Apresentação
Nos últimos 25 anos, a produção brasileira de leite aumentou 119%, passando de 10,2 bilhões de litros em 1979 para 22,3 bilhões em 2003. Para o ano de 2005 a expectativa é de que se confirme uma produção de 22,9 bilhões de litros de leite.
Considerando a importância do leite para a economia, para a dieta humana e as exigências de qualidade dos consumidores faz-se necessário a produção de publicações que contemplem informações quanto a contaminação deste produto por substâncias e/ou resíduos químicos, sobre tudo as ocasionadas por metabólitos fúngicos, com foco na melhoria da qualidade, segurança e inocuidade do leite.
Procedimento de detecção e quantificação
O procedimento mais utilizado é a Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE), com ou sem derivação pós-coluna, detector de fluorescência, os kits de Elisa, fluorimetria e Cromatografia de Camada Delgada (CCD) ou a Cromatografia de Camada Delgada de Alta Eficiência (CCDAE).
Especificamente na CLAE a coluna cromatográfica mais utilizada é a C18. Os volumes de injeções mais freqüentemente utilizados estão entre 50 e 150 μL, e a temperatura da coluna varia de ambiente à 50ºC. Os componentes das fases móveis mais utilizados são os solventes: acetonitrila, metanol, água. No caso da derivação pré-coluna o reagente utilizado é o Ácido Trifluoracético (TFA), e na pós-coluna o reagente perbrometo de di-bromo pirimidina (C5H6Br3N) e a razão de fluxo fica entre 0,25 a 0,75 mL/min. Nas metodologias que não realizam a derivação, a razão de fluxo varia de 0,25 até 1,75 mL/min. Os tipos de detectores são os de fluorescência, Ms, MS-Ms e UV (Association..., 2000).
Legislação
A legislação para as micotoxinas, inclusive a AFM1 é muito controvertida, entretanto existe uma perspectiva de uma maior uniformização ao longo dos próximos anos em função das recomendações do Codex Alimentarius, principalmente, dos países signatários da Organização Mundial do Comércio. Existindo, porém, diferenças significativas na regulamentação de micotoxinas a nível nacional e internacional ( Legislação..., s.d.).
Brasileira
Ministério da Saúde: Resolução RDC no 274, da ANVISA, de 15 de outubro de 2002, publicada no Diário Oficial da União, de 16/10/2002:
- Leite fluido: Aflatoxina M1 = 0,5 μg/L (ppb)
- Leite em pó: Aflatoxina M1 = 5,0 μg/L (ppb)
Métodos de detecção e quantificação de Aflatoxina M1 em leite e derivados
Os métodos existentes para determinação de aflatoxina M1 baseiam-se em alguma medida física ou característica química da mesma. A vantagem e utilidade do método analítico são diferenciadas pelas características práticas como aplicabilidade, o custo, a eficiência, o tempo requerido, o equipamento e o nível de treinamento necessário. A confiança é determinada pelas características científicas tais como precisão, exatidão, sensibilidade e especificidade. De um modo geral os métodos de análise de resíduos contêm cinco etapas básicas. A primeira é a amostragem, a segunda é a extração ou diluição, a terceira o clean-up ou limpeza do extrato, a quarta concentração e a quinta detecção ou quantificação.
A extração
Os solventes de extração mais utilizados nas metodologias disponíveis na literatura para análise de aflatoxina M1 em leite em pó e fluído são: água, acetonitrila, metanol, além de clorofórmio, diclorometano, acetato de etila, hexano, solução de cloreto de sódio, NaOH, tampão fosfato, dentre outros.
Procedimento de extração
Os tratamentos mais utilizados no leite fluído e leite em pó são: blender e homogeneização com solvente, centrifugação, agitação mecânica com solvente, adição de NaCl, dentre outros Existem metodologias que utilizam também ultrasom, ultra turrax e extração com água quente ou gelada para a análise de micotoxinas em leite em pó.
