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Qualidade Sanitária de Grãos e de Forragens Conservadas “versus” Desempenho Animal e Qualidade de seus Produtos

Publicado: 29 de novembro de 2011
Por: Clóves Cabreira Jobim1 Geane Dias Gonçalves2 Geraldo Tadeu dos Santos1
1 - Introdução
Nos últimos anos, tem-se buscado investigar as dietas dos animais com relação a qualidade sanitária, com o intuito de aumentar a produtividade e melhorar a qualidade de vida da população mundial. Nesse sentido, várias pesquisas vem sendo desenvolvidas com propósitos definidos. Tais como, estudar os principais microrganismos e seus compostos formados (ácidos indesejáveis e micotoxinas), que se desenvolvem nas forragens e grãos e que, consequentemente, prejudicam o desempenho animal, a qualidade de seus derivados e por fim trazem sérios prejuízos econômicos.
No Brasil, embora sabidamente as micotoxinas sejam responsáveis por expressivos prejuízos na produção de grãos, praticamente não existem estimativas das perdas econômicas associadas as micotoxinas. Mesmo em países com alta tecnologia para produção e armazenagem de milho, as perdas por presença de micotoxinas são elevadas. Como exemplo citam-se os dados divulgados pela AL-TECH (2000), onde somente em 1980 os produtores e processadores de milho da Carolina do Norte perderam cerca de 30 milhões de dólares.
As micotoxinas resultam em perdas econômicas significativas para os criadores, uma vez que afetam a saúde dos animais, reduzem a produtividade e podem até levar a morte. Segundo a AL-TECH (2000), em 1992 o impacto econômico anual estimado para as micotoxinas na Carolina do Norte era de 20 milhões de dólares na avicultura, 10 milhões na suinocultura, 5 milhões na produção de leite, um milhão para bovinos e ovinos de corte e um milhão de dólares em eqüinos.
Acreditamos que no Brasil, se os prejuízos relativos à presença de micotoxinas em rações animal fossem dimensionados, teríamos números surpreendentes, a julgar pela qualidade do milho utilizado nas propriedades para alimentação de aves, suínos e bovinos principalmente.
Desta forma, julgamos de fundamental importância uma abordagem sobre o impacto da qualidade sanitária de grãos e de forragens conservadas sobre a saúde, produtividade e qualidade do produto animal, com ênfase nos riscos da presença de micotoxinas e bactérias na cadeia alimentar e as possíveis formas de tratamentos ou aditivos para reduzir tais problemas.
2 - Micotoxinas
2.1 - O que são micotoxinas?
O termo micotoxina é originário de uma palavra grega “mykes” (fungo) e de uma palavra do latin “toxicum” (toxina). A expressão greco-latina “mykes toxicum” significa toxina fúngica, ou como, dizemos, micotoxina (LAZZARI, 1997). É usado para designar um grupo de compostos, altamente tóxicos, produzidos por certos fungos ou leveduras que são organismos aeróbios que se desenvolvem em lugares que apresentam baixa disponibilidade de água, o qual são inadequados para o crescimento de bactérias (NEWMAN, 2000a). Os fungos também podem se desenvolver em condições de campo, durante o transporte ou durante o período de armazenamento dos alimentos, quando as condições são favoráveis ao seu crescimento (JOUANY, 2001). Diante disto, as micotoxinas produzidas durante a esporulação dos fungos, contaminam os animais que consomem alimentos contaminados, e desta forma são transferidas para os seus produtos, tal como o leite ou a carne e, consequentemente, prejudicando a saúde humana (BRUERTON, 2001). As micotoxinas podem causar doenças e mortes, quando ingeridas pelo homem ou pelos animais domésticos. As doenças causadas são denominadas micotoxicoses (LAZZARI, 1997).
As micotoxicoses podem resultar da ingestão de toxinas produzidas por três tipos de fungos: a) macroscópicos – mais conhecidos como cogumelos. Existem várias espécies que são tóxicas para o homem e para os animais domésticos; b) parasitas – infestam e causam doenças nas plantas durante o seu desenvolvimento no campo; c) de armazenamento – infestam e crescem nas plantas durante o seu desenvolvimento no campo, colheita, secagem, armazenamento e transporte. Em forragens, grãos e sementes, com teores de umidade relativamente baixos e em condições favoráveis podem produzir micotoxinas.
