse componente no farelo de arroz.
Na Tabela 2 encontram-se os resultados médios do ensaio de digestibilidade.
Observando os dados da Tabela 2 verifica-se que o consumo de matéria seca da cana-de-açúcar não foi influenciado pelo tipo de suplemento utilizado.
O consumo médio de matéria seca das dietas foi de 6,4 kg/animal/dia, superior ao encontrado por PATE et al. (1985) trabalhando com dietas nas quais a cana-de-açúcar perfazia 70% da matéria seca total da dieta e 56% do nitrogênio total era proveniente da uréia. No presente experimento a proporção de matéria seca da cana-de-açúcar nas dietas experimentais foi aproximadamente de 80%, sendo que em média 57% do nitrogênio total era proveniente da mistura uréia/sulfato de amônia.
O consumo de matéria seca em porcentagem do peso vivo apresentou diferença significativa entre as médias das dietas dos tratamentos 2 e 4 (P< 0,05), enquanto as dos tratamentos 1 e 3 apresentaram consumos intermediários não diferindo das demais. O resultado obtido com a dieta do tratamento 2 é semelhante ao obtido por MELO (1983) trabalhando com novilhas leiteiras alimentadas com dieta a base de cana-de-açúcar e uréia, suplementada com farelo de arroz. O menor consumo na dieta do tratamento 2 pode estar relacionado com a palatabilidade do farelo de arroz, sendo observado que os animais que a consumiram recusavam a ingerir esse suplemento quando fornecido exclusivo no cocho. Já na dieta do tratamento 4 o melhor consumo pode estar relacionado com a presença da quirera de arroz.LENG e PRESTON(1976) formularam a hipótese que a baixa ingestão de alimentos em dietas básicas de cana-dea çúcar estaria relacionada com o baixo fornecimento de glicose e proteína pós-rúmen proveniente do alimento. Como a quirera de arroz possui alto teor de amido em sua composição (70%), este poderia estar fornecendo os precursores gluconeogênicos necess ários, estimulando maior ingestão da dieta.
Tabela 1. Composição bromatológica dos ingredientes e das dietas experimentais utilizadas no ensaio de digestibilidade e balanço de nitrogênio 1,2
Tabela 2. Resultados médios do ensaio de digestibilidade 1, 2, 3
Os resultados dos coeficientes de digestibilidade da matéria seca observados na Tabela 2 apresentaram diferença significativa (P<0,05) entre as médias das dietas dos tratamentos 4 e 2, enquanto as médias dos tratamentos 1 e 3 apresentaram resultados intermediários não diferindo das demais. O resultado obtido quando os animais receberam cana-dea çúcar adicionada da mistura uréia/sulfato de amônio e suplementada com farelo de arroz é inferior ao observado por ALVAREZ et. al. (1978) quando forneceram a bovinos dietas básicas de cana-de-açú- car misturadas com uréia/sulfato de amônia suplementada com farelo de polidura de arroz.
Os resultados dos coeficientes de digestibilidade da proteína bruta, observados na Tabela 2, apresentaram diferenças significativas (P< 0,05) entre as mé- dias das dietas dos tratamentos 4 e 1, enquanto as médias dos tratamentos 2 e 3 apresentaram resultados intermediários, não diferindo das demais. Esse fato já era esperado, uma vez que o nitrogênio proveniente da mistura uréia/sulfato de amônia sofre uma hidrólise quase que completa em nível de rúmen, transformando-se em amônia que é utilizada pelos microorganismos para a síntese de proteí- na microbiana, sendo o excesso absorvido. PATE et al. (1985) estudando níveis crescentes de uréia (0, 28% e 56% do N da dieta como uréia ) em dietas básicas de cana-de-açúcar suplementada com milho grão moído e farelo de algodão, observaram um aumento nos coeficientes de digestibilidade da prote ína bruta com os níveis crescentes da uréia, apresentando resultados semelhantes aos do presente trabalho quando utilizaram 28% e 56% de nitrogê- nio da uréia na dieta. O nitrogênio proveniente da uréia neste trabalho contribuiu com 56,6; 57,6 e 58,4% do nitrogênio total respectivamente para os tratamentos em que a cana-de-açúcar foi pulverizada com a mistura uréia/sulfato de amônia.