Procedimento de limpeza ou clean-up
Os mais utilizados são as colunas de imunoafinidades, e os clean-up químicos mais utilizados são os cartuchos de sílica tipo Sep-PaK ou SPE.
Prevenção
A melhor forma de prevenção contra a contaminação por AFM1 consiste em não administrar aos animais rações contaminadas por AFB1. Os métodos de seleção dos grãos de cereais e posterior separação mecânica da casca e do pó, do resto do cereal, são adequados para minimizara contaminação, uma vez que normalmente a maior concentração de micotoxinas se verifica no pericarpo do grão e no pó do cereal. Estes procedimentos podem ser utilizados tanto nos alimentos para animais como para seres humanos.
Portanto, é fundamental a aquisição de milho e rações de boa procedência, bem como dispensar os devidos cuidados na armazenagem destes produtos, tais como : controle da temperatura, da umidade, e de pragas.
Os tratamentos térmicos aplicados para o controle de aflatoxinas, a uma matéria-prima ou a um alimento composto, não são muito eficazes, uma vez que a AFB1 é resistente a altas temperaturas, cerca de 120ºC. Apesar de, em alguns tipos de processamento onde a temperatura utilizada ser superior a 120ºC, o tempo de permanência nessa temperatura é insuficiente para uma redução significativa do teor de AFB1.
As rações destinadas a alimentação de animais poligástricos e, consequentemente, para vacas leiteiras normalmente contém matériasprimas secas (12-13% de umidade ou água livre), como também, forragens com um teor de umidade ou de água livre muito elevado, na ordem dos 70 a 85%. Estes valores que podem dar origem a atividades de água (Aa) muito elevadas de cerca de 0,85-0,98 em temperaturas entre 20 e 25ºC. Estas condições são ideais para o desenvolvimento dos Aspergilli e consequentemente para a síntese de AFB1.
A aplicação de normas de higiene, de limpeza, bem como de fumigação contra insetos, roedores, bactérias e fungos nas fábricas de alimentos e de rações devem ser observadas. É aconselhável, sempre que possível, o armazenamento das matérias primas com teores de umidade situados entre 8 e-11,5% no caso das oleaginosas, ou entre 12-13% para amiláceas como é o caso dos cereais, proporcionando atividades de água (aA) da ordem de 0,65-0,70 a 25-30ºC. Desse modo pode-se minimizar o desenvolvimento de fungos e a conseqüente produção de micotoxinas (Gimeno & Martins, 2003).
Principais Efeitos Tóxicos
O potencial carcinogênico da AFM1 é significativamente inferior ao da AFB1, como tal, a AFM1 e a AFB1 possuem uma TD50 (teor de micotoxina passível de desenvolver tumores malignos em 50% dos indivíduos) de 10,38 e 1,15 microgramas/kg p.c. (peso corporal) / dia, respectivamente, o que pressupõe que a AFM1 é cerca de nove vezes menos carcinogênica que a AFB1. Os fatores que influenciam a toxicidade da AFM1 em seres humanos, são similares aos mesmos que influenciam a toxicidade das micotoxinas, de uma maneira geral (Kuiper-Goodman, 1994), tais como:
a) a biodisponibilidade das micotoxinas;
b) os sinergismos que ocorrem entre elas;
c) o teor de micotoxinas ingerido diariamente em função da concentração de substâncias e da quantidade dos alimentos ingeridos;
d) a continuidade ou intermitência da ingestão do alimento contaminado;
e) o peso do indivíduo, respectivo estado de saúde e condição fisiológica;
f) a idade do indivíduo, as crianças e os jovens são mais sensíveis à toxicidade das micotoxinas devido à maior variabilidade do metabolismo basal e que eventualmente não possuem todos mecanismos bioquímicos suficientes para a destoxificação.
Relação de AFB1 ingerida e a concentração de AFM1 excretada no leite
Em vacas leiteiras, a relação entre a concentração de AFB1 na ração e a da AFM1 produzida é muito variável, podendo oscilar entre 34:1 a 1600:1. Esta variação pode ocorrer de um animal para outro, bem como, de uma lactação para outra.