As pesquisas têm demonstrado que a incidência de micotoxinas e a ocorrência de micotoxicoses não estão restritas a um determinado clima, região geográfica ou país. É difícil de estimar a extensão dos problemas causados pelas micotoxinas por várias razões, dentre as quais podemos destacar: a) as toxinas podem ocorrer em baixas concentrações dificultando sua detecção; b) freqüentemente o produto contaminado já foi totalmente consumido quando os sinais de micotoxicoses são aparentes; c) os sinais de micotoxinas podem ser confundidos com outras doenças dificultando a sua caracterização; d) médicos e técnicos não são treinados ou não estão familiarizados com os sinais de micotoxicose.
Para complicar, algumas toxinas não produzem sinais aparentes. Segundo LAZZARI (1997), o efeito mais comum de envenenamento leve ou crônico por micotoxinas é o mau desenvolvimento dos animais domésticos – aves, suínos e bovinos. A contaminação de alguns ingredientes da dieta pode levar a ingestão de níveis de micotoxinas potenciais para reduzir o desempenho animal.
3.2 - Principais Micotoxinas Encontradas nos Alimentos
Embora já existam 300 a 400 micotoxinas conhecidas, as mais preocupantes em relação à toxicidade e ocorrência são as Aflatoxinas, Desoxinivalenol (DON ou Vomitoxina), Zearalenona, Fumonisina, Toxina T-2 e toxinas semelhantes à T-2 (tricotecenos) (AL-TECH, 2000).
As principais micotoxinas encontradas nas forragens e grãos, estão geralmente associadas com um grupo de espécies de fungos, tal como, Fusarium, Aspergillus, Penicillium e Claviceps (BRUERTON, 2001; DAWSON et al., 2001).
Algumas espécies de fungos podem produzir mais do que um tipo de micotoxina (Tabela 1) e mais do que uma toxina pode surgir em uma única amostra (JELINEK et al., 1989). DON, Zearalenona, Toxina T-2 e Fumonisina são produzidas por fungos do gênero Fuzarium. Fungos desse gênero são encontrados em praticamente todos os lotes de milho e como um todo, são capazes de produzir 70 tipos diferentes de micotoxinas. Algumas cepas de Fuzarium podem produzir até 17 micotoxinas simultaneamente. Assim, as toxinas produzidas por Fuzarium são mais freqüentemente encontradas em grãos e rações (AL-TECH, 2000).
Tabela 1 – Importantes fungos e micotoxinas encontrados em ração animal.
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3.2.1 - Aflatoxinas
As Aflatoxinas podem causar danos no fígado, diminuir o desempenho reprodutivo, reduzir a produção de leite, saúde embrionária, defeitos de origem, tumores e diminuir as
funções imunológicas (NEWMAN, 2000a). Muitos alimentos, estão livres da contaminação no campo. Porém, o milho, o algodão e o amendoim são exceções.
Os cereais colhidos com alto teor de umidade, tal como o arroz e o milho, podem ser classificados como apresentando potencial risco de crescimento de fungos na armazenagem. Da mesma forma, em regiões onde a umidade é alta e as secagens no campo são deficientes os riscos de contaminação por fungos se tornam bastante significativos. É importante salientar que muitas espécies de Aspergillus se desenvolvem lentamente em locais com conteúdos de umidade abaixo de 18%.
3.2.2 - Ocratoxinas
Vários efeitos maléficos e níveis de tolerância vem sendo detectados em diferentes espécies de animais domésticos.De acordo com NEWMAN (2000a), vacas contaminadas por Ocratoxina (níveis maiores do que 800 ppm), podem apresentar decréscimo no desempenho, redução na produção de leite, problemas nos rins e morte.
Os fungos responsáveis pela produção da Ocratoxina podem atacar os grãos de cereais, como o milho e o trigo com conteúdos de unidade de aproximadamente 15,5 a16%. A Ocratoxina A é ligeiramente solúvel em água e é absorvida na seção superior do trato gastro intestinal de modo passivo na forma não ionizada, sendo sujeita a secreção e reabsorção pela via enterohepatica. Nos mamíferos, a Ocratoxina A é absorvida primariamente no estômago ou no jejuno proximal, embora já tenha sido documentado absorções através dos pulmões pela circulação sistêmica (Di PAOLO et al., 1993). É importante salientar que as absorções de Ochratoxin A são maiores em pH ácido. Desta forma, a toxidade em ruminantes é relativamente baixa, devido a ação da microflora ruminal sobre as micotoxinas (Hult et al., 1976; citado por NEWMAN, 2000a).