Na Tabela 2 observa-se que o coeficiente de digestibilidade da proteína bruta foi numericamente maior na dieta do tratamento 4 em relação as dos tratamentos 2 e 3. A diferença na composição dos concentrados utilizados nas dietas dos tratamentos 3 e 4 foi a inclusão da quirera de arroz no concentrado do tratamento 4. Como visto anteriormente a diferença de consumo de matéria seca entre os suplementos não foi significativa, embora os animais do tratamento 4 apresentassem uma tendência de maior ingestão. Esse fato proporcionou um aumento na ingestão de uréia para esse tratamento em rela ção aos outros, com conseqüente aumento no coeficiente de digestibilidade da proteína. Um outro fator que poderia ter proporcionado maior valor do coeficiente de digestibilidade da fração protéica para esse suplemento seria o tipo de carboidrato fornecido na dieta. BRIGGS (1967) afirmou que o amido proporciona melhor eficiência da utilização de nitrogê- nio em relação aos açucares solúveis devido a sua fermentação mais lenta, com conseqüente fornecimento de energia de uma forma mais contínua. Sendo assim, a inclusão da quirera de arroz no concentrado do tratamento 4, contendo 70% de amido, pode ter contribuído de forma positiva melhorando a eficiência de utilização do nitrogênio.
Os resultados dos coeficientes de digestibilidade da fibra bruta (Tabela 2) não apresentaram diferen- ças significativas entre as médias dos suplementos estudados, embora fosse observado uma grande diferen ça numérica entre as médias dos suplementos nos tratamentos 4 e 2. Esse fato pode ter ocorrido devido ao alto coeficiente de variação observado entre as médias (17,7%) não sendo assim detectada nenhuma diferença estatística entre elas.
Os coeficientes de digestibilidade do extrato etéreo não apresentaram diferenças significativas entre as médias dos suplementos como pode ser observado na Tabela 2. Numericamente houve um aumento no valor para o suplemento no tratamento 2 em relação aos outros, explicada pelo maior teor desse componente no farelo de arroz, com conseq üente aumento do teor de extrato etéreo nessa dieta, proporcionando maior ingestão e melhorando a digestibilidade.
Os coeficientes de digestibilidade da energia bruta apresentados na Tabela 2 apresentaram diferen- ças significativas entre os animais suplementados com o concentrado contendo quirera de arroz e aqueles que receberam somente o farelo de soja (P<0,05), enquanto os que receberam farelo de arroz e o concentrado com rolão de milho e farelo de soja ficaram intermediários não diferindo dos demais. O menor valor obtido para o farelo de arroz pode estar relacionado com o alto teor de extrato etéreo contido nesse ingrediente, o qual, segundo RODRIGUES et al. (1987) quando utilizado acima de 20% na dieta poderia inibir a digestibilidade da celulose no rúmen, devido ao efeito tóxico que o excesso de gordura causa para as bactérias ruminais pela presença do óleo de arroz, provocando uma diminuição da síntese de proteína microbiana, devido a menor disponibilidade de energia.
Os resultados dos nutrientes digestíveis totais (Tabela 2) não apresentaram diferenças significativas entre as médias das dietas estudadas, embora fosse observado um valor numérico maior na dieta do tratamento 4 em que o concentrado continha quirera de arroz. Esse fato pode ser explicado pela presença desse ingrediente fornecido aos animais o qual proporcionou maior digestibilidade da maté- ria seca devido ao seu alto teor de amido.
Os farelos e concentrados fornecidos aos animais não tiveram efeito significativo no teor de NDT das dietas experimentais como pode ser observado na Tabela 2. BOIN et al. (1983) também não observaram nenhum efeito do nível de concentrado (15 e 30% em base seca) sobre o teor de NDT em dietas básicas de cana-de-açúcar.
Os resultados médios da concentração de energia digestível (Kcal/Kg MS) encontram-se na Tabela 2. Não foi observada diferença significativa entre as dietas experimentais embora numericamente os valores das dietas suplementadas com farelo de soja e com o concentrado contendo quirera de arroz fossem superiores as demais. O menor valor observado com a suplementação exclusiva com farelo de arroz pode ser explicado pela maior perda de energia fecal dos animais desse tratamento.
No ensaio de balanço de nitrogênio (Tabela 3) a ingestão de nitrogênio das dietas não apresentou diferen ça significativa entre as médias dos tratamentos, embora os animais suplementados com os dois concentrados apresentassem maiores valores numé- ricos em relação aos demais. Quanto ao nitrogênio absorvido houve diferença significativa (P<0,05) entre os animais suplementados com o concentrado contendo a quirera de arroz e aqueles que receberam o farelo de soja, enquanto as médias dos demais suplementos ficaram intermediárias não diferindo das demais. A diferença entre esses suplementos pode ser explicada pela tendência de maior ingestão de nitrogênio da dieta pelos animais recebendo o concentrado com quirera de arroz e pela excreção de nitrogênio fecal ligeiramente superior dos animais suplementados exclusivamente com farelo de soja.