Introdução
O leite está entre os produtos alimentícios que apresentarão maior crescimento de produção e de consumo nos próximos anos. Entretanto, o leite é altamente susceptível a contaminações microbianas que o torna facilmente deteriorável, podendo ser um veículo de toxi-infecção alimentar. Existe, ainda a contaminação ocasionado por substâncias e/ou resíduos químicos entre os quais a aflatoxina M1 (AFM1). Este composto, potencialmente hepatocarcinogênico, é sintetizado a partir da biotransformação de aflatoxina B1, um metabólito secundário, produzido por algumas espécies fúngicas pertencentes ao gênero Aspergillus, que se desenvolvem principalmente em grãos, cereais e rações. Estas matériasprimas são cada vez mais são utilizados na complementação da alimentação de bovinos, a medida que se busca maior produtividade, e pela insuficiência de pasto, e quando a silagem, não são suficientes para alimentação de rebanhos de alta produtividade. A presença de AFM1 no leite, destinado ao consumo humano, é altamente preocupante para a segurança alimentar (Bressan & Martins, 2004), considerando-se que grande parte deste produto é destinado a alimentação infantil.
As Aflatoxinas
São substâncias tóxicas, essencialmente produzidas por espécies de Aspergillus flavus e A. parasiticus. Embora estes microrganismos desenvolvam-se a temperatura média de 30º C, a síntese de micotoxinas situa-se na faixa entre 10 - 12º C. A atividade de água (Aa) mínima necessária para o início do desenvolvimento e conseqüente produção destas micotoxinas situa-se entre 0,75 e de 0,83, respectivamente. Os Aspergilli crescem e podem produzir micotoxinas a 25º C, com uma atividade de água de 0,95. No entanto, existem algumas espécies de Aspergillus flavus que podem produzir aflatoxinas em condições mais extremas em arroz, com produção entre 6 e 45º C, tendo um comportamento ótimo a 37º C, ocorrendo a produção de micotoxinas entre 11 e 36º C, com um nível máximo de produção a 30ºC (Hesseltine, 1976; Mycotoxins, 2003). Atualmente, conhecem-se 18 tipos de aflatoxinas, entre as quais a mais tóxica é a aflatoxina B1 (AFB1).
A Aflatoxina M1 (AFM1)
A aflatoxina M1 (AFM1) é um derivado 4-monohidroxilado (Fig. 1) proveniente de um complexo processo de biotransformação da aflatoxina B1 no organismo de alguns animais. Assumindo importância destacada, considerando-se que pode ser excretada no leite e na urina (Oliveira & Gemano, 2001).
Fig. 1. A aflatoxina M1 (AFM1)
Mecanismo de Contaminação do Leite por AFM1
A contaminação do leite por Aflatoxina M1 se da a partir da ingestão de ração ministrada ao gado contaminada por Aflatoxina B1, sendo absorvida via trato gastrointestinal, passando ao sistema sangüineo e transportada para o fígado onde se processa a sua metabolização. Uma parte desta aflatoxina é ativada e fixada nos tecidos hepáticos. Outros metabólitos conjugados da AFB1 hidrossolúveis são excretados via bílis, através das fezes. Outras formas conjugadas hidrossolúveis, produtos de degradação da AFB1 e respectivos metabólitos não conjugados são excretados no sistema circulatório sangüíneo distribuindo-se por via sistêmica e transferindo-se para o leite, ovos, músculos e demais tecidos comestíveis (Dennis & Hsieh, 1981) (Fig. 2).
A AFM1 é um desses derivados metabólicos que passa para o leite, contaminando-o. A partir da AFB1 poderão se formar outros metabólitos. Na maioria das vezes o organismo animal produz estes metabólicos como um sistema de auto-destoxificação. A reação que se produz a partir da micotoxina original não é, necessariamente completa, nem irreversível.
Fig. 2. Metabolismo de Aflatoxina B1 no fígado de aves