3.2.3 - Micotoxinas Fusarium
As principais micotoxinas Fusarium que demandam cuidados práticos estão ilustradas na Figura 1.
Os sintomas dos animais contaminados com a micotoxina Desoxinivalenol incluem decréscimo na ingestão de alimentos e produção de leite (WHITLOW e HAGLER, 1999). Já a Toxina T-2 e substâncias químicas afins causam irritação, hemorragias e necrose em 246
todo o trato digestivo, deprimem o processo regenerativo na medula óssea e no baço, afetam a função do sistema imunológico e causam alterações em orgãos reprodutivos (AL-TECH, 2000). Animais afetados apresentam perda de peso, baixa eficiência alimentar, falta de apetite, vômito, diarréia sanguinolenta, aborto e, em casos graves, morte. Enquanto que a Zearalenona, apresenta ação estrogênicas e pode prejudicar a reprodução em muitas espécies (NEWMAN, 2000a).
A Fumonisina é uma toxina que pode prejudicar as funções do sistema imunológico, causar lesões no fígado e rins, causar edemas pulmonares e também pode levar o animal à morte. Porém, o Ácido Fusarico, tem sido destacado por causar vômitos em suínos, além de elevar as concentrações de seratonina e triptofano do cérebro.
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Figura 1 – Micotoxinas Fusarium comumente encontradas em forragens e rações.
3.3 - Efeito da Contaminação por Micotoxinas sobre a Ingestão de Matéria Seca
Os efeitos biológicos aparentemente ocasionados pela contaminação por micotoxinas, estão diretamente relacionados com o nível de contaminação e tempo de exposição dos animais (JOUANY, 2001).
A recusa de grãos ou forragens contaminados por micotoxinas tem sido um dos grandes problemas encontrados na alimentação animal. Segundo alguns autores (BERSJO et al., 1992; FRIEND et al., 1992; BERSJO et al. 1993), os animais monogástricos apresentam maior sensibilidade quanto a contaminação por micotoxinas do que os ruminantes. Da mesma forma, os ruminantes adultos são menos sencíveis a contaminação quando comparados com os jovens. Isto deve-se ao fato de que o principal ponto de absorção das micotoxinas ocorre no intestino delgado. Assim, os animais monogástricos são mais susceptíveis às micotoxinas do que os ruminantes, uma vez que nestes animais a absorção de nutrientes ocorre posteriormente à digestão fermentativa (AL-TECH, 2001).
O efeito negativo de algumas micotoxinas sobre a ingestão de alimento, pode ser devido as alterações no odor ou palatabilidade dos alimentos contaminados. Segundo Mertens e Watt (1977); citado por JOUANY (2001), o pó presente nas forragens secas associado com a presença de mofo e esporos pode estar envolvido no decréscimo da palatabilidade. Além disto, existe as desordens metabólicas e digestivas causadas pela presença de micotoxinas e que provavelmente estão envolvidas na redução da ingestão voluntária do alimento.
Segundo APPLEBAUM e MARTH (1983), o fornecimento de 13 mg/dia de Aflotoxina B1 (por volta de 8 mg/kg de alimento) para vacas em lactação, não afetou a ingestão de matéria seca. No entanto, quando os mesmos autores forneceram aos animais, Aflotoxina B1 pura ou misturada com outras Aflotoxinas e metabólicos de fungos, verificou-se flutuações na ingestão de matéria seca para as vacas que receberam 13 mg/dia de aflotoxinas impuras.
Outrossim, é muito importante que ao fornecer alimentos (volumosos e/ou concentrados) aos animais seja eliminado as partes estragadas (mofadas) mesmo presentes
em pequenas quantidades. Isso porque mesmo que a quantidade de fungos presentes não seja suficiente para reduzir o consumo, a ingestão continuada de micotoxinas poderá acarretar sérios problemas aos animais.
3.4 - Micotoxinas no Trato Digestivo e Fígado de Ruminantes
Podem ocorrer bioconversão no trato digestivo dos animais. No geral, a bioconversão, leva a formação de moléculas menos tóxicas quando comparadas com as moléculas de origem, particularmente no caso hidrolizado, reduzido ou metabólicos conjugados ligados aos conjugados deepoxytricothecenes, ochratoxin α, aflatoxicol ou glutathione da aflatoxina B1 (Figura 2), que é a substância carcinogênica natural mais potente que existe. Portanto, se apenas uma ligação química for alterada na estrutura da molécula, sua toxicidade pode ser dramaticamente reduzida (AL-TECH, 2000).
