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FVH: solução ou enganação?

Publicado: 18 de abril de 2012
Por: Hélio Cabral Júnior, produtor.
Muitos produtores têm se voltado para FVH (forragem verde hidropônica) como uma solução à estacionalidade forrageira e por conseqüência falta de volumoso para suplementar seus animais, principalmente em regiões do norte de Minas Gerais e no Nordeste brasileiro, devido à severidade dos períodos secos nestas regiões e a escassez de água.
Vamos tentar fazer uma análise o mais técnica possível desta tecnologia, procurando nos isentar das paixões que normalmente envolvem o tema, e ao final que os leitores decidam se é uma solução a ser usada ou uma "boa intenção" que acaba por enganar aos animais e aos produtores que se valem desta tecnologia.
Vale lembrar que tal tecnologia encontra amparo inclusive junto a órgãos de acreditação pública como a FAO (sigla da Food and Agriculture Organization of the United Nations, ou Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) e instituições de pesquisa e ensino no Brasil e mundo à fora.
Eu mesmo comprei o chamado "kit hidroponia" para FVH, no caso milho, para testá-lo (há anos atrás), e parte dos resultados aqui apresentados são oriundos desta literal experiência.
A técnica pressupõe o cultivo "sem solo" de cereais em bandejas, canteiros lonados ou algo que o valha e com soluções nutritivas para regar, com finalidade de produção intensiva de forragem para ser fornecida aos animais. No caso foi utilizado o milho (Zea maiz), mas poderia ser aveia, cevada, trigo, milheto, etc.
Todos os dados informados serão baseados em MS (matéria seca), ou seja, ao eliminar-se a água, é o que sobra (carboidratos, minerais, proteína bruta e extrato etéreo).
Um site conhecido que faz apologia ao uso da FVH baseado em substrato de bagacilho/palha de cana, reporta rendimento de 25 kg/m2/massa verde com 20% de MS com 20 dias de cultivo, a partir de uma semeadura de 1 ou 2 kg de sementes de milho sobre 5 kg/palha de cana/MS/m2. O site informa uma PB média de 14,5% e apenas diz ter boa digestibilidade, mas não informa a DIVMS ou o NDT.
Vamos nos basear nestes dados para fazermos uma análise:
Atentem que a recomendação é de 5kg de MS de palhada de cana por m2, e não simplesmente 5kg de palhada de cana. Há diferença nisto? Claro que há; vejamos no exemplo: 1kg de sementes de milho tem apenas 88% de MS, ou seja, 1kg de MS de sementes de milho correspondem na verdade a 1,136kg de sementes in natura (um quilo e cento e trinta e seis gramas). Portanto, a não ser que esta palha de cana esteja 100% desidratada, o que é pouco provável, deveria ser colocado por m2 mais de 5kg de palha de cana in natura. E a esta palha de cana ainda será adicionado 1 ou 2 quilos de sementes de milho.
Então estaríamos partindo de uma "base" de no mínimo 6kg de MS (5kg da palha mais 1kg de semente). Ora, se o rendimento é de 25kg de massa total de forragem verde (contado o substrato de palha junto) com 20% de MS (em realidade não chega a isto!), teríamos apenas como resultado final 5kg/MS, então houve uma perda no processo de 1kg/MS.
Agora a coisa começa a ficar ainda mais séria, pois 1kg/MS representa uma perda de cerca de 15%. Eu pergunto aos leitores, os senhores acham que o processo de germinação de uma semente é apenas uma maravilha da natureza ou é na verdade um processo bioquímico de reprodução e transformação celular? E como todo processo bioquímico ele demanda energia para se efetuar e de onde os senhores acham que vem esta energia para dar a "arrancada inicial" no processo germinativo? Exatamente daquilo que a semente de milho tem de mais nobre que é seu NDT (nutrientes digestíveis totais) e basicamente de seus carboidratos não estruturais, que são energia prontamente disponível para o processo germinativo como também são energia prontamente disponível tanto para o organismo animal como para os microorganismos ruminais.
Vejam que 1kg de MS de sementes de milho tem aproximadamente 85% de NDT. Já 1kg de MS de FVH oriunda de puras sementes de milho, sem nenhum sustrato (palha de cana, capim, casca de café, etc) tem menos de 50% de NDT!
Alguém poderia tentar argumentar afirmando que o grão de milho tem apenas cerca de 9% de PB na MS enquanto a FVH teria cerca de 14,5%. Ora isso é muito simples, e se deve apenas e tão somente a adição de solução nutritiva nitrogenada ao "cultivo", que faz a mesma coisa que a uréia mais sulfato de amônia faz quando adicionado à cana para ser fornecida aos animais, aumentando o teor de NNP (nitrogênio não protéico) que "aumenta" a PB.
Outra questão que poderia ser levantada seria o fato de se aproveitar na alimentação animal um material como bagacilho ou palhada de cana, capim, casca de arroz/café, etc que de outra forma teria como destinação o lixo ou a fornalha ( produzindo o injustamente temido CO2 ).
Ora, é muito mais econômico do ponto de vista financeiro, nutricional e de trabalho despendido, o processo de amonização destes resíduos de forma a aumentar sua digestibilidade e seus níveis de PB para a alimentação animal.
Pelo visto, é muito mais racional fornecer 1kg de grãos de milho diretamente ao animal do que cultiva-lo na forma de FVH para fornecimento a este mesmo animal. E deve-se atentar para o fato que o milho tipo grão é mais barato no caso de ter que ser adquirido no mercado que o milho tipo semente.