Tabela 3. Resultados médios do ensaio de balanço de nitrogênio
Os valores médios do nitrogênio retido não apresentaram diferença significativa entre as dietas, embora os animais suplementados com o concentrado composto por rolão de milho e farelo de soja apresentasse resultado absoluto menor em relação aos demais. Esse fato pode ser explicado pela alta taxa de nitrogênio excretado na urina pelos animais que receberam essa dieta uma vez que dois animais apresentou balanço próximo de zero para esse tratamento.
Não foi observada diferença significativa para a relação nitrogênio retido/ingerido entre as dietas estudadas. Embora sem apresentar significância (provavelmente devido ao alto coeficiente de varia- ção) a dieta do tratamento 3 apresentou um valor numericamente inferior em relação as demais. PATE et al. (1985) em ensaio de balanço de nitrogênio com bovinos, utilizando dietas nas quais a uréia supria 0, 28 ou 56% do nitrogênio total e 70% da matéria seca era proveniente da cana-de-açúcar, observaram que o nitrogênio proveniente do farelo de algodão era utilizado pelos animais com melhor eficiência em relação ao nitrogênio proveniente da uréia. O resultado obtido na dieta suplementada somente com farelo de soja é inferior ao obtido por aqueles autores quando suplementaram cana-de-açúcar com milho e farelo de algodão.
A porcentagem de nitrogênio absorvido que foi retida foi significativamente maior (P<0,05) para a dieta do tratamento 1 em relação a do tratamento 3 enquanto as médias das outras foram intermediárias não diferindo das demais. Embora apresentando um valor numericamente inferior na ingestão de nitrog ênio em relação as outras dietas, a que continha exclusivamente farelo de soja foi a que apresentou a maior porcentagem de nitrogênio retido (43,6%) em relação ao absorvido. Como discutido anteriormente esse fato está relacionado com as maiores quantidades de nitrogênio eliminado na urina, principalmente pelos animais do tratamento 3. Com exce ção desse tratamento, os outros apresentaram porcentagens do nitrogênio retido em relação ao absorvido superiores as obtidas por MANZANO (1982) e BOIN et al. (1983). No entanto, PATE et al. (1985) encontraram resultados de 67,3; 51,6 e 58,2% utilizando dietas básicas de cana-de-açúcar suplementadas com milho e farelo de algodão acrescidas com dois níveis de uréia, nas quais 0, 28 e 56% respectivamente do nitrogênio total da dieta era proveniente da uréia.
Os resultados dos tratamentos experimentais indicam que quando utiliza-se fonte de nitrogênio não protéico , como no caso da uréia, uma grande parte é eliminada na urina. No presente trabalho as dietas que continham a mistura uréia/sulfato de amônio adicionada a cana-de-açúcar apresentaram teores de nitrogênio urinário em relação ao nitrogê- nio ingerido de 44,7; 55,1 e 45,2%, superior a composta somente por cana e farelo de soja (36,9%). Esse fato foi observado por PATE et al. (1985) quando utilizaram dietas a base de cana-de-açúcar suplementadas com farelo de algodão ou dois ní- veis de uréia (28 e 56% do nitrogênio total da dieta) obtendo teores de nitrogênio urinário em relação ao ingerido de 23,3; 32,1 e 29,1% respectivamente.
A composição média dos ingredientes utilizados no ensaio de ganho de peso encontram-se na Tabela 4 e os dados médios do desempenho animal encontram- se na Tabela 5.
Tabela 4. Composição média dos ingredientes utilizados no ensaio de ganho de peso(1)(2)
Tabela 5. Resultados médios do desempenho animal no ensaio de ganho de peso. (1) (2)
Os resultados médios da ingestão de matéria seca (kg/animal/dia) apresentaram diferença significativa (P<0,05) entre a dieta do tratamento 1 e as demais. Quando os resultados foram expressos em porcentagem de peso vivo ou em gramas por quilo de peso metabólico foi observada diferença significativa (P<0,05) entre essa mesma dieta e as suplementadas com os dois concentrados. O resultado observado para o consumo diário de matéria seca quando os animais receberam farelo de soja exclusivo é semelhante aos obtidos por PATE et al. (1985) e PACOLA et al. (1986) quando forneceram a novilhos em crescimento, dietas básicas de cana-dea çúcar suplementada com milho moído e farelo de algodão ou com farelo de algodão exclusivo.
