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Atraso na colheita e incidência de grãos ardidos e fumonisinas totais em grãos de milho

Publicado: 25 de outubro de 2013
Por: Rodrigo Véras da Costa, Valéria Aparecida Vieira Queiroz, Luciano Viana Cota, Dagma Dionísia da Silva, Fabrício Eustáquio Lanza, Simone Martins Mendes e Lauro José Moreira Guimarães, Embrapa Milho e Sorgo, MG.
Introdução
No milho, a maturação fisiológica dos grãos ocorre cerca de 50 a 60 dias após a polinização, quando o teor de umidade encontra-se entre 30 e 38% dependendo da cultivar, o que corresponde ao ponto de máxima produção. Nesta fase, após a obstrução dos vasos, os grãos tornam-se independentes da planta mãe (MAGALHÃES; DURÃES, 2011). Quando a planta atinge a maturidade fisiológica, ocorre a redução da umidade dos grãos e a perda de massa seca no campo devido ao processo de respiração (BROOKER et al., 1992). No entanto, o elevado teor de umidade dos grãos nesta fase inviabiliza a colheita mecanizada, devido a dificuldades na debulha, decorrentes do excesso de partes verdes e úmidas das plantas, o que pode levar a severas injúrias por amassamento dos grãos (MARQUES et al., 2009; ALVES et al., 2001).
Em levantamentos visando a caracterização dos sistemas de produção para elevadas produtividades de milho no Brasil, Cruz et al. (2009) constataram que na região Sul o período médio do plantio até a colheita foi de 172 dias, chegando a 195 dias nos plantios realizados em julho. Nas regiões Sudeste e Centro- Oeste, as médias do período do plantio até a colheita foi de 165 dias, chegando a mais de 190 dias nos plantios realizados em julho, na região Centro-Oeste. De uma maneira geral, o atraso na colheita do milho no Brasil tem variado, em média, de 2 a 10 semanas, dependendo de alguns fatores como a cultivar semeada, condições climáticas predominantes, tamanho da área plantada, colheitadeiras, capacidade de armazenamento, disponibilidade de recurso para secagem artificial e nível tecnológico do produtor (informação pessoal).
O atraso na colheita tem sido uma prática considerada de elevado risco, visto ficar a lavoura sujeita à ocorrência de uma série de fatores, como o acamamento das plantas devido a fortes ventos e chuvas, a germinação dos grãos nas espigas em condições de umidade elevada e o ataque de insetos. Além destes riscos, a secagem no campo tem sido relatada como favorável à infecção por fungos toxigênicos, pelo acúmulo de micotoxinas e pela perda na qualidade dos grãos (LAUREN et al., 2007; KAAYA et al., 2005; SANTIN et al., 2004; BRUNS; ABBAS, 2004). O atraso na colheita dos grãos na cultura do milho tem sido relacionado com o aumento da incidência de grãos ardidos e dos teores de aflatoxinas (KAAYA et al., 2005; MARQUES et al., 2009), das micotoxinas nivalenol e deoxynivalenol (LAUREN et al., 2007) e de fungos do gênero Aspergillus spp., Penicillium spp., Cephalosporium spp., e de algumas espécies do gênero Fusarium spp. (SANTIN et al., 2004). As perdas devido aos fatores acima relacionados têm sido estimadas entre 7 a 15%, podendo ser superiores a 50%, em situações de condições extremas (KAAYA et al., 2005).
A infecção dos grãos por fungos toxigênicos pode ocorrer tanto no campo quanto no armazenamento. Assim, as práticas culturais adotadas pelos produtores têm efeito direto, ou indireto, favorecendo, ou não, a infecção dos grãos por fungos toxigênicos e o acúmulo de micotoxinas (MARQUES et al., 2009; PALACIN et al., 2006).
O milho é um dos cereais mais predispostos à contaminação por fungos toxigênicos e ao acúmulo de micotoxinas nos grãos (HERMANNS et al., 2006). As micotoxinas são metabólitos tóxicos resultantes do metabolismo secundários de uma variedade de fungos, especialmente os pertencentes aos gêneros Fusarium spp., Aspergillus spp. e Penicillium spp.. Esta contaminação pode tornar os grãos impróprios para o consumo, resultando em grandes perdas econômicas e elevados riscos à saúde (HERMANNS et al., 2006; PASTER; BULLERMAN, 1988).
As principais micotoxinas relatadas em milho são as fumonisinas, as aflatoxinas, a zearalenona, a esterigmatocistina, o deoxinivalenol, o nivalenol, as ocratoxinas e a toxina T-2 (SCUSSEL, 1998; QUEIROZ et al., 2012). As fumonisinas, produzidas por fungos do gênero Fusarium spp. (principalmente F. verticillioides e F. proliferatum), constituem um grupo de micotoxinas com maior incidência e importância em grãos de milho, pois são altamente frequentes e a sua ingestão está relacionada a vários problemas de saúde em humanos e animais (BLANDINO et al., 2008; BUSH et al., 2004).
Estudos têm demonstrado uma forte correlação entre o consumo de alimentos contaminados com fumonisinas e anormalidades no tubo neural e câncer de esôfago em humanos (HERMANNS et al., 2006; PLACINTA, et al., 1999; STACK, 1998). Em animais, essa micotoxina é relacionada à ocorrência de leucoencefalomalácea em equinos e à síndrome de edema pulmonar em suínos (HERMANNS et al., 2006).
Diante do exposto, o presente trabalho teve como objetivo avaliar o efeito do atraso na colheita sobre a incidência de grãos ardidos e no acúmulo de fumonisinas totais em grãos de milho.
 