A hidrolização é um passo importante na excreção de metabólicos estranhos pelo corpo do animal. Estes processos de desintoxicação ocorrem no rúmen e em algumas vezes no fígado. Por outro lado, reações oxidativas envolvendo o citocromo P450, podem produzir metabólicos altamente tóxicos (JOUANY, 2001). No fígado, o citocromo P450 oxidase metaboliza os compostos em formas menos tóxicas. No entanto, através de algumas reações pode-se desencadear a formação de câncer.
Como já descrito anteriormente, os animais ruminantes são mais resistentes a certas micotoxinas do que os animais monogástrico. Isto pode ser um indicativo de que biotransformações ocorrem no rúmen. Da mesma forma, podem ocorrer bioconversões no intestino grosso, porém, a degradação é inferior e apresenta menor efeito de proteção sobre o animal, já que, as toxinas de origem são absorvidas no trato digestivo antes de atingir o intestino grosso.
Existem resultados conflitantes sobre a biodegradação no rúmen da Aflatoxina B1. Pois, Engel e Hagemeister (1978); citado por JOUANY (2001), encontraram decréscimo na concentração da Aflatoxina B1 de origem quando incubada em líquido ruminal. Da mesma forma, FERNÁNDEZ et al. (1997) registrou quantias significativas de toxina AFM1 em relação a toxina AFB1 nas fezes de ovinos alimentados com uma dieta contaminada com 2,5 mg kg-1 de Aflatoxinas. Entretanto, outros autores não verificaram decréscimo na concentração da micotoxina de origem através de estudos in vitro (KIESSLING et al., 1984).
A explicação de que os ruminantes são menos sensíveis aos efeito tóxicos causados pela Ocratoxina A, pode ser pelo fato de que a Ocratoxina A contém a molécula metil- isocoumarin (Ocratoxina α) ligada pela L-β-fenilalalina por ligação peptidica. A hidrólise das ligações peptidicas pelos microrganinsmos do rúmen leva a excreção do Ocratoxina α, o qual não é tóxico e também da fenilalanina que é um aminoácido utilizado pelos microrganismos ruminais.
Algumas micotoxinas, tal como a Aflatoxina B1, não apresenta efeitos sobre a digestão da celulose e nem sobre a produção de AGVs através de medidas realizadas in vitro. Entretanto, a presença de uma grande soma de micotoxinas e um possível efeito sinérgico entre diversas micotoxinas, pode ter impacto negativo sobre a digestão ruminal. Também, a composição da microflora ruminal é dependente do tipo de dieta que o animal está consumindo, pois as condições de alimentação podem afetar a atividade biológica dos microrganismos envolvidos nos processos de desintoxicação (AUERBACH et al., 1998).
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Figura 2 – Metabolismo no fígado da aflatoxina B1.
3.5 - Efeitos de Micotoxinas sobre a Saúde de Vacas Leiteiras
Vacas leiteiras são altamente expostas a ação de micotoxinas devido a dependência de concentrados e volumosos conservados como feno ou silagem. Assim sendo, é possível que no Brasil os prejuízos na bovinocultura leiteira, em razão da ingestão de alimentos contaminados, sejam entraves para atingir-se alta produtividade no setor.
As micotoxinas originarias do fungo Fusarium, tal como, a Desoxinivalenol (DON), e a Zearalenona, são encontradas em grãos de cereais e em pastagens (JOUANY, 2001). A Desoxinivalenol, está associada à menor ingestão de alimento, redução da produção de leite, maiores contagens de células somáticas no leite, menor eficiência reprodutiva, além de uma ampla variedade de desordens no trato gastro intestinal, tais como vômitos (DON), diarréia e inflamações. Também podem surgir abortos, hemorragias e através de um mecanismo complexo, surgem alterações no sistema imunológico (SHARMA, 1993). Segundo AL-TECH (2001), o consumo de 500 ppb ou mais de DON pode resultar em queda na produção de leite de até 11,3 kg.