Os resultados médios do ganho de peso (Tabela 5) apresentaram diferença significativa (P<0,05) entre os animais que receberam a dieta do tratamento 1 em relação as demais, provavelmente devido ao maior consumo de energia digestível pelos animais que receberam essa dieta. CREEK et al. (1976) encontraram resultado semelhante ao do tratamento 1 quando forneceram a novilhos confinados dietas básicas de cana-de-açúcar suplementadas com uma solução de melaço/uréia, farelo de arroz e farelo de algodão, na qual 59% da matéria seca era proveniente da cana-de-açúcar, enquanto no presente trabalho a dieta continha 81% de matéria seca proveniente desse volumoso. PATE (1981) observou decréscimos no desempenho em bovinos confinados alimentados com níveis crescentes de cana-de-açúcar na dieta.
FERREIRO et al. (1977) encontraram resultados semelhantes para ganho de peso vivo aos observados nos animais que receberam as dietas dos tratamentos 3 e 4 quando forneceram a novilhos confinados dieta básica de cana-de-açúcar com melaço/uréia, suplementada com farinha de peixe e farelo de soja. No entanto, o resultado obtido para o tratamento 2 é inferior ao encontrado pelos mesmos autores quando utilizaram a mesma dieta suplementada com farelo de polidura de arroz, provavelmente devido ao maior peso vivo dos animais no inicio do experimento e a inclusão do melaço na dieta, aumentando a ingestão de matéria seca, proporcionando maior ganho de peso dos animais.
A porcentagem de proteína bruta consumida pelos animais foi mais elevada nas dietas dos tratamentos 2, 3 e 4 em relação a 1 (P<0,05). No entanto, devido a maior ingestão de matéria seca dos animais do tratamento 1 a quantidade de proteína ingerida por esses animais foi superior (P<0,05) as dos animais dos tratamentos 3 e 4, ficando a 2 intermedi ária, não diferindo dos demais.
O consumo de uréia pelos animais nos tratamentos 2, 3 e 4 foi, respectivamente, de 118, 108 e 110 g/dia fornecendo 54,0; 49,4 e 50,3 g/N/dia. Do total de nitrogênio da dieta, 52,3; 52,4 e 53,7% eram provenientes da mistura uréia/sulfato de amônio, respectivamente para os tratamentos 2, 3 e 4. O NRC (1984) recomenda que, para evitar problemas de toxidade, no máximo 1/3 do nitrogênio total fornecido aos animais seja na forma não protéica. No presente trabalho a mistura uréia/sulfato de amônio forneceu mais de 50% de nitrogênio não protéico do total de nitrogênio das dietas. Esse fato pode ter influenciado a ingestão de matéria seca, diminuindo o consumo, afetando negativamente o ganho de peso.
A relação nitrogênio: enxofre foi de 12,8:1; 12,9:1; 12,7:1 e 12,6:1 respectivamente para as dietas dos tratamentos 1, 2, 3 e 4, valores esses próximos aos preconizados por HUME e BIRD(1970) que encontraram a relação 11,5:1 como sendo a que possibilitou a máxima produção de proteína microbiana no rúmen. A importância do enxofre em dietas básicas de cana-de-açúcar foi demonstrado por FERREIRO et al. (1977) quando adicionaram sulfato de amônia e uréia à cana-de-açúcar suplementada com 0,500 kg/ animal/dia de farelo de polidura de arroz obtendo maior ganho de peso em bovinos em relação ao tratamento controle.
Os resultados para conversão alimentar (Kg MS/ kg GPV) apresentados na Tabela 5 apresentaram diferen ça significativa (P<0,05) entre as médias dos tratamentos 1 e 3 enquanto as dos tratamentos 2 e 4 ficaram intermediárias não diferindo das demais. A melhor conversão alimentar para a os animais que receberam cana-de-açúcar e farelo de soja está relacionada com a maior ingestão de matéria seca dos animais proporcionando maiores taxas de ganho de peso.
CONCLUSÕES
A cana-de-açúcar misturada com uréia/sulfato de amônia e suplementada com farelo de arroz ou os suplementos estudados nesse trabalho pode tornar- se um sistema de alimentação de baixo custo, proporcionando ganhos de peso para bovinos em crescimento, propiciando a sua utilização para produtores de pequeno e médio porte.
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***O trabalho foi originalmente publicado no Boletim da Indústria Animal (BIA), do Instituto Zootecnia (IZ/APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo, Brasil.