Material e Métodos
Foram conduzidos dois experimentos na área experimental da Embrapa Milho e Sorgo, em Sete Lagoas – MG, nas safras agrícolas 2009/2010 e 2010/2011. As semeaduras foram realizadas em dezembro de 2009 e em novembro de 2010. Foram utilizadas as cultivares Attack (Syngenta), BRS1035 (Embrapa) e DKB390YG (Dekalb). Os tratamentos consistiram de diferentes épocas de colheita, as quais foram realizadas aos 135, 150, 165, 180, 210 e 225 dias após a emergência (DAE). Em ambos os experimentos, foram utilizadas as mesmas cultivares e as mesmas épocas de colheita.
Foi utilizado o delineamento experimental de blocos ao acaso, com os tratamentos dispostos em arranjo fatorial 3 x 6 (cultivares x épocas de colheita), e três repetições. As parcelas foram constituídas por quatro linhas de cinco metros, espaçadas de 0,8 m entre linhas e média de cinco plantas por metro, após o desbaste. A adubação de plantio consistiu da aplicação de 350 kg.ha-1 da fórmula 8-28-16 + Zn (NPK). Aos 30 e 45 DAE foram realizadas as adubações nitrogenadas em cobertura utilizando-se 150 kg.ha-1 de ureia.
Em cada época de colheita, as espigas das duas linhas centrais de cada parcela foram colhidas, identificadas e debulhadas separadamente. O teor de umidade de cada massa de grãos foi determinado utilizando um medidor de umidade de grãos portátil modelo Mini Gac Plus, com resolução de umidade de 0,1%. A massa de grãos de cada parcela foi homogeneizada e duas amostras de 500 g foram retiradas para a realização das análises de patologia dos grãos e determinação dos teores de fumonisinas totais, respectivamente.
Em ambos os anos, as variáveis meteorológica temperatura (ºC) máxima e mínima, umidade relativa (%) e precipitação (mm) foram coletadas na estação climatológica, localizada na área experimental da Embrapa Milho e Sorgo.
Determinação da incidência de grãos ardidos e fungos associados aos grãos
A quantificação da incidência de grãos ardidos, em cada amostra, foi realizada através do exame visual e da separação dos grãos sadios daqueles que apresentavam sintomas de podridão (ardidos). Os grãos ardidos foram pesados e os resultados foram expressos em percentagem em relação ao peso total da amostra.
A partir dos grãos considerados ardidos foram realizados os testes de patologia para a identificação dos patógenos associados aos grãos. Para a realização deste procedimento, os grãos foram desinfetados superficialmente, através da imersão em hipoclorito de sódio a 2%, por cinco minutos. Em seguida, foram lavados duas vezes em água destilada esterilizada e, posteriormente, plaqueados em caixas tipo gerbox contendo papel de filtro umedecido com Ágar-Água a 5%. As caixas gerbox foram mantidas em temperatura ambiente para estimular a germinação dos grãos e, após 24 horas, foram transferidas para um freezer a uma temperatura de -5 ºC, onde permaneceram por um período de 24 horas. Após esse período, as caixas foram levadas à câmara de incubação com temperatura de 24 ºC e fotoperíodo de 12 horas. Após 15 dias, procedeu-se à identificação e à quantificação dos patógenos presentes nos grãos, com o auxílio de um microscópio estereoscópico e de um microscópio binocular.
Determinação dos teores de fumonisinas totais nos grãos
O preparo das amostras para análise dos teores de fumonisinas totais foi iniciado com a homogeneização do teor de água em estufa a 65 °C, até se obter peso constante. Após o resfriamento, os grãos foram moídos em moinho tipo Willey com peneira de 20 mesh. As fumonisinas totais foram extraídas em solução de metanol:água (80:20) e purificadas em colunas de imunoafinidade FumoniTest (VICAM Inc. USA), de acordo com a metodologia recomendada pelo fabricante no manual, com modificações validadas no laboratório para o peso de 10 g de amostra e os demais reagentes seguindo a proporção adequada para esse peso. Os extratos foram utilizados para as análises logo após a extração e a purificação. As fumonisinas foram quantificadas em fluorímetro VICAN, série 4. Todas as análises foram realizadas em duplicatas e, para cada bateria de análise, uma amostra referência com teor conhecido de fumonisinas totais (3,63 ppm +/- 1,290 ppm, Romer Labs, código BRM 003017, lote M10203B) foi adicionada como forma de garantir a qualidade.
Análises estatísticas
Os dados de incidência de grãos ardidos (%), dos teores de fumonisinas totais (ppm), teores de umidade e de incidência de fungos nos grãos (%) foram submetidos à análise de variância (teste F). Para o fator cultivar, as médias de grãos ardidos, dos teores de umidade e de micotoxinas e da incidência de fungos nos grãos, quando significativas pelo teste F, foram comparadas entre si através do teste de Tukey a 5% de significância (P<0,05). Para o fator época de colheita, as referidas médias, quando significativas pelo teste F, foram submetidas à análise de regressão linear (P<0,05). As variáveis estudadas foram analisadas utilizando-se o programa de análises estatísticas Sisvar 5.3 (FERREIRA, 2010).
 