E como argumento final, proponho que os senhores ainda descrentes de tudo que foi escrito acima executem até em suas residências mesmo uma pequena experiência de cultivo de FVH, mas sem utilizar o substrato de material orgânico (palha de cana, cascas, etc). Na verdade não há necessidade de se utilizar substratos, já que os mesmos apenas "aumentam" a MS final obtida. As sementes podem ser colocadas diretamente em uma bandeja para o cultivo teste ou se acharem que fará diferença, usem areia mais grossa como substrato, já que é fácil "lavar" a mesma da forragem obtida ao fim do processo para se aferir a MS real obtida.
Para obtenção desta MS nem é necessário usar por exemplo o método do microondas. Basta por o material já "lavado da areia" para secar a pleno sol até virar um ´feno". Como um feno de qualidade tem mais ou menos a mesma umidade de uma semente de milho que é cerca de 12%, basta ver o peso inicial das sementes usadas e o peso final da FVH "fenada" obtida. Simples assim!
Para que os senhores não sejam explorados pagando valores absurdos por "kits" de soluções nutritivas, vai abaixo a receita da solução usada para o cultivo do milho hidropônico:
Solução concentrada A (gramas/10L)
Fosfato monoamônio - 350
Sulfato de magnésio - 500
Nitrato de potássio - 1100
Solução concentrada B (gramas/10L)
Nitrato de cálcio - 2080
Sulfato de cobre - 0,5
Sulfato de manganês - 2,5
Sulfato de zinco - 1
Ácido bórico - 6
Molibdato de amônio ou de sódio - 0,5
Quelato de ferro* (Dissolvine-13%Fe 25g ou Ferrilene-6%Fe 50g ou TensoFe-6%Fe 50g)
*Utilizar apenas uma das 3 opções
Procedimento para a preparação das soluções concentradas A e B
1. Pesar, separadamente cada componente de cada solução concentrada
2. Num balde com capacidade de 15-20 L de plástico, acrescentar 6 litros de água
3. Colocar os sais já pesados seguindo-se a ordem listada para cada solução
4. Após a dissolução completa do primeiro sal, acrescentar o segundo e assim sucessivamente até a dissolução de todos os sais
5. Completar o volume com água até obter 10 litros e homogeneizar
6. Efetuar estes procedimentos separadamente para as soluções A e B
7. Transferir cada solução A e B obtidas para recipientes de plástico separados, etiquetar e guardar em lugar arejado e protegido da luz.
Preparo da solução nutritiva de uso para regar o cultivo de FVH:
Exemplo - para 50 litros de solução nutritiva:
1. Medir a quantidade de água necessária.
2. Adicionar 250mL de solução concentrada A e homogeneizar.
3. Adicionar 250mL de solução concentrada B e homogeneizar.
Talvez os senhores tenham alguma dificuldade apenas em conseguir o molibdato; como dica, procurem em regiões produtoras de feijão, já que faz parte das boas técnicas de produção utilizá-lo na adubação.
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Hélio Cabral Júnior
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Luciano Pecorelli
25 de julio de 2020
A eficiência da FVH depende muito do fim pelo qual ela deverá ser usada, se um ruminante for alimentado com apenas grão seco terá provavelmente problema de acidose, porém se a FVH for associada a milho grão seco e também a um concentrado você terá uma saída para alimentar os ruminantes , em locais de pouca água também é viável por poder reaproveitar a água ( processo sem substrato em bandejas ), observasse um questionamento sobre os teores de MS e NDT , porém deve se lembrar das formulações das rações e das exigências dos animais , pois a formulação tem outros ingredientes , não se pode simplesmente questionar a FVH isolada na dieta de um ruminante , seria o mesmo que avaliar a cana de açúcar e questionar a associação com ureia , a cana por se só não atende as exigências totais dos animais ruminantes em questão , a FVH é palatável, além de nutrientes existentes que não existe no grão seco, assim como animais no pasto deve ser suplementado com sal proteinado. Existe uma exigência dos animais a qual deverá ser atendida, questionar alimentos isolado faz o produtor ou formulador de rações refletir , porém deve se ater a disponibilidade da forragem disponível na propriedade, a melhor forragem é aquela disponível na propriedade.
Rubens Moretti
4 de septiembre de 2013
Sr. José Garcia Gostaria de saber como é feita a hidratação do milho com cal. Rubens
Jose L.M. Garcia
1 de septiembre de 2013
Caro Marcelo, Essas informações que você me solicita deveriam ser providas pelos inúmeros pesquisadores dos inúmeros órgãos governamentais que são mantidos com dinheiro público, isto é, nosso dinheiro. Infelizmente, não dá dinheiro vender Cal e, portanto, não vamos ver nenhuma indústria dando dinheiro a pesquisador algum para montar um ensaio que prove o que foi afirmado. O que tenho são informações de pessoas sérias que utilizam esse processo e que se dizem satisfeitas e isso, para mim, já é suficiente. Caso isso não preencha os seus requisitos eu sugiro que escreva para algum pesquisador conhecido e que cobre dele uma pesquisa nesse sentido. Se o pesquisador atender ao seu pleito você deve dar graças a Deus, porque o que é mais comum seria ele considerar o seu pedido um ultraje pois eles se consideram semideuses e a maioria das pessoas como reles mortais. É assim que funciona o sistema e é preciso começar a deixar de ser ingênuo e pensar que as coisas funcionam de outra maneira. José Luiz
Marcelo Waddington Telles Ribeiro
27 de agosto de 2013