O grãos de cereais contaminados, freqüentemente apresentam combinação de Zearalenona, a qual induz a respostas estrôgenicas em vacas leiteiras, e grandes doses dessa toxina estão associadas a abortos. Outras respostas de vacas leiteiras à Zearalenona vão desde menor ingestão de alimento, menor produção de leite, vaginite, aumento uterino, vulva e glândulas mamarias túrgida em novilhas virgens, declínio na taxa de ovulação e ciclos longos (SMITH et al., 1990). Sugere-se que o nível de Zearalenona não deve exceder a 250 ppb na dieta total (AL-TECH, 2001).
Além destas duas micotoxinas anteriormente citadas (DON e Zearalenona), não devemos deixar de comentar sobre a Toxina T-2, a qual está associada à recusa de alimento, produção reduzida, gastroenterite, hemorragias intestinais, morte e imunossupressão em bezerros (AL-TECH, 2001). De acordo com Pier et al. (1980); citado por JOUANY (2001), o fornecimento para vacas leiteiras de 0,6 mg/kg da toxina T-2, resultou em presença de sangue nas fezes, enterites, ulceras digestivas e morte.
2 - Qualidade do leite de vacas
Atualmente o Mínistério da Agricultura elabora a nova legislação para classificação do leite. A proposta prevê a substituição da classificação B e C por um padrão de qualidade do produto cru na propriedade. As mudanças na legislação estão baseadas no Programa Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite (PNQL), elaborado através de grupos de trabalho formado por representantes de toda a cadeia produtiva. Isso determinará a profissionalização da atividade com melhora na qualidade, uma vez que deverá ser mantido rigoroso controle do leite para atingir o padrão exigido pela nova legislação.
Segundo informações divulgadas pelos meios de comunicação (revistas, jornais, rádio e televisão) esse conjunto de medidas, com previsão de entrada em 2002, traça metas que podem começar a valer dentro dos próximos meses. A adoção de padrão higiênicos sanitários rigorosos, implicam mudanças na forma de trabalho do produtor e da indústria.
A qualidade do leite e da carne está diretamente relacionada com o tipo e a qualidade da dieta dos animais. O valor nutritivo e a qualidade sanitária de volumosos conservados como feno ou silagem são de grande importância na exploração pecuária, principalmente na exploração leiteira. Quando o processo de conservação das forragens não é bem conduzido certamente haverá perdas de qualidade e do valor nutritivo e isso terá reflexo direto na produção e na qualidade do leite.
A qualidade do leite é definida por WOLTER (1997) como sendo o conjunto das propriedades desejadas pelo consumidor. Ou seja, implica em segurança da qualidade sanitária (bacteriológica e química), valor gastronômico (sabor, odor) e valor nutricional. Assim, a qualidade do leite está ligada a sua faculdade de conservação e aptidão de ser transformado, como rendimento, em derivados igualmente são, saborosos e de alto valor nutritivo.
O alimento consumido pela vaca tem efeito sobre a cor, sabor e odor do leite. Portanto, silagens, fenos e outros alimentos mal conservados podem modificar as qualidades organolépticas do leite (odor, gosto, ...). Mas o maior risco é em relação as alterações na fermentação ruminal. Também, há riscos de contaminação, com toxinas produzidas por microrganismos durante as fermentações secundárias na ensilagem. É o caso das silagens com alta umidade. Isso determina a importância de compactar bem e
vedar adequadamente os silos, e de evitar a contaminação com terra. Esse procedimento evita o desenvolvimento de fungos com conseqüente produção de toxinas, as quais poderão contaminar o leite.
As forragens desidratadas (fenos) apresentam a vantagem de boa conservação, quando do uso de tecnologia adequada para a produção, armazenagem e utilização. No entanto, cuidados devem ser tomados para evitar o consumo de feno com presença de fungos e de outras substâncias estranhas que poderão acarretar problemas aos animais.
Silagens ou fenos mal conservados normalmente têm a digestibilidade reduzidas, em razão das perdas dos componentes não estruturais de alta digestibilidade. Uma forragem de baixa digestibilidade limitará a produção de acetato pelas bactérias celulolíticas e, em conseqüência, o teor de gordura no leite diminuirá. De acordo com AMÉDÉO (1997), a relação teor de gordura:teor de proteína no leite deve ficar ao redor de 44:34.