Resultados e Discussão
As variáveis incidência de grãos ardidos, teor de fumonisinas totais (fumonisinas), incidência de Fusarium spp. e de Stenocarpella spp. e teor de umidade nos grãos, foram significativas (P≤0,05) para os fatores cultivar, épocas de colheita e ano. A interação cultivar x ano foi significativa para as variáveis incidência de grãos ardidos e teor de fumonisinas totais (P≤0,05). As demais interações não foram significativas. Portanto, os fatores época de colheita e ano foram analisados separadamente. O fator cultivar foi analisado na interação com o fator ano.
Para a variável teor de fumonisinas, as amostras referência apresentaram teores médios de 3,1 e 3,3 ppm para as análises realizadas nas safras 2009/2010 e 2010/2011, respectivamente, portanto, dentro do limite aceitável (3,63 +/- 1,29 ppm). Esses resultados garantem a qualidade das análises nas amostras de milho de ambos experimentos, as quais foram realizadas simultaneamente.
Na safra 2009/2010, o menor valor de incidência de grãos ardidos foi observado na cultivar Attack, seguido das cultivares BRS1035 e DKB390YG, respectivamente, os quais diferiram entre si (Figura 1). No entanto, uma tendência inversa foi observada para os teores de fumonisinas. Nesse caso, a cultivar DKB390YG apresentou o menor valor de fumonisinas nos grãos, seguido das cultivares BRS1035 e Attack, respectivamente, que também diferiram estatisticamente entre si. Na safra 2010/2011, foi verificada a mesma tendência observada no experimento anterior, embora as cultivares BRS1035 e DKB390YG, que apresentaram os maiores valores de grãos ardidos, e as cultivares Attack e BRS1035, que apresentaram os maiores valores de fumonisinas, não tenham diferido, estatisticamente, entre si.
A análise de regressão linear entre o fator época de colheita e a variável dependente do teor de umidade dos grãos, para a média dos dois anos, apresentou valor de R2 de 0,95 (Figura 2). O valor do parâmetro b1 da equação de regressão linear foi negativo, indicando a redução do teor de umidade dos grãos com o atraso da colheita. Os valores médios de umidade variaram entre 17,1 e 11,82%, para as colheitas realizadas aos 135 e 225 DAE, respectivamente. O valor de R2 da análise de regressão linear para a variável teor de fumonisinas totais em função da época de colheita foi de 0,93, na média dos dois anos. Nesse caso, o valor de b1 da equação de regressão foi positivo, indicando uma tendência de aumento dos teores de fumonisinas nos grãos com o atraso da colheita (Figura 2). Os valores médios de fumonisinas variaram entre 1,95 e 3,44 ppm, nas colheitas realizadas aos 135 e 225 DAE, respectivamente.
 