Luis, quando a gente deixa de ler, não sabe o que está desprezando. Eu li tudo, até o seu artigo, e quero dizer que ainda não tenho opinião formada, até porque, como o autor declarou, não estão disponíveis os dados nutricionais completos sobre o produto da FVH (DIVMS ou o NDT). Por outro lado, a chancela da FAO ao processo de FVH me leva a desejar mais informação. Quero agradecer ao autor que me despertou o desejo de me informar melhor, e peço ao Jose Luiz M Garcia referências bromatológicas ao milho tratado com cal.

Luis Espirito Santo
30 de julio de 2013

Deixei de ler onde diz que adquiriu um "kit Hidroponia" para fvh. Provavelmente vai falar de teor nutritivo ms e mb, coisas do gênero, no século em que estamos só o facto de semear em terra já pode ser prejudicial para os animais! Mas começo pelo gasto de água: no método tradicional qual a quantidade de água desperdiçada? entre 40/60%? Na hidroponia o excesso de rega pode ser recuperado e reutilizado (a ivaporação também mas isso é outra historia)! Só aí já temos solução e não enganação!

Agora na nutrição, quando alimentamos um animal com FVH estamos realmente a alimentar o animal com planta, semente e a raiz; no método tradicional o animal alimenta-se da planta, a semente e a raiz ficam no chão! Solução 2 - Enganação 0! A forragem Hidroponica também alimenta animais como galinhas, pombos, etc., dos quais o excremento pode ser utilizado como nutrição da fvh, mais 1 ponto a favor da solução, e há muito mais a favor da solução!
A qualidade da semente é o segredo chave da agricultura geral.

Daniel Dalgallo
Epagri - Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina
3 de julio de 2013

Boa tarde, Como deve ser realizada (protocolo e concentrações) do grão de milho com água e cal. Att, Daniel Dalgallo - Porto União

Hélio Cabral Júnior
27 de mayo de 2013

Ramon,

Se na sua região tiver pluviosidade suficiente para a cana, opte por esta forrageira como fonte de alimento volumoso para o período seco, sendo usada triturada no cocho com correção à base de ureia e sulfato de amônio. Se a pluviosidade for muito baixa, na casa dos 600 mm anuais, o que significa que forçosamente suas pastagens sejam de gramíneas nativas ou uma pastagem plantada com espécies como o capim buffel (Cenchrus ciliares), a palma forrageira seria a opção economicamente viável como fonte de volumoso para o período seco.

Como a Srta. Romina Lindemann comentou com propriedade, a FVH demanda o aporte de água, que parece ser o problema em sua região. Em termos de logística, custo e uso de água, acho que seria economicamente e nutricionalmente mais interessante irrigar uma pequena área para produção intensiva de cana. Dependendo da luminosidade e temperaturas mínimas médias ao longo do período seco, talvez até uma pequena área intensivada de capim elefante para corte pudesse ser uma opção. Mas lembrando que nem mesmo ele supera a cana em produção de carboidratos totais por hectare.