3.7 - Presença de Resíduos Tóxicos nos Produtos de Origem Animal
Rações contaminadas por micotoxinas, além de reduzir o desempenho e afetar o estado geral da saúde do animal, constituem um risco para seres humanos, uma vez que produtos animais contendo resíduos de micotoxinas podem ser consumidos por pessoas com possíveis danos a saúde (AL-TECH, 2000). Embora animais saudáveis tendem a “filtrar” ou detoxificar muitas micotoxinas às quais estão expostos, a questão dos resíduos no leite e em tecidos animais não deve ser ignorada por produtores e consumidores, em virtude dos possíveis danos a saúde humana. Cita-se como exemplo o fato de que, de acordo com publicações da AL-TECH (2001), a Aflatoxina é eliminada através do leite na forma de Aflatoxina M1 com resíduos equivalentes a 1 a 2% do nível existente na dieta.
A presença de Aflatoxina nos alimentos é um perigo para a saúde animal e, consequentemente, para a saúde publica, já que os animais podem reter resíduos de Aflatoxinas ou de seus metabólicos nos tecidos (FERNÁNDEZ et al., 1994). Segundo FERNÁNDEZ et al. (1997), a prática de produção de animais confinados associada com o uso de múltiplas fontes de ingredientes na dieta, aumentou a probabilidade de ovinos se contaminares com Aflatoxina. Através de investigações, tem sido demonstrado que os ovinos são extremamente sensíveis a contaminação por Aflatoxina, já que, quando intoxicados, apresentam baixo desempenho, perda de peso, significante acréscimo do
tamanho e peso do fígado e rins, lesões histológicas no fígado e rins, associado com variações nos parâmetros clínicos e no metabolismo dos minerais (FERNÁNDEZ et al., 1996). FERNÁNDEZ et al. (1997), trabalhando com ovinos contaminados com 2,5 mg de Aflatoxina por kg-1 de alimento consumido em um período de 21 dias, encontraram uma pequena parte da fração de Aflatoxina consumida nos tecidos dos animais. Os autores sugerem que esta pequena quantidade encontrada não é suficiente para causar intoxicação aguda em humanos, mas que, efeitos indesejáveis podem ocorrer, já que a AFB1 é uma substância responsável pela formação de tumores malignos.
Através de estudos epidemiológicos, comprovou-se que as Aflatoxinas, principalmente a AFB1, estão envolvidas na gênese de câncer no fígado (EATON e GALLLAGHER, 1995). Diante deste fato, muitos países adotaram um limite de concentração de aflatoxinas no alimento para consumo humano de 10 μg kg-1 para a soma de AFB1, AFB2, AFG1 E AFG2 e um máximo de 5 μg kg-1 para AFB1.
As micotoxinas podem ser absorvidas pela glândula mamária de diferentes formas, como por exemplo, através dos mesmos processos básicos que ocorre no trato digestivo, ou seja, filtração intercelular, difusão passiva através da membrana celular ou transporte ativo. A filtração intracelular, é importante na formação da fase líquida do leite (água e entrada de eletrólitos), mas é secundária na excreção das micotoxinas (JOUANY, 2001). As micotoxinas lipolíticas, tanto na forma não ionizadas como ionizadas atravessam as membranas celulares por difusão passiva. Ao contrário, os compostos ácidos e polares, tal como Fumonisina, apresentam baixa taxa de excreção no leite. Existe certa dificuldade em se predizer as excreções de micotoxinas no leite, principalmente pelas mudanças nas estruturas celulares durante o metabolismo no corpo do animal. Entretanto, a AL-TECH (2001) relatou que a proporção de micotoxinas no leite não é influenciada pelo nível de produção de leite, uma vez que animais de alta produção consomem mais ração e eliminam níveis ligeiramente menores de toxinas no leite.
Segundo PRELUSKY et al. (1990), a ingestão por vacas leiteiras de 50 a 165 mg de Zearalenona por um período de 21 dias, não foi suficiente para apresentar resíduos no leite. Porém, a ingestão de 544,5 mg/dia, induziu o aparecimento de Zearalenona associada com α-Zearalenol. A excreção cumulativa no leite representou 1,4% das micotoxinas ingeridas.
3.8 - Métodos para Reduzir o Impacto Negativo de Micotoxinas no Animal e seus Derivados
Como já foi descrito na presente revisão, as micotoxinas são metabólicos secundários de fungos e leveduras presentes nas plantas. O primeiro passo para reduzir a contaminação do animal por micotoxinas e, consequentemente, seus derivados seria reduzir o nível de contaminação de volumosos e concentrados. Como por exemplo, armazenagem de feno ou grãos com baixo teor de umidade, uso de aditivos que controlam o desenvolvimento de microrganismos (REIS e RODRIGUES, 1998) ou até o uso de plantas melhoradas geneticamente com o intuito de reduzir ou eliminar a contaminação por fungos (BROWN et al., 1999).