Figura 1. Incidência média de grãos ardidos e teor de fumonisinas totais em grãos de três cultivares de milho, nos experimentos conduzidos nas safras 2009/2010 (A) e 2010/2011 (B).
 
Para a variável incidência de grãos ardidos, foi verificada a mesma tendência observada para os teores de fumonisinas nos grãos. O valor de R2 foi de 0,96 e o parâmetro b1 da equação de regressão foi positivo, o que indica, também, uma tendência de aumento da incidência de grãos ardidos com o atraso da colheita (Figura 2). Os valores médios variaram entre 1,5 e 3,0%, nas colheitas realizadas aos 135 e 225 DAE, respectivamente.
Nos dois anos, a menor incidência de Fusarium spp. foi detectada na cultivar DKB390YG (Figura 3). As cultivares Attack e BRS1035 apresentaram os maiores valores de incidência de Fusarium spp. e não diferiram entre si, nos dois experimentos realizados. Para a incidência de Stenocarpella spp., as cultivares apresentaram resposta inversa ao verificado para as espécies de Fusariumspp. Nesse caso, no primeiro experimento, as cultivares Attack e BRS1035 apresentaram valores de incidência de Stenocarpella spp. significativamente inferiores aos verificados na cultivar DKB390YG, não diferindo estaticamente entre si. No segundo experimento, todas as cultivares diferiram entre si. A cultivar Attack apresentou o menor valor de incidência de Stenocarpella spp., seguido das cultivares BRS1035 e DKB390YG, respectivamente (Figura 3).
Em todas as épocas de colheita, a incidência de Fusarium spp. foi elevada na cultivar Attack, variando entre 77,9 e 100% (Figura 4). Na cultivar BRS1035, a incidência de Fusarium spp. variou entre 72,3 e 82,8%. A menor incidência desse gênero de fungos foi detectada na cultivar DKB390YG, a qual variou entre 30,7 e 79,3%.
 
Figura 2. Umidade, teor de fumonisinas totais e incidência de grãos ardidos em milho, em função de diferentes épocas de colheita nas safras 2009/2010 e 2010/2011.
Atraso na colheita e incidência de grãos ardidos e fumonisinas totais em grãos de milho - Image 1
 
Figura 3. Incidências médias de Fusarium spp. (A) e Stenocarpella spp. (B) em três cultivares de milho. Os números 1 e 2 representam as safras 2009/2010 e 2010/2011, respectivamente. Médias seguidas pela mesmas letras não diferem entre si pelo teste de Tukey (P≤0,05).
Atraso na colheita e incidência de grãos ardidos e fumonisinas totais em grãos de milho - Image 2
 
No segundo experimento, foi realizada a comparação da incidência de fungos entre os grãos considerados ardidos e os grãos visualmente assintomáticos (aparentemente sadios). Em todas as cultivares, a incidência de Fusarium spp. foi elevada tanto nos grãos ardidos quanto nos grãos assintomáticos (Figura 5). No entanto, a incidência de Stenocarpella spp. foi predominantemente mais elevada nos grãos ardidos. Na cultivar BRS1035, não foi detectada incidência de Stenocarpella spp. em grãos assintomáticos, estando esse gênero de fungos, na maioria dos casos, restrito aos grãos apodrecidos.
 