O Sr. Jose L.m. Garcia bem lembrou um fato de grãos germinados terem maior digestibilidade, o que se confirma também no caso da FVH, entretanto a perda de nutrientes totais e o baixíssimo índice de fibra efetiva oriunda somente da FVH, sem contar o substrato fibroso normalmente utilizado, não compensam a maior digestibididade da matéria seca deste material.

O Sr. Jose L.m. Garcia também apontou uma solução, que é a hidratação do milho grão antes de ser servido aos animais. Esta era uma prática antiga que foi abandonada, e que voltou nos últimos tempos pelo real ganho em digestibilidade deste grão, em que pese haver uma pequena perda de carboidratos solúveis no processo.

Então, de forma resumida, se for viável opte sempre em primeiro lugar pela cana (só depende da pluviosidade média anual)! Mas faça análise de solo e o corrija, de forma a ter uma boa produção de MS com bom conteúdo de carboidratos (brix) em uma área menor, o que vai propiciar após a correção com uréia e sulfato de amônio um bom volumoso que atenderá seu rebanho de forma muito superior à FVH!

Abraço,

Hélio Cabral Jr

Jose L.M. Garcia
27 de mayo de 2013

Prezados Participantes,

Creio que o autor Hélio Cabral Jr. demonstrou matematicamente que essa tecnologia não aumenta e nem melhora alguns parâmetros como o NDT, MS, etc...

Entretanto, como dizem os americanos, "a prova do pudim está no sabor ". Por "sabor" eles querem realmente dizer "resultados". Foi dada uma receita e a prova final deveria vir dos resultados obtidos como ganho de peso, aumento da produção leiteira, dados relativos a fertilidade e a reprodução, etc....
Não sei se os mesmos órgãos que promovem essa receita já fizeram o dever de casa e podem realmente afirmar que o FVH é realmente melhor que o milho seco triturado ou se tudo não passa simplesmente de um mero jogo de números, como demonstrou o autor do artigo, números esses criados por esses mesmos órgãos, muitas das vezes e/ou pelo status-quo acadêmico-científico.

É sabido que os grãos secos possuem os chamados "fatores anti-nutricionais" que são inibidores enzimáticos e também já é de conhecimento geral que todo grão germinado apresenta uma melhor digestibilidade e, por conseguinte, um aproveitamento melhor pelo organismo animal, independentemente de seus teores absolutos individuais tais como % de Proteína.

Vejam bem: A Nutrição está supondo que se o teor absoluto individual (como por ex. teor de Proteína - na verdade teor de N simplesmente) de um determinado nutriente for maior, esse produto deverá ser melhor que o outro, porém, nem sempre as coisas funcionam dessa maneira em organismos biológicos.

O autor demonstrou que o FVH é meramente um jogo de números. Ponto.

Por outro lado temos a evidência da germinação melhorar a absorção, e, em consequência, o aproveitamento dos grãos ao terem os seus fatores anti-nutricionais eliminados.

Eu tenho usado, há anos sempre que posso, o grão de milho simplesmente embebido em água de cal (pelo cálcio solúvel). Coloca-se o grão de milho submerso em água de cal por 24 a 48 horas e esse processo já é suficiente para eliminar os fatores anti-nutricionais e ao mesmo tempo aumentar bastante o teor de cálcio solúvel, e por conseguinte, assimilável.
Pode não ter fibras como o FVH , porém apresenta teores de cálcio mais altos e tenho certeza que a digestibilidade e o aproveitamento dos nutrientes será bem maior que o grão seco triturado. Além do mais, reduz consideravelmente o trabalho de moagem do milho e o uso de energia elétrica.


Jose Luiz M Garcia

Romina Lindemann
27 de mayo de 2013

Olá querido, se o seu problema é justamente a falta de água, não vejo como a hidropônia poderia lhe ajudar, sendo que ela precisa de muita água e produtos químicos. Sugiro armazenamento e captação de água de chuva em grandes reservatórios, e assim você conseguirá ter água para o ano todo, programando de acordo com suas necessidades alimentares, e dos animais também.

Ramon Ferreira
30 de abril de 2013

Hélio, tenho uma fazenda no interior de Pernambuco, e estou tendo muitas dificuldades com a seca.
Queria saber se a Hidroponia é uma solução viável para alimentar 40 gados leiteiros + 220 nelores (somente para sobrevivencia, não para deixá-los gordos). 
Iria sair muito caro este investimento? E se sim, somente para o gado leiteiro seria uma boa saída? O que você acha da Aeroponía? Já que a questão da seca é algo sério por aqui.

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