Segundo REIS e RODRIGUES (1998), existe uma grande variedade de produtos químicos que podem ser aplicados em fenos armazenados com alta umidade, com o objetivo de controlar o crescimento de microrganismos. Dentre estes produtos podemos citar a amônia, que além de atuar no controle de fungos, pela elevação do pH, também age sobre a fração fibrosa da forragem, solubilizando a hemicelulose e aumentando a disponibilidade de substratos prontamente fermentáveis para os microrganismos do rúmen.
PRICE et al. (1982) registraram redução na soma de Aflatoxina M1 no leite de 85 a 90%, quando sementes de algodão foram tratadas com 1,5% de amônia e 10% de água, por um período de 21 dias.
Além da utilização da amônia, existem outras formas de tratar o alimento e que apresentam resultados bastante viáveis, tais como, solução de peróxido de hidrogênio, hidróxido de cálcio, bissulfeto de sódio, carbonato de sódio, cal, calor, etc. No entanto, o uso destes produtos nem sempre é viável.
Os Absorventes inorgânicos são adicionados nos alimentos contaminados e atuam como verdadeiros faxineiros dentro do trato digestivo do animal. Pois, os mesmos se ligam com a toxina sem causar efeito negativo ao animal (JOUANY, 2001). Entretanto, o uso de absorventes inorgânicos causa redução na densidade de nutrientes da dieta, além de promover um excesso da capacidade absortiva que pode levar ao decréscimo na disponibilidade de microelementos importantes (KARL, 2001). Diante deste fato, pode-se utilizar os absorventes orgânicos, que apresentam algumas vantagens em relação aos inorgânicos (SMITH, 2001).
Os absorventes orgânicos são derivados da parede celular de microrganismos ou de fibras de plantas (JOUANY, 2001; SMITH et al., 2001). Através de estudos tem-se comprovado que o feno de alfafa é efetivo no combate da Toxina T-2 e Zearalenona (Carson e Smith, 1983; James e Smith, 1982: citado por SMITH, 2001), além de apresentar algumas vantagens sobre os absorventes inorgânicos, como apresentar teores satisfatórios de energia e proteína. Entretanto, deve ser aplicado em altos níveis na dieta dos animais.
4 - Microbiologia da Forragem
As plantas forrageiras normalmente são contaminadas por microrganismos epífitas benéficos ou não e o desenvolvimento de cada espécies dependerá dos tipos de condições encontradas no meio. Por exemplo, no processo de confecção da silagem a presença ou ausência de O2 no interior do silo determinará o desenvolvimento, mesmo que temporário, de três tipos de microrganismos: aeróbios, anaeróbios e anaeróbios facultativos. A ação dos diferentes grupos de bactérias levará a formação de produtos de maior ou menor importância para a conservação e qualidade da silagem.
As bactérias ácido láticas (BAL) são o principal grupo de microrganismos que atuam no processo fermentativo para a conservação da massa ensilada. As BAL incluem, principalmente, os gêneros Lactobacillus, Streptococcus, Pediococcus e Leuconostoc, que produzem, principalmente ácido lático como produto da fermentação dos açúcares. Já as bactérias anaeróbias do gênero clostridium têm efeitos negativos sobre a qualidade das silagem. Esses microrganismos fermentam açúcares, ácido lático e aminoácidos produzindo ácido butírico e aminas. Esse tipo de fermentação resulta em significativas perdas de matéria seca, e os produtos da fermentação reduzem a palatabilidade, além de dimunuir a estabilidade da silagem (MAHANNA, 1994; ROTZ e MUCK, 1994).
Os clostrideos podem ser divididos em três grupos: Clostridium sacharoliticos (ex. C. butyricum), que são aqueles que produzem ácido butírico a partir da fermentação de açúcares e ácido lático; Clostridium proteolitico (ex. C. esporogenes) são aqueles que fermentam aminoácidos com produção de vários ácidos, (butírico, acético, propiônico) amônia e aminas (histamina, putrescina, cadaverina) e CO2; Clostridium sacharo-proteolíticos (ex. C. perfringens) que são aqueles que fermentam ambos, açúcares e aminoácidos (McDONALD, 1981).