Figura 4. Incidência média de Fusarium spp. em grãos de milho em diferentes épocas de colheita. Os valores representam as médias das três cultivares e dos dois anos de estudo.
Atraso na colheita e incidência de grãos ardidos e fumonisinas totais em grãos de milho - Image 3
 
Figura 5. Incidências médias de Fusarium spp. e Stenocarpella spp. em grãos sintomáticos (ardidos) e assintomáticos (visualmente sadios) de milho. Os valores representam as médias para as três cultivares no experimento conduzido na safra 2010/2011.
Atraso na colheita e incidência de grãos ardidos e fumonisinas totais em grãos de milho - Image 4
 
Embora tenham sido detectadas diferenças entre as cultivares e as épocas de colheita, os percentuais de incidência de grãos ardidos detectados nos dois anos desse estudo foram considerados baixos, não ultrapassando o limite de 6% estabelecido como valor máximo para a presença de grãos ardidos em lotes ou cargas de grãos de milho no Brasil. No entanto, para os teores de fumonisinas totais, foram detectados valores acima do limite máximo de 5 ppm estabelecido recentemente pelo Ministério da Saúde, para milho em grão não processado, que entrará em vigor a partir de 2014.
No presente trabalho não foi detectada, entre as cultivares, correlação entre a incidência de grãos ardidos e o acúmulo de fumonisinas nos grãos. O híbrido DKB390YG apresentou as maiores incidência de grãos ardidos nos dois anos de estudo, no entanto, os teores de fumonisinas totais nessa cultivar foram estatisticamente menores que as detectadas nas demais cultivares, nos dois anos (Figura 1). Esse fato pode ser explicado devido à menor incidência de fungos do gênero Fusarium spp., responsáveis pela produção de fumonisinas, na cultivar DKB390YG. Por outro lado, a elevada incidência de grãos ardidos nessa cultivar pode ser justificada pela incidência significativamente maior de Stenocarpella spp. em comparação às demais (Figura 3). A elevada suscetibilidade da cultivar DKB390YG aos fungos do gênero Stenocarpella spp. tem sido relatada em outros trabalhos. Mendes et al. (2011), avaliando a viabilidade de inoculações de fungos causadores de podridões de espigas, em condição de campo, relatam a elevada suscetibilidade da cultivar DKB390 às espécies Stenocarpella maydis e S. macrospora. Resultados semelhantes foram obtidos por Mendes et al. (2012).
No milho, o ponto de máximo acúmulo de matéria seca nos grãos ocorre na fase de maturação fisiológica, quando estes se encontram com teor de água um pouco acima de 30% (MAGALHÃES; DURÃES, 2011). No entanto, a elevada umidade dos grãos nesta fase inviabiliza a colheita mecanizada, podendo levar a severos danos por amassamento dos grãos (MARQUES et al., 2009; ALVES et al., 2001). Segundo Mantovani (1989), o período ideal para a colheita do milho corresponde ao de teor de água nos grãos entre 18 e 26%. No presente trabalho, a primeira colheita foi realizada aos 135 DAE, quando os grãos apresentavam cerca de 17% de umidade. A partir desse momento, foi detectada uma redução gradativa do teor de água dos grãos, chegando a 12,3 e 11,3%, nas colheitas realizadas aos 225 DAE, nos dois anos, respectivamente.
A permanência das espigas no campo para permitir a secagem dos grãos favorece a incidência de fungos toxigênicos e o acúmulo de micotoxinas em milho (LAUREN et al., 2007; KAAYA et al., 2005; BRUNS; ABBAS, 2004; SANTIN et al., 2004). No entanto, Santin et al. (2004) verificaram que o atraso na colheita não influenciou no aumento da incidência de grãos ardidos, embora tenha resultado no aumento da incidência de Fusarium graminearum e das espécies dos gêneros Aspergillus spp., Cephalosporium spp. e Penicillium spp. Segundo esses autores, o atraso na colheita resultou, ainda, na redução da incidência de F. verticillioides. No presente trabalho, o atraso na colheita resultou em um aumento gradativo da incidência de grãos ardidos e dos teores de fumonisinas totais nos grãos, nos dois anos de estudo. Segundo Marin et al. (1998), as espécies do gênero Fusarium spp. infectam e colonizam, preferencialmente, substratos com teores de umidade maiores, ao contrário do que ocorre com os gêneros Aspergillus spp. e Penicillium spp. Essa tendência não foi observada no presente trabalho, uma vez que a incidência de fungos do gênero Fusarium spp. foi elevada em todas as épocas de colheita (Figura 5) e, considerando o aumento gradativo dos teores de fumonisinas observado nos grãos, é provável que a espécie F. verticillioides tenha sido predominante entre as desse gênero, por ser esta uma das principais produtoras dessa micotoxina em grãos de milho. Lauren et al. (2007) verificaram uma tendência de aumento das micotoxinas nivalenol e Deoxivalenol, produzidas por espécies do gênero Fusarium spp., com a permanência das espigas no campo. Segundo os mesmos autores, a incidência de espécies do gênero Fusarium spp., em híbridos suscetíveis, continuou aumentando mesmo com a redução do teor de água dos grãos. Esse fato também foi verificado no presente trabalho, visto que, nas cultivares mais suscetíveis à Fusarium spp., a incidência das espécies desse gênero foi elevada mesmo com a redução da umidade dos grãos observada nas últimas colheitas. É provável, portanto, que a reação (resistência ou suscetibilidade) das cultivares tenha um efeito mais pronunciado na incidência desse gênero de fungos que a umidade dos grãos em si.
