Introdução
A presença do vírus da Doença de Newcastle em sua apresentação velogênica continua sendo um grave problema na avicultura em todo o mundo. As medidas de biossegurança e vacinação são, atualmente, os métodos de controle disponíveis mais efetivos para seu controle. No entanto, a diversidade antigênica e genética do vírus distanciou filogeneticamente as linhagens vacinais atuais dos isolamentos velogênicos recentes, encontrados na América Central, América do Sul (Miller et al., 2010), algumas regiões dos Estados Unidos (Peedersen et al., 2004) e do México pertencentes ao Genótipo V, da classe II (Perozo et al., 2008). A heterologia mencionada poderia facilitar a evolução do vírus da ENC virulento (Miller et al., 2007). Num estudo, Lucio et al.(2007), demonstraram a distância filogenética entre linhagens de campo isoladas no México e a linhagem La Sota, amplamente utilizada neste e outros países. Diversos estudos foram feitos para comparar a eficácia das vacinas utilizadas frequentemente e das vacinas com linhagens homólogas aos desafios (Miller et al., 2009). Existe evidência recente de que o uso de vacinas homólogas aos vírus de desafio pode reduzir a excreção viral. Miller et al. (2007) mostraram que uma vacina homóloga à linhagem de desafio (CA02 do genótipo V) reduziu a excreção viral oral significativamente mais que as vacinas heterólogas inativadas com linhagens como a B1 e a Ulster (Genotipo II e I respectivamente). Hu et al. (2009) mostraram efeitos semelhantes contra o vírus do genótipo VII.
O objetivo deste trabalho foi desenvolver uma vacina com um vírus recombinante (quimera) que expresse o gene da hemaglutinina-neuraminidase de um vírus do Genótipo V (classe II), realizando uma modificação na sequência genética, no ponto de ruptura de sua proteína de fusão, e determinar sua eficácia contra a mortalidade diante de um desafio de campo, e seus efeitos nos parâmetros produtivos num lote de frangos de corte, assim como na excreção viral.
Materiais e Métodos
Desenvolvimento da linhagem vacinal recombinante recP05
O genoma em forma de ARN da linhagem La Sota foi proporcionado pelo Laboratório de Biologia de Investigación Aplicada S. A. de C.V. A linhagem P05 foi isolada em 2005 por Investigación Aplicada S.A. de C.V. e seu genoma em forma de ARN foi proporcionado pelo Laboratório de Biologia da mesma empresa.
Foi utilizado o método da transcriptase La Sota. Finalmente, foram construídos três vetores plasmídicos de expressão pIASAP, pIASANP e pIASAL para os genes P, NP e L do vírus P05 para as proteínas que conformam o complexo da ARN polimerase e se recuperou o vírus em células Hep 2, após ser infectado com o vírus "Vaccinia" modificado Ankara para expressar a ARN polimerase do bacteriófago T7. A construção final do genoma do vírus recombinante aparece na figura 1.
Figura 1. Construção do vírus linhagem recP05.
Uso da vacina com linhagem recP05 num lote de frango de corte
Foi avaliada a proteção proporcionada pela vacina recombinante do genótipo V recP05 numa granja de frango de corte em que foram utilizados um total de 299.943 frangos da linhagem Ross, os quais foram divididos em 2 grupos: Grupo A de 96.869 frangos e Grupo B de 203.074 frangos. As aves de ambos os grupos receberam o mesmo manejo médico e zootécnico. Por isso, todas foram vacinadas com uma vacina bivalente a vírus inativo contra a ENC (genótipo V) e Influenza Aviária (A/Chicken/México/232/94CPA) em emulsão nos dias 1 e 10 de idade. Nos dias 10, 20 e 31 de idade as aves do Grupo A receberam a vacina experimental a vírus vivo de ENC, linhagem do genótipo V (recP05), enquanto que as do Grupo B receberam uma vacina a vírus vivo de ENC, do genótipo II (La Sota). Na granja foram realizadas as mesmas prática de manejo, alimentação e biossegurança para ambos os grupos, e foram registrados os seguintes parâmetros produtivos do lote: total de baixas, porcentagem de mortalidade, idade média de venda, peso médio de venda, conversão alimentar, ganho diário de peso (GPD) e índice de produtividade. Foram coletados swabs traqueais nas 4ª, 5ª e 6ª semanas para detecção de partículas virais por PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) em tempo real. Foram realizados o isolamento e o sequenciamento genético do vírus.