Um dos principais problemas da ingestão de alimentos contaminados com esporos de clostrideos é a contaminação do leite. No Brasil, até o presente momento, pouca atenção tem sido dada a esse assunto, o qual julgamos de relevada importância, uma vez que tem relação direta com a saúde pública. A presença de esporos de clostrídeos em número elevado no leite, visto serem capazes de resistir a pasteurização, possui ações catastróficas principalmente na fabricação de queijos.
O ciclo de contaminação do leite é conhecido, da mesma forma que as medidas a serem adotadas para quebrar essa cadeia. Mas a aplicação de regras deste a colheita da forragem, conservação, utilização e higiene do local de ordenha dificilmente são observados com a atenção que merecem.
Na França, um estudo conduzido em várias propriedades, demonstrou que a contaminação do leite com esporos de clostrídeos aumentou quando houve aumento da silagem na ração (COULON et al., 1991). A contaminação das silagens foi em média elevada, com 70% dos silos avaliados com contaminação periférica (mais de 10.000 esporos/g de silagem) e 50% com contaminação no centro do silo. Associado a esse fator verificou-se pH acima de 4,0, presença de ácido butírico e N-NH3/N total maior que 10%. Dessa forma, a utilização de silagem na alimentação de vacas leiteiras é freqüentemente proibida na França, Suíça e Áustria, com o objetivo de evitar problemas na produção de queijos (semi-duros, requeijão) e iogurtes. Além disto, a velocidade de coagulação da caseína tende a diminuir no leite produzido com silagem em função da acidez.
Com as condições favoráveis durante a maturação dos queijos, esses microrganismos proliferam. Os mais importantes são Clostridium tyrobutiricum e Clostridium sporogenes. Segundo WOLTER (1997) o C. tyrobutiricum fermenta o ácido lático contido nos queijos formando ácido butírico e CO2. O C. sporogenes é mais danoso uma vez que degrada aminoácidos. Com a desaminação há liberação de amônia e ácido capróico e caprílico ocasionando odor de “bode”. Também, haverá produção de aminas (histamina, tyramina, putrescina e cadaverina) que acarretam odor pútrico aos queijos. A contaminação do leite ocorre geralmente, durante o trato e ordenha. Essa contaminação pode ser por fragmentos de silagem, pó ou fezes, considerado o principal vetor.
Além dos grandes problemas causados com a contaminação por clostrideos, podemos também enfatizar a contaminação com listéria, a qual ocorre principalmente nas
regiões periféricas do silo onde há alterações na conservação da silagem. Portanto, a eliminação dessa silagem mal conservada, no momento de fornecer aos animais, pode evitar problemas de contaminação não só com a listéria mas também com outros microrganismos, como por exemplo fungos (toxinas) e esporos de clostrídeos.
O desenvolvimento de listéria nas silagens está diretamente ligado ao pH. Quando o pH for inferior a 5,2 a listéria monocytogenes não se desenvolve, mas sua destruição ocorre somente em pH mais ácido. Em silagens com pH elevado poderá ocorrer desenvolvimento de listéria, salvo se o teor de MS for muito elevado, ao redor de 70% (CORROT, 1998).
5 – Considerações finais
Em qualquer exploração pecuária o produtor deve buscar não só altos índices de produtividade, como também a qualidade do produto. Isto torna-se mais evidente no momento em que o mundo globalizado exige produtos de qualidade, e o consumidor adquiriu consciência da necessidade de consumir produtos de origem animal com segurança da qualidade higiênica-sanitária.
Dessa forma, é relevante que o produtor considere que a qualidade da carne e do leite depende, em grande parte, da qualidade (estado sanitário) dos alimentos oferecidos aos animais. Assim, o uso de tecnologia adequada é vital, pois, como demonstrado nesta revisão, a população de microrganismos depende do manejo de produção e armazenagem dos grãos e volumosos.
Entendemos que esse assunto deve se constituir objeto mais frequente de pesquisa dentro de institutos e universidades, para oferecer aos produtores e a indústria brasileira informações que possam melhorar a eficiência de produção e também garantir qualidade sanitária dos produtos de origem animal.
6 - Referências Bibliográficas
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Autores:
Geraldo Tadeu Santos
Universidade Estadual de Maringá UEM
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