Os resultados dos teores de fumonisinas nos grãos em função do atraso da colheita, obtidos nesse trabalho, estão de acordo com os relatados em outros trabalhos na literatura. Segundo Kaaya et al. (2005), a contaminação com aflatoxinas em grãos de milho teve início na fase de maturação fisiológica dos grãos e aumentou cerca de 4 vezes com um atraso de 3 semanas e mais que 7 vezes quando a colheita foi retardada por 4 semanas. Bush et al. (2004), estudando a infecção e a produção de fumonisinas em diferentes fases de desenvolvimento de grãos de milho na Carolina do Norte, verificaram que a infecção dos grãos por F. verticillioides e o acúmulo de fumonisinas foram detectados nos grãos próximos da fase de maturação fisiológica e aumentaram até a data média de colheita do milho. Segundo os autores, a realização da colheita dos grãos mais cedo, em torno de 25% de umidade, pode auxiliar na redução do nível de contaminação com essa micotoxina nos grãos.
No segundo experimento desse trabalho, foi realizada a análise de patologia tanto dos grãos sintomáticos (ardidos) quanto dos grãos assintomáticos. Essa análise revelou que fungos do gênero Fusarium spp. estavam presentes, em elevado nível de incidência, tanto nos grãos sintomáticos quanto naqueles assintomáticos (Figura 5). Contrariamente, fungos do gênero Stenocarpella spp. foram detectados quase que exclusivamente em grãos sintomáticos. Esses resultados podem explicar, pelo menos em parte, os elevados teores de fumonisinas detectados nos grãos, mesmo com a baixa incidência de grãos ardidos detectada nos dois anos de estudo. Bush et al. (2004) verificaram baixa incidência de grãos apodrecidos, mofados ou com descolorações nos dois anos de estudo. No entanto, os autores afirmam que apesar da baixa ocorrência de grãos ardidos, foram detectadas concentrações de fumonisinas nos grãos superiores aos limites estabelecidos para essa micotoxina em grãos in natura. Existe um grande número de modos pelos quais as espécies de Fusarium spp. podem infectar grãos de milho, resultando em grãos apodrecidos ou em infecções assintomáticas (BACON et al., 1992; HEADRICK; PATAKY, 1991; MUNKVOLD et al., 1997; THOMAS; BUDDENHAGEN, 1980). Segundo os mesmos autores, a incidência de grãos assintomáticos é, geralmente, maior que a incidência de infecções com presença de sintomas de podridão dos grãos.
Na comparação entre os dois anos, verificou-se, em média, teores de fumonisinas totais e incidência de grãos ardidos significativamente maiores (P≤0,05) no ano safra 2009/2010 (Figura 6). Os teores de fumonisinas totais foram de 3,8 e 1,76 ppm, nos anos safra 2009/2010 e 2010/2011, respectivamente. Quanto à incidência de grãos ardidos, os valores médios foram, na mesma ordem anterior, 2,59 e 1,73%, respectivamente. A comparação dos registros das variáveis climáticas, no período de condução dos experimentos, revela que as temperaturas (máxima e mínima) e a umidade relativa do ar se comportaram de modo semelhante nos dois anos (Figura 7). No entanto, uma diferença marcante entre os anos foi verificada para a variável precipitação. No ano 2009/2010, o total acumulado de chuva, no período de dezembro a julho, foi de 934,7 mm. No mesmo período do ano 2010/2011, o total acumulado de chuva foi de 260,9 mm, totalizando uma diferença de 673,8 mm. O estresse hídrico tem sido considerado um dos principais fatores determinantes da ocorrência de podridões de espigas e produção de fumonisinas por F. verticillioides em milho (MAIORANO et al., 2009; BATTILANI et al., 2008; DE LA CAMPA et al., 2005; MILLER, 2001). Os resultados obtidos no presente trabalho não reforçam essa informação. Uma elevada incidência de espécies do gênero Fusarium spp. foi detectada nos dois anos, tanto em grãos sintomáticos quanto assintomáticos. Os teores de fumonisinas totais foram significativamente mais elevados no ano 2009/2010, quando ocorreu um maior volume de chuva no período de condução do experimento. Parsons e Munkvold (2010) avaliaram o efeito da data de plantio, do estresse hídrico e ataque de insetos na incidência de podridões de espigas e no acúmulo de fumonisinas produzidas por Fusarium spp. Segundo os autores, dentre os fatores avaliados, o estresse hídrico foi o de menor efeito na ocorrência de podridões de espiga e fumonisinas nos grãos. Embora exista a correlação entre o estresse hídrico e o aumento da incidência de podridões de espiga por espécies do gênero Fusarium spp e da concentração de fumonisinas, o fator causal dessa maior severidade, sobre condição secas, pode incluir outros estresses que estão correlacionados com a insuficiente umidade do solo, como elevadas temperaturas e ocorrência de algumas espécies de insetos. Temperaturas mais elevadas estão correlacionadas com o maior crescimento de F. verticillioides (SAMAPUNDO et al., 2005; REID et al., 2009) e são frequentemente associadas com condições de estresse hídrico, o que permite um crescimento mais rápido do fungo, resultando em maior severidade da doença e maior teores de fumonisinas nos grãos.
 