Resultados & Discussão
Porcentagem de Mortalidade (%)
O Grupo A vacinado com vírus vivo com linhagem do Genótipo V mostrou uma mortalidade menor (4,76 %), com uma diferença de 12,17 % com relação ao Grupo B (16,93 %) vacinados com linhagem do genótipo II (Tabela 1).
Idade média de venda (dias)
El Grupo A vacinado a vírus vivo com linhagem do Genótipo V resultou com 0,8 dias menos para a venda (42,1 dias) em comparação com as aves do Grupo B vacinadas a vírus vivo com linhagem do Genótipo II (42,9 dias) (Tabela 1).
Peso médio de venda (gramas)
O Grupo A vacinado com a vacina experimental com vírus vivo recP05 mostrou 98g menos na venta (1.965 g) em comparação com o Grupo B vacinados a vírus vivo com linhagem do Genótipo II (2.063 g). (Tabela 1)
Conversão alimentar
O Grupo A vacinado a vírus vivo, linhagem do Genótipo V mostrou 0,056 melhor conversão alimentar ou 56 gramas menos de ração consumida por quilograma produzido (1.902), em comparação com o Grupo B vacinados a vírus vivo com linhagem do Genótipo II (1.958).
Ganho diário de peso (gramas)
O Grupo A vacinado a vírus vivo com linhagem do Genótipo V teve 1,34 g menos de GDP no final da criação (46.44 g) em comparação com o Grupo B, vacinados a vírus vivo com linhagem do Genótipo II (47.78 g). (Tabela 1)
Índice de produtividade
O Grupo A vacinado vírus vivo com linhagem do Genótipo V mostrou um melhor índice (214,40) em comparação com o Grupo B vacinados a vírus vivo com linhagem do Genótipo II (202,68). (Tabela 1)
Tabela 1. Parâmetros produtivos do lote e diferença de resultados entre Grupo A e Grupo B.
Na semana 4, o teste de PCR, em tempo real, foi positivo em ambos os grupos. No entanto, se observou um título maior de partículas virais no Grupo B vacinado com a linhagem La Sota, com uma diferença logarítmica (Tabela 2). Foi feito sequenciamento genético e identificado o vírus do genótipo V. O isolamento viral demonstrou a presença de vírus velogênico.
Tabela 2. Excreção viral. Resultados de PCR em tempo real de detecção de partículas virais em exsudado faríngeo.
Os resultados obtidos coincidem com o que foi observado por Miller et al. (2007), que demonstraram que as vacinas elaboradas com vírus homólogos ao de desafio reduziram mais a excreção viral que as vacinas heterólogas, e por isso sugerem que as vacinas formuladas para ser filogeneticamente mais próximas ao vírus potencial de desafio podem facilitar o controle da ENC, reduzindo a transmissão a partir das aves infectadas. As vacinas utilizadas atualmente, em geral, protegem contra a morbilidade e a mortalidade em desafios de campo. No entanto, de acordo com van Boven et al. (2008) a efetividade das vacinas deve ser determinada, além disso, por sua capacidade para diminuir a excreção viral.
Conclusões
Nos últimos anos, cresceu o interesse por atualizar as linhagens vacinais contra a ENC, com o propósito de proporcionar uma maior proteção aos lotes, controlando a recirculação de vírus nas granjas pela excreção viral, que geralmente se detecta nas aves que recebem vacinas com linhagens heterólogas. O uso da vacina elaborada com um vírus recombinante de genótipo homólogo ao de um vírus de campo demonstrou que é possível oferecer uma adequada proteção contra a mortalidade e proporcionar um melhor controle da excreção viral, além de melhorar os parâmetros produtivos de um lote de frango de corte. Isto demonstra que são consistentes os benefícios obtidos com o aproveitamento dos avanços em tecnologia genética e com a análise da situação no campo, em relação a uma doença que continua preocupando tanto a indústria como a comunidade científica que procura melhorar os métodos de controle.
Bibliografia
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