Figura 6. Valores médios de fumonisinas totais (ppm) e de grãos ardidos (%) nos anos safra 2009/2010 e 2010/2011. Os valores, em cada ano, representam as médias das três cultivares nas seis épocas de colheita. Médias seguidas por letras distintas, dentro de cada ano, são estatisticamente diferentes entre si pelo teste de Tukey (P≤0,05).
Atraso na colheita e incidência de grãos ardidos e fumonisinas totais em grãos de milho - Image 5
 
Figura 7. Precipitação (mm), umidade relativa (%) e temperaturas (ºC) máxima e mínima, no período de dezembro/2009 a julho/2010 e dezembro/2010 a julho/2011, obtidas na estação climatológica da Embrapa Milho e Sorgo, em Sete Lagoas - MG.
Atraso na colheita e incidência de grãos ardidos e fumonisinas totais em grãos de milho - Image 6
 
Conclusões
O atraso na realização da colheita, nas condições do presente trabalho, resultou no aumento gradativo da incidência de grãos ardidos e dos teores de fumonisinas totais nos grãos de todas as cultivares avaliadas. Portanto, evitar a permanência dos grãos no campo por longos períodos de tempo, após a maturação fisiológica, pode ser uma estratégia para contribuir com a redução da contaminação dos grãos com fungos toxigênicos e fumonisinas.
As espécies do gênero Fusarium spp. foram capazes de colonizar e de produzir elevados teores de fumonisinas mesmo com baixo teor de umidade nos grãos.
Fungos do gênero Fusarium spp. podem estar presentes tanto nos grãos com sintomas de podridão quanto em grãos assintomáticos.
 
Agradecimentos
À Embrapa Milho e Sorgo e ao CNPq pelo auxílio financeiro.
 
Referências
ALVES, W. M.; FARONI, L. R. A.; CORRÊA, P. C.; QUEIROZ, D. M.; TEIXEIRA, M. M. Influência dos teores de umidade de colheita na qualidade do milho (Zea mays L.) durante o armazenamento. Revista Brasileira de Armazenamento, Viçosa, MG, v. 26, n. 2, p. 40-45, 2001.
BACON, C. W.; BENNETT, R. M.; HINTON, D. M.; VOSS, K. A. Scanning electron microscopy of Fusarium moniliforme within asymptomatic corn kernels and kernels associated with equine leukoencephalomalacia. Plant Disease, St. Paul, v. 76, p.144-148, 1992.
BATTILANI, P.; PIETRI, A.; BARBANO, C.; SCANDOLARA, A.; BERTUZZI, T.; MAROCCO, A. Logistic regression modeling of cropping systems to predict fumonisin contamination in maize. Journal of Agricultural and Food Chemistry, Washington, v. 56, p. 10433-10438, 2008.
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